28 janeiro 2012

 

Em maré de citações - II Ataque à classe média

(...) Aquilo que no discurso político se chama "ataque à classe média" corresponde à instauração de uma nova ordem que até há pouco tempo não era previsível. A expansão e universalização da lei do mercado precisou também da generalização do que começa agora a ser visto como um sobressalário, até porque a paz social era garantida através da promessa aos trabalhadores da satisfação das suas necessidades, cada vez mais amplas, quer porque o horizonte se alargava quer porque foram sendo suscitadas à medida das exigências do sistema económico. Ora, neste momento, em que a lei do mercado se estendeu ao mundo inteiro, uma nova ordem dá os seus primeiros passos, com base na convicção pragmática de que a burguesia custa demasiado caro e "vivemos acima das nossas possibilidades". Daí, a entrada em cena de uma nova regra de ação e do discurso políticos: a de que é necessário empobrecê-la, subtraí-la à sua "zona de conforto". Mas, deste modo, vem à luz uma contradição fundamental: como é possível manter o desenvolvimento capitalista ao mesmo tempo que se dá o declínio desta burguesia maioritária? Uma questão afim é a de pensar criticamente o trabalho e dar conta das suas metamorfoses, quando é a privação do trabalho e a humilhação do desemprego que estão a fazer-nos regressar a modelos de de dominação conhecidos de fases anteriores do capitalismo. Marx, que tinha enunciado como axioma da economia política que os coveiros da burguesia seriam também os coveiros do capitalismo, estava longe de prever o que já está a ser anunciado por alguns índices: que o próprio capitalismo seerá em breve o coveiro da burguesia.

António Guerreiro - Expresso - Actual n.º 2047, de 21 de Janeiro de 2012

 

Em maré de citações - I A manipulação genética

GEORGE: É muito simples, Martha, este jovem está a trabalhar num sistema para manipular os
cromossomas – bem, não é ele sozinho, provavelmente tem um ou dois cúmplices –
a estrutura genética de uma célula de esperma é alterada, reordenada… para
ordenar, na verdade, programar a cor do cabelo e dos olhos, a estatura, a
virilidade… imagino eu… a quantidade de cabelo, as feições, a saúde…a mente.
Todos os desequilíbrios serão corrigidos, eliminados… a propensão para determinadas
doenças desaparecerá, a longevidade será assegurada. Teremos uma raça de homens…
criados em tubos de ensaio… nascidos em incubadora… soberba e sublime.
(…)
GEORGE: Mas toda a gente será praticamente igual. Idênticos. Toda a gente… e tenho a certeza de que aqui não me engano… tenderá a ser igual a este jovem aqui.
(…)
GEORGE: À superfície tudo será muito bonito… muito alegre. Mas é evidente que também haverá um lado negro. Será necessário um certo número de regras… hum… para a experiência ser
bem sucedida. Um determinado número de tubos de esperma terá de ser eliminado.
(…)
GEORGE: Milhões e milhões de operações, pequenas incisões, que deixarão apenas uma pequena cicatriz debaixo do escroto (Martha ri), mas que assegurarão a esterilidade dos imperfeitos… dos feios… dos estúpidos…dos… inaptos.
(…)
GEORGE: … e assim, teremos, um dia, uma raça de homens gloriosos.
(…)
GEORGE: Haverá uma certa… perda de liberdade, imagino eu… como resultado desta experiência… mas a diversidade deixará de ser o objectivo. Culturas e raças acabarão por desaparecer… as formigas tomarão conta do mundo.

Edward Albee, QUEM TEM MEDO DE VIRGíNIA WOOLF? 1962 – actualmente em cena no Teatro Nacional de D. Maria II, com encenação da cineasta Ana Luísa Guimarães.

Comentário: E se, por acaso, essa manipulação genética não fosse para tornar os homens todos iguais, mas para produzir uma raça de homens perfeitos, superiores, destinados a mandar, ao lado de outra raça de homens imperfeitos, inferiores e destinados a obedecer e a servir?
Claro, estamos no puro domínio da ficção científica.

26 janeiro 2012

 

As "provas" do jornalismo que temos

Notícia o DN, com sabor a censura, que os tribunais absolvem (diz que "arquivam") dois terços dos processos de abuso sexual de menores (vá lá: não usaram o termo "criança") "por falta de provas" e que esses "dados" (as "provas", presume-se) são "muito valorizados pelos tribunais". Lê-se e pasma-se perante níveis tão elevados (diria mesmo: olimpicos) de estupidez e amoralidade. Portanto, segundo o solitário neurónio de quem escrevinhou a notícia, os tribunais talvez devessem deixar de valorizar as provas e condenar, mesmo sem esses incómodos "dados" que são as provas. É obra!

23 janeiro 2012

 

Inconstitucionalidades judiciais e inconstitucionalidades políticas

Hoje no "Público" Miguel Poiares Maduro faz alegações a favor da não inconstitucionalidade dos cortes dos subsídios de férias e Natal. De leitura obrigatória para o TC. É uma tomada de posição que não espanta ninguém. O que porventura é inovador é a classificação de inconstitucionalidades que ele enuncia. Citando: "... nem todas as questões que têm dimensão constitucional - e esta é uma questão com dimensão constitucional porque há uma questão de igualdade entre os cidadãos que está em causa - podem ser decididas pelo TC. Nem todo o discurso com relevância constitucional deve ser um discurso relativo à justiça constitucional. Acho que a questão é sobretudo política." Portanto temos doravante dois tipos de inconstitucionalidades: as que são susceptíveis de fiscalização pelo TC; e as outras, as "políticas". Nestas se incluem as violações do princípio da igualdade... Revogado fica o Título I da Parte IV da Constituição e todos os manuais de direito constitucional.

 

TV e serviço público

Ao proceder ao reordenamento de velhos escritos, topei com esta crónica publicada no Jornal de Notícias em 2002. Achei-a de uma flagrantee actualidade e, por isso, a publico aqui neste momento.
Serve ela também para mostrar como a questão da televisão é uma daquelas que já vem de tempos muito de trás e que a luta para pôr fim a uma determinada concepção de serviço público encontra também agora, com a tal "crise", o momento adequado para pôr tudo em "pratos limpos"


TV e serviço público

Começo por afirmar que me parecem indispensáveis dois canais para a realização do serviço público, e com isto já sei que me coloco naquela linha utópica tão metralhada pelos pragmáticos, pelos antidespesistas e pelos privatistas. Dois canais: um para um público mais vasto, em que a programação abranja o círculo mais alargado possível de telespectadores, e outro para dar expressão a interesses de carácter mais minoritário, como tem sido, embora com perda de qualidade de há uns tempos para cá, o canal 2 da RTP.
O principal argumento que se tem mobilizado contra os dois canais é o do descalabro, mas já se viu que esse argumento, aliás recorrente sempre que se quer inverter drastica-mente uma situação, só serve, no fundo, para mascarar outras intenções, nomeadamente a de liberalizar um dos canais, confundindo o saneamento económico e financeiro da empresa com a necessidade de articular um verdadeiro serviço público, que contemple todos os públicos. Este argumento anda normalmente associado com um outro — o minimalista. Já que está provada a falência do serviço público com dois canais, que se constitua ao menos um canal de serviço público, mas bem feito (Leonor Beleza à SIC Notícias). E ainda a um outro argumento (decisivo): os privados podem fazer tão bem ou melhor do que o Estado. Outros, como Pacheco Pereira, defendem mesmo a total priva-tização do serviço público.
Ora, como disse, o serviço público tem de satisfazer todos os públicos, orientado, obviamente, por um critério de “interesse público”, que não propriamente da maximiza-ção de audiências. Esse serviço público tem, portanto, de ser sempre de qualidade, mas, sendo os públicos diversos e com exigências diferentes, dificilmente se conciliarão todos num único canal generalista, a menos que se posterguem alguns desses públicos (minoritários). Assim, Leonor Beleza, que disse não estar muito preocupada com esses públicos e certos responsáveis do Governo, ao afirmarem que “depois se verá”. Assim também Sousa Tavares, que disse, arrasador, na TVI: “Ninguém vê o 2° canal”. Ou seja, uma outra forma de anular certas camadas de público, mais exigentes.
A solução de entregar aos privados uma dessas fatias do serviço público implicaria que o Estado o tivesse de pagar, a peso de ouro, se fosse em horário decente; mais barato, se a horas furtivas, em que o público seria realmente nenhum.
JN 16-05-2002

 

A escalada do retrocesso

Vivemos, na verdade, tempos ominosos. Já escrevi várias vezes e em diferentes registos que aquilo a que estamos a assistir é a uma fantástica recomposição de forças nas relações sociais, como talvez nunca se tenha visto desde a Segunda Guerra Mundial. Os grupos e as classes que têm sido sistematicamente pilhados são, evidentemente, os jovens, as classes trabalhadoras e parte das classes médias. A “crise” tem sido o «instrumento» indiscutido e indiscutível dessa recomposição, em que o total aniquilamento de direitos fundamentais adquiridos se tem apresentado como alvo de um combate simultaneamente político, social, jurídico e ideológico, intentando-se reduzi-los ao estrito catálogo dos clássicos direitos individuais, cívicos e políticos. Só estes é que fariam parte do núcleo dos verdadeiros direitos humanos ou direitos fundamentais (e mesmo assim…) Esta luta, que ganhou maior projecção a partir da derrocada do «socialismo real» e da queda do Muro de Berlim, no final dos anos 80, tem-se intensificado nos últimos tempos e tem mesmo ganho adeptos em certas fileiras da Esquerda. Veja-se, por exemplo, Sousa Tavares, que está sempre a invocar o «emprego para a vida» (isto é, a estabilidade no emprego) como um privilégio quase aberrante.
Ora, a escalada contra os referidos direitos adquiridos (direitos económicos, sociais e culturais, rebaptizados de “privilégios”) tem-se traduzido numa escandalosa desprotecção das classes mais débeis, e depauperação progressiva de parte das classes médias, em favor do reforço de poderes e vantagens dos bancos, dos empresários, dos capitalistas e dos agiotas, muitos dos quais estão precisamente na origem da tal “crise”, que é apresentada como uma catástrofe provocada por forças abstractas e transcendentes, quase da ordem dos fenómenos naturais, ou como o resultado de um colectivo modo de viver, acima das possibilidades reais de cada um, vindo a traduzir-se numa culpabilização de todo o corpo social, quando não mesmo das classes que agora são oneradas com os principais sacrifícios.
O acordo obtido com a UGT na semana passada representa um aprofundamento de tomo dessa escalada de retrocesso, destruindo as melhorias que o “25 de Abril” introduziu na área dos direitos económicos e sociais e culminando todo o esforço que tem vindo a ser desenvolvido no sentido da reinstalação das classes detentoras do capital no seu antigo poderio. O economista e ex-ministro do Governo de Guterres Daniel Bessa, classificando o acordo como uma «boa surpresa», disse tudo ao afirmar que «o aumento de meia hora diária de trabalho era uma “brincadeira de crianças”, quando comparado com as novas medidas» (Público do passado dia 18 de Janeiro).

19 janeiro 2012

 

O novo pacote laboral: o ajuste de contas da direita

O momento é propício e a direita não o desperdiça. É o ajuste de contas com a legislação de trabalho instituída com o 25 de Abril e a Constituição de 1976. Na expressão sintética e incisiva de um especialista de direito de trabalho, João Santos, hoje citado no "Público", "as alterações obrigam a trabalhar mais por menos dinheiro, com menos descanso e com maiores riscos associados à segurança no emprego". Que bela prenda para o nosso patronato, que nunca se conformou com a democracia social! É claro que tudo é feito para tornar o nosso país competitivo. Competitivo com Marrocos, a Tailândia, a Indonésia, o Sri Lanka... Salários baixos, despedimentos fáceis, indemnizações baixas: o regresso ao passado... Quanto à UGT, ela limitou-se a desempenhar o seu papel histórico...

17 janeiro 2012

 

A regionalização do MP

Segundo o "Público" de ontem, a Procuradoria Distrital de Lisboa adoptou a proposta de Figueiredo Dias quanto aos "acordos em processo penal", proposta saudada pela "inovação e audácia". Estranho antes de mais que uma proposta de ruptura, claramente de ruptura, e muito discutível (no mínimo) quanto à sua conformidade com a lei vigente, seja assim adoptada sem uma discussão prévia alargada. (Não falando já do esquecimento ou menorização a que são votadas as formas já consagradas na lei de consenso). Estranho também a consagração da proposta a nível distrital... Será que a regionalização vai começar pelo MP?

15 janeiro 2012

 

Telegrama de Mozart enviado a certa loja

INDIGNADO UTILIZAÇÃO MEU NOME EM LOJA DUVIDOSA VENHO EXIGIR FIM IMEDIATO DESSA UTILIZAÇÃO STOP DESCONHEÇO MAS DUVIDO VOSSOS CONHECIMENTOS MUSICAIS STOP VOSSA MÚSICA É OUTRA

 

Aperfeiçoamento pessoal ou patrimonial?

Já foi mais ou menos dito por muita gente, mas não quero aqui deixar de exprimir o que se segue. A maçonaria foi historicamente, na Europa e particularmente em Portugal, uma instituição importante na luta pela liberdade e contra o obscurantismo. Ponto final. Hoje não tem sentido a existência de associações secretas (ou "discretas"), quando é livre a associação, a reunião, a expressão, a participação na coisa pública. É claro que pode haver associações informais, grupos da bisca, da sueca, tertúlias de desporto, de má língua, e até de "boa língua". O que é inadmissível é a existência de associações que cultivem o segredo e a "fidelidade" entre os seus membros como princípios. Não são os rituais que me preocupam (os rituais têm geralmente valor estético). É essa fidelidade "de sangue" entre os "irmãos". Já sei que é tudo para o aperfeiçoamento pessoal dos "irmãos" (oh, gente imperfeita!). Mas a dúvida é esta: não será antes para o aperfeiçoamento do património?

13 janeiro 2012

 

Uma nova demonstração da superioridade moral do Ocidente no Afeganistão

Um vídeo captou imagens de soldados americanos urinando para cima de cadáveres inimigos no Afeganistão. Assim se vai construindo a democracia naquele país. Certamente que não houve ordens superiores para a prática do acto. Mas o certo é que a repetição insistente e persistente de actos de violência para com os vivos (militares ou civis) e de desprezo para com os mortos revela uma cultura militar profundamente enraizada que assenta na violação dos direitos humanos.

 

Chamar os boys pelos nomes

Aí está uma nova enxurrada de boys. Mas não lhes invejo a sorte. Porque, vendo bem, não é fácil a vida de boy. Começa logo no processo de selecção. Não é fácil chegar a boy. É que há muitos mais boys (candidatos a) do que jobs. É preciso uma árdua e persistente actividade, chamada lobbying (em português, cunha, empenho, bajulação, juras de fidelidade pessoal e/ou partidária, etc.), para construir uma candidatura viável. Muitos ficam pelo caminho, ignorados e ressabiados, mas prontos a investir (de todas as formas) em outras ou futuras candidaturas. Obtida a nomeação, segue-se um período dourado: vencimento chorudo, subsídios vários, automóvel, cartões de crédito, viagens, visibilidade na comunicação social. Mas tudo é breve e incerto na vida. Quatro anos depois, se não antes, começam as dúvidas e incertezas. Ganhará o partido-patrono? Se ganhar, manter-lhe-á a confiança? Não aparecerá um novo boy mais hábil a disputar-lhe o assento? É a precariedade, esse grande mal da sociedade de hoje, o maior inimigo do boy. Nunca se sabe o dia de amanhã... Por isso, compreende-se que o boy aproveite ao máximo o tempo presente: é gozar, gozar enquanto é tempo.

12 janeiro 2012

 

O inferno de Guantánamo: 1ª década

Passaram ontem dez anos sobre a "inauguração" do campo de concentração de Guantánamo. Desde então estiveram lá mais de 700 prisioneiros, vivendo, pelo menos nos anos iniciais, em condições sub-humanas, e submetidos a torturas constantes. Libertados já na sua maioria, por ausência absoluta de indícios de "culpa", sem que fossem indemnizados ou sequer de alguma forma "reparados" dos sofrimentos passados, ainda lá apodrecem cerca de 150, dos quais a grande maioria desconhece qualquer acusação formal. Obama muito prometeu e nada cumpriu. Não há tribunais, não há processos, não há prazos. Alguns chamaram a isso "limbo judicial". É um eufemismo, porque na verdade é um inferno. Um inferno sem fim à vista.

 

"Combater a corrupção: entre o imperativo da Res Publica e a razão instrumental"

Publico aqui os excertos mais significativos da comunicação apresentada por António Henriques Gaspar no ciclo de conferências "Ministério Público e o combate à corrupção", organizado pela Procuradoria- Geral da República e realizado ontem em Lisboa. 1. A corrupção, como conceito, facto ou metáfora, permanece intensamente no centro do discurso político e na agenda da comunicação, que se auto-assume como mediadora das projecções de cidadania. O fenómeno da corrupção, muito exposto nas representações sociais ou, com maior rigor, na suposta mediação das percepções sociais, está presente em todas as latitudes, em diversas modalidades e em diversos graus de intensidade. Estudos mostram que constitui um fenómeno sociológico, presente ao longo da História, multiforme, crónico, previsível nas suas manifestações principais, e que apresenta grande visibilidade social em tempos de crise. A corrupção tem uma história política e social. Desde a mais remota antiguidade se foi fazendo a história autónoma das várias formas e do desenvolvimento e da permanência da corrupção: na essência, a alteração da ordem das coisas, das regras estabelecidas, a manipulação e o desvio das formas e dos fins do exercício do poder. Como episódio simbólico da religião, CARLO BRIOSCHI refere que nas regras que Deus transmitiu a Moisés constava a de «não aceitar prendas, porque a oferta cega os que a vêem e perverte as causa justas», embora na antiguidade «olear as rodas» fosse costume difundido e aceite com ambivalência e até mesmo com compreensão. Mas nas Escrituras encontram-se traços incontestáveis sobre o primado da dimensão ética; na Bíblia dos Profetas e na filosofia antiga a ideia da corrupção emerge como pecado e como culpa. Em Roma, na Idade Média, na Reforma, no Iluminismo e pelos tempos e etapas da História até hoje, cada época teve a «sua» corrupção em modelos que os historiadores podem reconstituir – nas projecções axiológicas, nas referências da filosofia política, no poder ou contra-poder das religiões, no comprometimento das instituições. Mesmo nos fins do séc. XVIII a proclamação revolucionária dos valores confrontou-se, logo no período pós-revolução, com a persistência das práticas de corrupção. A história autónoma da corrupção tem sido a da permanência, mas também a da afirmação ética e o combate de uns tantos; a história da corrupção afinal, dito de modo simples, é uma fábula da luta entre o bem e o mal. Mas as exigências de cidadania, interpelando-nos, recordam que a corrupção é hoje apresentada pela opinião, e consequentemente pressentida pela sociedade como um obstáculo ao desenvolvimento económico e uma ameaça real para a qualidade da democracia. O discurso político e as percepções sobre a corrupção que se apresentam como postulado, substituindo-se e dispensando as demonstrações, revelam, porventura, no essencial, mais a emergência da imposição social e democrática de probidade e de rigor nos costumes e na moral política e administrativa, do que verdadeiramente uma agravação do fenómeno ou das suas implicações como problema. (…) 2. A actualidade permanente, o lugar central de um discurso recorrente e a generalidade das proclamações que traz frequentemente coligada, não podem nem devem fazer esquecer a necessidade de compreensão dos mecanismos da corrupção, de verificar ou indagar sobre a densidade real do problema, as condições e os ambientes de emergência e as consequências associadas, e de identificar a tipologia dos agentes implicados. O combate frontal, superando por vezes a indiferença popular, não pode ser empreendido sem firmeza na procura de remédios, políticos, éticos e institucionais, para prevenir e eliminar os diversos níveis e perspectivas que a corrupção apresenta. A dimensão «ambiental» condiciona as análises. Mas o «ambiente» está, por regra, analiticamente viciado pelas impressões e por truísmos mediáticos e pelo condicionamento dos estereótipos que, por detrás das formulações de intransigência, podem esconder posições não necessariamente objectivas, mas objectivamente entorpecentes da acção. (…) Recentrar as noções e impor o rigor das definições constituem condições essenciais da legibilidade do discurso sobre a corrupção, porque é necessário saber do que falamos quando todos falamos de corrupção. No sentido semântico comum, são estigmatizados através da expressão diversos tipos de comportamentos não lícitos ou ilícitos, ou como tal considerados nas expressões externas das representações sociais. O termo “corrupção” tem sido, não poucas vezes, em exasperação conceptual, vítima de vulgarização no senso comum, com extensivos apelos emocionais induzidos por uma noção genérica e cultural que pretende englobar todas as formas de abuso ou de mau uso de uma função pública. Assiste-se à «voragem conceptual» da corrupção. (…) 3. O rigor no estabelecimento das relações entre a substância dos actos e as denúncias sociais constitui elemento central na análise e na definição dos modos de reacção. Pressente-se alguma ambivalência no resultado de um discurso excessivo e da extensão das definições, e consequente corrosão do sentido da proporcionalidade dos valores, ou na anomia em algumas representações sociais. A ausência de rigor que, não poucas vezes, parece rodear os tópicos discursivos, impõe exigências de cuidado nas grelhas de leitura e no reordenamento dos critérios, que evitem erros nas percepções e nas reacções; a resposta ao problema exigirá mais resultados do que retórica. (…) Está estudado que cada sistema político cria e combina estruturas de oportunidade próprias para a corrupção. As estruturas relacionais, os vínculos de dependência, os valores que comprometem e os comportamentos que impõem, podem levar o conceito a uma projecção sistémica. A circularidade de posições de poder gera oportunidades políticas e administrativas, e os sistemas de alianças informais diluem não poucas vezes os valores de referência. Mas a democracia, através dos seus meios de controlo permanentes e escrutináveis, é também o sistema que melhor pode produzir estratégias e formas de resposta e contenção. Para enfrentar e dominar a corrupção pelos mecanismos institucionais, a delimitação a que há que proceder tem de separar bem a dimensão sociológica, para limitar o problema ao que é essencialmente jurídico, e especificamente penal. (…) Mas há que assumir claramente que devem ser pensados outros modos ou modelos muito antes do direito penal. Enfrentar o complexo – a «nebulosa» - da corrupção não pode identificar-se com a manutenção da questão criminal como único modelo de percepção e abordagem. O direito penal não permite enquadrar em definições típicas e nos limites das exigências dogmáticas, a multiplicidade de actos que possam constituir patologias e desvios dos deveres funcionais. A expansão do direito penal tem limites e o direito penal não pode ser infinitamente elástico; poderá mesmo ter esgotado o limite da razoabilidade das construções dogmáticas com as criações da Lei nº 32/2010, de 2 de Setembro. A invenção de soluções apelativas e aparentemente fáceis, mas racionalmente discutíveis, construídas na maximização de políticas penais, pode não ter o efeito pretendido e perturbar a sedimentação de conceitos e as aquisições da «praxis». (…) 4. A primeira dificuldade na estratégia das respostas começa pela apreensão da medida e do volume da corrupção – isto é, da amplitude real e não apenas pressentida. As estratégias, os meios e o discurso devem ser proporcionados à dimensão real, ou à dimensão realmente conhecida e não apenas suposta do problema. A dificuldade de medição ou mesmo de simples estimativa prestável como base significante acrescenta complexidade na identificação das causas e das consequências da corrupção. Não existem critérios e instrumentos de medição, nem dados objectivos e fiáveis sobre a específica danosidade social da corrupção; as impressões não valem como método e critério de análise. São apenas referidas estimativas que resultam, por regra, de instrumentos de análise empíricos, de meras percepções sem critérios científico, produto do tratamento de micro-realidades fragmentadas, por vezes factualmente não demonstradas, constituindo apenas índices que, não revelando mais de que uma parte, não podem ser tomados pelo todo. (…) 5. Enfrentar a corrupção, entendida nas definições extensivas da «nebulosa da corrupção», exige, por tudo isto, estratégias culturais, de prevenção, e a intervenção de meios e de instrumentos formais de controlo. (…) A prevenção primária exige a instituição de contra-medidas que contribuam para eliminar, bloquear ou enfraquecer os factores de emergência, e incidir sobre os contextos de oportunidade. A prevenção primária deve começar na lei e na definição da elasticidade dos poderes. Por exemplo: - previsão de espaços com menor amplitude de poderes discricionários e com mais fortes vinculações naqueles campos em que a decisão de excepção vem prevalecendo, frequentemente, sobre decisões estritamente vinculadas; - maior participação popular e democrática no procedimento para decisões de excepção; - melhor regulação de procedimentos de decisão, eliminando factores intermédios e não estritamente essenciais, propícios a compensações ou a manipulação de informação técnica; - atenção particular à construção dos novos modelos de parcerias público-privadas onde pode residir alguma ambiguidade quanto ao limite material do interesse público; - risco dos modelos voláteis de transição funcional do sector público para o privado, com espaços de indefinição do sentido material dos vínculos na «circularidade de posições»; - ou mesmo, em plano que anda arredado do discurso, regulações adequadas que dificultem a emersão de situações de nepotismo directo ou cruzado, podem constituir critérios operativos em função preventiva primária. Na prevenção situacional, por seu lado, justifica-se a utilização sistémica, integrada e cruzada dos resultados e verificações dos diversos serviços de inspecção e auditorias, seja de legalidade administrativa ou de natureza financeira. (…) 7. O sucesso do combate através do direito penal depende do afinamento dos modelos de investigação e da utilização adequada dos instrumentos processuais disponíveis, na conjugação de pró-actividade entre os resultados da prevenção e as competências das instâncias formais de controlo. (…) O «poder de fogo» - expressão que nestes tempos se tornou «jargão» – dos instrumentos normativos e processuais específicos no domínio da investigação dos crimes associados na «nebulosa da corrupção» é considerável. Recordem-se: - medidas especiais de prevenção e de recolha de informação; verificação e solicitação de verificação inspectiva de actos e procedimentos administrativos suspeitos (no chamado «pré-inquérito» - Lei nº 36/94, de 29 de Setembro); - regime das acções encobertas – Lei nº 101/2001, de 25 de Agosto; - protecção de testemunhas, com ocultação ou reserva do conhecimento da identidade – Lei nº 93/99, de 14 de Julho; - regime especial de recolha de meios de prova; quebra de segredo profissional e perda de bens, especialmente a quebra de segredo das instituições de crédito, o acesso total às contas bancárias e documentação e a solicitação do controlo de contas bancárias, a solicitação do Mº Pº no inquérito – Lei nº 5/2002, de 11 de Janeiro; - criação no Banco de Portugal de uma base de contas bancárias – Lei 36/2010, de 2 de Setembro. - novos modelos penais criados pela Lei nº 32/2010, de 2 de Setembro, que devem ser testados in action. …) Há, no entanto, no estado actual das coisas e na interpretação que me permito, bloqueios que são insuperáveis e que não dominamos: uns, reais; outros, apenas virtuais. A circulação de capitais – circulação virtual em que o dinheiro já nem sequer é escritural – por praças bancárias sem regras, sem regulações e com ocultação dos titulares, para só referir três factores, bloqueia qualquer investigação que exija o recurso a elementos fora do espaço paroquial. E como todos já percebemos, o poder financeiro e associados impõem a sua força; os off-shore restam o grande tabu, revelando a incapacidade dramaticamente comprovada da política para conter a avidez e o cinismo dominador da finança. A «razão instrumental» económica e financeira limita a afirmação do imperativo da res publica. A uma qualquer sociedade de esquisita nomenclatura, com sede numa caixa postal, numa qualquer ilha não se sabe bem onde, sem identificação de titulares ou beneficiários, não deveria ser permitida a aquisição de bens ou a realização de investimentos. Enquanto assim não for, não inventaremos meios de investigação que sejam tocados por Midas. 8. Intervir sobre o essencial, definindo antes de mais o essencial, constitui o dever dos responsáveis pelo trabalho de identificação adequada dos problemas, para organizar racionalmente os meios para os enfrentar. A experiência acolhida de processos que chegaram ao termo, ou não, aconselha a necessidade de identificar, e consequentemente trabalhar sobre os reais problemas, para respeitar a razão de proporção entre os riscos, os danos, as consequências e a utilização racional dos meios. Separando também as águas e rasgando a ambiguidade que continua a condicionar tanto os princípios como as práticas de controlo. O combate à corrupção (usada a expressão no sentido sociológico) tem estado, com efeito, por demais condicionado por impulsos voluntaristas, determinados pelos estímulos exteriores, pela encenação dramatizada nos medias, com generalizações associadas às dinâmicas de certos acontecimentos marcados com o selo labelizado do «escândalo». A dinâmica da criação e da exibição do «escândalo» é sociologicamente complexa. E a eficácia das reacções pode ser (é sempre) afectada por percepções desadequadas dos problemas. Por vezes, fica a sensação que a «metáfora da corrupção» tem sido o objecto e o programa de uma espécie de «concurso de demagogias», com reacções verbais proclamatórias, excessivas e ruidosas, por vezes em afagamento das boas consciências, sobretudo políticas. Com o consequente «engarrafamento» de iniciativas e a perda de sentido das prioridades e da eficácia. Mas a nível internacional numa replicação de sentido duplo, o panorama não é diferente. Temos assistido a uma sucessão de Convenções – que já vi designada por convention congestion - , a uma acumulação desordenada de tratados, num concurso de modelos ou numa espécie de leilão, tentando ultrapassar-se umas às outras pela inflação de exigências, que fazem desviar do essencial. 9. Havemos, porém, de reconhecer que as instituições de justiça – órgãos de polícia criminal, Mº Pº, tribunais – estão também nesta matéria sob o fogo intenso dos novos messias e dos industriais do escrutínio. É uma consequência da actuação em ambiente democrático, mas as instituições têm de saber conviver tanto com as razões, como especialmente com a não-razão ou mesmo a desrazão. Prevenindo-se, no entanto, de uma dupla armadilha. Por um lado, não produzir nem aderir ao discurso da assumpção da responsabilidade inteira de um combate que não é apenas da justiça. As possibilidades e as responsabilidades da justiça têm como limite a dimensão penal, e esta é apenas a parte de ultima ratio do problema; o direito penal e o seu arsenal de intervenção estão no fim da linha, e no esforço de contenção do «complexo da corrupção» não lhe pode ser reservado um lugar principal. Por outro lado, superar condicionamentos mediáticos, que podem ter agendas próprias não coincidentes com a realização da justiça, e não entrar em competição para demonstrar, sob a cominação implacável de rotunda incapacidade, a obrigatória realidade daquilo cuja existência urbi et orbi a comunicação decretou. 10. Delimitados os campos, evitadas as armadilhas, utilizados os meios processuais alargados que estão disponíveis, as instituições judiciárias – órgãos de polícia criminal; Mº Pº; tribunais - têm capacidade para responder ás expectativas dos cidadãos e às exigências da República. Sabendo bem os limites, mas compreendendo os ambientes, os métodos e a linguagem, e actuando com rigor o objectividade para fazer justiça, sem tentações de justicialismo. Na procura de elementos de demonstração e prova não há, por estas bandas, recibos de quitação. A prova é o problema central na investigação, para a acusação e no julgamento. No ambiente da corrupção há dissimulação, códigos de actuação; tem de haver específicas regras para reconhecimento de comportamentos e o saber da experiência para interpretar conjugações e indícios subliminares e ténues; tanto os documentos registrais, como as presunções naturais e os feixes poliédricos de indícios são essenciais para abrir o espaço escuro das dissimulações e segredos. Temos de assumir aqui o dever da inteligência. Com a firmeza das convicções, a consciência serena da dificuldade do empreendimento e a intuição de que a eficácia e a obtenção de resultados são prejudicados pela diversão resultante do excesso inconsequente das palavras. Em tempos de «lassidão ética» e de cedência à razão instrumental financeira, enfrentar a corrupção, seja sociológica ou jurídico-penal, constitui um imperativo da res publica. Com a humildade de reconhecer nos ensinamentos da história que o combate foi sempre presente, mas o sucesso nunca foi suficiente. Recordemos S. Thomas More em carta a Erasmo: «Se a honra fosse rentável, todos seriam honrados». (António Henriques Gaspar)

10 janeiro 2012

 

A deriva fascistoide

Estamos a caminhar para uma sociedade fascistoide. Agora é a tentativa para impor a proibição de fumar mesmo à porta de restaurantes, bares, discotecas, etc., sob o pretexto de que o fumo entra para dentro desses estabelecimentos e polui o ar dos não fumadores. A proibição procura assentar num estudo dito científico, mas do que se trata é de uma imposição que ultrapassa os limites de necessidade e proporcionalidade, do estilo «cortar o mal pela raiz», próprio dos totalitarismos, que, como se sabe, muitas vezes procuram caução nas «verdades científicas».
Estamos a viver uma época de autoritarismo sanitário (não será por acaso que tanto se usa a metáfora das «gorduras do Estado», que é preciso cortar), de um recuo sem precedentes da democracia, com soluções impostas à revelia de qualquer processo democrático e de opacidade social e esoterismo da linguagem (por exemplo, na área da economia), quando tanto se fala de transparência.

07 janeiro 2012

 

Mensagem de Ano Novo

dirigida a todos os concidadãos de boa vontade, principalmente aos que a sorte elegeu como salvadores da nossa querida Pátria

Desejo um heróico Ano de 2012 a todos os compatriotas para erguermos a nossa querida Pátria do negro fundo onde está atolada. E, acima de tudo, apelo para a compreensão de todo o nosso Povo, que, felizmente, é um Povo Ordeiro, Pacífico e habituado a suportar os sacrifícios que lhe são pedidos para o bem geral.
O ano que agora vai entrar vai ser de arromba, no bom sentido da palavra. Quero dizer, vai ser um ano de demolir muita coisa velha que entorpece o desenvolvimento harmonioso da nossa sociedade. Temos de continuar as reformas que estão em curso, mas aprofundando-as num sentido mais estrutural, isto é, indo à raiz dos problemas, aos alicerces, aos fundamentos, às vigas que suportam as paredes e o peso da construção, pois o que se pretende é edificar uma sociedade nova que não tenha semelhança com a do passado.
Alguma coisa já foi feita sob a égide dos nossos amigos da troika, os que nos aconselham com os seus sábios conselhos e vigiam (aqui também no bom sentido) a forma como gerimos o dinheiro que generosamente nos emprestaram a juros caros (sempre no bom sentido da palavra, porque “caro” quer dizer precioso, estimado, amigo), de modo a alcançarmos a tal sociedade justa e perfeita. Assim é que, com esse generoso amparo da troika, já fizemos cortes substanciais nas gorduras excessivas do Estado. Corajosamente vamo-nos aprimorando em ser bons cortadores de carnes e enxúndias, extirpando sem piedade, mas com alto profissionalismo, matérias adiposas que desbordam dos limites higienicamente aconselhados e dos padrões requeridos por uma estética estadual moderna e bem lançada. Não somos meros carniceiros; somos talhantes bem intencionados e movidos apenas por amor patriótico.
Impõe-se agora avançar para uma outra meta: a das reformas estruturais, atirando para o “caixote do lixo da História” velharias e antigualhas sem sentido. Estão neste caso os privilégios das classes trabalhadoras e das classes médias, os quais, persistindo à custa de um Estado inchado, gordo, dito social, têm vindo a empecer o desenvolvimento sem entraves da riqueza nacional. É preciso que aquelas classes compreendam e se comprazam no sacrifício, porque é delas que depende a futura prosperidade do país.
Os trabalhadores têm que renunciar a direitos adquiridos muitas vezes de uma forma irresponsável, a coberto de teorias egoístas, camufladas sob a falsa ideia de progressismo. Deste modo, terão que trabalhar mais horas sem ganharem mais por isso, perder alguns feriados (o desejável seria perdê-los todos), evitando a ardilosa engenharia das pontes (ligação de um feriado com um fim-de-semana, passando por cima de um dia laboral), perder dias de férias (o desejável, aqui, seria também acabar com esse luxo ocioso), perder regalias no que toca a despedimentos, facilitando-se os despedimentos colectivos e individuais, contentar-se com muito menos dinheiro a título de indemnização por despedimento, pois os empregadores (“patrões” na antiga gíria desprimorosa) até nem deveriam ter que suportar qualquer ónus quando se vêem obrigados a despedir um trabalhador seu.
Por outro lado, os subsídios de desemprego também não podem ter valores tão elevados, nem durar tanto tempo como até aqui, para estimular os desempregados a procurarem ocupação, seja ela qual for, porque os trabalhadores não se podem dar ao luxo de escolherem a profissão que muito bem querem e a remuneração que lhes parece mais adequada. Em suma, o lema é trabalhar mais para emagrecer, evitando as tão indesejáveis gorduras, sobretudo se são conseguidas à custa dos empregadores, e ganhar menos, para se consumir apenas o necessário à manutenção da linha dos trabalhadores que se pretende como padrão estético do Estado moderno.
Quanto aos cuidados de saúde, o objectivo é encarecer os respectivos serviços, por um lado porque é em grande parte por causa deles que se vai a linha do Estado por água abaixo, e por outro, porque não se pretende que os cidadãos em geral tenham uma saúde excessiva, visto que uma saúde óptima faz com que se coma mais e se tenha mais apetite, por aí se perdendo o objectivo de fazer emagrecer os nossos compatriotas, como medida geral de higiene e saneamento público.
Às classes médias, principalmente às que dependem de rendimentos do seu trabalho, que por sua natureza não podem ser escamoteados, faz-se apelo a que tenham a humildade necessária para compreenderem que devem ser oferecidas em holocausto à crise em que estamos mergulhados, por um lado porque têm desafogo suficiente para empobrecerem (isto é, para serem sujeitas a uma drástica cura de emagrecimento), e por outro porque as classes abaixo delas não podem ser mais oneradas, senão com mais trabalho gracioso e vida mais cara, e as acima delas, também não podem, embora tenham rendimentos e capital. É que estes, como são de sua natureza voláteis, ao menor sinal de acossamento fogem para o estrangeiro ou para sítios paradisíacos onde podem estar sossegadinhos da vida, sem qualquer importunação, e convém ao bem da Pátria mantê-los (rendimentos e capital) por cá, devendo ser tratados com todo o desvelo.
Certo é que, consentindo com a abnegação esperada nesse sacrifício, todos esses nossos compatriotas (trabalhadores, classes médias e gente humilde) poderão um dia ser lembrados nas páginas imorredouras da História como os heróicos salvadores da nossa Pátria.
Bom Ano a todos deste vosso compassivo compatriota

Jonathan Swift (1665 – 1745)

06 janeiro 2012

 

Iniciativa popular, sim, populismo, não!

A proposta de reduzir drasticamente o número de assinaturas para os projectos legislativos de iniciativa popular pode parecer muito democrática e progressista, mas é muito perigosa. É a porta aberta para o populismo (por exemplo, em matéria penal, imigração, etc.) e o populismo é uma doença (senil) da democracia.

05 janeiro 2012

 

Lojas escuras

Estas lojas sem porta aberta para a rua, dedicando-se a negócios obscuros, reunindo comerciantes de diversos ramos e interesses, aparentemente contraditórios, mas afinal convergentes, deixam-me arrepios (democráticos). É certo que o segredo é a alma do negócio... Mas qual é o negócio?

02 janeiro 2012

 

O empobrecimento como salvação

É o novo catecismo. E é obrigatório para todos os portugueses.

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