tag:blogger.com,1999:blog-188044832024-03-06T11:09:52.922+00:00Sine DiePatrícia Naré Agostinhohttp://www.blogger.com/profile/16686368966400692904noreply@blogger.comBlogger2925125tag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-89401661554030400522020-10-20T23:05:00.002+01:002020-10-20T23:05:39.557+01:00O discurso do Presidente<p>
</p><p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
(demonstrativo da coragem que um líder invulgar ostenta ao mundo
inteiro em tempo de pandemia)
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Eis, eis! Aqui estou
acenando-vos com a mão e retirando da cara, com energia, este trapo
que parece uma mordaça com que saí do hospital, disposto a retomar
o lugar de <i>great president</i> do nosso país <i>very great. </i><span style="font-style: normal;">
Antes de mais, </span><i>thank you very much</i><span style="font-style: normal;">
pelo amor que tendes demonstrado para com a minha pessoa. Uma
mensagem patriótica vos quero transmitir nesta hora do recomeço.
</span>Não tenham medo da Covid 19. Afinal, não presta para nada,
asseguro-vo-lo. É muito fácil debelar a doença. Acabo de ter a
experiência disso. Sou o vosso presidente e, por isso mesmo, quis
desafiar o vírus e enfrentá-lo sem medo, como um valente que não
teme arrostar a adversidade, seja que adversidade for. Vocês sabem
muito bem que sou um homem teso, no verdadeiro sentido da palavra, e
que não sou como os maricas desses democratas que andam mascarados.
Comigo não há máscaras. Apanhei o vírus com a coragem e a
frontalidade que vocês conhecem. Posso mesmo dizer: <i>cacei o vírus</i>
e vi a realidade de que é feito. Não é nada do que dizem para aí.
Ele é mesmo chinês, um fracalhão. Agora posso dizer com mais
fundamento ao presidente Xi que o império dele não vale nada e que
nós não vamos deixar que esse falso império nos ultrapasse. </span>
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Encarei o vírus e eis-me aqui
à vossa frente, são como um pêro, como estais a ver; sinto-me
melhor do que nunca, depois de o ter derrotado em tempo <span style="font-style: normal;">recorde</span>
(comigo, não há cá forma de engonhar: <i>it’s make or br</i><i>e</i><i>ake.</i>
Vocês conhecem-me). Eu andei pelas ruas e pelo meio das multidões
sem medo desse vírus, sempre de cara destapada, como deve andar um
homem que se preza, e a verdade é que o apanhei e dei com ele em
pantanas. Fi-lo para vos demonstrar, como vosso presidente, que é
preciso não ter medo. </span>
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">É certo que já sucumbiram ao
vírus mais de duzentos mil dos nossos compatriotas, mas não receiem
pelas vossas vidas. Esses compatriotas eram, na sua maioria,
democratas timoratos (as informações em contrário são <i>fake
news</i>) e não tinham o segredo da resistência ao vírus. Foi
preciso que eu me expusesse insistentemente ao risco de o apanhar
para que esse segredo fosse descoberto. Estou rodeado dos melhores
médicos, porque, sendo o vosso presidente, tenho naturalmente o
direito de tê-los e é preciso que a minha saúde seja bem cuidada
para que possa continuar a ser o vosso presidente, embora correndo
riscos com toda a generosidade e valentia. Foi graças à minha
equipa de brilhantes médicos e à minha serenidade face ao vírus,
que estoicamente recebi no meu corpo quando ele resolveu atacar-me,
que se descobriu a arma para o fulminar. Claro que eu tive que
voluntariar-me (fi-lo pela nossa grande Nação e pelos meus queridos
compatriotas) para experimentar a mezinha apta a liquidá-lo. E agora
estou aqui rijo como sempre (porventura até mais fortalecido pela
crise que atravessei), estou aqui a dizer-vos que aprendi com a minha
experiência como se comporta o vírus que Xi nos mandou para cá e a
maneira de o liquidar. É muito fácil anulá-lo. Não se acreditem
nesses gajos da Ciência que andam para aí a dizer que ele é muito
perigoso. Olhem para mim. Estou sem máscara e imunizado de vez. A
primeira dama também lá está na Mansão Presidencial, bem de
saúde, mofando do vírus. Eu vou revelar-vos o segredo de o
derrotar. É muito fácil. Coisa de um <i>coktail</i> e mais umas
beberagens. Já sei que os democratas preferem andar mascarados,
porque eles são maricas com medo do vírus, mas os meus apoiantes
são homens e mulheres que vão em frente como eu, de cara destapada.
Aprecio esses homens e sobretudo essas mulheres, que são grandes
entusiastas e fãs da minha pessoa. </span>
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><i>Thank God </i> o vírus
atacou-me perto das eleições, dando-me a oportunidade de mostrar ao
nosso povo a coragem que me caracteriza e de descobrir a fórmula
para o debelar. Ele vai desaparecer, vai… Vamos ter doravante um
período dourado. E o candidato democrata que venha enfrentar-me sem
máscara. Mando-lhe um bafo, que o deito por terra. </span>
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">(Transcrito com a fidelidade
que sempre tem demonstrado este vosso criado)</span></p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</p>
<p align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"> Jonathan Swift (1665-1745)</span></p>
<p><style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: #000000; line-height: 115%; text-align: left; orphans: 2; widows: 2; background: transparent }
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p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; so-language: hi-IN }</style></p>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-60784947950084396362020-08-07T18:26:00.001+01:002020-08-07T18:31:15.330+01:00China VIII<br />
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">De
regresso a Hong Kong, reatamos a ligação com Ken, o guia que
deixámos na partida para Macau. Vamos a um passeio na baía de Hong
Kong e ao porto de Aberdeen, uma vila piscatória. De barco,
percorremos a baía, por entre juncos, yates, traineiras e as
célebres casas flutuantes, onde vivem muitas famílias com seus
animais, roupas estendidas a secar ao sol, antenas de televisão a
ligarem-nas ao mundo exterior. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">De
novo em terra, vamos em demanda do pico Vitória. No início da
subida que vai caracolando em curva e contracurva até ao cimo,
paramos numa praia magnífica, uma estância balnear no oceano
Pacífico, bem servida de adequadas instalações. Praia deserta
neste quase fim-de-tarde, mas banhada em doce tranquilidade, sol a
esmorecer por cima da água em repouso, uma ilhota erguendo-se no mar
em majestosa melancolia, colinas diluindo-se ao fundo em esfumada
distância. Apetecia dar um mergulho e umas braçadas valentes, mas
não é ocasião de praia. Há quem se contente em ir até à borda
de água para molhar os pés, atravessando o vasto areal.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Seguimos
em frente, na ascensão ao </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>Victoria
Peak</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
550 m. de altitude. É um local de muito turismo. Do alto, obtém-se
uma vista soberba sobre Hong Kong, o casario com seus arranha-céus
avultando, a baía, as montanhas que rodeiam a cidade. É ao
escurecer, as luzes começam a acender-se. Restaurantes e dois
centros comerciais povoam o alto. Junto a um dos centros comerciais
tem paragem final o funicular. Porém, não é aqui que tem lugar o
nosso jantar. Este ocorre num restaurante na baixa da cidade, para
onde vamos no autocarro, sempre encaminhados pelo Ken. Por sinal, um
jantar muito agradável, com muitos pratos, como é típico na China,
dos melhores que temos saboreado. Comida cantonesa.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Instalados
no hotel, saio para a rua antes de dormir. Não há por aqui grandes
coisas para observar, nem grandes vistas. Como já referi, o hotel
fica num alto, que é ocupado praticamente pelo complexo que inclui o
centro comercial Metropolis. Ao fundo, vêem-se estradas alcatroadas
cruzando-se em vários níveis. Porém, saio para contemplar, pelo
menos, a grande fachada do hotel, que se desenvolve em harmónio, o
grande átrio buliçoso, onde os funcionários do câmbio trocam
divisas estrangeiras pelos dólares de Hong Kong. Fora, há um espaço
ajardinado bastante agradável, iluminado durante a noite, com
pequenos lagos e chafarizes e bancos para as pessoas se sentarem. Há
uma escadaria para descer a colina e que, por baixo de uma das
estradas acima referidas, conduz os peões ao outro lado, onde parece
haver uma estação de Metro. Este local onde está situado o hotel
não olha para a cidade, o casario, o movimento das pessoas; em
contrapartida, está muito perto das vias de acesso e saída da
cidade, nomeadamente da estrada que conduz ao grande túnel
subaquático, no termo do qual está o cais onde se apanham os barcos
para Macau, como já referido. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="font-style: normal; line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br />
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Eis
um novo dia cheio de sol – um sol companheirão que não nos tem
largado nestes dias de viagem. Ele entra pelo quarto em jorros, mal
corrida a cortina, proclamando estridentemente o seu carácter
festivo. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Esta
é uma manhã livre em que cada qual pode dispor do tempo como lhe
aprouver. Tomado o pequeno-almoço nas calmas na sala de aspecto muio
íntimo com mesinhas de duas ou quatro pessoas devidamente atoalhadas
e onde se detectam hóspedes de várias proveniências, atestando o
ar cosmopolita do hotel, pondero entre sair para o centro da cidade
num dos pequenos autocarros a isso destinados, ou ficar por aqui na
sorna. Hoje é o último dia útil de viagem; os dias gastos nas
viagens de ida e volta não os incluo no tempo útil de fruição.
Estes são consumidos a andar de avião em que se vai atarracado em
bancos sem espaço para cruzar as pernas, numa total ausência de
paisagem, fingindo dormir quando o sono aperta, ansiando pelo dia ou
hora de chegada. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Opto
por ficar no hotel. Por volta do meio-dia, há que pôr as malas à
porta do quarto, a fim de que os funcionários a isso destinados as
carreguem em carrinhos próprios e as levem para o autocarro que nos
há-de transportar durante todo o longo dia que temos pela frente,
até à hora de avançarmos para o aeroporto. Se fosse para o centro
da cidade, teria que sujeitar-me às horas dos autocarros que levam e
trazem os hóspedes, embora com frequência de 20 em 20 minutos e,
preocupado com a hora das malas, pouco disfrutaria da cidade. Não
seria assim, se me tivesse levantado muito cedo. Fico, pois, e vou
lendo, de meu vagar, os guias que trouxe comigo, escritos em inglês.
Antes, porém, vou dar um curto passeio a pé, descendo a rampa que
vai do hotel a uma das estradas asfaltadas, lá em baixo. É uma
forma de quebrar o mistério: saber o que há para esses lados. E há
prédios altos na continuação do hotel, grandes armazéns ou
empresas de largas portas, algumas escancaradas, mostrando largos
pátios interiores onde se movimenta um ou outro trabalhador e se
divisa um carro pesado; no fundo, apenas confluência de estradas e
avenidas. Nada que mostre a malha urbana. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Após
o almoço, já no autocarro, paramos no Mercado de Jade. Ocasião
para umas compras, como não podia deixar de ser e oportunidade para
gastar os últimos dólares de Hong Kong (também aceites em Macau,
onde a moeda própria é a célebre </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>pataca</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
de cotação inferior). Há entre nós alguns que têm muito jeito
para marralhar e correm num repente todas as bancas. Em toda a China,
pelo menos neste tipo de comércio, começa-se por pedir alto e
oferecer baixo, muito baixo, com um longo marralhanço pelo meio,
fingindo-se desprezar a peça que se pretende e os mais avezados a
este tipo de mercadejo abandonando mesmo o local, em sinal de
desapego ou desinteresse, à espera que o vendedor vá no seu
encalço. Não é teatro para mim. Apesar de que acabei por comprar,
mas sem marralhar muito (apenas um tímido questionar o preço) um
pequeno buda.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Seguimos
para o famoso templo </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>Wong
Tai Sin</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
também situado no Kowloon. É um templo apresentado como taoísta,
mas onde confluem o taoísmo, o confucionismo e o budismo. Ocupando
uma vasta área com seus pavilhões construídos na tradicional
arquitectura chinesa de telhados de bordos revirados, dispõe de
zonas ajardinadas (O Jardim dos Bons Desejos), ampla escadaria
ascendente e descendente, esculturas, um lago e um fontanário de
belo efeito cénico, passadiços e uma ponte sobre a água. Rodeada
pelos típicos arranha-céus de Hong Kong, a levantarem os seus topos
sobre o arvoredo que circunda o templo ou a mostrarem-se na sua
inteireza através dos espaços sem árvores, diz-se que nesta área
de culto confluem os cinco elementos: metal no Pavilhão de Bronze,
madeira no Salão de Arquivo, água no fontanário Yuc Yic, fogo no
santuário Yue Heung, onde arde a lanterna de Buda, terra na Parede
de Terra. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">O
templo honra a memória do monge Wong Tai Sin, nascido no século IV
e venerado como divindade. O seu retrato está exposto no templo e
foi trazido por um padre taoísta do sul da China em 1915, mas, como
vimos, o culto estende-se a Buda e ao confucionismo, patente no Salão
confucionista.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">São
muitos os fiéis que acorrem a este local, munindo-se dos
tradicionais pauzinhos de incenso, que acendem num queimador colocado
à entrada e apagam de seguida, deixando evolar-se o fumo –
pauzinhos esses que depositam num dispositivo próprio perto do altar
principal. Como são muitos os fiéis e cada qual transporta uma mão
cheia de pauzinhos de incenso, o fumo que se evola é muito e o
cheiro que se espalha é intenso. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">No
recinto onde os fiéis se ajoelham em almofadas, há um contínuo
batuque produzido pelo barulho de cilindros ou caixas de bambú
contendo pequenas pedras numeradas que os crentes agitam, como se
estivessem a tanger um instrumento. A dada altura, uma dessas
pedrinhas sai da caixa e cai no chão. O número que lhe corresponde
é depois decifrado através de um rolo de papel com o mesmo número,
que os crentes obtêm dirigindo-se ao sítio onde se encontra um
monge encarregado de tal tarefa. O desejo que os fiéis formulam ou
em que pensam no momento em que abanam o cilindro é ou não
satisfeito consoante a resposta obtida, que se encontra escrita no
papel. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Uma
das atracções deste recinto de culto é o conjunto de avantajadas
esculturas de animais que simbolizam os doze signos do zodíaco
chinês. Numerosos chineses e estrangeiros circulam pelo meio dessas
figuras, tentando encontrar o animal do seu signo e tirando fotos
junto dele. “Como cada signo no horóscopo chinês rege para um
ano e são doze: o Ano do Porco, do Tigre, do Dragão, da Serpente,
etc… é só saber qual o signo deste ano e andar para trás até
encontrar o ano do nascimento e o signo que lhe corresponde”,
diz-me um dos companheiros de viagem que já tinha descoberto o seu
signo. Mas não será bem assim, porque o ano chinês não coincide
com o ano do calendário ocidental, o que torna mais complexas essas
contas. Quem for à </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>internet,</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
pode descobrir facilmente o seu signo, escrevendo o ano e a data do
nascimento.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Como
o dia é longo e a tarde ainda é comprida, vamos de visita ao </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>Jardim
de Nan Lian</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
um recanto paradisíaco com belos arruamentos, esplanadas e pequenos
declives, povoado de </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>bonsai</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
árvores de todos os estilos, algumas delas de madeira que ardeu e
que aqui se conservam como relíquias ao alto, mas de efeito
singular, pedras de vários formatos, construções de arquitectura
chinesa entalhadas no arvoredo, lagos, uma azenha movendo-se num
cenário rústico, pontes, canteiros, miríades de nenúfares boiando
na água em variegadas cores. Logo à entrada do jardim, o visitante
é surpreendido com uma série de pavilhões onde se abrigam
magníficas peças em madeira, reproduzindo diversos objectos e
construções representando mosteiros em miniatura, mas de complexa
factura e cobrindo áreas assinaláveis. Uma visita reconfortante a
um lugar não muito frequentado por turistas. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Ainda
sobrou tempo para uma surtida ao centro da cidade. Ruas
compridíssimas (duas ou três paralelas umas às outras, que nos
foram indicadas pelo Ken como nevrálgicas em termos comerciais),
cruzadas por outras de través, correndo entre arranha-céus e
parecendo, por isso, estreitas. Uma corrida de fim de tarde,
vistoriando estabelecimentos e farejando mais qualquer coisa para
comprar, pois que outra coisa sabem fazer os turistas nos intervalos
dos programas de visitas? Muitos dos nossos companheiros de viagem
regressam ao autocarro afobados da corrida às compras, exibindo com
alvoroço o objecto que adquiriram ou enaltecendo a pechincha que
conseguiram. E com isto são horas de jantar, pelo que vamos em
direcção ao restaurante situado também no centro e com uma
particularidade que mencionarei. É a nossa última refeição em
solo chinês. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Um
jantar digno de um fim-de-festa. Foi um belo repasto composto de
vários pratos chineses, colocados na placa giratória que existe no
centro das mesas chinesas: os convivas vão-se servindo disto e
daquilo, fazendo rodar a placa de modo a acederem ao prato desejado.
Houve direito a vinho (raro nos sítios por onde passámos), cerveja
ou água, para além, claro!, do chã que sempre faz parte de
qualquer refeição chinesa. Havia bons bolos para sobremesa, para
além de fruta. Café – nicles. Mas a derradeira surpresa estava
para vir: um espectáculo de luminotecnia observado de uma grande
esplanada que havia na parte de trás do restaurante e se debruçava
sobre a água, ali em corrente como um rio, onde de vez em quando um
barco passava, talvez transportando turistas. Do outro lado
postavam-se os edifícios iluminados, acompanhando o monte. A dada
altura, o espectáculo começou com um singular jogo de luzes que se
projectavam do outro lado e vinham reflectir-se nas águas num
cromatismo variado e de belo efeito, não só cénico, como
coreográfico e sinfónico, ao mesmo tempo que trechos de música,
criteriosamente seleccionados, acompanhavam em acordes condizentes o
bailado luminotécnico. Isto durante uns 20 minutos a meia hora. Uma
noite de S. João no Oriente. “Todos os dias isto?”, perguntei.
“Sim, todos os dias”, respondeu Ken. Uma festa todas as noites é
obra. Porventura, mais com vista nos turistas, do que nos residentes,
para os quais isto será a rotina diária. A festa pressupõe a
raridade, segundo penso. Não me refiro, evidentemente, à falsa
festa permanente das nossas sociedades de consumo, dos hipermercados,
dos </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>shopping
centers, etc</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">.
- que essa é a festa da </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>sociedade
do espectáculo</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
[da mercadoria], de Guy Debord. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Bem,
mas assim entrando em filosofices, já vamos a caminho do aeroporto,
onde é preciso estar umas horas antes do embarque para as muito
demoradas e penosas formalidades de controle. Ken ajudou-nos a
ultrapassar algumas das vicissitudes surgidas no decurso dessas
operações. A mim, sobretudo, que, para além das malas – a mala
grande, de rodinhas, uma mochila grande e outra pequena - tinha o
empecilho do edredon, causando desconfianças. Tive que abrir o saco
onde vinha metido, mas passou, felizmente. Agora, ia ter uma longa
noite para pensar na viagem e ordenar ideias sobre o país que me
preparava para deixar – um dos países que ardentemente aspirava
conhecer desde há muitos anos. Mas, primeiro, vou à procura de um
café verdadeiro num desses estabelecimentos do aeroporto. E, sim,
encontro um sítio onde posso tomar um café expresso e, por cima do
café, tenho o desejo dum cigarro, talvez também pela enorme
descompressão que sinto por ver-me livre do </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>stress</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
do controle (actualmente só fumo de tempos a tempos). Andando a pé
metros e metros, acabo por encontrar um recinto fechado com
aspiradores de fumo onde se pode fumar, mas não tenho isqueiro para
acender o cigarro, pois tive que o deitar fora para poder passar no
controle. Peço lume a um dos fumadores, que deve ter arranjado
isqueiro algures dentro do aeroporto, ou então teve artes de o
subtrair à vigilância dos funcionários. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Às
primeiras horas da madrugada embarcámos na aeronave da </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>Emirates
</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">com
destino a Dubai. Aqui, apanharemos outro avião com destino a Lisboa.
Longas horas, grande parte delas de noite, as cortinas opacas das
minúsculas janelas totalmente descidas, aumentando a sensação de
imobilidade, nave suspensa no ar, cercada de escuridão, os motores
ronronando monotonamente. A mim, que viajo solitariamente, calha-me o
lugar da janela, como quase sempre tem sucedido, obrigando-me a ter
de pedir licença aos dois viajantes que ocupam os lugares à minha
esquerda, se quiser ir à casa de banho ou libertar as pernas da
prisão onde se encontram. Mas nada de azar. Trata-se de um casal que
me tem acompanhado durante a viagem e, durante o voo, que durará 8
horas e 20 minutos, segundo as previsões, há intervalos para as
refeições: uma maior (ceia) e outra mais pequena, equivalente ao
pequeno-almoço. Durante elas, as pessoas sempre palram e mexem-se de
um lado para o outro. Entre Dubai e Lisboa, outras 8 horas e tal, mas
já com sol entrando pelas vigias, haverá mais duas refeições;
outro pequeno-almoço e almoço. A chegada está prevista para as 12
horas. Com as formalidades e recolha de malas, só pelas 13 horas
estaremos a sair do aeroporto para tomarmos (os viajantes do Norte)
assento no autocarro que nos levará ao Porto. Mais 4 horas de
viagem.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Muito
tempo para dormitar e reflectir sobre várias coisas, principalmente
sobre a excursão à China. Uma viva impressão que me ficou foi o
desenvolvimento económico. Trata-se, sem dúvida, de um país
altamente desenvolvido, ao nível dos países capitalistas mais
avançados. Pode-se dizer que, se há benefício que a revolução
trouxesse para tão vasto território foi no tocante ao
desenvolvimento das forças produtivas, que sofreram um incremento
notável num país atrasado da Ásia, onde dominava o campesinato e
mesmo o feudalismo. Tal incremento, a meu ver, deve-se sobretudo ao
regime político, que é ditatorial, regime de ditadura de um partido
– o Partido Comunista -, que não é a mesma coisa que a célebre
</span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>ditadura
do proletariado,</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
e não sei se será mesmo ditadura do Partido propriamente dito,
ou apenas de uma clique – a sua fracção dirigente. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Foi
essa ditadura, a meu ver, que permitiu a gigantesca acumulação de
capital e o desenvolvimento acelerado das forças produtivas durante
alguns decénios em que a total ausência de direitos fundamentais,
como a liberdade de expressão, a liberdade de imprensa e de
comunicação social, os direitos de reunião e manifestação, o
direito de livre sindicalismo, o direito de greve, etc. e ainda um
sistema sufocante de controle no trabalho e em outras esferas da
sociedade, principalmente durante o maoísmo, aplanaram o caminho
para esse desenvolvimento, eliminando todos os obstáculos que se lhe
poderiam opor. Tudo em nome da diabolização da democracia burguesa
e das virtudes inquestionáveis da democracia popular, ou do Estado
Socialista, ou como lhe queiram chamar.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Do
ponto de vista económico, é, pois, visível a abertura da China ao
mundo exterior e ao entrosamento do país na trama das relações
económicas mundiais, às leis do mercado, à concorrência do
capital estrangeiro, permitindo a entrada das grandes empresas que
dominam o mercado mundial, cuja presença é palpável em todo o
território, abertura, enfim, às seduções múltiplas do consumo
(dos centros comerciais, à comida de </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>fast
food</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
à moda, etc...). Nada diferencia as grandes cidades chinesas das
metrópoles ocidentais, a começar pela intensidade do tráfego e
pelos incómodos correspondentes. Carros e carros particulares, em
competição com os transportes públicos, dando azo a
engarrafamentos de trânsito e grandes delongas na chegada aos
locais. Carros de marcas sonantes no Ocidente, como Mercedes,
Volkswagen, BMW, Porshe, a par de marcas dos países asiáticos, como
Mitshubichi, Toyota, Nissan, Honda, Kia, etc. Grande parte dessas
marcas têm sede na própria China, sendo os carros lá fabricados e
montados. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">A
China abriu largos sectores da economia à iniciativa privada,
continuando, porém, o Estado a controlar grandes empresas
estratégicas e o sector financeiro, segundo deduzi das respostas que
os guias, sobretudo Zhao Naipu, o guia de Pequim (para mim o de maior
arcaboiço), deram às questões que lhes foram formuladas por
alguns. É, assim, possível encontrar gente muito rica na China,
donos de meios de produção consideráveis. Por exemplo, donos de
empresas de transporte, como as que fazem excursões turísticas de
barco em Xangai e Guilin, se estão correctas as informações
fornecidas pelos guias locais, a quem fiz a pergunta. Aliás, estes
guias faziam alusões frequentes a compatriotas com muito dinheiro. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Na
cidade de Xian, passámos numa avenida com vivendas e a senhora que
nos acompanhava fez referência aos donos delas, dizendo que eram
chineses com posses, encarecendo o seu estatuto social. Os chineses
podem ser proprietários de imóveis, mas, de um modo geral vivem em
casas mais modestas, possuídas no regime de propriedade horizontal.
O terreno onde as casas estão implantadas pertence ao Estado, que
cede o direito de superfície por 70 anos, se bem entendi, como em
qualquer país ocidental. Os proprietários podem vender as casas e
deixá-las em herança aos familiares que gozam do direito de
sucessão. Porém, com a condição de o direito transmitido ficar
sujeito ao limite dos tais 70 anos, o que não será muito distinto
do que se passa entre nós. Setenta anos será presumivlmente o tempo
de duração da própria construção.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Pelo
exposto, será fácil de concluir que a liberalização económica,
iniciada no tempo de Deng Xiaoping, trouxe uma certa liberalização
de costumes e mesmo algumas liberdades, como a liberdade religiosa e
a liberdade de deslocação. Jung Chang, a autora de </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>Cisnes
Selvagens </i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">que
já citei, a viver em Londres, onde se doutorou e ficou a leccionar
no ensino superior, diz que, entre 1983 e 1989, regressou à China
todos os anos para ver a mãe e que, na primavera de 1989, viajou
por todo o território para fazer pesquisa para aquele seu livro. Sem
entraves, num país que ela tinha conhecido peado de movimentos e
onde os pais, militantes comunistas de certa envergadura, não tinham
escapado à repressão maoísta, mais tarde tendo sido reabilitados,
o pai já falecido. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Ela
reconhece, no final dessa obra, que muita coisa mudou na China nos
anos 80 ao nível das reformas económicas, com a abertura ao
comércio e ao investimento estrangeiros e à autorização de um
sector privado, ao nível das comunicações com o exterior, nos
contactos interpessoais, na facilidade de deslocação e mobilidade,
nos noticiários da TV, embora filtrados e, consequentemente, numa
maior liberdade de expressão e de informação e mesmo de crítica,
reconhecendo, todavia, que o caso de Tiananmen, parecia fazer
regressar o medo que uma grande parte dos cidadãos incautamente
tinha esquecido. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Os
chineses podem inclusive emigrar para tentarem obter outros meios de
fortuna e, segundo o que apurei, recebem mesmo auxílio material do
Estado para o efeito, se necessitarem. A condição é a de, quando
regressarem ao país, darem ao Estado uma contrapartida, não sei em
que termos. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Outra
das conclusões que é fácil de extrair do exposto até aqui é que
a referida liberalização reforçou os traços capitalistas do
regime, criando uma classe capitalista de vulto, como se tem visto
entre nós com a história dos </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>vistos
gold</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
em que chineses particulares são dos maiores investidores no nosso
país. Há, assim, uma estrutura de classes na China, em que uma
burguesia construída à sombra do Estado desempenha um papel
fundamental na dinamização económica, cabendo, no entanto, ao
Estado a detenção de importantes e estratégicos meios de produção
e a primordial função de controle, direcção e estímulo de todo o
sistema económico, sob uma férrea disciplina autoritária. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Isto
constituirá, então, o capitalismo de Estado chinês? Um capitalismo
que, sob a ditadura do Partido Comunista, visa o desenvolvimento mais
rápido das forças produtivas como via para atingir o almejado
socialismo? E beneficiando, entretanto, as elites dirigentes do
Partido, constituídas como uma classe burguesa dominante? Que seria
dissolvida como? Por meio de outra revolução?</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Eis
questões que fui formulando insistentemente durante esta viagem. Em
Pequim, ganhei confiança com Zhao Naipu e confrontei-o com uma
questão fundamental tratada por Lenine em </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>O
Estado e a Revolução</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">.
O Estado é sempre um instrumento especial de repressão de uma
classe sobre outra. Se o socialismo, na sua fase superior ou
comunismo, pressupõe o desaparecimento das classes sociais, mesmo do
proletariado, erigido transitoriamente em classe dominante, como é
possível falar em Estados Comunistas? Não há Estados Comunistas.</span></span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Zhao
Naipu não se desmanchou, nem perdeu a sua fleuma habitual.
Respondeu-me ele: “Sim. Não há Estados Comunistas. O Comunismo só
é possível a nível mundial, quando houver condições para isso.”
Ou seja, esta teoria corresponderá ao cerne da doutrina marxista
clássica, segundo a qual o comunismo só é possível numa
perspectiva internacionalista, em que os países mais desenvolvidos
fazem a revolução, arrastando para ela os países dependentes. </span></span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span style="font-family: times new roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Penso,
então, nestas incomensuráveis horas de voo: Quererão os dirigentes
chineses levar a China a ser a primeira potência mundial e ir
ganhando preponderância no aparelho produtivo global pelo
assenhoreamento de importantes sectores de produção? Há uma frase
de Deng Xiaoping, o principal obreiro da abertura da China e também
o chefe de Estado que ordenou o massacre de Tiananmen, que me vem
bailando no espírito: “Escondei a vossa força, ganhai tempo, não
desanimeis”. </span></span></span></span></span>
</div>
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p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; so-language: hi-IN }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-64818371293649190052020-07-10T19:38:00.001+01:002020-07-10T19:53:05.910+01:00China VII<br />
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">De
manhã cedo atravessámos, de autocarro, um comprido túnel que, por
baixo do mar, liga a cidade de Hong Kong ao cais onde se apanham os
ferries para Macau. Fomos acompanhados pelo guia chinês, que, no
seu fluente castelhano, nos foi ministrando conhecimentos sobre as
construções subaquáticas na região da península do Caulum, onde
se encontra Hong Kong. Actualmente existe uma ponte que liga os dois
territórios e que tem uma extensão total de 55 kms. (a maior ponte
do mundo?), inaugurada em Outubro de 2018.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Munidos
dos respectivos bilhetes, pré-comprados, embarcámos num agradável
turbo-jet, que fez a travessia do grande delta do rio das Pérolas
em apenas 1 hora (num ferry tradicional levar-nos-ia pelo menos três
horas). Estava um belo dia de sol, como tem estado sempre nesta
viagem, pelo que pudemos desfrutar plenamente o prazer de navegar a
uma velocidade considerável, contemplando a vastidão do delta,
através dos vidros das janelas, que a água, arremessada com a força
da deslocação, vinha borrifar de gotículas, deparando-se-nos, de
quando em quando, as arribas cobertas de verdura de alguma ilhota.
Antigamente, estas águas estariam enxameadas de arrojadíssimos
piratas, que assaltavam com perícia e ferocidade as embarcações
que passavam. Segundo uma versão que se conta, os portugueses que
andavam pelos mares desta parte da Ásia, ajudaram os chineses a
combater os piratas e a vencê-los, ao cabo de três anos de
porfiados esforços, o que fez com que as autoridades chinesas
tivessem premiado Portugal com a doação de Macau. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Aqui,
uma vez desembarcados, esperava-nos a guia que nos iria acompanhar
durante o tempo da nossa permanência. Chamava-se Maria Eugénia, uma
senhora de origem portuguesa, com uns ligeiros traços achinesados. A
língua em que se exprime é o português, com uma ou outra palavra
em castelhano. Diz que não percebe os chineses, porque não fala o
mandarim, mas o cantonês. É uma mulher desembaraçada e cheia de
bom humor, alegre, muito expressiva e satisfeita da vida. Aparenta
mais de sessenta anos, mas diz que não chegou aos cinquenta com uma
tal graça, que põe toda a gente a rir. É esta mulher que, de
microfone em punho no interior do autocarro, nos vai dando indicações
sobre Macau, as pontes que fazem a ligação às ilhas da Taipa e de
Coloane, a Hong Kong e à China continental. Fala com entusiasmo dos
progressos do território, da religião cristã que é a sua e do seu
conforto em viver neste canto do mundo, onde não a parece incomodar
a integração na vasta China dita comunista. Ah!… e também fala
de Sun Ya Tsen. Como poderia não falar desse homem, fundador da
República da China em 1911 e seu primeiro presidente, que varreu do
mapa o regime dos imperadores, esse médico natural de Cantão, que
viveu e exerceu em Macau? “Sabem que foi ele que acabou com o
enfaixamento dos pés, esse bárbaro costume que vitimava as
mulheres? Uma coisa horrível que obrigava as mulheres a andarem com
os pés amarrados, encolhendo os dedos e fazendo feridas. E sabem que
o Dr. Sun Ya Tsen trouxe a medicina ocidental para Macau?” </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Eis
que, levados pela loquacidade e a boa disposição da D. Eugénia,
chegamos à Porta do Cerco. Uma porta que não tem nada de imponente,
é até relativamente modesta, ao menos em comparação com aquilo
que nos pintava o nosso imaginário, que nos inculcava uma porta
muito mais avantajada para servir de fronteira entre Macau e o vasto
território da China continental. A verdadeira fronteira, aliás,
seria mais acima. D. Eugénia narra um pouco da história desta porta
e fala de um governador português – Ferreira do Amaral, que teve
um final trágico: os chineses assassinaram-no e decapitaram-no. D.
Eugénia fala da abertura de uma estrada ordenada pelo governador,
que ia de Macau até às designadas portas do cerco (isto é, até à
fronteira com a China) e que, para o efeito, foram escavados
cemitérios chineses que para ali existiam, dando origem a que os
camponeses se revoltassem e o matassem. Insatisfeito com a
explicação, procurei mais informações, designadamente na
internet. Sumariando o que investiguei, aqui vai algo mais:</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Ferreira
do Amaral foi governador de Macau no tempo de D. Maria II.
Distinguiu-se por reforçar a soberania da colónia, aliás, em
consonância com os desígnios políticos manifestados pela rainha,
acabando com certas dependências chinesas em termos alfandegários e
direitos correlacionados, pagamento de rendas anuais, etc...,
declarando Macau como um porto franco e ordenando a expulsão dos
mandarins. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Por
outro lado, teve a pretensão de estender o seu domínio sobre toda a
comunidade macaense, estabelecendo impostos que oneravam também a
comunidade chinesa e acabando com o seu estatuto especial, isto para
compensar a perda de receitas provocada pelo facto de Macau passar a
ser um porto franco. A comunidade chinesa reagiu revoltando-se e a
revolta foi sufocada pelas forças militares portuguesas. Dias
depois, em 22 de Agosto de 1849, Ferreira do Amaral foi assassinado,
tendo sido decapitado e tendo-lhe sido decepado o braço direito.
Quanto à abertura da estrada, encontrei efectivamente alusão a esse
facto, mas não vi nada que se relacionasse com a escavação de
cemitérios.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Esta
cena deu origem a um confronto entre os militares portugueses e as
tropas imperiais chinesas, refugiadas num forte que se situava do
lado chinês. Um oficial macaense, chamado Vicente Nicolau de
Mesquita, reuniu umas dezenas de soldados, os quais atacaram o forte,
acertando-lhe com um único tiro disparado por uma peça de
artilharia e espalhando a confusão no forte, que depois assaltaram,
expulsando os cerca de 500 chineses que lá se encontravam. Como
represália, trouxeram a cabeça e a mão de um mandarim.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Os
dois acontecimentos – a morte do governador e o assalto ao forte,
conhecido como Passaleão -, ficaram registados a um lado e outro da
porta do cerco, cujo arco foi mandado erigir em 1871 para comemorar
esses feitos. A porta não data dessa altura, mas anteriormente seria
em madeira. Do lado esquerdo está gravada a data da morte de
Ferreira do Amaral – 22 de Agosto de 1849 – e do lado direito, a
da btalha de Passaleão – 25 de Agosto de 1849. Na barra por cima
do arco, a inscrição: A Pária Honrai Que A Pátria Vos Contempla.
</span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">De
autocarro, seguimos para outra paragem. Desta feita, vamos visitar
alguns monumentos do centro histórico, fazendo parte do património
mundial classificado pela UNESCO em 2005. Há um conjunto de igrejas
situadas próximo umas das outras, as quais vamos percorrendo,
entrando nesta ou naquela: igrejas de Santo António, Santo
Agostinho, S. Lourenço, S. Domingos, esta com uma fachada mais
imponente, de estilo barroco, mas nenhuma delas com uma riqueza digna
de uma menção especial, quer pelo que toca ao exterior, quer no
respeitante ao interior. A igreja efectivamente mais relevante é uma
ruína, de que apenas se conserva a grandiosa fachada, barroca, mas
com outros estilos à mistura, ostentando uma profusão de imagens. É
a igreja de S. Paulo, aliás, da Madre de Deus, que é praticamente
um ex libris de Macau. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Construída
pelos jesuítas no século XVI (1565), sofreu um incêndio no final
do século. Sujeita a reparação, esta veio a ficar concluída em
1602, mas um novo incêndio, em 1735, veio a destruir a igreja por
completo, assim como o colégio anexo, esse, sim, denominado Colégio
de S. Paulo, uma espécie de instituto universitário, onde faziam
estudos superiores os aspirantes a missionários, que depois iam
evangelizar para diversas paragens da Ásia. Elevada no cimo de vasta
escadaria, a fachada é o testemunho sobrevivente de uma das maiores,
senão a maior igreja católica do Oriente. Está construída em
vários níveis, terminando num frontão triangular; cada nível e o
frontão encerram uma determinada simbologia.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
célebre Gruta de Camões não podia deixar de estar inscrita no
cardápio de visitas obrigatórias. É talvez daqueles lugares
míticos que o viajante português almeja com mais ardor. Talvez por
isso o confronto com a realidade deixe um certo sabor de decepção.
Já se sabe que realidade alguma preenche as dimensões de um mito,
seja ele de que natureza for. Porém, esta gruta resume-se a três
calhaus, dois ao alto e um de través, em cima daqueles. O viajante
pergunta, incrédulo: «Foi aqui que o nosso épico se refugiou a
urdir a gesta dos descobrimentos?» A lembrá-lo lá está a
inscrição numa lápide da primeira estrofe d’Os Lusíadas. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Os
pedregulhos sugerirão a possível rudeza, mas não certamente a
beleza primitiva do lugar, hoje inserido num belo e cuidado parque
urbano com vegetação tropical, que ascende pelo outeiro, dispondo
de uma ampla escadaria de pedra; o local que se diz ter sido a gruta
fica sensivelmente a meio do escadório, num recanto pavimentado,
como aliás todo o recinto. Ajustadas serão as palavras que
Ferreira de Castro escreveu sobre o local: </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">«É
um admirável parque, cheio de amáveis recantos, de árvores
seculares, de flores, de chineses que meditam sobre os bancos, de
pares que buscam as sombras e de crianças que brincam nas clareiras.
Situado junto ao porto interior, o outeiro oferece belas perspectivas
sobre os juncos ancorados, a Ilha Verde no flanco da península, e as
distantes montanhas de Chung Shan. A única coisa feia é,
justamente, a gruta onde o épico teria escrito parte d´”Os
Lusíadas”. Dois penedos verticais, sobre eles um penedo
horizontal, eis o sítio que se julga eleito por Camões para nele
trabalhar.» (A Volta Ao Mundo, edição monumental, Empresa Nacional
de Publicidade, 1942, p. 480).</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
propósito da gruta de Camões, um pensamento que me ocorre é como
foi ele um profundo renovador da língua portuguesa e um exímio
estilista, que abriu caminho ao português moderno, e ao mesmo tempo
um vastíssimo conhecedor da mitologia e da cultura da Antiguidade
Clássica, da literatura, da cosmografia, da história e de várias
outras ciências do seu tempo, de que deu provas sobejas de erudição
n’Os Lusíadas e também na sua obra lírica, tendo levado a vida
que levou. Como foi ele um tal portento, tendo sido um boémio
brigão, um viajante de largo espectro e um aventureiro como Fernão
Mendes Pinto, em suma, um homem de vida instável e acidentada,
sobretudo no Oriente, escrevendo em lugares silvestres como terá
sido este e noutros locais precários e não podendo transportar
consigo grande bagagem, principalmente em apoio bibliográfico. É
certo que terá adquirido vasta soma de conhecimentos em Coimbra,
pelo menos através de um tio que era prior do Mosteiro de Santa Cruz
e chanceler da Universidade, que a frequência da Corte lhe alargou
os horizontes culturais e que a enorme experiência do mundo e da
vida que acumulou nas suas andanças lhe proporcionou uma visão das coisas assente no real vivido, como lembram certos dos seus
biógrafos, como Hernâni Cidade na sua obra Camões, mas tudo isso
não explica a sua capacidade para suprir a falta dos referidos
apoios no acto da criação. Era, certamente um homem dotado de uma
craveira excepcional. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Aproveito
para perguntar à D. Eugénia por outro grande poeta português,
embora de escassa produção: Camilo Pessanha, que viveu e morreu em
Macau. Não há nada que o lembre? D. Eugénia encolhe os ombros em
sinal de vago conhecimento de tal personalidade. Por fim, diz que lhe
parece que há em local que não identifica uma estátua. E com isso
me fico, resignado a essas magríssimas referências, aliás,
conformado também com o limitado tempo que nos é dado para
conhecimentos mais pormenorizados e mais fora do habitual.
Entretanto, seguindo em frente, perto da hora do almoço, dou-me
conta de que outras coisas se vão perdendo mesmo entre monumentos
normalmente enquadrados no rol turístico: a Sé Catedral, a
Fortaleza do Monte e a Fortaleza de Nossa Senhora da Guia, todas
incluídas no centro de Macau classificado pela Unesco em 2005.
Apenas uma referência em andamento ao cemitério protestante, que
fica ao lado do parque que acabámos de visitar e onde estão
sepultadas algumas proeminentes personalidades britânicas que
passaram por aqui. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
pé, vamos andando pelas ruas antigas, de sabor muito português e
familiar, enfiamos por uma rua pedonal (qual o seu nome, em que não
atentei?), animada à hora a que passamos, com lojas comerciais,
restaurantes, cafés e pastelarias. À porta de duas delas, uns
simpáticos jovens, com tabuleiros nos braços, vão oferecendo aos
passantes biscoitos e pequenos bolos. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">E
já estamos no Largo do Senado. É uma bonita praça com o chão em
calçada portuguesa formando desenhos ondulantes, um fontanário ao
centro, ao fundo o icónico edifício que albergou o Leal Senado, que
foi o centro do governo e administração colegial do território e
depois e actualmente, de actividades ligadas com funções
municipais. Bordejando a praça, edifícios seculares de boa
arquitectura, entre os quais o da Santa Casa da Misericórdia.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
edifício que foi sede do Leal Senado é uma digna construção
neoclássica, dividida em três corpos, com janelas de sacada em
ferro forjado sobrepujadas por áticas, no piso nobre, e um frontão
triangular na parte central a rematar o frontispício, e na parte de
baixo, de um lado e outro da entrada principal aberta ao centro,
janelas de peito, com resguardos de ferro forjado. Não visitámos o
interior, onde se destaca o jardim, a sua, pelos vistos, bela
biblioteca, a sala de reuniões do antigo Senado e seus tectos
apainelados, os seus corredores dignos de nota. Tudo isso fica para
outra encarnação. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Após
o almoço, o autocarro deixou-nos junto da emblemática Torre de
Macau, uma das maiores torres do mundo, com 338 metros de altura,
construída em 2001. Não subimos ao cimo, onde há um restaurante
giratório que deve ter vistas magníficas e onde se vêem alguns
jovens a praticar desportos radicais (500 euros para saltar, diz a D.
Eugénia). </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Dali
seguimos para o templo de A-Ma’, muito perto da Torre, também
conhecido por Pagode da Barra, assim designado por se encontrar em
frente à baía que forma o porto interior de Macau. A-Ma’Gao
significa exactamente, em cantonês, “baía de A’Ma, de onde
teria derivado o nome de Macau, como lhe chamaram os portugueses ali
desembarcados pela primeira vez em 1554 ou 1557 (datas estas que
colhi na Wikipédia).</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A-Ma
seria a Deusa do Céu, venerada no Sul da China e considerada
protectora dos marinheiros e pescadores, que teriam erguido o templo
que lhe é dedicado e que datará do século XIV ou XV (nenhum dos
guias fornece uma data exacta). A-Ma é uma deusa taoísta, que,
segundo a lenda, teria salvo pescadores no mar, a quem aparecera em
espírito. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
templo é composto por vários pavilhões de várias épocas, que se
estendem pela Colina da Barra acima, sendo o último um templo
budista. Está incluído no património histórico de Macau
classificado pela Unesco. O mais rico deles todos é, justamente,
aquele que ostenta a imagem da deusa A-Ma. Todo o conjunto está
impregnado do penetrante cheiro a incenso queimado pelos crentes que
aqui acorrem. Pelos vistos, trata-se do maior monumento religioso de
Macau e aquele que faz o cruzamento de várias culturas que estão na
orgem da civilização chinesa: confucionismo, taoísmo, budismo.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Com
isto, passa-se uma boa parte da tarde e é altura de irmos ao hotel
para atribuição do quarto (a bagagem é reduzida, visto que as
malas ficaram em Hong Kong, como já referi). Antes de lá chegarmos,
percorremos a pé algumas ruas do centro, onde a D. Eugénia nos vai
apontando este ou aquele edifício emblemático e dando outras
indicações sobre a cidade e o seu ambiente: os seus casinos, que
são numerosos (36), fazendo da cidade um dos principais centros de
jogo na Ásia, conhecida por isso mesmo como a Las Vegas do Oriente,
o seu circuito automobilístico da categoria Fórmula 3, sendo também
conhecida por isso como a cidade Monte Carlo da Ásia, e D. Eugénia
acentua essa característica com evidente orgulho.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
nosso hotel é um dos mais, se não mesmo o mais sonante de Macau,
com uma arquitectura moderníssima e uma torre de arrojadas formas,
que é uma das referências da cidade – o Hotel Lisboa, tendo ao
lado o casino do mesmo nome, sedeado no mesmo edifício, da autoria
de dois arquitectos de Hong Kong. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Depois
de feita a instalação, ainda sobrou tempo para umas voltas pela
cidade. Saindo sozinho do hotel, acabei por acamaradar com um médico
e a sua mulher, que já me tinham acompanhado na excursão à muralha
da China, exactamente a seguir ao incidente, que eles lamentaram
comigo, de uma lufada de vento me ter levado o boné e me ter exposto
a cabeça ao gélido frio da Mongólia. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Fomos
até junto do porto interior, onde nos fotografámos mùtuamente;
percorremos depois várias ruas e avenidas do centro, cheias de
movimento, como se numa grande e buliçosa cidade, contemplando o
colorido das numerosas luzes dos estabelecimentos, onde sobressaíam
as das bizarras torres do Casino Lisboa e de outros casinos e hotéis,
cada qual parecendo disputar a primazia do efeito cénico, mas não
suplantando a daquele na sua singularidade. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Andámos
pela Avenida Almeida Ribeiro para a qual dá parte da fachada do Leal
Senado, agora com as janelas todas iluminadas, e voltámos a admirar
o bonito largo em frente, com o fontanário também a resplender de
luz (uma luz líquida); percorremos assim várias ruas e avenidas com
sonoros nomes portugueses. Numa dessas avenidas, a Avenida do Infante
D. Henrique, entrámos em vários estabelecimentos (eu comprei um
boné para substituir o que o vento desabrido de Pequim me tinha
levado) e encontrámos por mero acaso o edifício-sede da Escola
Portuguesa, onde se leccionam em português as matérias do 1.º ao
12.º ano de escolaridade (inaugurado em 1998). Neste passeio
descontraído, chegámos ao hotel a horas de jantar. Foi um bom e
animado jantar, que a todos agradou.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">No
final, saí sozinho para a noite. Havia ainda grande movimento pelas
ruas. Ao lado do hotel, uma vistosa fiada de riquexós, com os
condutores aguardando qualquer cliente. A cidade resplandecia na sua
féerie de luzes. É, sem dúvida, uma bonita cidade. Pena era que
ali não permanecêssemos mais do que uma noite e pouco mais do que
um dia e meio. Infelizmente, não dispúnhamos da faculdade soberana
de Ferreira de Castro, quando andou a dar a sua volta ao mundo; era
para lá ficar dois dias e acabou por decidir ficar duas semanas.
Não será fácil voltar aqui com outra disponibilidade. Já estive
para vir a Macau em 1998, convidado para um colóquio sobre liberdade
de imprensa, mas acabei por desistir, por achar que fazer uma tão
longa viagem de avião para cá permanecer apenas três ou quatro
dias não valia o sacrifício. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Volteando
por aqui e por ali, acabei por entrar no casino Lisboa, ao lado do
hotel. A sala de jogo estava repleta e, entre os jogadores,
encontravam-se muitos jovens. Não sei em que tipo de jogo se
envolveriam, porque não percebo patavina do assunto. Andei em torno
das mesas, observando sem nada entender: a roleta, o bacará e também
o tradicional jogo chinês – o fantan? Estive assim que tempos. Por
fim, saí e fui para o hotel. O quarto era magnífico, com uma
casa-de-banho ultramoderna, mas não era muito amplo. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Levantámo-nos
cedo para prosseguir na visita. Fomos então visitar as ilhas de
Coloane e da Taipa, atravessando de autocarro as pontes que ligam o
território àquelas ilhas. Dia magnífico, de sol. A D. Eugénia
quis presentear-nos com uma oferta em Coloane (primeira paragem);
levou-nos a um café simpático, com os donos do qual ela tinha
familiaridade. Aí pudemos tomar um café expresso e comer um pastel
de nata. Este último era a sua oferta. O pastel de nata associado ao
café, uma imagem gastronómica de Portugal, muito recente, já
chegou à China. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Passeámos
a pé por bairros típicos de casas chinesas, com arruamentos
estreitos, livres de trânsito e muito sossegados, com nomes
portugueses. Numa praça, em frente da baía, a capela de S.
Francisco Xavier, um humilde templo evocativo da passagem do
missionário por Macau, a caminho da China e do Japão, sem grande
interesse artístico. Em frente, um obelisco com canhões em ferro
fixados no pavimento comemora o rechaçamento do último ataque de
piratas, em 1910. Era nas grutas e falésias desta ilha, habitada por
indígenas, que os piratas se acoitavam. Os portugueses chegaram aqui
no século XIX e depois integraram a ilha no território de Macau. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
ilha de Coloane, conforme a fomos vendo de autocarro, está repleta
de prédios altos, mansões, parques e resorts, sugerindo ambiente de
lazer, a que a existência de praias dará o cenário adequado,
embora com águas impróprias, segundo parece. Nesta ilha está a ser
construída a que será a maior universidade de Macau, segundo
informa a D. Eugénia, apontando para o lugar onde está a decorrer a
construção. Através do istmo de Cotai, actualmente urbanizado
graças ao alargamento do aterro, chegámos à ilha de Taipa.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Aqui
parece existir uma maior abundância de arranha-céus e residências
de luxo e é o sítio onde se localizam numerosos casinos. O complexo
urbanístico dominante é o denominado Veneza de Macau, imitando o
Veneza de Las Vegas; inclui hotel e casino com 40 andares, um edifíco
que será um dos maiores do mundo, sendo o casino mesmo o maior a
nível mundial, com 800 mesas de jogo, 3.400 máquinas também de
jogo, uma vasta área para espectáculos, feiras e congressos,
resorts na sua cintura, milhares de suites. Tudo lá dentro tem um ar
de requinte, sobretudo a decoração da denominada Praça de S.
Marcos, imitando essa praça veneziana com céu e tudo; este parece
mesmo natural. A sensação que dá é que, naquele espaço interior,
o tecto é mesmo o céu. Em toda a parte, patamares, corredores,
salas, os tectos são um luxo, decorados com pinturas, e os lustres
são peças de arte. A decoração ficou a cargo de artistas,
arquitectos e decoradores italianos. Tenho nos meus apontamentos de
viagem que esta construção durou apenas dois anos (condição
imposta pelo governo chinês), tendo ocupado 30.000 trabalhadores 24
horas por dia. Trata-se, evidentemente, de uma maravilha ofuscante,
de uma catedral moderna de comércio e consumo, diante da qual o
turista não podia deixar de ficar embasbacado e nenhuma agência de
viagens poderia deixar de incluir no seu cardápio de visitas. Por
isso, foi aqui que se gastou o tempo praticamente todo dedicado a
Coloane. É certo que esse tempo era escasso e que passámos pela
pitoresca rua do Cunha, mas foi mesmo uma passagem fugaz que ficou
obnubilada pela visita à “catedral”. Outras catedrais, como a de
Macau, como já referi, ficaram no olvido.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
seguir ao almoço, à vontade de cada um no centro comercial do
edifício Veneza, seguimos para Macau. Despedimo-nos da D. Eugénia e
apanhámos o turbo jet para Hong Kong. Sulcando o vasto estuário do
rio das Pérolas sob um sol magnífico, de que temos sido sempre bem
servidos, eu transportava comigo uma sombra, que me coava os raios
solares, por ser tão fugaz o encontro com a bela cidade que conserva
tantos vestígios da nossa estadia de vários séculos nesta parte do
Oriente.</span></div>
<style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; line-height: 115%; background: transparent }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-9075122816353283552020-06-02T20:06:00.001+01:002020-06-02T22:57:02.086+01:00Os grandes estadistas do nosso tempo<br />
<div align="left" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="left" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="left" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="left" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Nestes tempos conturbados de
pandemia não podemos deixar de medir o pulso aos grandes estadistas
contemporâneos. Com efeito, é em circunstâncias peculiares como
estas que sobressaem os grandes chefes, os grandes condutores de
povos, os verdadeiros líderes. Pois é de dois desses valorosos
estadistas que me proponho falar hoje. São eles o Senhor Fake News e
o S<span style="color: black;"><span lang="pt-PT">enhor Resfriadinho. Penso
que toda a gente os tem em mente, quando se fala nos dois mais
eminentes vultos destes dias. Por isso, acho que é inútil
referi-los com outros sinais de identificação, bastando que diga o
Senhor Fake News e o Senhor Resfriadinho para que logo toda a gente
os reverencie no seu íntimo como duas figuras verdadeiramente
exemplares que a história há-de perpetuar como marcos indeléveis.</span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">Na
verdade, eles são como as duas faces de uma mesma moeda (a face A e
a face B); como que foram moldados na mesma liga, a ponto de se poder
afirmar que pertencem à mesma progénie. Ambos estadistas de grandes
países, de grandes uniões de Estados (United States A e United
States B), eles têm-se distinguido pela firmeza e pela audácia das
suas decisões. Aparentemente não são decisões de grande espectro,
mas, passada a surpresa do primeiro impacto, logo começa a ganhar
relevo a sua verdadeira dimensão, a sua grandiosa simplicidade, ou
talvez mesmo simplismo, a sua expedita rudimentaridade, como já há
tantas décadas, ou talvez mesmo centúrias, não se via. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">Decisões
dotadas de firmeza e audácia, repita-se. Firmeza pela força de
pulso (de músculo) de que vêm animadas; audácia pelo destemor com
que arrepiam caminho contra a opinião dos aparentemente mais
circunspectos espíritos. Veja-se o caso por que temos vindo a
passar desta pandemia originada por um vírus destruidor e
avassalador. Ambos estes notáveis presidentes se têm disitnguido
pela forma absolutamente soberana com que têm </span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>mandado
às urtigas</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">
(permita-se aqui o plebeísmo) conselho</span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">s</span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">
de peritos, médicos, epidemologistas, tanto nacionais, como
estrangeiros, que têm recomendado, maioritariamente, contenção e
prudência, recolhimento em casa e afastamento social. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">Quando
toda a gente, por esse mundo fora, se refugiava em casa, desertando
das ruas e dos locais de trabalho, estes denodados chefes-de-estado
riram-se das imprudentes recomendações dos “sábios” com a
superioridade que os caracteriza e não se vergaram à ditadura do
vírus. Era agora o que faltava que um insignificante inimigo, que
nem se consegue enxergar à vista desarmada, um miserável vírus,
</span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>virasse</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">
a sociedade do avesso! Homens verdadeiros, com a devida testosterona
nos seus sítios, jámais o deveriam permitir, seguindo o exemplo
destes líderes. Ambos eles mostraram a sua fibra de políticos
enérgicos e independentes não só desprezando os melados conselhos
da gente de ciência, como despedindo na hora certa os conselheiros e
ministros da saúde que teimavam em contrariar ou franzir o nariz às
suas decisões. Rua com eles! A política está acima da ciência, da
arte, da moral e provavelmente da divindade. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">O
presidente Fake News veio a público mostrar que o remédio para o
vírus era uma decisão política e não da medicina e que as pessoas
podiam perfeitamente obter a imunidade se infiltrassem em si próprias
desinfectante, ou se bebessem um xarope feito em casa com detergente
para limparem as entranhas. O presidente Resfriadinho, por seu
turno, não lhe ficando atrás,veio para a rua desafiar o vírus, num
acto de impavidez digno de um antigo capitão de armas, e disse ao
povo que podia vir para a rua e dansar o samba. São actos tão
destemidos estes e tão demonstrativos de uma invulgar entrega à
causa pública, que ambos os presidentes já provavelmente
conquistaram a sua figuração icónica para a eternidade: o
presidente Fake News numa estátua, no lugar mais central da capital
do seu país, com uma seringa gigantesca a combater o vírus e o
presidente Resfriadinho, em lugar destacado da sua moderníssima
capital, a enfrentar o mesmo vírus com um passo de samba.</span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">Apesar
destas atitudes premonitórias, muita gente tem sucumbido aos ataques
do vírus nos países dos dois estadistas aqui focados. Contudo, os
mesmos não se deixam arrastar por essa onda de mortandade, nem mover
pelas fragilidades da compaixão, agindo sempre com coragem e alto
sentido de Estado. O presidente Resfriadinho, aliás, definiu como
ninguém, numa frase sábia, a essência do que tem vindo a acontecer
no seu país: “</span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>É
a vida!”</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">
E rematou com esta modesta auto-apreciação, tão característica
dos grandes homens, que medem sempre por baixo o seu valor: </span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>Eu
não faço milagres</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">.</span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">A
profissão de fé de ambos eles, quer face a esta pandemia, quer a
outras </span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">lérias
inventadas por falsos cientistas</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">,
como a das alterações climáticas, é esta: “Salve-se a economia
e morra quem tem de morrer”. Ora aqui está o princípio salutar da
vida humana. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT">Estes
dois estadistas são </span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>aves
rarae </i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">na
história</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>
</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">dos
povos e será preciso recuar vários séculos para se encontrar
alguma personalidade que se lhes equipare, pois os estadistas de
envergadura são mesmo muito raros. O presidente Fake News com o seu
gesto magnânimo de enviar, em nome pessoal, envelopes aos seus
concidadãos com quantias de mil dólares para mitigarem os efeitos
da pandemia faz, talvez, lembrar o imperador Calígula, o qual,
segundo o biógrafo dos </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>Doze
Césares</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
o imortal Suetónio, distribuiu por duas vezes ao povo trezentos
sestércios por cabeça, </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">para
além de ter mandado chover </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">sobre
o </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">mesmo
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">povo
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">dinheiro
em moedas</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">durante
vários dias, </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">ao
passo que o presidente Resfriadinho talvez </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">pudesse</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
arremedar o imperador Nero </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">a
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">contempla</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">r</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
o incêndio sobre Roma que ele próprio mandara atear tocando cítara
e cantando, </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">figurando-se
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">desta feita o
presidente Resfriadinho a tocar violão, contemplando um incêndio na
Amazónia</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">.</span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">É
possível encontrar mais semelhanças nobilitantes entre </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">os
dois estadistas</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">.
Por exemplo: na forma como ambos reagem tão destemidamente aos
jornalistas que não são capazes de perceber a excelência dos seus
actos, não obstante a evidência do seu valor: o presidente Fake
News </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">vociferando</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">:
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>go
out!</i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">;
o presidente Resfriadinho: </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><i>Cala
a boca! </i></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
</span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Acima
de tudo o que vai exposto, há uma virtude raríssima que é preciso
assinalar-</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">se-lhes</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">:
a incrível </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">leveza</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
com que exercem os seus cargos, provando que a aparente complexidade
da arte ou da ciência de governar está, afinal, ao alcance de
qualquer um, e que não é preciso ter conhecimentos por aí além
para governar países de grande dimensão e exigência. Formidável
pedagogia </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">que
</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">o
cidadão comum universal </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">daí
pode colher</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">!</span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Enfim,
quase se poderia afirmar que os presidentes Fake News e Resfriadinho,
se vivessem no mesmo país, pod</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">er</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">iam
formar um consórcio e serem o presidente e o vice-presidente um do
outro, alternadamente, </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">revezando-se
nos respectivos cargos </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">e
perpetuando-se no poder</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
a bem do povo que tivesse a sorte de os merecer. </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Há
exemplos, porventura mais toscos, por esse mundo fora, que lhes
poderiam servir de modelo</span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">.
</span></span></span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Estou
certo de que há-de aparecer um novo Cervantes para fixar
literariamente as aventuras épicas desta dupla de estadistas: o
presidente Fake News no seu Rocinante a brandir uma grande seringa
de desinfectantes, arremetendo contra o vírus e, a seu lado, o
impagável Resfriadinho, </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">cavalgando
a sua alimária e </span></span></span><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">ajudando-o
com os alforges carregados de detergentes injectáveis.</span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="font-style: normal; line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="color: black;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">Jonathan
Swift (1665-1745)</span></span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 200%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: #000000; line-height: 115%; text-align: left; orphans: 2; widows: 2; background: transparent }
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p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; so-language: hi-IN }</style><style type="text/css">
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p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; so-language: hi-IN }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-7382295134315783612020-05-21T19:16:00.003+01:002020-05-21T19:16:56.071+01:00China VI
<br />
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Guilin</span></div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Hoje
foi cedo o acordar: 06H30 locais.</span></div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Após
o pequeno-almoço no hotel, eis que vamos a caminho do cais do rio Li
para uma excursão de barco. O guia foi aproveitando a viagem de
autocarro para nos continuar a fornecer indicações sobre a cidade
de Guilin e a região. A cidade tem 800.000 habitantes (quatro
milhões se se contarem as zonas contíguas) e é puro o ar que aqui
se respira, límpidas as águas, que se podem beber directamente das
fontes e correntes, dispondo de invejáveis condições de
salubridade, graças à sua situação geográfica e condições
naturais. O governo protege, por meio de medidas adequadas, o
ecossistema deste espaço urbano e zonas envolventes. Por exemplo:
retirou daqui as indústrias poluentes e deslocou-as para outros
locais, nomeadamente a área de Cantão; preserva as tradições e
impôs limites à construção imobiliária, não podendo os
edifícios exceder determinada altura. Por isso, não se vêem por
aqui arranha-céus.</span></div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">É
vulgar as pessoas atingirem idades provectas: mais de 100 anos. Há
uma mulher com 110 anos e outra faleceu com 118 anos. A reforma, em
toda a China, é aos 60 anos para os homens e 55 para as mulheres e
muitos chineses, depois de reformados, querem fixar-se aqui para
viverem outro tanto. Esta é a legenda da cidade, segundo o guia, o
simpático José. Só mais uma nota: Na China há cinco regiões
autónomas: Macau, Hong-Kong, Guanshi, Mongólia Interior e Tibete.
Nas regiões autónomas pode ter-se mais do que um filho. Guilin
pertence à região autónoma de Guanshi. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">E
com isto, depois de 1 hora de viagem, já estamos a apear-nos, cada
qual com a caixinha do farnel que o hotel nos preparou, já
atravessamos as guardas que dão acesso ao cais, munidos do bilhete
que nos foi fornecido e por entre a vasta multidão de turistas,
encaminhamo-nos para o nosso barco (há vários), transpondo a
prancha de madeira que conduz ao portaló. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
viagem ao longo do rio é um deslumbarmanto, que se prolonga durante
4 horas. Uma sucessão interminável de colinas de formas arrojadas,
mesmo inverosímeis, de vertentes muito abruptas e picos a furarem o
céu, oferecendo perspectivas inesperadas a cada volta do rio, umas
isoladas, outras agrupadas, em duetos como se fossem irmãs, ou em
magotes, com os pináculos formando serrania, esta estrangulando a
corrente, a outra mais além obstruindo ilusoriamente a passagem,
aquelas duas estando dispostas de tal maneira nas curvas do rio que
simulam uma garganta entre gigantes, como Sila e Caríbedes, as mais
longínquas envoltas em neblina, esfumadas e como se estivessem
grudadas ao céu. Muitas têm nomes que evocam as figuras que as
formas sugerem, como a célebre colina da Tromba de Elefante. Este é
o cenário de muitas pinturas clássicas evocativas das paisagens
chinesas.</span></div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
almoço foi a bordo, cada qual extraindo o conteúdo da caixinha que,
desde o hotel, o acompanhava, o que contribuiu para dar uma agradável
sugestão de viagem campestre. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
regresso foi no autocarro que nos levou de manhã cedo. Já chegámos
para lá do meio da tarde. O tempo até ao jantar foi ocupado como
cada um quis. E havia onde passar esse bocado da tarde, nomeadamente
nas margens rústicas do lago que se encontra mesmo perto do hotel do
outro lado da rua. Já falei dos seus arruamentos em terra, por entre
árvores, arbustos e plantas da mais variada espécie, conferindo ao
local um resguardo protector para os dias de grande calor. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Após
o jantar, fomos fazer uma excursão de barco pelos lagos do centro,
denominados o lago Cedro (Shanhu) e o lago Figueira (Ronghu),
ligados um ao outro e navegáveis como se fossem um rio. A embarcação
tinha um aspecto de bar nocturno, com mesas e bancos, onde nos fomos
sentando. Como a noite estava boa, muitos subiam à amurada para
melhor desfrutarem da viagem. Ao longo da passeata, a cidade
ia-se-nos revelando, iluminada e multicolorida (os chineses parecem
apreciar muito as iluminações nocturnas das cidades e pôr nisso um
brio especial). Zonas ribeirinhas, jardins, parques, pontes, casebres
das margens iam desfilando a um lado e outro. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
pesca ncturna foi uma das atracções mais inéditas e bizarras que
se nos deparou. Os pescadores postavam-se no meio do rio, de pé, em
barquitos pequenos, quase pranchas de surf, cada qual em seu
barquito, um aqui, outro lá adiante, trajados com fatos
fosforescentes e iluminados por uma lanterna ou coisa parecida.
Tinham como companheiros corvos marinhos e eram estes que,
devidamente amestrados, mergulhavam nas águas a um sinal gutural
dos pescadores. Quando regressavam ao barquito, depois de uns
momentos em mergulho, não aparentavam trazer nada com eles. Porém,
os pescadores apertavam-lhes o pescoço, num gesto sacudido que
parecia de estrangulamento, e eles largavam, inteirinho, o peixe que
tinham engolido. Disse-nos o guia (o tal José) que os corvos são
recompensados e procuram os maiores peixes. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Outra
das surpresas que a viagem nos porporcionou foi um bailado executado
num terraço sobre o rio por um conjunto de jovens beldades
pertencentes a uma minoria étnica. Não seria nada de especial, se
não tivesse surgido como uma espécie de espectáculo onírico,
deusas marinhas ou ninfas que tivessem surgido do fundo das águas
para deslumbrarem o viajante. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Uma
última curiosidade foram as torres octogonais dos dois pagodes
conhecidos como o Sol e a Lua, erguendo-se no lago Shanhu (Cedro),
cada qual delas trepando nas alturas em vários andares com os seus
telhados típicos. A mais alta, a do Sol, está iluminada em tons
dourados e a da Lua, um pouco inferior, em tons prateados. Ambas
produzem um belíssimo efeito na noite de Guilin, que as toma como ex
libris. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">No
regresso, o barco foi mesmo transformado em bar nocturno com uma
jovem chinesa tocando piano chinês e difundindo aquelas sonoridades
orientais tão delicadas e sonhadoras. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Como
se intui do descrito, a viagem tem o seu quê de menu turístico, o
que mais uma vez prova a actual capacidade demonstrada pela China
para atrair o forasteiro, dando- lhe a comer as iguarias que são as
preferidas de quase todo o turista, mas não deixa de ser
interessante e reconfortante. Valeu a pena sobretudo para ver a
cidade à noite no multicolorido das suas luzes e as torres dos
pagodes, que têm outra beleza iluminadas. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Estamos
num outro dia, mas ainda em Guilin. O acordar foi às 07h00. Saída
de autocarro em direcção ao museu das pérolas, que de museu tem
pouco. Uma visita dirigida ao turista consumidor e à promoção da
produção e comércio locais. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
coisa começou num auditório, onde houve desfile de beldades
exibindo as jóias com que adornavam o colo e os braços,
movimentando-se no tablado para trás e para a frente, ao som de
música, pondo em evidência os seus enfeites. De seguida, passou-se
à sala da exposição das jóias, onde uma senhora fez uma parlenda
sobre a cultura das pérolas. Estas são provenientes de ostras, as
quais produzem nácar como forma de defesa contra objectos estranhos
que entram nas suas conchas – processo esse que, demorando anos, dá
origem às pérolas. Há-as de água salgada e de água doce, sendo
as de água salgada de melhor qualidade. Exemplificou com a abertura
de um ou outro molusco, que retirou de aquários onde se cultivavam.
Também deu explicações sobre os tamanhos e os feitios (as de forma
redonda é que são aproveitáveis para colares e pulseiras de
qualidade) e sobre a maneira de distinguir as pérolas verdadeiras
das falsas (aquelas, sendo friccionadas, largam umas particulazinhas
quase imperceptíveis de pó, as outras, não). </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Passou-se
de seguida à venda, no fundo o acto mais importante para que tendiam
todos os passos anteriores. E foi um corrupio à volta dos
mostradores e balcões, um fervilhar de desejos e de pequenas
explosões de entusiasmo, com os da casa incentivando à compra com
acenos de aprovação e palavras de encarecimento (normalmente em
inglês) dos objectos sobre que se detinham mais demoradamente os
olhares ou sobre os quais incidiam as inclinações dos potenciais
compradores. Foi assim que gastei os últimos yenes, confortando-me
com a necessidade de gastar aquela moeda, dado que, daí para a
frente, a mesma já não tinha cotação. Haveria de ser o dólar de
Hong-Kong.</span></div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Em
Guilin ainda fomos visitar a Gruta da Flauta de Cana. É uma das
grutas maiores e mais célebres desta zona de rios, lagos, colinas e
grutas. Trata-se de uma enorme galeria, na qual se desce em
profundidade, com estalactites e estalagmites formando as mais
fantásticas figuras: leão, homem da neve, queda de água e muitas
outras figuras imaginárias. Um microcosmo com elementos naturais e
artificiais, estes consistentes sobretudo nos arranjos de luzes e
sonoridades, onde se percebiam chilreios de pássaros, que na
realidade não existiam. Em tempos ancestrais, fluiria por aqui um
rio. No final, junto de um dos lagos da gruta, houve espectáculo com
alusão cosmogónica e bailado. Na verdade, não se pode dizer que os
chineses não sabem explorar convenientemente os seus recursos também
do ponto de vista da indústria turística.</span></div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Terminada
a visita, metemo-nos no autocarro com destino à estação dos
caminhos-de-ferro. Despedimo-nos do José (afinal, Dong, o seu nome
chinês, soube-o nesta altura). Dirigimo-nos para o comboio, que
acabara de parar na plataforma, à procura da carruagem que o bilhete
designava. Num rápido, num rápido, que o tempo urgia. Com toda a
bagagem (mala grande, uma mochila, o volume do edredon e ainda uma
caixinha com o lanche ou almoço, que tinha sido preparada no hotel).
Toda a gente se precipita para as portas, as pessoas demoram a
subir, demoram a entrar, por causa dos engarrafamentos, uma aflição.
Por fim, consegui subir com toda a tralha e arrastá-la lá para
dentro. Na coxia, as pessoas permandeciam de pé, atarefadas a
colocar a bagagem nas prateleiras, completamente repletas. Quando
consegui mover-me lá para dentro, vi um espaço livre numa
prateleira, por cima do lugar onde iam duas jovens. Atirei a mala
grande para esse sítio e, por felicidade, ela coube lá, embora com
um dos rodados ligeiramente de fora, o que não pareceu agradar às
referidas jovens. Verifiquei as condições de segurança e
mostrei-lhes que a mala estava segura. Entalei o volume do edredon,
mais espalmado, num espaço que havia entre as costas do último
banco da carruagem e a parede do compartimento, confiando em que
ninguém me pegaria nele. Fui depois à procura do meu lugar.
Acomodei a mochila aos pés e respirei fundo, já o comboio, tipo
Alfa, rodava a boa velocidade. Embalado entre estações, atingia 300
kms. por hora. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Fui
lendo uns contos maravilhosos de Gao Xinjiang, prémio Nobel da
Literatura no ano 2000 (Uma Cana De Pesca Para O Meu Avô,
publicações Dom Quixote) e espreitando a paisagem. Planícies a
perder de vista, áreas cultivadas, relevos boleados, povoações
aqui e acolá, centros urbanos, tudo incaracterístico, assim me
pareceu. Sobretudo no que diz respeito aos edifícios, que a paisagem
era agradável à vista, inundada de sol. O comboio parou em várias
estações e, já perto de Hong Kong, parou em Cantão, uma grande
mole urbana com prédios trepando para o céu, mas onde também não
divisei nada que chamasse a atenção. </span>
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Ao
cabo de três horas e meia de viagem estávamos em Hong Kong. Já
estava o autocarro à nossa espera com o respectivo guia, que falava
castelhano. Enquanto a viagem durou, foi-nos dando explicações
sobre a cidade. No hotel – o Harbour Plaza Metropolis, de 4
estrelas – coube-me o quarto n.º 69 no 17.º andar. O hotel ficava
num alto e dele se divisavam estradas rápidas, cruzadas,
sobrepostas, passagens aéreas, carros circulando a alta velocidade.
O centro ficava a uns 20 ou 30 minutos de distância. Pequenos
autocarros do hotel transportavam quem quisesse para lá, de meia em
meia hora, se não estou em erro. Nesse dia, porém, com o cansaço
da viagem e a freima da instalação, mais o tempo gasto no câmbio
(troca de euros pelos tais dólares de Hong Kong – os funcionários
examinavam cada uma das notas minuciosamente, virando-as de um lado e
outro), acho que ninguém saiu. Entretanto já eram horas de jantar,
que não houve (o único dia em que tal aconteceu). Andando perdido
pelo foyer do hotel, depois de arrumadas as malas, acabei por
encontrar duas pessoas que também vagueavam pelo mesmo local (duas
senhoras, que eram companheiras de viagem e partilhavam o mesmo
quarto). Desprezamos o restaurante e o bar do hotel e fomos para o
centro comercial contíguo (Metropolis), que comunicava com aquele.
Circulámos por corredores vazios, com lojas praticamente desertas
àquela hora, num cenário universalmente estereotipado. Acabámos
por ir dar a um pequeno restaurante que não tinha ninguém – uma
dessas manjedouras de centro comercial. Mandámos vir lasagna à
bolonhesa para todos (não havia muito mais) e uma sopinha de tomate
picante. Acompanhámos com chá. Foi um pouco desolador em termos
gastronómicos, mas divertimo-nos com piadas ao que nos rodeava. No
quarto, o mais acanhado em toda a viagem, telefonei para casa, mas o
WatsApp não deu (finalmente experimentava a interdição que
impendia sobre essa rede social). Tive que fazer chamada pelo Rooming
só para dizer olá, porque o preço escalda. Dormi com as malas por
desmanchar, porque no dia seguinte partiríamos para Macau, de onde
regressaríamos dois dias depois a Hong Kong. O grosso da bagagem,
contudo, ficaria nos arrumos do hotel. </span>
</div>
<style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; line-height: 115%; background: transparent }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-82610455193641067552020-04-25T18:06:00.001+01:002020-04-25T18:06:44.591+01:00Pensamentos de um político singular
<br />
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: small;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">(Para
que o leitor se ocupe, em tempos de pandemia, a procurar a quem podem
caber estes pensamentos)</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Estamos
confinados nas nossas casas, por via de um ser ínfimo e invisível,
que é o coronavírus (do latim </span><span style="font-family: Times New Roamn, serif;"><i>corona</i></span><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">
- “coroa”), ou seja, o vírus coroado em rei do nosso tempo. É
ele quem manda no nosso destino por estes dias.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Este
vírus faz jus ao seu nome: vira tudo ao contrário. Um rei que nos
manda andar às avessas. Nunca se viu um ser tão minúsculo pôr
toda a gente de quarentena, refugiada com medo dele. Na verdade, ele
despacha muita gente para o cemitério e, para além disso, paralisa
toda a economia. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Mas
será que nós vamos ter que obedecer a um serzinho destes? Ter a
indústria parada?, os transportes imobilizados?, as casas de
comércio fechadas?, os restaurantes sem vivalma?, os cafés e
botequins vazios?, as casas de espectáculos às moscas?, as escolas
sem mestres e sem discípulos?,os céus livres de ruído e de
fumarada?, as estradas libertas dos engarrafamentos e do rebuliço do
quotidiano?, enfim, será que vamos abdicar de tudo aquilo que é
sinal de vida e sangue e luta? Não. Não vamos ter essa atitude,
senhores. Vamos enfrentar esse vírus e dar-lhe uma ensinadela.
Enfrentá-lo como homens de barba rija e de peito feito. Dar cabo
desse reizinho, desse bicharoquinho. Veja-se aquele presidente do
país do samba. Ele tem muita razão, até porque ele é destemido e
foi capitão da tropa. Ele não tem medo do vírus e veio cá para
fora sem máscara nem viseira, pronto a pegar no vírus pelos cornos,
como um touro no redondel (eh, vírus! eh...eh!), exortando o povo a
seguir o seu exemplo.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Ora
aí está! Temos de nos deixar de “mariquices” e voltar a encarar
a vida com firmeza e fortaleza. A vida não é dos fracos, nem dos
impotentes; a vida é sangue e luta; a vida é dos fortes e dos que
arriscam, não dos timoratos, nem dos que ficam pelo caminho. Alguns
cairão doentes, mas isso é próprio de quem vai à luta. Há
perdedores e ganhadores; sempre assim foi e há-de ser.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Dizem
que são os velhinhos os alvos preferenciais do vírus. Pois, se
assim é, deixá-los ir, dando a vez aos jovens e saudáveis. Nestes
reside a força, a coragem, o denodo. E talvez se possa dizer que o
último tributo válido dos velhinhos à continuação da vida seja o
de poderem contribuir para a imunidade geral, de que tanto se tem
falado. Aliás, como disse um governador de um Estado, nos United
States, “os velhos deviam voluntariar-se para morrer”. Isso, por
paradoxal que pareça, é que seria um grande hino à vida,
principalmente da vida daqueles de nós que ainda têm a esperança
de muito tempo pela frente, como provavelmente será o caso do
referido governador.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Por
estes dias temos assistido a um espectáculo deplorável: perdão de
penas e liberdade condicional para os reclusos, a pretexto do vírus.
Isto é inqualificável e bem pode ficar com um nome para a história
vergonhosa das nossas instituições: </span><span style="font-family: Times New Roamn, serif;"><i>virulência</i></span><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">.
Veja-se o paradoxo: cidadãos honestos sem poderem sair, confinados
em casa, e os criminosos fora das prisões. Bem certo que se diz
deverem els ficar com igual obrigação de retenção em casa, mas
mesmo isso é inadmissível, pois tal equivale a torná-los iguais a
nós, ou seja, a equiparar-se a banditagem ao comportamento ordeiro
dos restantes cidadãos. É este o perigoso igualitarismo que está
em vigor no nosso país. Os nossos governantes aduzem que é por
causa do vírus. Mas então o vírus é o tal reizinho que manda no
país e os nossos governantes são os títeres manobrados pelo
bicharoco, como num teatro de marionetes? Vergonhoso!</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Querem
estes cavalheiros celebrar o dia da liberdade! Mas que liberdade,
quando está toda a gente metida de portas adentro? Só se for a
liberdade que pôs os criminosos fora das prisões. A liberdade
indiscriminada dos vendilhões do templo. Temos de nos livrar desta
liberdade que mistura o crime com a vida honesta. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Soltem
mas é a economia, abram o comércio e as indústrias, ponham cá
fora a mão-de-obra, glorifiquem o trabalho. </span><span style="font-family: Times New Roamn, serif;"><i>Arbeit
macht frei</i></span><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roamn, serif;">Jonathan
Swift (1667-1745)</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: #000000; line-height: 115%; text-align: left; orphans: 2; widows: 2; background: transparent }
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p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; so-language: hi-IN }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-52300141162317999952020-04-22T22:39:00.003+01:002020-04-22T22:39:30.381+01:00China VManhã em Shangai. O autocarro já está à nossa espera, à porta do Center Hotel, onde me coube o quarto 2004, no 20.º andar. O infalível Júlio, de pé, ao lado do autocarro, aponta-nos a porta da frente. Aí vamos nós por esta manhã de sol (que sorte temos tido, ao longo destes dias!) marchando por entre prédios altíssimos que fazem as ruas parecerem estreitas, com destino precisamente a um dos edifícios emblemáticos desta cidade, que disputa a Nova Iorque o cenário urbano. E aí está o Jin Mao, um dos arranha-céus mais alto da cidade, com 88 andares. Subimos ao topo, em elevadores ultra-rápidos. Lá de cima perscrutámos demoradamente, em toda a roda, a cidade, com o sol a entrar de jorro pelas vidraças e a sensação de estarmos nas núvens. Uma miríade de pináculos, em que se avantajavam o edifício Pérola (torre da televisão) e a Torre de Shangai, com 120 andares; ao longe, o grande rio Yang Tse e o seu afluente Huangpu , irradiando num poço de luz. Até por estes dois rios Shangai parece emular Nova Iorque. <br />De caminho para o templo do Buda de Jade, passámos pelo centro financeiro, com as respectivas catedrais da finança erguendo para o alto as suas torres. O Templo Buda de Jade é um templo grandioso construído nos finais do século XIX por iniciativa de um monge budista, que coligiu os necessários fundos para albergar duas estátuas de Buda que trouxe de Burma, por ocasião de uma peregrinação que fez ao Tibete. O templo foi destruído no tempo da revolução nacionalista de Sun Yat-sen de 1911 e reconstruído entre 1918 e 1928. Dos vários halls e câmaras que o compõem, destacam-se o dos Reis do Céu, onde se exibem as estátuas dos Quatro Reis do Céu e as estátuas douradas de Maitreya e de Weituo; o grande hall, onde se seguem câmaras contendo várias estátuas douradas de Buda e várias divindades, a estátua dourada de Guanyin (deusa da misericórdia) e da discípula Sudhana ao seu lado, representando a última fase da aprendizagem budista, mas o que me feriu mais a atenção foram as câmaras onde se encontram as tais duas estátuas trazidas pelo monge fundador, estátuas estas em jade branco, uma representando Buda sentado, em tamanho gigante, e outra representando Buda deitado com um riso beatífico e ameninado ou bonacheirão, provavelmente imerso no Nirvana. <br />Este templo foi também vandalizado pelos activistas da revolução cultural, que nele implantaram, em vez do Buda, o retrato de Mao Zedong, assim elevado ao plano da divindade e do culto dos fiéis. Agora totalmente reposto, recebe as visitas dos devotos, não do grande timoneiro, mas dos crentes budistas. Aparecem com pauzinhos de incenso a arder, espalhando em redor um odor forte, e fazem vénias enormes ao Buda, antes de se ajoelharem, e quando terminam as orações, voltam a fazer três vénias profundas, de joelhos, levando a cabeça ao solo.<br />Vamos agora em direcção ao restaurante, mas como a visita ao jardim Yuyuan, o jardim do Mandarim, foi suprimida, assim como o passeio pelo Bund, por causa dos preparativos para a Expo, paramos numa oficina da seda, um dos locais sempre recomendáveis para o turista fazer os seus dispêndios. E aqui foi realmente a minha perdição. Caí na asneira de comprar um edredão e respectivas almofadas, tudo em seda, claro. Para além da soma que tive de pagar em euros (uma das moedas com cotação internacional mais desejadas), tive de passar a carregar, durante o resto da viagem, o embrulho, que, não sendo muito pesado e estando bem ajeitado e comprimido, em saco de nylon com asas, veio juntar-se incomodativamente ao resto da bagagem e originar penosidades de transporte e arrelias nas estações ferroviárias, nos autocarros e nos aeroportos, contribuindo para complicar as já de si ensarilhadas formalidades de controle. Ninguém me mandou ser parvo turista e, por isso, tive a sanção merecida. <br />Depois do agradável almoço em restaurante, fomos para a cidade velha. É um dédalo de ruas estreitas, a engurgitar de gente, com prédios de construção chinesa tradicional, telhados em forma de quilha de barco, contrastando com a cidade moderna dos arranha-céus e movimento frenético. Aqui não há carros, há pessoas a pé, deambulando descontraídamente, entrando e saindo dos estabelecimentos, que são aos milhares, juntando-se nas pequenas praças, em amena convivência. Tudo tem um aspecto íntimo e aconchegado, pese embora o amontoado de pessoas, para o que contribui a estreiteza das ruas, a disposição das casas, estas aqui encavalitadas sobre o lago serpenteante, conferindo ao ambiente um ar de cascata, o ar familiar que perpassa por todo o conjunto humano. Passeia-se por estas ruelas gostosamente, por entre o formigueiro de pessoas, metendo o nariz em cada entrada de loja, e são de todo o estilo as lojas – mercearias, casas de chã, estabelecimentos de roupas, de electrónica, lojecas de bugigangas, quiosques, restaurantes e stands de comida de rua – admirando o belo cenário que se nos depara a cada esquina. Mas não podemos ficar aqui a morar, que o tempo de que dispomos está medido ao minuto. <br />E assim vamos para um passeio de barco pelo rio Huangtsu. Com o cair da noite, os grandes edifícios da cidade moderna iluminam-se, e isso é um espectáculo digno de se ver. Os barcos carregam-se de turistas, como em Nova Iorque. Um a um, os arranha-céus vão acendendo as suas luzes, caprichando em exibicionismos luminotécnicos. Luzes de todas as cores, espiralando pelos edifícios, subindo até aos pináculos e descendo por eles abaixo, tremelicando, piscando, mudando de cor e de feitio, formando um arco-íris ao longo de todo o percurso. É a grande cidade a anunciar a noite. No barco vai um corrupio, uma algaraviada de vozes, um tal disparar de máquinas fotográficas, de telemóveis e de tablets, turistas onde há vozes estrídulas de asiáticos sobrepondo-se uns aos outros, acotovelando-se, “roubando” as vistas ao parceiro do lado ou de trás, no afã de filmarem a cena em vídeo.<br />No trajecto para o jantar, o patusco Júlio voltou a arranjar ensejo para falar do seu catolicismo, mas parte da malta protestou vivamente e houve quem lhe dissesse que guardasse a sua religiosidade para outras ocasiões e que se limitasse a falar de temas ligados à viagem. Ele, porém, não pareceu molestar-se, mas deixou efectivamente de falar na religião. O jantar num restaurante fora do hotel é que veio animar toda a gente e conferir unanimidade relativamente à qualidade dos pratos, que eram servidos em regime de self service. Até as sobremesas, de ordinário sofríveis nos sítios por onde tínhamos andado, eram acima da mediania, com vários tipos de gelado e bolos e, a coroar tudo, chã ou café (grande maravilha). <br />A noite terminou com uma passeata livre pela célebre Rua Nanquim, uma rua interminável mesmo ao lado do hotel, pejada de pessoas e de lojas de todo o tipo, grandes armazéns, mercearias, restaurantes, comida de rua, casas de chã, tendas de roupa e de fruta, enfim uma gigantesca área comercial, animada de luzes e de movimento, nesta noite de sábado para domingo. Uma boa estafadela, depois de uma jornada intensa, parando aqui, parando acolá, embasbacando diante de certos estabelecimentos, pois alguns companheiros de viagem o que querem é farejar coisas para comprar. É a praga do turista. <br />Às tantas, apanho a boleia de um casal que vai já retrocedendo rumo ao hotel. No alto do 20.º andar, ainda me chegam ecos do bulício na rua, sobretudo ecos musicais. Espreito pela janela, antes de me deitar, e ainda há pessoas a formigar lá em baixo, as quais parecem mesmo formigas.<br />Domingo. A rua Nanquim, vista de cá de cima, está sem movimento a estas horas da manhã. Após o pequeno-almoço no hotel, aí vamos nós no autocarro, levando na frente o infalível Júlio, não sei se depois de ter assistido à missa dominical. Foi coisa que não lhe perguntei, por um lado porque a fé é do foro íntimo de cada um; segundo, porque poderia despertar uma daquelas suas divagações místicas e provocar uma tempestade no autocarro. Assim, vamos tranquilos a caminho do Museu Nacional de Shangai, com ele a elucidar o que se vai deparando a um lado e outro da cidade. <br />Shangai é uma metrópole com 20.000.000 de habitantes, parecida com as grandes cidades europeias, exceptuando a parte velha (aliás, foi submetida a grande influência e até administração de potências europeias, após o Tratado de Nanquim de 1842, no seguimento da Guerra do Ópio) e parece emular a cidade de Nova Yorque. Tenho dificuldade, nesta correria pelas grandes avenidas atravessando florestas de arranha-céus em autocarro de turismo, em imaginar o cenário onde decorreu a acção do grande romance de André Malraux – A Condição Humana – que eu li pela terceira vez, pensando nesta viagem. Leitura perfeitamente inútil desse ponto de vista. O cenário do romance permanece-me tão abstracto como antes. Estas viagens de agora são viagens-relâmpago; não dão para tomar o gosto às coisas, para nos envolvermos na atmosfera de um local, para pesquisarmos algo ou, ao menos, darmos substracto a um capricho de imaginação, que é muitas vezes de onde vem o impulso para irmos ao encontro do desconhecido. Fica então sem um referente material esse território imaginário onde decorreram os trágicos acontecimentos que se desenrolaram num espaço de tempo concentrado e densíssimo, entre 27 de Março e 12 de Abril de 1927, de enfrentamento entre revolucionários do Partido Comunista Chinês (PCC), tentando liderar o movimento de trabalhadores em insurreição, e as tropas de Chiang-Kay-Chek, de cujo partido – o Kuomitang – o PCC era aliado, obedecendo a orientações estratégicas de Stalin e do Komintern. O enfrentamento desembocou no massacre dos comunistas em 12 de Abril e na prisão e tortura até à morte de muitos dos seus revolucionários. Os acontecimentos descritos por André Malraux adquirem, para além da expressão de uma tragédia colectiva, uma dimensão trágico-individual com ressonâncias existenciais fundíssimas, que justificam o título da obra – A Condição Humana. Kyo e a sua namorada May, Gisors (pai de Kio), Katow, o revolucionário que cedera a sua dose de cianeto a dois outros prisioneiros, expondo-se, assim, ele próprio à tortura, Tchen, o revolucionário que se transformou em terrorista-suicida, todas essas personagens têm uma espécie de desmesura que as aproxima do sobre-humano, ou seja, da vontade “de escapar à condição humana”, como Gisors sentencia a dado passo.<br />E com isto chegamos ao museu de Shangai. Muito à vol d’oiseau, aqui vai uma referência ao que se nos depara nas várias galerias, a começar no rés-do-chão e subindo pelos seus três andares:<br />Rés-dochão: bronzes, alguns muito antigos, do 13.º ao 11.º séculos a. C. Objectos e instrumentos já bastante notáveis, quer do ponto de vista da execução, quer da forma artística: talhas e vasos de vinho, potes para comida, instrumentos de trabalho (pás, facas, espadas, etc.), instrumentos musicais (os mais perfeitos datam dos séculos VII e VI a.C.); um espelho em bronze transparente da dinastia Han (206 a.C. - 220 d. C.) Escultura chinesa antiga. <br />Nos pisos superiores: <br />Galeria das cerâmicas. Peças muito interessantes, sobretudo das dinastias Ming e Kim.<br />Galeria das pinturas e caligrafias. Pouco vi de pintura, que me pareceu consistente, na maior parte, em painéis compridos, de forma rectangular, com paisagens típicamente chinesas. Caligrafias efectuadas de cima para baixo em grandes tiras de papel dispostas verticalmente.<br />Galeria dos objectos de jade. Esta galeria abrange várias épocas, desde a Antiguidade até tempos mais recentes, contendo peças de adorno, estatuetas, etc., muitas delas admiráveis, sem dúvida, sendo a galeria do museu de longe mais concorrida, não só por turistas internos, mas também externos à China, formando grupos diante das vitrinas e obrigando a tempos de espera.<br /> Galeria de selos e numismática. Passei de largo pelos selos, retendo-me diante de alguma espécie mais fora do vulgar, nomeadamente os primitivos selos do império. Quanto à numismática, dei uma espreitadela ao conjunto, por não me interessar particularmente e, ante a limitação de tempo, ter que escolher. <br />Galeria do mobiliário chinês das dinastias Ming e Kim. Aqui, sim, detive-me diante de peças esplêndidas, nomeadamente uma mobília de quarto imperial, mas também de outros mobiliários de uso doméstico.<br />Á saída do museu, enganei-me na porta que devia usar para me reunir com os companheiros de viagem; uma vez lá fora e dando pelo erro, pensei em retroceder pela mesma porta pela qual tinha saído uns dez minutos antes, mas não era permitida a entrada por ali. Usando o meu escasso inglês e gestos, falei com um dos funcionários que estava à porta e disse-lhe, mostrando-lhe o bilhete de entrada no museu que ainda conservava comigo, que me tinha enganado e que tinha os companheiros de viagem do outro lado. Ele permitiu-me a entrada, mas obrigou-me a passar novamente pelo controle, e tive que colocar na máquina o saco de viagem, a máquina fotográfica e o casaco para serem radiografados e sujeitar-me àquela fiscalização pessoal que é de uso, com aparelho electrónico de mão. Estava a passar a porta giratória e o infalível Júlio a entrar por ela, com intuito de me procurar.<br />Almoçámos em restaurante já previamente contratado, como tem sucedido sempre.<br />Enquanto seguíamos de autocarro, travou-se inesperadamente um diálogo com o Júlio a propósito da situação que se tem vivido em Hong-Kong (manifestações de protesto que duram há meses em prol da plenitude dos direitos, liberdades e garantias democráticos, conforme o compromisso das autoridades chinesas com os antigos colonos ingleses, no acto da restituição do território à China em 1997. Curiosamente, o Júlio pôs-se a expender o mesmo ponto de vista das autoridades de Pequim, ou seja, do Comité Central do Partido Comunista da China, ele que confessou não ser filiado nesse partido e ter demonstrado durante a viagem uma visão e hábitos culturais pouco conformes com a ortodoxia chinesa. E afirmava acaloradamente que os distúrbios que estavam a ocorrer naquele território eram inspirados pelos Estados Unidos da América e por outras potências ocidentais, interessadas em fomentar a desordem. Eu disse “curiosamente” e daí talvez não, porquanto a atitude de Júlio era, ao fim e ao cabo, demonstrativa de uma rigidez em matéria política, que tem na generalidade dos cidadãos chineses uma câmara de eco da propaganda governamental, ao passo que o seu catolicismo, conquanto bacoco e reaccionário, é sinal da abertura que os actuais líderes do Partido Comunista instauraram em matéria económica, religiosa e a nível de certa vivência comunitária, como decorrência da abertura da economia ao mercado.<br />Após o almoço, embarcámos no célebre comboio magnético, a caminho do aeroporto, onde iríamos tomar o avião para Guilin. O percurso, de cerca de 30 kms., fez-se em cerca de 8 minutos, com uma ou duas paragens pelo meio. O comboio não teve tempo para atingir os 400 kms. horários que pode atingir, mas passou dos 300 kms. por hora, marcados no visor por cima da porta da carruagem. O comboio circula dentro de uma plataforma, mas não tem carris; é impelido pela força magnética. <br />No aeroporto de Shangai, despedimo-nos do Júlio, após as formalidades, que foram muito demoradas – um tormento que já vem sendo habitual e que desafia a proverbial paciência chinesa, mas lá consegui passar com toda a bagagem, incluindo o volume do edredão e travesseiras, um empecilho que passei a ter de suportar e que me obriga a andar com ele na mão até à entrada do avião, para além da bagagem que vai comigo no assento, pois o mesmo não me cabe na mala que vai no porão. <br />O voo até Guilin durou 02h30m. Chegámos mesmo ao fim da tarde. À nossa espera já lá estava o guia local, que disse chamar-se José, na tradução do seu nome chinês. É um jovem muito simpático; fala excelentemente bem o castelhano e é dotado de um formidável sentido de humor. Acompanhava-o um outro amigo, que também arranhava uma palavras na mesma língua. Enquanto viajávamos de autocarro até ao hotel, elucidou-nos sobre as características da terra.<br />O hotel onde ficámos, de 4 estrelas, como sempre tem sucedido, chama-se Lijian Waterfull Hotel; fiquei no 8.º andar, quarto n.º 68. Consegui telefonar para casa pelo WatsApp. Tenho tido sorte nos meus telefonemas diários, apesar de me terem advertido que na China essa rede social é proibida. Jantámos num restaurante fora do hotel. Após, quem quis passeou pelo centro comercial ao ar livre, estendendo-se por várias ruas, mesmo perto do hotel. Chuviscava. O clima, aqui, parece ser um pouco mais húmido, por força das montanhas que rodeiam a cidade, conferindo ao local um ar bucólico, que o rio, com suas margens arborizadas e ajardinadas e rústicos caminhos de terra, acentua. Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-19774150652241721662020-03-18T23:22:00.001+00:002020-03-18T23:22:18.804+00:00China IV
<br />
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Manhã
cedo, quando a circulação de trânsito é ainda escassa, já
estamos a rodar no autocarro em direcção à estação dos
caminhos-de-ferro. É uma cidade ainda estremunhada esta, com raros
trauseuntes, um ou outro autocarro, carros de limpeza. A Praça
Tiananmen aparece de relance, ainda deserta, apenas povoada por meia
dúzia de pessoas, talvez operários nas limpezas matinais,
preparando o recinto para a multidão de turistas que a hão-de
encher e animar de movimento.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Caminhamos
por grandes avenidas; esta por onde circulamos chama-se Avenida da
Paz Eterna (estes nomes chineses são uma delícia, transportando-nos
para um mundo que não é deste mundo). É uma avenida inerminável,
que praticamente vai dar à estação e ao longo da qual se pode
dormir um bom bocado ao ritmo monótono do rodado do autocarro, uma
soneca tão repousante e compensatória da forçada madrugada, que
parece ter o sabor de uma paz, se não eterna, pelo menos abençoada.
A grande chatice são as malas no termo da viagem, pois trazemos
connosco toda a bagagem, enfileirando em bichas, passando com esforço
portas automáticas e controles complicados, como nos aeroportos, a
voz de Zhao Naipu chamando-nos à ordem e procurando juntar-nos com
os braços abertos: Olá! Olá!…, correndo para aqui e para acolá:
Olá! Olá!…, num curioso vocativo que me fez lembrar o barqueiro
de Gil Vicente no Auto da Barca do Inferno: “À barca, à barca,
hou lá!”</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Entrámos
para a plataforma quando, no painel electrónico surgiu a hora do
embarque e passada mais uma porta que se accionava com a introdução
do bilhete. Despedimo-nos de Zhai Naipu e tomámos os nossos lugares
numa carruagem confortável. A distância que iríamos percorrer até
Chian cifrava-se em 1200 quilometros. Vencêmo-los em seis horas
exactas. Isto, porque o comboio parou em, para aí, uma dezena de
estações ou mais, que serviam outros tantos centros urbanos. O
certo é que perdia tempo a reduzir a velocidade antes da paragem, na
estação e novamente no arranque. De resto, a velocidade a que
normalmente circulava era de 300 quilómetros por hora. O serviço de
bar é que não achei famoso, pelo menos em termos de refeições.
Nem sequer serviam chá, que tão bem me teria sabido, em vez do café
a que estou habituado.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Durante
a viagem, houve sempre sol e podiam observar-se com nitidez as
paisagens que se iam desenrolando diante dos nossos olhos. Poucas
zonas montanhosas e planícies a perder de vista. Os povoados que
surgiam pareceram-me desolados, com os seus prédios tipo caixote,
uniformizados, sucedendo-se em filas, com espaços entre eles pouco
desafogados. Áreas cultivadas, sim, mas onde não se divisavam nem
pessoas, nem animais, assim como não se viam casas rurais, que
emprestam sempre às paisagens campesinas um carácter especial. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Enfim,
chegámos a Xian e já tínhamos à nossa espera a guia chinesa que
iria conduzir-nos durante o tempo que lá estivéssemos. Falava
castelhano muito bem e disse chamar-se Sílvia. É claro que era a
tradução do seu nome chinês. Quando lhe pedi para me escrever o
seu nome original, fez um gatafunho no caderno, que me deixou
perplexo. Durante o trajecto de autocarro até ao hotel, foi-nos
expondo, de um modo geral, um pouco da história da China, da sua
indústria e das suas populações e, em especial, da história da
cidade. Xian tem 3.000 anos de existência e foi a capital durante
metade das dinastias do império. O nome Xian significa Paz do Oeste
(Xi – Paz; An – Oeste). A cidade situa-se no Norte, perto da
Mongólia Interior e tem 10 milhões de habitantes. Ainda se vêem
trechos das muralhas que a cercavam.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
chegada ao hotel – Grand Noble Hotel, onde me coube o quarto 1205 –
foi só para descarregar as malas, que o tempo nestas viagens tem de
ser aproveitado até ao segundo. De volta ao autocarro, visita ao
Pagode do Grande Ganso Selvagem, dos finais do século VII. É uma
construção em pirâmide, escalonada em andares que se vão
estreitando até ao vértice. Fica no alto de uma pequena elevação
à qual se ascende por uma ampla escadaria. Espaço de lazer
envolvente, interessante, com árvores. Havia função à hora a que
lá chegámos. Viam-se os monges budistas e os fiéis, através da
larga porta, salmodiando numa toada repetitiva, ritmada por um tambor
e um pequeno sino. Era vedada a entrada, evidentemente, e a tentativa
de disparar as máquinas fotográficas para o interior era
imediatamente sustada por vigilantes. Em redor, várias dependências
com figuras de jade representando a vida de Buda.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Actualmente,
após o degelo maoísta, conforme foi salientado pela Guia, existe
liberdade de culto na China. Mao queria acabar com a religião. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">De
seguida, partimos para um outro templo, desta feita, da religião
muçulmana - a Grande Mesquita de Xian, cujas origens remontam ao
século VIII (dinasstia Tang), segundo o que foi posto a circular na
altura da visita, mas o templo terá sido construído bastante mais
tarde, durante a dinastia Ming (1368-1644), segundo o que leio num
velho guia da Baedecker (1996), que adquiri com vista a uma frustrada
viagem a Macau antes da retirada de Portugal do território, onde
iria participar num seminário sobre liberdade de expressão e de
imprensa. É possível, no entanto, que antes deste tenha exisitido
um outro templo para prestar serviço religioso à comunidade
muçulmana, que desde cedo se fixou nesta cidade integrada na Rota
da Seda. O actual dispõe de uma entrada comprida com jardins e
várias construções. O templo propriamente dito está construído
no estilo das construções chinesas e não no estilo tradicional
muçulmano, não dispondo de cúpula e minaretes. Porém, a decoração
é muçulmana.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">À
hora em que por lá andávamos, os fiéis eram convocados para a
oração por meio de aparelhagem sonora, naquele estilo de cantoria
monótona.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Percorremos
depois o exótico bairro muçulmano, muito concorrido, com uma
imensidade de lojas e barracas e uma grande variedade de comidas, que
enchiam o ambiente de desencontrados odores. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Após
o jantar, fora do hotel, em local previamente combinado, saímos para
uma visita nocturna à cidade, em autocarro, acompanhados pela guia,
que jantou connosco. Por força, queria trazer-nos para esta visita,
tendo-se fartado de elogiar o encanto da cidade à noite, com o
espectáculo das suas luzes. E, de facto, o cenário é magnífico.
Fizemos várias paragens pelo caminho para admirarmos o efeito
cromático das luzes, em que se distinguiam cores variegadas
combinando-se em fantásticas composições, em particular numa zona
ribeirinha dominada por uma elevação, com os prédios e a vegetação
em cascata. Também no centro, numa das principais praças, onde
avultavam vários edifícios nobres, com trechos da muralha a
surdirem por entre as luzes, havia espectáculos de luminotecnia e
animação com bonecos, movendo-se num bailado nas varandas de um
desses edifícios, ao som de música ambiente. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Esta
animação prosseguia por outros sítios. Transportados para outro
local, fomos dar a um centro com variadas ruas, uma delas muito
comprida, pedonal, uma espécie de rua mágica (acho que era
designada mesmo assim), cheia de iluminações de variada coloração
e composição. Numerosas pessoas passeavam por ali, em grupo,
descontraídamente, ao som de música ambiente. Havia uma parte da
rua onde actuavam grupos musicais de jovens, que tocavam uma música
mais frenética e mais consonante com as novas modas. Passeámos
longamente por ali, antes de recolhermos ao autocarro, para
regressarmos ao hotel. Perguntei à guia se aquele ambiente festivo
se devia a alguma comemoração (estava-se em Outubro, em que é
tradicional celebrar-se durante o mês o aniversário da revolução
socialista) ou se era habitual. Ela respondeu que era sempre assim.
Caso para estranhar.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
mais importante, porém, estava para vir: a visita ao museu que
guarda os célebres guerreiros de terracota. Foi para essa visita,
fundamentalmente, que Xian foi incluída no roteiro da China. Logo de
manhã cedo foi para lá que nos dirigimos.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Que
espectáculo mais fora do comum! Não há ninguém que, em face do
que lhe é exposto, não fique boquiaberto. Trata-se, efectivamente,
de um local imperdível, ao menos para quem vai à China. Ir lá de
visita e não se deslocar a Xian é como ir à Índia e privar-se de
ver o Taj Mahal. Multidões de turistas circundam demoradamente este
recinto, debruçando-se sobre a balaustrada de ferro que lhe serve de
resguardo e disparando as suas máquinas fotográficas. Abaixo do
solo, alinhadas em trincheiras escavadas na terra, milhares de
figuras em terracota compõem um exército completo, com soldados,
generais, carros de combate e cavalos. Tudo em tamanho natural. As
duas trincheiras da direita estão repletas de soldados e carros de
combate com cavalos, uma delas com maior número de figuras (cerca
de 6.000), ao passo que a outra tem cerca de 1.300; a terceira, com
menor número de figuras (umas dezenas) , está ocupada apenas por
oficiais de várias patentes e um carro de combate puxado por quatro
cavalos. As armas - arcos, lanças e espadas de bronze – eram reais
e terão sido utilizadas na guerra. Uma coisa espantosa é o realismo
e o detalhe com que estas figuras, do século III a.C., foram
concebidas: as figuras humanas, os animais, os carros de combate,
assim como as indumentárias e os apetrechos. E mais curioso ainda: a
individualidade de cada figura, como se cada uma delas representasse
um estilo e uma personalidade própria.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Esta
fantástica armada de terracota será um monumento funerário,
formando provavelmente um conjunto com outros objectos que foram
encontrados junto do mausoléu do primeiro imperador da China – Qin
Shihuang – situado ali perto, e carecendo ainda de uma cabal ou,
pelo menos, mais completa explicitação da sua simbologia. O
conjunto, que representaria o exército e a guarda de honra do
referido imperador, velando-o poderosamente na outra vida ou dando
continuidade à sua missão guerreira, pois que os soldados estão em
posição de combate, foi descoberto em 1974 por camponeses, quando
procediam à perfuração de uma parede que estava soterrada. Desde
então para cá, tem-se desenvolvido um intenso trabalho arqueológico
de desenterramento das figuras (visto que terão sido originalment
enterradas) e de restauro das mesmas, o que obriga a mil cuidados, um
restauro que não é integral, pelo menos no que se refere à pintura
das esculturas, que em algumas figuras expostas é evidenciada por
alguns vestígios que permaneceram ao longo do tempo. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Por
conseguinte, este museu singular é o próprio local arqueológico
onde têm sido desenterradas e recuperadas as figuras.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">O
resto do tempo até ao almoço foi preenchido com a visita a uma
oficina de terracota e de móveis pintados e com incrustações em
jade e madrepérola. Uma oportunidade, evidentemente, para as compras
turísticas, pese embora o facto de a visita ter realmente interesse
pela qualidade e beleza de muitos objectos expostos.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Após
o almoço num restaurante situado no mesmo edifício, marchámos para
o aeroporto, onde, após as demoradas formalidades, apanhámos o
avião para Shangai. Duas horas e meia de viagem, entre as 18,00h e
as 20,30h. À nossa espera, lá estava o guia, um patusco gordinho e baixote, com curso
superior de português. Durante a viagem, expendeu longamente o seu
gosto pela nossa língua e cultura e deu mostras da sua erudição
citando Camões e alguns autores mais. E não só pela nossa língua
e cultura, mas também pela religião tradicional do nosso país,
confessando-se católico, apostólico, romano, menino de coro e
defensor da vertente mais conservadora da Igreja, incluindo a missa
em latim.</span></div>
<style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; line-height: 115%; background: transparent }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-48905894782281413152020-03-09T23:58:00.000+00:002020-03-09T23:58:00.331+00:00China III
<br />
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Transposta
a majestosa Porta Meridional, cá estamos na Cidade Proibida. Um
ampla esplanada ou praça é atravessada pela Ribeira Dourada,
cavalgada por cinco pontes em mármore, ricamente decoradas com
esculturas. É uma ribeira cujo nome é auspicioso; ao contrário
dos rios que levavam ao Inferno, com nomes escuros como Letes,
Estige, Aqueronte, etc., esta ribeira, uma vez atravessada,
conduz-nos ao fabuloso conjunto de galerias e palácios imperiais com
denominações evocadoras de um mundo harmonioso e perfeito, que se
devia parecer com o Olimpo. Uma cidade dentro da cidade, celestial,
que o não seria tanto para a multidão de serventuários, ocupando
uma extensão vastíssima, que assim o exigia a magnificência da
corte imperial. Rezam as crónicas que mais de um milhão de metros
quadrados, comportando cerca de 800 edifícios e 9.000 aposentos.
Este conjunto de imóveis, que foi declarado pela UNESCO como
Património Mundial da Humanidade, constitui um belo e singular
acervo da arquitectura palaciana chinesa. Escapou por pouco à fúria
arrasadora da Revolução Cultural.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Os
diversos pavilhões e palácios que se sucedem uns a seguir aos
outros dispõem-se ao centro, ao longo de um eixo, que divide
simetricamente a cidade em duas (aos lados, Este e Oeste, outros
palácios menos importantes se perfilam).</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">O
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Pavilhão da Harmonia
Suprema</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> é o primeiro
que se nos depara, transposta a grandiosa porta do mesmo nome,
flanqueada por dois enormes dragões em bronze. No vasto recinto que
o antecede, onde, pelos vistos, havia lugar para 100.000 pessoas,
decorriam as cerimónias importantes, como a coroação, os
casamentos imperiais, as celebrações do Ano Novo, etc. O imperador
era transportado numa liteira e colocado no seu luxuoso trono,
designado por </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Trono do
Dragão</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, ao centro do
pavilhão, em face do público. Tal o espectáculo que era necessário
montar para que o poder aparecesse em todo o seu esplendor. Dezoito
queimadores de incenso, em bronze, simbolizando as dezoito províncias
da China, ardiam no último dos três escalonados terraços, ornados
de ricas balaustradas de mármore, que ascendiam até à entrada onde
estava o trono. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">A
parte da frente do recinto era ocupada pelos funcionários (cerca de
9.000, segundo diz o guia Zhao </span><span style="color: black;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span lang="pt-PT">Naipu
pelo </span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>walkie
talkie</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span lang="pt-PT">;
segundo o guia em forma de livro</span></span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">
escrito em inglês que tenho comigo, o pessoal tinha que saudar o
imperador curvando a cabeça até ao solo, por nove vezes). As
bancadas laterais eram destinadas aos músicos, tangendo os seus
instrumentos. </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Há
uma enorme massa de turistas vagueando por aqui, subindo ao terraço
e rondando o pavilhão. Acotovelam-se junto do sítio onde o
imperador aparecia no seu trono. Parece que o trono está lá, mas eu
não o vi. Não tive paciência para tolerar aquelas cabeças
apinhadas, espreitar por cima delas e fazer a ginástica que toda a
gente fazia de levantar os braços com a máquina em punho e tirar
uma foto. Aliás, para a maior parte dos turistas, incluindo os do
grupo onde me integro, o importante parece ser dar ao gatilho da
máquina e disparar. Atingir o alvo. Alguns, mal acabam de entrar num
determinado local, já estão a metralhar, antes mesmo de se
aperceberem da realidade do objecto ou do sítio. Pior: a sua
voracidade de imagens, a sua azáfama de caça vai ao ponto de nem
sequer escutarem o que diz o guia, tolhendo a vida a quem quer
prestar atenção. Também fui um pouco apanhado por esse vício, mas
não me deixei possuir de todo e algumas vezes resisti. Como desta
vez em relação ao trono do imperador. Por causa dele e da mania da
fotografia, uma professora de inglês na reforma perdeu-se do grupo.
Foi necessário os dois guias – a portuguesa e o chinês – irem
no seu encalço, agitando a bandeirinha portuguesa, porque pelo
telemóvel não se conseguiu falar com ela, fosse por causa do
barulho, fosse por outra razão. Felizmente, com a sua experiência
de viagens, deixou-se ficar onde estava e, daí a pouco, regressava
ao nosso seio, gingando o corpo nas pernas trôpegas, que todavia não
a tolhiam de acompanhar o grupo, mesmo quando era preciso andar mais
depressa. Era uma mulher afável, de olhos azuis, viúva de um
advogado que falecera vitimado por um cancro do pulmão, devido ao
abuso do tabaco, e por quem os olhos dela se lhe aguavam, quando
falava dele.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Assim
se passou ao </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Pavilhão
da Harmonia Central</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">,
ou do </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Meio</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">,
ou ainda, creio, </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Pavilhão
da Harmonia Perfeita</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
(os dois primeiros são designações que encontro nos guias
impressos; o último foi o que recolhi no meu caderno de
apontamentos, a partir do que o guia Zhao Naipu nos ia transmitindo).
</span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Este
era o local onde o imperador recebia cumprimentos ou vassalagem dos
seus funcionários mais próximos, e dava os últimos retoques antes
de passar ao Pavilhão da Harmonia Suprema, onde decorriam, como
vimos, as cerimónias oficiais. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">O
terceiro Pavilhão que vem a seguir tem a designação de </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Pavilhão
da Harmonia Preservada</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">.
Era o local dos banquetes imperiais, onde, de facto, conviria
preservar alguma harmonia.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Este
conjunto de edifícios enquadrava-se no chamado </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Pátio
Exterior </i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">e era
destinado às representações do poder, exteriorizado por
cerimoniais, fausto e grandiosidade e pela criação de uma atmosfera
de transcendência, em que o imperador aparecia revestido de uma
espécie de magnificência celeste. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Para
além desse Pátio Exterior, seguindo a ordem da sucessão de
edifícios que se nos depara após a entrada pela Porta Meridional
ou Porta Tiananmen, mas inversa à disposição construtiva, que é
Norte/Sul, fica o Pátio Interior, um espaço exclusivamente
reservado ao imperador e demais membros da sua corte e onde era
proibida a entrada de qualquer estranho, sob pena de execução
sumária. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Esta
face interior era formada por três palácios: o </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Palácio
da Pureza Celestial</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, o
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Palácio da União
entre o Céu e a Terra</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
e o </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Palácio da
Tranquilidade Terrena</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">.
Nomes que, só por si, dizem muito da concepção da vida imperial e
da ancestral cultura chinesa. Rezam as crónicas que era no último
dos palácios citados que as imperatrizes viviam e dormiam e, além
disso, era lá que era passada a noite de núpcias. As outras noites
ficariam à discrição dos imperadores, segundo penso, pois tinham à
sua disposição uma gama variável, mas no geral muito diversificada
e vasta de concubinas, que viviam em palácios próprios, situados na
área imperial. Através das vidraças das janelas, os turistas
curiosos tentam imaginar como seria o seu dia-a-dia, coscuvilhando
móveis, utensílios vários e objectos de adorno, que se divisam no
interior. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Por
trás destes palácios, ou seja, a seguir a eles, segundo a
orientação que vamos seguindo, situa-se o </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Jardim
Imperial</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, um belo e
aprazível espaço que é um modelo da arquitectura paisagística
chinesa. Pequenos recantos, montículos arrelvados e variadas
espécies arbóreas, onde se distinguem velhos pinheiros, bambus,
ciprestes. Entre o arvoredo, outras construções com nomes
igualmente magnânimos, como o </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Pavilhão
da Paz Imperial</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">. Num
destes edifícios, se bem escutei Zhao Naipu, foi que o último
imperador, o protagonista do filme de Bertolucci, fez a sua
aprendizagem escolar.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">E
assim vamos fruindo o espaço neste dia de sol, imaginando as
delícias de um piquenique em qualquer destes recantos, enquanto nos
vamos encaminhando para a porta de saída, situada do lado Norte.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Após
o repasto chinês num restaurante de Pequim e um cafèzinho expresso
tomado numa cafetaria ao lado, da cadeia </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Starbucks</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">,
que é uma multinacional (já o vimos noutras partes do planeta,
nomeadamente na Índia, no Dubai e em Manhattan), pois os
restaurantes chineses apenas servem chá, de ordinário durante a
refeição, já vamos de largada para outra visita. Desta feita, o
alvo da nossa viagem é o célebre </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Templo
do Céu. </i></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Mal
descemos do autocarro num largo situado na vizinhança,
deparou-se-nos, no cimo de uma elevação, um curioso monumento, que
tenho a impressão que se avista de muitas partes da cidade, dada a
sua localização altaneira. A área circundante é um amplo espaço
de lazer com esplanadas arborizadas e mesas para piquenique. Muitos
chineses por aqui passeiam e se divertem, com destaque para os
reformados (homens e mulheres), que, em grande número, sentados em
bancadas e muros baixos, pincipalmente a todo o comprimento de um
</span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Longo Corredor</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">,
semelhante ao que já encontrámos no Palácio de Verão, se dedicam
ao jogo de cartas com entusiasmo e e grande arruído. Pelos vistos,
segundo informação do guia, que interpelei, é um jogo muito comum
na China e o principal divertimento dos reformados (a reforma é aos
60 anos), depois da obrigação de cuidarem dos netos. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
“<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Dos
netos?”, reagi espantado. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
“<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Sim,
reafirmou ele.” </span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
“<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Então
não são as creches?, os infantários? Não é o Estado que se
encarrega obrigatoriamente da ocupação e educação das crianças?”
</span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
“<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Não
é obrigatório que as crianças vão para as creches e os
infantários. Depende da vontade dos pais, respondeu”.</span></span></span></div>
<div align="justify" style="font-style: normal; line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Este
é mais um exemplo da viragem da China. É claro que não se tratará
apenas de uma maior liberdade educativa em benefício dos parentes da
criança e da consequente abdicação, por parte do Estado, do
monopólio da educação e ensino a todos os níveis, mas também (e
principalmente?), da libertação estadual do correspondente ónus
financeiro.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Mas
retornemos ao </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Templo
do Céu</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">,
que se avista mesmo na nossa frente, como estava dizendo. O monumento
que ressalta na sua beleza invulgar é o principal de três templos
taoístas. O taoísmo é uma religião</span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">
baseada em grane medida nos ensinamentos e na filosofia de Lao Tse,
um poeta que viveu no século VI a.C. a quem é atribuído o livro de
poemas </span></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span lang="pt-PT"><i>Tao
Te King</i></span></span></span><span style="color: black;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span lang="pt-PT"><span style="font-style: normal;">,
que significa “livro da Via e da Virtude”, </span></span></span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">um
livro que, sob muitos aspectos, é admirável pelo esforço que faz
na conciliação dos contrários, na exaltação do fraco em vez do
forte, da suavidade em vez da rudeza, do simples em vez do complexo,
do humilde em vez do poderoso, como via ou o caminho para atingir a
perfeição, a paz e a tranquilidade, a sublimidade celestial, mas
que também é descoroçoante no exaltar a quietação, a inacção,
por vezes até a ignorância e o nada [“Rejeita a sabedoria e o
conhecimento,/o povo tirará assim cem vezes mais proveito” (…) e
noutro poema: “Quem pouco sabe terá o conhecimento seguro, Quem
muito sabe ficará na dúvida (…)”], (</span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Tao
Te King</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">,
Editorial Estampa, 2ª edição, 1977)</span></span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Uma
escadaria majestosa em três lanços, com uma tríplice balaustrada
em mármore, conduz ao principal dos templos a que me vinha
referindo. Tem uma forma cónica e está coberto por um triplo tecto,
cujos círculos se vão estreitando para cima e terminando por um
pináculo com uma bola dourada. Telhas de um azul purpúreo cobrem o
triplo tecto, conferindo-lhe um aspecto gracioso. Estamos em face da
denominada </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Sala
da Oração pelas Boas Colheitas</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">.
Era aqui que o imperador vinha rezar, todos os anos, pelas boas
colheitas, no início da Primavera, e pelos frutos e cereais obtidos,
no Outono. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">O
espaço em redor é um vasto círculo, de chão marmóreo, cercado
pela referida balaustrada, interrompida no cimo pelos vários lanços
de escadas correspondentes aos vários acessos que conduzem ao
recinto – Norte, Sul, Este e Oeste. O que foi utilizado por nós
leva directamente à Sala de Oração pelas Boas Colheitas.</span></span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">Os
outros templos situados na área são a </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Abóbada
Celestial Imperial</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">
e o </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Altar
Circular, </i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">ligado
por um arruamento empedrado</span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>
à Sala da Oração pelas Boas Colheitas</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">.
O primeiro apresenta uma construção similar à deste último
templo, embora de dimensão mais reduzida e tem como curiosidade o
muro que o cerca, conhecido pelo </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Muro
do Eco</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">,
por permitir que uma voz emitida em qualquer parte dele seja ouvida
no lado oposto ou em qualquer outro ponto. O </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Altar
Circular</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">
dispõe de uma simbologia especial à volta do número 9 e seus
múltiplos (9, 27, 81), patente no número de degraus da escadaria
que lhe dá acesso, na balaustrada e na decoração interior. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">É
curioso constatar que a simbologia do número 9 e seus múltiplos
está ligada ao sagrado de várias religiões e ao ritual de certas
práticas iniciáticas, bem como transparece no simbolismo de certas
obras de arte, das quais </span></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>A
Divina Comédia</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-style: normal;">
de Dante é um exemplo flagrante. Nove é o número de círrculos
infernais; nove é um múltiplo de 3, sendo que o poema de Dante está
construído em tercetos. </span></span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Do
Templo do Céu partimos para outro local de Pequim, para um teatro,
onde assistimos a um espectáculo teatral de Kung Fu. Contava a
história de uma criança entregue aos cuidados de um monge de Kung
Fu, o qual, através de ilustrações e exercícios próprios desta
arte marcial, de uma incrível destreza e acrobática
espectacularidade, ia ministrando ensinamentos sobre o domínio do
corpo e da mente, sobre a arte de vencer resistências e
dificuldades e de se superar a si próprio, expondo toda uma
filosofia de vida. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Dali
fomos para o jantar, num restaurante situado numa das grandes
avenidas de Pequim. O jantar foi constituído por, entre outras
coisas, porque a comida chinesa consta de uma variedade de pratos,
como é sabido, pato à pequinense. Munidos de branquíssimos e
brunidos aventais e armados de facas afiadíssimas, lá estavam dois
empregados cortando aplicadamente as aves já cozinhadas em pequenas
lascas, como é de uso na comida chinesa, por causa da não
utilização da faca e do garfo. Faziam-no de forma extremamente
metódica e expondo-se ostensivamente à curiosidade dos turistas,
que, como é de prever, disparavam as suas máquinas fotográficas e
telemóveis com grande voracidade gastronómica.</span></span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">O
mais curioso é este facto que nos foi contado pelo guia e que causa
consternação: os patos, enquanto vivos, são submetidos a uma
alimentação especial para crescerem rapidamente e para perderem a
gordura que vão acumulando, são metidos em capoeiras alongadas com
o chão forrado de tijolos aquecidos por meio de um qualquer sistema
térmico, de forma a obrigarem os pobres animais a moverem-se
constantemente de um lado para o outro. Cruel, não? E de sinistra
imaginação glutona. </span></span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br />
</div>
<div style="line-height: 100%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<style type="text/css">
p { margin-bottom: 0.25cm; line-height: 115%; background: transparent }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-64036645555523741482020-01-29T19:18:00.001+00:002020-01-29T19:18:10.768+00:00China II
<br />
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Manhã
cedo, bafejados por um sol outonal, vamos a caminho de um dos locais
de Pequim mais vibrantes de expectativa no imaginário do forasteiro
– a Praça Tiananmen, através da qual se acede à Cidade Proibida.
Por avenidas já pejadas de carros, o guia vai dissertando sobre
costumes antigos e factos da história chinesa, aproveitando a
lentidão do trânsito. Entre outras coisas sobre as quais divaga de
uma forma minuciosa, como o calendário tradicional chinês e
práticas rurais ancestrais, alude ao Palácio Imperial, na Cidade
Proibida, construído na dinastia Ming (1406-1420), após ter sido
derrubado o domínio Mongol, que se havia iniciado por meio de
conquistas paulatinas, onde pontificara o célebre Genghis Khan, e
fora ultimado pelo seu neto Kublis Khan, que inaugurou a dinastia
Yuan.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">De
1420 a 1911, sucederam-se 11 imperadores chineses e duas dinastias –
a Ming e a Qin. Em 1911, a dinastia Qin foi destronada pelo movimento
nacionalista que estabeleceu a República da China, cujo primeiro
presidente foi Sun Yat Sen, figura cimeira daquele movimento e
fundador do Kuomitang. Teve aí origem a China moderna; não só o
regime imperial foi desmantelado e substituído pela República, como
tiveram fim muitas práticas sociais que ostentavam marcas de
servidão. Por exemplo, o costume de enfaixar os pés das mulheres
desde tenra idade, uma prática que sacrificava a comodidade do
andar, a saúde e a higiene femininas a um ideal de beleza e
submissão - o andar saltitante, aliado a graça e fragilidade das
mulheres, despertando nos homens impulsos protectores (veja-se o
retrato horrível que nos dá Jung Chang da sua avó e dos tormentos
que sofria por causa dessa prática em </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i><span style="font-weight: normal;">Cisnes
Selvagens</span></i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, 14.ª
edição, Quetzal editores, p. 26). </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Outra
prática ou instituição que foi abolida e a que o guia faz uma
mais demorada referência foi a dos eunucos. Normalmente estes homens
castrados, que estavam ao serviço do imperador, provinham de meios
pobres. Os pais escolhiam um dos filhos para eunuco, encontrando aí
uma forma de promoção social e de sustento desse membro da
família; era uma boca que deixava de ser alimentada pela família e
passava para a mesa farta do palácio imperial. Muitos dos eunucos
estavam muito próximos do imperador; eram guardas das esposas e
concubinas e desempenhavam outros serviços</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">n</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
de intimidade ou proximidade imperial. Daí possivelmente uma das
razões para a castração. A oportunidade para a escolha desse modo
de vida surgia entre os nove e os quinze anos. O candidato tinha que
se submeter a uma operação para lhe serem removidos os órgãos
genitais e havia grande percentagem de mortos. </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Tinham
dificuldade em urinar e, por vezes, o cheiro nos sítios onde dormiam
era nauseabundo.</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Entretanto,
chegámos à muito aguardada Praça Tiananmen. Aí estava ela, na
manhã ensolarada, a regurgitar de turistas. Levas e levas de
turistas, circulando disciplinadamente, sob o olhar atento e o
acicate dos agentes de polícia, que espevitavam constantemente o
andamento dos passeantes, a fim de evitarem demoras e
engarrafamentos. Ali não se queriam basbaques. Era sempre a andar e
a ver os monumentos </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">situados
nas partes laterais</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> de
pescoço torcido. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">O
guia já lá vai à frente, erguendo a bandeira portuguesa no meio de
dezenas de bandeiras de outras nacionalidades, incluindo a
inconfundível bandeira da China (vermelha com uma estrela rodeada de
quatro outras mais pequenas, todas amarelas, colocadas no canto
superior esquerdo); o grupo vai-se fragmentando, por efeito de
ligeiros atrasos de um ou outro membro que se demora a contemplar
este ou aquele </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">monumento</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
ou que aproveita para sacar uma foto, ou ainda por se ter enleado em
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">desfiles </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">de
outros grupos que cruzam o mesmo espaço e forcejam por passar
adiante, arremetendo contra quem passa, e o retardatário, sempre com
o olho fito na bandeira verde-rubra, lá vai estugando o passo para
reenfileirar no grupo. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Grande
espaço este, de quase um quilómetro de comprimento (880 metros) e
passante de meio quilómetro de largura (550 metros), repleto de
pessoas em movimento, orientando-se em várias direcções,
acentuando no turista que vai integrado num grupo o sentimento de
confusão e receio de se perder.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Lá
na frente, o guia, através do </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>walkie
talkie</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, vai referindo
os monumentos que se vão perfilando à nossa esquerda e à nossa
direita (Leste e Oeste), considerando que entrámos pelo lado Sul,
onde se encontra a Torre Quiánmen e uma das portas mais antigas de
entrada no recinto, outrora amuralhado, do tempo da dinastia Ming.
Vamos, pois, em direcção ao Norte e lá está o mausoléu de Mao
Tse Tung, um monumento situado no centro da praça, para o qual se
encaminha uma interminável fila de turistas, de várias centenas de
metros, facto só por si desencorajador de uma visita, se outras
razões não houvesse para darmos ao desprezo a contemplação da
múmia. O que lá está é a carcaça de um homem extinto empalhada
por dentro. Ao diabo esta divinização estalinista dos chamados
heróis do povo! À frente da mastaba, lá está o monumento aos
Heróis do Povo, que mal se enxerga do sítio por onde vamos andando,
e onde, segundo informa o guia, se pode ler a inscrição </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Os
Heróis do Povo são imortais</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">.
Nem sempre. Às vezes, o povo também acaba por os derrubar do
plinto onde os altearam. Qual </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>glória
eterna</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, qual carapuça!
Aí está também a Assembleia Popular </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Segue-se
o Museu Nacional da China, do lado direito da praça, considerando o
sentido em que vamos e, lá ao fundo, depois de caminhada intensa, a
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Porta da Paz Celestial</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">,
onde finalmente repousamos. É ela que nos dá acesso ao paraíso, à
cidade dos eleitos ou à </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Cidade
Proibida.</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> Proibida,
justamente porque não tinham direito de nela entrar as pessoas que
não pertenciam à corte do Imperador. Foi da Porta da Paz Celestial
que Mao Tse Tung proclamou a República Popular da China em 1 de
Outubro de 1949. O seu retrato lá está, bem ostensivo, no centro do
muro, por baixo do balcão onde teve lugar a referida proclamação. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Esta
foi uma das grandes efemérides da história da China moderna que se
desenrolou nesta grande praça. Uma outra mais recente acode, de
certeza, à memória de qualquer turista minimamente informado: o
massacre de 4 de Junho de 1989. Tanques e camiões do Exército
invadiram a praça ocupada por várias dezenas de milhar de
estudantes, operários e intelectuais, que se vinham manifestando
pacificamente, sob a liderança dos primeiros, em vários locais de
Pequim, exigindo mais democracia e a instauração de um regime que
respeitasse os direitos fundamentais acolhidos pela Declaração
Universal dos Direitos do Homem. Pois foram massacrados sem dó nem
piedade, durante a noite, nesta praça onde as luzes foram apagadas,
e trucidados pelas lagartas dos tanques, que rolaram por cima deles
com total indiferença, e alvejados pelas metralhadoras. Morreram
muitos, na ordem dos milhares, sem que nunca se soubesse o número
exacto. Mortos pelo Exército da República Popular da China,
exactamente quarenta anos passados sobre a proclamação de 1 de
Outubro, que anunciou a libertação do povo chinês. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Imaginar
o que seria o pandemónio e o terror dessa noite, com pessoas a
fugirem desorientadas à aproximação inexorável dos tanques,
esbarrando-se umas nas outras, gritando espavoridas, ficando umas
esmagadas e outras caídas no recinto, é tarefa quase impossível no
meio da multidão de turistas que cruza este espaço em rebanhos que
seguem atrás das bandeirinhas dos guias. Por sinal, o timoneiro que
comandava os destinos do povo chinês, nessa altura, era Deng
Xiaoping, um veterano comunista em projecção após a morte de Mao
que decisivamente contribuiu para pôr fim às atrocidades da
Revolução Cultural, ele próprio uma grande vítima dela, bem como
membros da sua família. A ele se devem as reformas profundas que
inauguraram na China um novo período (“uma segunda revolução”,
como lhe chamou), instaurando a designada “economia de mercado
socialista” e abrindo o país às relações internacionais (foi o
primeiro presidente a visitar os Estados Unidos). O impulso
reformista (outros chamar-lhe-ão revisionista) não lhe tolheu,
todavia, o velho reflexo comunista ou estalinista de reprimir
duramente qualquer manifestação cívica e política favorável aos
mais elementares direitos democráticos.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Jung
Chang, no livro já citado </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Cisnes
Selvagens</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">, que se lê
como um romance e que é, simultaneamente, biografia de uma família,
atravessando várias gerações, autobiografia e história da China
contemporânea, diz que nem queria acreditar que o político que pôs
fim ao caos e à violência indiscriminada da Revolução Cultural,
que permitiu a reabilitação definitiva dos seus pais, militantes
comunistas desde a juventude, na década de 40, e </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">a
s</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">aída </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">dela
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">da China, beneficiando de
uma bolsa de estudos, </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">por
ter sido a melhor </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">aluna </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">em</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
inglês na </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">licenciatura</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">,
para estudar numa universidade inglesa, foi o responsável por
aquele horrível massacre. “Teria aquilo verdadeiramente sido
ordenado pelo mesmo homem que aos meus olhos e aos de tantos outros
aparecera como um libertador?” (p. 516).</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">É
assim: o medo de perder o pé no poder leva, por vezes, aos actos
mais insanos. Abertura sim, mas sem destapar completamente a panela,
não vá a pressão que salta para fora tornar-se incon</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">trolável
e levar tudo na frente, como sucedeu com Gorbachov.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Não
sei se era nisto que pensavam os meus ocasionais companheiros de
viagem, </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">quando
atravessávamos a Praça Tiananmen</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">.
Sei é que, chegados ao fundo, junto ao retrato de Mao Tse Tung, o
guia </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">(em que pensaria ele,
que não referiu nada disto que escrevo?) </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">propôs
que se tirasse uma fotografia em grupo, sob a imagem tutelar do
antigo timoneiro. O fotógrafo, evidentemente, já lá estava.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br />
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br />
</div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-2471334360609190462020-01-14T12:08:00.002+00:002020-01-14T12:08:54.177+00:00A sombra que perpassa sobre o mundo actual
<br />
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-size: medium;">Um dos aspectos mais chocantes
do assassinato do general iraniano Qasem Soleimani mandado executar
por Trump é a motivação que parece estar-lhe subjacente: o
objectivo de desviar as atenções do processo de <i>imp</i><i>ea</i><i>chment</i>
que presentemente está suspenso, antes de ser presente ao Senado
para julgamento, aguardando a possibilidade de se produzirem
testemunhos do pessoal da Casa Branca sabedor dos factos que
desencadearam a investigação e que o próprio Trump interditou de
depor, e a aproximação de eleições presidenciais, a realizarem-se
no mês de Novembro, que o actual presidente pretende disputar, com
vista a um segundo mandato. Foi, aliás, a pensar nelas que Trump se
envolveu nos factos, inquestionavelmente condenáveis e
suficientemente gravosos para merecerem uma destituição do cargo,
que deram origem ao processo. Note-se que um dos desabafos do
presidente logo a seguir ao assassinato, foi o de censurar a atitude
daqueles congressistas (os democratas, evidentemente) que
impulsionaram e pretendem prosseguir com o processo de <i>imp</i><i>ea</i><i>chment</i>:
« Vejam bem», disse mais ou menos, «andam a discutir no Congresso
uma coisa tão ridícula, e eu a braços com tão magno problema!». </span>
</div>
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-size: medium;">Portanto, trata-se de uma
reiteração de processos condenáveis, criminosos, o relativo à
Ucrânia e este do assassinato, traduzido num verdadeiro acto de
guerra levado a cabo sem consentimento do Congresso e envolvendo, por
isso, a possibilidade de uma guerra de consequências incalculáveis,
que para já parece arredada, e, no mínimo, um agravamento das
condições explosivas que se vivem no Médio Oriente, tudo por
simples manobra calculista e profundamente egoísta – a ideia de
lançar uma nuvem sobre o processo de <i>imp</i><i>ea</i><i>chment</i>
e de obter vantagem nas próximas eleições.</span></div>
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm; text-align: justify;">
<span style="font-size: medium;">Assim está o mundo entregue à
bicharada pelas mãos de homens pusilânimes e indecorosos como
Trump e outros, à frente de nações poderosas, que se lhe equiparam
nos lances criminosos e na falta de escrúpulos.</span></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; text-align: left; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 12pt; }p.cjk { font-family: "Droid Sans Fallback"; font-size: 12pt; }p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-86878216666608233552019-12-15T12:30:00.000+00:002019-12-15T12:37:20.642+00:00Viagem à China I<br />
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br /></div>
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Visitar
a China é praticamente uma banalidade, nesta época em que o turismo
de massas devassa todos os cantos do mundo e não sabe que mais
inventar para satisfazer a curiosidade esquipática do turista mais
maluquinho de viagens. A China, por outro lado, abriu-se ao mundo,
através de uma ostensiva liberalização económica que a integra,
sem problemas, na trama das relações capitalistas mundiais,
incentivando o turismo em larga escala em moldes perfeitamente
idênticos aos do Ocidente e permitindo que os seus nacionais saiam
do país, quer em turismo, quer para fixação no estrangeiro. Por
isso, a China perdeu uma grande parte da sua aura de mistério,
sobretudo o que lhe vinha da sua singularidade dos tempos
revolucionários, que aguçava a curiosidade de muitos turistas de
querer descobri-la. Mesmo assim, a China é um país imenso do
Continente Asiático que conserva uma identidade própria, uma certa
impenetrabilidade do ponto de vista da sensibilidade do homem
ocidental e a pertença a um mundo outro que é (era) o distante e sonhado Oriente. Distância que, apesar de
tudo, é muito sensível mesmo para quem viaja de avião, nas suas 15
ou 16 horas cumpridas num daqueles acanhados espaços entre os bancos
da classe económica, pese embora o facto de a minha viagem ter sido
efectuada na excelente Companhia aérea dos Emirates em duas etapas,
com intervalo de cerca de 2 horas entre elas (Lisboa-Dubai;
Dubai-Pequim, na ida; Hong Kong-Dubai; Dubai-Lisboa, na volta).</span></span></div>
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Pequim
é uma cidade que me pareceu imensa, de grandes avenidas e prédios
ao alto, numa arquitectura que me pareceu bastante estandardizada,
mas que, nos prédios mais recentes, busca formas mais ousadas
esteticamente para fugir à vulgaridade e à uniformidade, avenidas
que sobretudo percorri de autocarro, uma que outra vez mergulhando,
quando assim calhava, em ruas mais tradicionais, de prédios baixos,
de aspecto popular, casas de traça antiga, dispostas interiormente
em quadrado, ruas mais buliçosas de pessoas deambulando,
atravancadas de veículos e pequenos comércios, as chamadas </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>hutong</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">
. Tive pena de não percorrer a pé estas e outras ruas semelhantes
que não vi, andar por certas avenidas e ter uma outra perspectiva
dos prédios, do movimento, ver as pessoas e senti-las no seu
quotidiano, mas em vez disso, vi quase sempre carros entupindo as
grandes avenidas, andando lentamente, como em qualquer grande
metrópole do Ocidente, multidões de carros de grandes marcas,
vendo-se em filas intermináveis, mesmo no dia em que cheguei, um
domingo ao fim da tarde, levando imenso tempo a percorrer a distância
do aeroporto ao hotel. Um dia perdido nas formalidades do
desembarque, no trânsito e no alojamento.</span></span>
<br />
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">O
tempo que permaneci nesta grande capital foi para ter uma imagem dos
sítios turísticos mais emblemáticos: a muralha da China, claro!,
colossal, começada a construir no século V a.C. (informação do
guia que nos acompanhou) e continuada ao longo de séculos.
Inicialmente foram várias as muralhas edificadas (sete, nas
fronteiras de vários principados, para proteger o território dos
aguerridos vizinhos, principalmente dos Hunos, posteriormente
unificadas numa única muralha com a unificação da China no tempo
da dinastia Qin, no século III a.C. Actualmente abrange oito
províncias da China nos seus seis mil quilómetros de extensão. </span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">Empinando-se pelas escarpadas encostas, é coroada por fortalezas nos
pináculos, cada cem metros, e dispõe de torres de vigia de dez em
dez quilómetros. Obra gigantesca, de quase inconcebível esforço
humano, actualmente qualificada como fazendo parte do Património
Mundial da Humanidade, nela pereceram milhares de trabalhadores ao longo de
centúrias.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">Neste
dia ensolarado, batido por um forte vento enregelante que sopra da
Mongólia, a muralha está a ingurgitar de turistas, muitos deles
autóctones. Uma lufada apanhou-me desprevenido e arrancou-me o boné
da cabeça com tal rapidez, que mo levou sem que eu o pudesse
capturar, voando pelos ares e pousando no galho de uma árvore, na
ravina. Fiquei a contemplá-lo, desolado, até que ele voltou a
desprender-se no seu voo para locais ignotos, deixando-me à mercê
das navalhadas gélidas do vento. Adeus, boné, para sempre! Com uns
anos que levas de uso na minha cabeça, transportas um pouco de mim
para ficar na China.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">A
muralha ficou para trás com o almoço num dos restaurantes locais, e
já vamos a caminho de outra preciosidade turística: o Palácio de
Verão do Imperador. Trata-se de um vasto complexo de edifícios
enquadrado pelo lago Kunming, em grande parte artificial, mas já
existente no século XII, e pela Colina da Longevidade, erguida com a
terra escavada para a construção do lago, em cujo topo se eleva um
elegante pagode budista – o </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>Pagode
da Fragrância Budista</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">,
que domina toda a paisagem em redor. </span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">O palácio, como o nome indica,
era a residência de Verão da família imperial, datando de meados
do século XVIII e dispondo de vários pavilhões: do despacho, da
residência, da imperatriz, da concubina, etc. No pátio fronteiro ao
edifício principal, encontra-se uma estátua em bronze de um
estranho animal, a fazer lembrar certos bicharocos fantasmagóricos da
Rosa Ramalho, o qual, segundo a lenda, só aparecia na Terra nos
tempos de harmonia. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">O
lago, de grandíssimas proporções, é atravessado por várias
pontes, das quais a mais grandiosa e de belo efeito cénico é a
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>Ponte dos Dezassete
Arcos</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">, destacando-se
ainda, ao longe, em relação ao complexo de edifícios, a ponte
denominada </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>Bossa de
Camelo</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">, pedonal, de um
único arco a fazer lembrar a saliência do dromedário. É ainda de
mencionar o chamado </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>Barco
de Mármore</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">, uma
construção extravagante que repousa na água do lago e que foi
restaurada sob mando da imperatriz Cixi nos finais do século XIX,
quando ali estabeleceu residência, tendo usado para o efeito vastas
somas que eram destinadas à marinha naval chinesa.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Uma
das atracções do Palácio é o chamado </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>Longo
Corredor</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"> – um
corredor enorme, de várias centenas de metros, situado no exterior.
Aberto dos lados, num sistema de colunas, sobre as quais repousa um
tecto em traves de madeira, ostenta pinturas com cenas da vida
chinesa na parte interior, recobrindo as colunas e as referidas
traves. </span></span>
</div>
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">O
espaço exterior do palácio está actualmente afectado ao uso
público como espaço de lazer, estando a navegação no lago
acessível ao público entre os meses de Abril e Outubro. Nesse
período, há carreiras de barcos para percorrer toda a sua vasta
área, podendo também fretar-se barcos de recreio, com pedais.
Aliás, nesta altura do ano da nossa viagem, havia grande animação
turística no espaço exterior do palácio, alimentada sobretudo por
turistas internos, onde se destacavam grandes grupos de jovens, com
todo o ar de fazerem parte de excursões escolares. Fora da área do
palácio, em frente à porta de entrada, estendiam-se várias tendas
de comidas, também muito concorridas, nas quais avultavam petiscos
repulsivos à sensibilidade ocidental, como pequenas espetadas de
escorpiões, insectos, morcegos, etc. - um tipo de comércio de rua
muito vulgar na China, em locais de ajuntamento de pessoas.</span></span>
<br />
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Esta etapa da viagem finalizou com uma visita ao parque olímpico, uma área soberba
de construções de grande efeito, em que domina o célebre </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>Ninho
de Pássaro</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">, o
edifício do estádio onde decorreram as imponentes cerimónias de
recepção das delegações olímpicas e de encerramento dos jogos,
transmitidos pela televisão, em 2008 (Olimpíadas de Verão). Obra
de arquitectos suíços, com a colaboração de arquitectos
chineses, tem a forma de um ninho no seu intrincado entrançado
exterior de fios de aço. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">O
guia chinês - Zhao Naipu (curso superior de línguas, com
predomínio do castelhano, aprendeu também português numa estadia
de dois anos em Moçambique; tratávamo-lo por Gustavo, que dizia ser
a tradução do seu nome em português) – atira números
mirabolantes: a construção do estádio importou em quatrocentas mil
toneladas de aço; o seu custo, em quatrocentos e oitenta milhões de
dólares; a sua capacidade estende-se a cem mil pessoas. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">De
entre as construções no enorme recinto, avulta a da piscina, um
amplo quadrado azul, iluminado na noite, onde outras luzes emprestam
ao local uma variegada paleta de cores. Referindo-se à piscina e ao
estádio em forma de ninho, o guia elucida que simbolizam,
respectivamente, a terra e o céu. Uma obra que sobretudo é um símbolo das altíssimas aspirações chinesas a destacar-se como primeira potência mundial.</span></span></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-14909373138566257472019-12-10T23:17:00.000+00:002019-12-10T23:17:49.799+00:00Reformas para a justiça
<br />
<div class="western" style="line-height: 100%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div class="western" style="line-height: 100%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Das reformas projectadas para
a justiça, concordo com algumas delas, mas outras vejo-as com
reserva, senão mesmo com desconfiança. É o caso da “delação
premiada”, ou, para empregar o eufemismo com que tentam dar outro
rosto à medida, “colaboração premiada”. Há sobretudo um
problema ético na medida que me é difícil ultrapassar. O direito
não deve socorrer-se de meios de prova que atropelam princípios
basilares da ética das relações humanas. Isto para além de a
referida medida poder conduzir com facilidade a situações de
atropelo de direitos fundamentais, de regras basilares do direito
processual e de justiça. O problema é agravado pelo facto de a tal
“colaboração premiada” poder ser forçada ou, pelo menos,
incentivada por quem investiga com promessas de benefício processual
para o arguido que denunciar outras pessoas – benefícios que podem
ser de monta, pois podem ir até à isenção de pena. A tentação
de quem investiga também não é tão secundária como pode parecer,
pois que o afã do investigador é obter êxito na investigação e,
por vezes, esse afã está acima de qualquer outro interesse. Se, de
facto, a referida “colaboração” fosse inteiramente espontânea
e da livre iniciativa de quem pretende “colaborar”, ainda vá que
não vá, mas é claro que há sempre o forte incentivo do prémio a
inquinar essa liberdade e espontaneidade.</span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Relativamente aos tribunais
especiais ou especializados, também tenho as minhas reservas. Para
já, a medida implica uma alteração do texto constitucional e isso
representa logo uma advertência. Depois, com mais um pouco de
esforço, não teremos tribunais comuns, mas só tribunais
especializados, com juízes especialistas em crimes de violência
doméstica, em crimes sexuais, em crimes contra os menores, em crimes
económicos, em crimes de corrupção e por aí fora. Tanta
especialidade somada não sei se redundará em melhor justiça.</span></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; text-align: left; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 12pt; }p.cjk { font-family: "Droid Sans Fallback"; font-size: 12pt; }p.ctl { font-family: "Droid Sans Devanagari"; font-size: 12pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-28776528340739538012019-10-16T22:29:00.001+01:002019-10-16T22:41:31.219+01:00Apontamentos sobre factos recentes<br />
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br /></div>
<br />
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">Foi
pena que a geringonça não pudesse vingar para a próxima
legislatura, apesar de os portugueses terem apreciado a forma de
governo anterior e desejarem uma continuação dessa fórmula,
segundo sondagens realizadas durante a campanha eleitoral e que os
resultados eleitorais confirmaram, pelo menos numa leitura que parece
ser racional e lógica. O BE pretendia um acordo escrito em que
algumas medidas suas fossem incorporadas no programa do governo. Os
representantes da coligação CDU proclamaram logo na noite das
eleições que não estariam dispostos a efectuar qualquer acordo
escrito, tendo Jerónimo de Sousa declarado, numa fórmula
estereotipada, apoiar todas as medidas que fossem favoráveis aos
trabalhadores e ao povo, uma coisa muito vaga, até porque não se
sabe o que são, rigorosamente, os trabalhadores, nem o que é,
rigorosamente, o povo.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">António
Costa, por seu turno, não parece estar muito preocupado, pois,
segundo declarou, está perfeitamente à vontade para governar sem
nenhum guião que envolva os outros partidos.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">Esperemos
que a orientação que fez do governo anterior um dos mais preferidos
do eleitorado possa de certo modo ser prosseguida nas suas linhas
gerais sem qualquer geringonça, mas com apoio dos partidos capazes
de a levar avante. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: "times new roman" , serif;"><span style="font-size: medium;">O
aplaudido Paulo de Macedo, um gestor de largo espectro que tem
servido a vários governos bastante diferentes uns dos outros, foi
chamado para administrar e endireitar as finanças da Caixa Geral de
Depósitos (CGD). Acontece que, nos meses que leva na sua nova
função, já produziu uma obra assinalável: encerrou agências em
numerosos locais, com destaque para certos concelhos do interior,
criando dificuldades às suas populações; fomentou a despedida de
pessoal; aumentou os encargos a suportar pelos clientes, descobrindo
novos meios de cobrar receitas; onerou as poupanças dos mais pobres
e criou privilégios para os donos de contas mais abonadas. Ora, aqui
está uma gestão eficacíssima, inteligente e mui digna de uma banca
pública. De se lhe tirar o chapéu.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Não
sou capaz de ver nos independentistas catalães, agora condenados
pelo Supremo Tribunal de Espanha a duríssimas penas de prisão, um
bando de criminosos, como tantos que enxameiam as prisões de cá e
de lá. Pedro Sanchez, o actual líder do Partido Socialista Operário
Espanhol (PSOE) disse que eles foram condenados por serem criminosos
de direito comum. Eu não quero acreditar.</span></span></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 11pt; }</style><style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 11pt; }</style></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 11pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-13978030054480851222019-10-09T23:37:00.003+01:002019-10-09T23:37:38.696+01:00Que venha uma nova geringonça
<br />
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br />
</div>
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br />
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Acho
que será evidente para todos que António Costa tentou conquistar a
maioria absoluta para ficar com as mãos livres para executar uma
política autónoma, sem depender de nenhuma outra força partidária,
uma política “sem empecilhos”, como abertamente proclamavam
outras personalidades do PS que não precisavam de se refugiar em
fórmulas equívocas e abstractas. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">A
construção governativa que resultou das eleições de 2015 e que
ficou conhecida como “geringonça”, um termo que tendo nascido
com um sentido pejorativo, acabou por ser adoptado praticamente sem
inibições por quem dela participava e mesmo acarinhado pela
generalidade das pessoas, resultou de uma conjuntura particular em
que o grosso da esquerda portuguesa sentiu a necessidade de sacudir a
política da </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>troika</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
e correr com o governo que </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">gostosamente</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
a corporizou e, em certo sentido, a ultrapassou – o governo PSD/CDS
– o governo mais à direita que Portugal teve desde o “25 de
Abril”. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Essa
construção governativa, olhada a princípio com </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">reserva
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">expecta</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">nte
pela</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> generali</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">d</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">ad</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">e</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">das pessoas </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">e
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">c</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">om
hostilidade por parte de </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">alguns
sectores da sociedade portuguesa, onde se incluíam algumas franjas
do PS, acabou mesmo por funcionar bem e com </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">agrado
de uma grande parte da população portuguesa, principalmente a que
foi mais vitimada com a política da troika e do governo anterior.
Esse facto tornou-se evidente nas eleições de domingo passado, que,
contra a pretensão de uma corrente do PS, onde estava incluído
António Costa, deram como resultado a não atribuição da maioria
absoluta a esse partido, aliás na esteira do que anunciavam as
sondagens, onde expressamente se questionava esse ponto.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">António
Costa teve que render-se a essa vontade dos eleitores, tendo
reconhecido na noite do passado domingo que a maioria dos eleitores
gostou da geringonça e era uma geringonça que voltava a querer,
pois a mesma tinha produzido boas políticas no passado. O problema
agora é a criação de condições para uma reedição da
geringonça, problema que tanto compete ao PS, como aos partidos à
sua esquerda. Algum compromisso entre algumas dessas forças
partidárias, com cedências de parte a parte, terá de haver para
que seja possível a geringonça n.º 2, </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">correspondendo
à vontade do eleitorado</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">.
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Mal era que agora não se
pudesse chegar a um entendimento, por cada qual se fechar no seu
programa ou na sua ortodoxia ou ainda n</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">a
sua contabilidade </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">partidári</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">a</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">.
António Costa tem razão quando diz que os partidos à sua esquerda,
se andaram a </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">pedir aos
eleitores para não darem a maioria absoluta ao PS, têm agora a
obrigação de não frustrarem as expectativas do eleitorado com uma
recusa ou dificultação de acordos para a constituição da referida
geringonça. E o PS, por seu turno, não pode encerrar-se na ideia de
que os outros é que têm de render-se às suas exigências, já que
lutaram pela não realização, por si, da maioria absoluta. Uns e
outros têm a mesma obrigação perante o eleitorado. </span></span>
</div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 11pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-39058959919311511872019-10-01T23:48:00.002+01:002019-10-01T23:52:05.768+01:00Tancos. Thanks.<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;"><span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">O
processo sobre o caso de Tancos veio fazer um </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>corte
epistemológico</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"> na
campanha eleitoral. Esta mudou completamente, a ponto de já ter
deixado de interessar qualquer esclarecimento a que supostamente as
campanhas se dirigem. A obsessão, agora, é Tancos, não por causa
da relevância do caso em si, mas como instrumento para outros fins
que primacialmente são eleitorais, mas que são inconfessáveis, por
força da hipocrisia e tortuosidade que lhes subjaz. Então, do ponto
de vista das oposições, a acusação do Ministério Público foi
providencial. Foi essa acusação que veio dar um alento formidável
a quem se posiciona contra o governo, sobretudo à direita, e andava
a arrastar a sua existência pelas ruas da amargura. É ver Assunção
Cristas, confundindo acusação com certeza provada. É ver Rui Rio e
o delírio que o tomou, extravasando completamente dos limites
admissíveis </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">mesmo num
contexto de luta política e</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
passando a elogiar interesseiramente a independência do Ministério
Público, quando é o político que mais o tem atacado e mais quer
intervir no seu controle. É vê-los a ambos, exigindo uma
interpelação </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">urgente </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">ao
governo na Assembleia da República, nos últimos dias da
pseudo-campanha.</span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><span style="font-size: medium;">Mas
também à esquerda do PS o caso aproveita e tem sido aproveitado,
embora com menos ardor, tendo em vista sobretudo retirar ao PS a
maioria absoluta – uma objectivo legítimo, mas que não deveria
admitir o emprego de qualquer meio.</span></span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-family: Arial, Helvetica, sans-serif;"><span style="font-size: medium;"><span style="font-family: Times New Roman, serif;">Uma
tal bomba atómica </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">pode</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">ria
ter sido evitada, tendo em vista a distorção provocada na campanha
e o dano no sistema democrático? Alguém, no PS, segundo certos
órgãos de comunicação social, fala de </span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>conspiração,
</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">mas o semanário
</span><span style="font-family: Times New Roman, serif;"><i>Expresso</i></span><span style="font-family: Times New Roman, serif;">
de sábado passado (e é, de momento, a única fonte de que disponho)
referia o termo do prazo da prisão preventiva do principal arguido
como motivação para o despoletamento, nesta altura, do caso
judicial. Sendo assim, não poderia o PS e o governo terem previsto à
distância a possibilidade de desfecho do caso em plena campanha
eleitoral, sobretudo porque o processo foi sendo arrastado ao longo
de meses e era previsível, à semelhança de outros casos, que a
acusação fosse ultimada próximo daquele prazo?</span></span></span></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 11pt; }</style><style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri", sans-serif; font-size: 11pt; }p.ctl { font-family: "Times New Roman", serif; font-size: 11pt; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-34920708631432873872019-09-29T23:17:00.000+01:002019-09-29T23:18:16.970+01:00O triunfo das vacas<div style="text-align: justify;">
Com algum atraso, por termos estado ausentes do nosso posto, publicamos o texto que se segue da autoria do celebrado escritor Jonathan Swift, por o reputarmos muito oportuno, não obstante o referido atraso motivado pela nossa ausência.</div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
<br /></div>
<div style="text-align: justify;">
</div>
<div class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<br />
<br /></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">As
vacas estão muito agradecidas ao reitor da mais vetusta universidade
do nosso país. Tanto quanto sei, mal souberam da notícia daquele
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">dignitário académico</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">,
reuniram-se </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">em manada </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">numa
pradaria onde remansosamente pastavam ao fim do dia, depois de
passada a onda de calor escaldante que tem sido o indício
preocupante das alterações climáticas a que temos vindo a
assistir, e festejaram vivamente a boa nova com mugidos
intermináveis: uuu, uuu, uuu!...</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
“<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Este
é um dia de vitória para nós”, disse a mais circunspecta das
vacas, a decana da pradaria, fremindo as narinas de satisfação.
«Vamos deixar de ser carne para bocas de humanos, ao menos nas
cantinas da mais velha universidade do país, uuu, uuu,uuu! Isto por
decisão mui esclarecida do seu magnífico reitor, com aplauso dos
seus estudantes, consoante rezam as notícias vindas a lume.» «Uuu,
uuu, uuu!”, mugiram todas aos pinotes de alegria.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
“<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Não
se trata</span> <span style="font-family: "times new roman" , serif;">de</span> <span style="font-family: "times new roman" , serif;">uma
vitória integral”, prosseguiu a decana, «uma vez que a decisão
que nos poupa à barbaridade de sermos comidas apenas concerne à
velha academia, e nem a toda ela, mas tão-só às cantinas da
estudantada. Portanto, nada de </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">grande
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">euforia. Só uma </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">certa
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">percentagem de estudantes
é que nos vai deixar de comer – os que frequentam as cantinas –
e mesmo esses nem sempre lá comem, mas também se desenfastiam de
quando em vez em restaurantes e noutros lugares de comedoria, onde
hão-de ingerir, para tirarem a barriga de misérias, a nossa carn</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">e</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">,
tão apreciada e tão arreigada nos hábitos gastronómicos dos
animais que se dizem “pessoas”. Até em cafés e
estabelecimentozecos de tapas e comidas para picar hão-de
comer-nos, quanto mais não seja sob disfarces traiçoeiros, como
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">croquetes, </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">rissóis,
pastéis de massa folhada, etc. E, quando vão de férias e </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">passam
a </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">come</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">r</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">
na casa das famílias e onde calha, também hão-de atraiçoar-nos
degustando a nossa carne. Isto para já não falar na população da
cidade dos doutores, a velha futricada, que essa não quer lá saber
de decisões dos magníficos reitores.»</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Uuuuuuuuuuuu!…»,
fizeram num gemido longo as vacas em congresso. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«De
maneira que não é tão bom como parece», prosseguiu a decana, «mas
de qualquer forma é já um triunfo que temos que agradecer ao
magnífico reitor e também, vá lá!, entoar um F-R-A em honra da
estudantada. Não é que essa gente nos queira muito, porque, se eles
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">resoveram</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">
prescindir da nossa carne, não é pelos nossos bonitos olhos, nem
por nos terem muito amor. É porque querem preservar o ambiente e a
saúde deles e a vida deles. Pelos vistos, a criação intensiva de
gado vacum para a alimentação desses animais que têm a mania que
são humanos está a dar-lhes cabo do seu futuro e também do
planeta. Portanto, o que eles no fundo querem é evitar-nos, não
prezar-nos. Precisamos de ter muita consciência disso.»</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Uuu,uuu!»,
assentiram as vacas em redor da sua mestra.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Se
fosse por prezarem o reino animal, esses velhacos não fariam
distinção entre a nossa carne e a dos outros animais. Ainda há
dias estive a conversar com o chefe de uma vara de suínos (não digo
“porcos”, porque </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">essa
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">é uma expressão racista)
e ele manifestou-me a sua raiva por a vetusta academia discriminar
dessa forma a sua espécie em relação à nossa, achando-os dignos
de serem comidos e nós não. Ou bem que eram todos iguais, ou não
havia moralidade nenhuma. </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Disse-me
o assisado chefe dos suínos que u</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">m
escritor do passado chegou a falar no triunfo dos da sua classe, mas
agora verificava que, afinal, as vacas é que pareciam triunfar, ao
menos no reino da velha academia. Seria </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">então
</span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">que alguns animais
continuavam a ser mais iguais do que outros?, perguntava ele com uma
enérgica vibração. Ora eu, sendo honesta como sou, concedo-lhe
toda a razão. Conheço de ginjeira esses gajos humanos. Todavia,
temos que ser realistas. Sem menosprezarmos os interesses de todo o
reino animal e, em especial, o dos nossos prezados suínos, temos que
agir com toda a cautela e sagacidade e, digo mesmo, </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>ma-trei-rice</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">.
Reparem que mesmo o presidente do nosso país disse que não
prescindia de nos comer de vez em quando. Portanto, </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>cau-te-la
e son-si-ce</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">, avisou
com toda a solenidade a conspícua decana. </span></span>
</div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Uu,uu,uu...»,
assentiram todas com vivos acenos de cabeça.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Em
primeiro lugar, acho que devíamos manifestar colectivamente o nosso
agradecimento ao magnífico reitor».</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Uu,
uu, uu» - concordaram todas.</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">«Depois,
devemos dirigir-nos à Academia e não regatearmos elogios a toda a
estudantada, enaltecendo o mais que pudermos o seu espírito inovador
e modernista, na linha das boas tradições da mais vetusta
universidade do país. Devemos tratá-los por ilustres doutores,
geração fixe, nata do país e esperança da humanidade. </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">E
no fim entoarmos o hino preferido deles: F-R-A… F-R-A… </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Talvez
um dia, desalojadas das pradarias, possamos circular pelas ruas da
cidade, como nas cidades indianas, e, quem sabe?, termos a honra de
participar nos cortejos académicos.»</span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Seguiu-se
grande alarido de satisfação, não só com prolongados </span><span style="font-family: "times new roman" , serif;"><i>uuuuu</i></span><span style="font-family: "times new roman" , serif;">,
mas também com pateadas no solo e marradas generalizadas com
entrechoque de chifres. </span></span></div>
<div align="justify" class="western" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0.35cm;">
<u><span style="font-size: medium;"><span style="font-family: "times new roman" , serif;">Jonathan Swift (1665-1745) </span></span></u>
</div>
<div style="text-align: justify;">
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; direction: ltr; color: rgb(0, 0, 0); line-height: 115%; text-align: left; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }p.western { font-family: "Calibri", serif; font-size: 11pt; }p.cjk { font-family: "Calibri"; font-size: 11pt; }p.ctl { font-size: 11pt; }</style></div>
Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-26294889484071309622019-09-26T19:46:00.001+01:002019-09-26T19:46:24.843+01:00A importância de um supremo tribunalUm dos anacronismos das instituições do RU (e são muitos) era a inexistência de um supremo tribunal. Na verdade, até 2009, a última instância judicial estava integrada na Câmara dos Lordes, não havendo portanto uma separação clara entre o poder judicial e o legislativo, como é imposto pelo princípio do Estado de Direito.<br />
A importância da criação do supremo tribunal, naquele ano, está agora à vista, ao ser tomada a decisão de anular a suspensão do parlamento, imposta pelo governo do Boris Johnson (a réplica britânica do Donald transatlântico). A não existir o supremo tribunal, o parlamento estaria fechado "para obras" enquanto conviesse ao governo. O supremo tribunal repôs em funcionamento o parlamento e a própria democracia, claramente lesionada pela decisão autoritária do Boris. Agora há no RU um novo ator institucional garante do princípio da separação de poderes do Estado.Eduardo Maia Costahttp://www.blogger.com/profile/14225898691764724433noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-23005713951117832272019-09-23T16:33:00.001+01:002019-09-23T16:33:40.025+01:00Telenovela mercenáriaA telenovela "Nazaré" da SIC tem uma personagem que é enfermeira. Até aqui tudo bem. Acontece que essa personagem não foi concebida e delineada pelos guionistas da novela. Essa personagem foi "comprada" pela Ordem dos Enfermeiros por 38080 €, a fim de promover a imagem dos enfermeiros na opinião pública; e mais, para "pressionar o poder político para as questões que têm envolvido a profissão" (declarações da Bastonária).<br />
Atingimos um grau máximo da manipulação da opinião pública. Agora até a ficção, a "inocente" ficção da telenovelas é objeto de compra e venda. É uma questão de preço. Vamos esperar pela "promoção" de outras profissões (dos motoristas de matérias perigosas, sei lá...). Temos que ter cuidado com as telenovelas que aí vêm. Todas as personagens "positivas" podem ter sido compradas...Eduardo Maia Costahttp://www.blogger.com/profile/14225898691764724433noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-23452000257605238272019-08-19T19:55:00.001+01:002019-08-19T19:55:55.504+01:00A rendição dos motoristas de transporte de substâncias perigosas
<br />
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">De
facto o Dr. Pardal está num dilema. Ele tinha garantido que a greve
poderia durar nem que fosse um ano, mas era previsível que ela
tivesse de acabar dentro de pouco tempo. Por um lado, o Dr. Pardal
poderia, por ele, ameaçar com uma greve <i>ad aeternum</i>, porque
nem sequer é motorista e a greve não lhe mexe directamente com a
carteira. Pode frustrar-lhe outros objectivos, mas não lhe acarreta
sacrifício directo e imediato. Para quem é motorista e aderiu à
greve é que a mesma poderia afectar seriamente o seu dia-a-dia, no
caso de ela se prolongar por muito tempo. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Por
outro lado, era previsível que a greve tivesse de terminar um dia
destes devido à grande percentagem de serviços mínimos fixada pelo
governo, que em certos casos atingiu a totalidade, ou seja 100%, e a
enorme pressão que se fez desencadear sobre os trabalhadores em
greve, quer por parte das entidades oficiais, quer por parte dos
patrões, identificados com o interesse nacional, quer ainda da
comunicação social. O isolamento desses trabalhadores era, assim,
um caminho mais do que viável e foi uma técnica empregue
persistentemente desde o início por uns e por outros, a que se
juntou, não sei se com esse objectivo ou não, o aparecimento
sistemático do representante da Fectrans na televisão, alardeando o
êxito das negociações que manteve com a entidade patronal, à
margem da greve, e servindo, pelo menos instrumentalmente, a aludida
técnica de isolamento. Os trabalhadores que agora suspenderam a
greve é que podem ter sido os maiores ludibriados e, no fim, poderão
ter ganho uma acumulação de frustração. É a paga do seu mau
comportamento, por terem ousado escapar dos controlos institucionais
conhecidos.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br />
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Temo
que o direito à greve saia desta experiência muito mais debilitado,
mesmo sem se alterar a lei em vigor. É que podem governos futuros
sentirem-se autorizados a intervirem em qualquer greve, sobretudo a
pretexto da defesa do interesse nacional, adoptando medidas que, na
prática, podem asfixiá-lo. Há indícios nesse sentido. Se um
governo PS, sustentado no hemiciclo por partidos à sua esquerda,
pôde tomar medidas geralmente consideradas “musculadas”,
imagine-se o que não poderá ser com um governo mais à direita.</span></div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-64060667515324150712019-08-16T15:40:00.000+01:002019-08-16T15:40:12.407+01:00O dilema do dr. PardalO dr. Pardal está metido num grande sarilho desde o outro sindicato "desertou" da greve. Agora está sozinho... E o problema é este: se desiste da greve, a sua carreira como "sindicalista" vai ao fundo; se continua a greve, a erosão do ânimo dos "seus" homens pode começar a galopar. Então que solução encontrou ele? Suspendeu a greve... Só que a suspensão não existe na lei; a greve ou acaba ou continua... Não há greves intermitentes, ao sabor dos caprichos dos dirigentes sindicais. Interrompida uma greve, para a retomar é preciso apresentar novo pré-aviso. Parece-me que é esta a única interpretação que a lei permite.Eduardo Maia Costahttp://www.blogger.com/profile/14225898691764724433noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-66858487096864475352019-08-14T20:10:00.000+01:002019-08-14T20:10:06.249+01:00Dr. Pardal, grande dirigente e educador da classe dos motoristasTem-se falado de um "novo sindicalismo"... Francamente, com uma personagem como esta a dirigir a greve, quem pode acreditar? Ponham um motorista verdadeiro no seu lugar e então falaremos.Eduardo Maia Costahttp://www.blogger.com/profile/14225898691764724433noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-49487988482952714452019-08-14T19:58:00.002+01:002019-08-14T19:58:59.938+01:00Plácido DomingoFoi apanhado na rede inquisitorial. Agora todo o seu passado, mesmo o mais remoto, vai ser passado a pente fino. Espera-o o pelourinho. Nada nem ninguém escapará à inquisição feminista.Eduardo Maia Costahttp://www.blogger.com/profile/14225898691764724433noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-21244702554772597732019-08-13T20:28:00.001+01:002019-08-13T23:16:29.329+01:00Algumas notas sobre a greve dos motoristas<br />
<div style="line-height: 100%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div style="line-height: 100%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Do
ponto de vista de uma visão das coisas por uma ângulo ideológico
de esquerda, não se pode deixar de notar que a greve dos motoristas
de substâncias perigosas deu origem a uma espécie de subversão
curiosa: a entidade patronal identificada com o interesse nacional e
o governo actual, que se quer de esquerda, identificado com a
entidade patronal.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
desobediência à requisição civil é um crime, como tem sido
repetido insistentemente por entidades oficiais e meios de
comunicação social. Só que tem sido acentuado quase exclusivamente
que a punição é de pena de prisão, quando isso é só meia
verdade: o crime é punido com pena de prisão ou pena de multa.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">A
greve é desaforada, inquestionavelmente impopular e até por isso
parece ter sido mal orientada, inconveniente pela forma e pelo timing
com que foi conduzida. Além disso, a luta destes trabalhadores
parece andar ao sabor dos ziguezagues e desnorteamentos de um homem
que é vice-presidente e principal porta-voz do sindicato não sendo
motorista, mas advogado e assessor jurídico do mesmo, o que não
deixa de ser um ineditismo quase surreal na história do sindicalismo
português. Porém,a luta que estes trabalhadores têm movido desde
Abril passado tem um mérito, porventura o único: o de mostrar a
enorme responsabilidade e gravidade deste trabalho, pago com um
salário-base francamente baixo e não correspondente à sua
exigência e dificuldade.</span></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<br /></div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
<span style="font-size: medium;">Não
falta por aí quem pretenda aproveitar o momento para sugerir ou
exigir uma intervenção na lei da greve. Obviamente com intuito de
limitar, dificultar ou mesmo anular o exercício desse direito. Já
se elencam sectores profissionais onde a greve deveria ser proibida.
Como se não bastassem os recursos que a lei actual já possibilita
para reduzir ao mínimo ou até anular os seus efeitos, como tem sido visível no
curso desta greve. </span>
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
</div>
<div align="justify" style="line-height: 150%; margin-bottom: 0cm;">
</div>
<style type="text/css">p { margin-bottom: 0.25cm; line-height: 115%; background: transparent none repeat scroll 0% 0%; }</style>Artur Costahttp://www.blogger.com/profile/11033324035394252339noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-18804483.post-74041691477338142352019-08-12T17:55:00.000+01:002019-08-12T17:55:59.582+01:00A luta de classes de novoSe a greve dos camionistas falhar não será por falta de apoio do "Público", que hoje desmascara frontalmente a operação de "agit-prop" (lembram-se ainda deste vocabulário?) do governo. O "Público" não se deixa enganar e elucida os seus leitores desta campanha "sem vergonha" do governo para ganhar eleições, denuncia todos os que demonizam o sindicato dos motoristas (incluindo o PCP) e todos os que se sentam à mesa dos ricos e poderosos (sic) para humilharem os pobres. Pedro Nuno Santos (será um desses?) suicidou-se como homem de esquerda, sobrevive agora como homem de direita. Derrubemos a mesa dos ricos! Viva a luta de classes!Eduardo Maia Costahttp://www.blogger.com/profile/14225898691764724433noreply@blogger.com