05 março 2008

 

Autoridade ou autoritarismo?

Parece evidente estar em curso uma ofensiva para restaurar a autoridade. Não exactamente a autoridade democrática, mas aquela autoridade que, em alguns casos, se aproxima da que os sectores mais conservadores sempre se esforçaram por colocar na ordem do dia. Isso é visível em vários sectores, de uma forma muito nítida: no sector da Educação, sobretudo com a implementação de um novo modelo de gestão das escolas, onde é acentuada a vertente autoritária; no sector da Justiça, com a criação dos tais megatribunais, em que ganha relevo a figura de um superjuiz , com funções de controle dos outros juízes, podendo, inclusive redistribuir processos, pedir inspecções ao trabalho deste ou daquele juiz, tudo isto com o risco várias vezes denunciado de subversão de princípios basilares, com assento na Constituição, como o princípio do juiz natural e o princípio da independência dos juízes; de uma forma geral, na Administração Pública, com introdução de regras ou práticas que restabelecem a antiga disciplina e hierarquia, o respeito e a obediência sem discussão, o temor reverencial, o medo de falar, o amolecimento crítico.
Essa ofensiva para restaurar a autoridade no sentido referido, encontrando, porventura, alento em certo estilo de governação do país, tem dado os seus frutos envenenados, um pouco por toda a parte e, se bem que aparecendo de uma forma aparentemente isolada, vão definindo uma atitude cada vez mais palpável e sistemática. São as atitudes de denúncia entre pares do mesmo ofício, os processos disciplinares, os afastamentos de pessoas “inconvenientes”, as atitudes de intolerância em relação às críticas, às manifestações, à liberdade de expressão e de reunião, pondo em causa direitos fundamentais. São ainda certas incursões policiais sub-reptícias, aparentemente inócuas, mas causando perturbação e perplexidade, ou aparentemente casuais, mas percebendo-se uma intencionalidade por detrás, certas formas aparentemente inocentes de inquirição, indagação, etc. e que parecem indiciar qualquer tentativa de controle e sobretudo a instauração de um clima intimidatório.
Ora, tudo isto vai de par com o lançamento do descrédito ou desprestígio de determinadas funções, seja a pretexto de privilégios, seja a pretexto de incompetência, que atingem classes profissionais inteiras, fazendo parte de uma estratégia política para mais facilmente impor os seus objectivos. Porém, isto pode ser fatal para o país. Fatal, porque é a democracia que é atingida de uma forma que pode trazer danos de difícil reparação, pois são alguns dos pilares dessa democracia que são minados, através do descrédito e desprestígio de certas classes profissionais; e fatal, porque estão de regresso velhos tiques autoritários que podem corroer o princípio de confiança nas instituições democráticas. Algumas manifestações que temos vindo a presenciar e que são organizadas de formas inéditas (através da Internet, de blogues, de telecomunicações) parecem significar justamente o clima de indignação a que se chegou.





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