31 março 2009

 

Iftikhar Chaudhry

Sob intensa pressão popular, o governo paquistanês viu-se obrigado a readmitir o presidente do ST, afastado por Musharraf porque insistia em cumprir a Constituição (e consequentemente impedi-lo de um novo mandato presidencial).
Já retomou o seu lugar no tribunal.
Uma história que acaba bem (se é que acabou...).
Um triunfo do movimento popular laico, do movimento de advogados e juristas progressistas, do Estado de Direito, afinal.
Uma conquista do povo paquistanês, não uma exigência do democrático "Ocidente".

 

A "ética militar" de Israel

O exército israelita pode arquivar as denúncias contra a brutalidade dos seus soldados, mas não pode apagar as imagens terríveis da agressão à Faixa de Gaza, nem sequer as fotografias das t-shirts usadas por alguns soldados, como aquela que tem estampada a imagem de uma mulher árabe grávida sob a mira de uma arma, com a sugestiva legenda: "1 shot, 2 kills".
Bastava esta t-shirt para ficarmos esclarecidos quanto à "ética militar" de Israel.

 

MP: a importância da "autonomia interna"

As alegadas "pressões" sobre o MP, existam ou não, ilustram bem a importância da "autonomia interna" do MP, como garantia objectiva da isenção e imparcialidade da investigação criminal, por sua vez essencial para a administração independente da justiça.
E fica-se a pensar na "teleologia" das alterações de 2008 ao EMP, tendentes ao reforço da hierarquia e da precariedade da colocação dos magistrados, com evidente prejuízo da sua estabilidade, que aliás tem consagração constitucional...

 

O aumento da criminalidade

O Relatório de Segurança Interna registou uma aumento de criminalidade, quer em termos gerais, quer da criminalidade violenta no ano de 2008 e logo ressoou, como de costume, um coro de vozes contra o aumento da criminalidade. A comunicação social deu o devido destaque, como lhe compete. Esse passou a ser o tema preferido das televisões, da rádio, dos jornais, em noticiários, artigos de opinião, entrevistas, fóruns de debate. A comunicação social, nestas ocasiões, ausculta sempre, muito democraticamente, as opiniões dos cidadãos. E estas, geralmente, primam pela excelência das ideias rasteiras. Eis algumas pela sua ordem crescente de interesse: dar mais autoridade à polícia; dar mais força à polícia; dar mais meios à polícia. Ideias simples, claras e concentradas nos objectivos.
A própria presidente do PSD não foi mais concisa e eloquente. Confrontada com o anunciado aumento das forças policiais pelo MAI, declarou que não basta mais polícia; é preciso dar mais autoridade à polícia. Pensa-se que para combater a criminalidade geral e a violenta. Uma receita antiga e sempre eficaz. Mas será que nesse desejado aumento de polícia e de mais autoridade policial se inclui também a prevenção e repressão da criminalidade dita de colarinho branco, aquela que tem sido responsável por grandes fraudes, grandes desvios, furtos de grande magnitude e crises económicas que atiram para o desemprego e a miséria milhares de pessoas?

30 março 2009

 

Pressões incomportáveis

A denúncia pública, pelo novo residente do Sindicato dos Magistrados do MP, de "pressões de nível incomportável" sobre os magistrados é um facto demasiado grave e relevante para ficar sem consequências.
Para quem faz a denúncia, se for falsa. Para quem pressiona, se for verdadeira.
Cair em saco roto é que não!

 

Nem sobe nem desce

Na secção do "Sobe e desce" do "Público" de hoje aparece a fotografia de António Martins, o presidente da Associação Sindical dos Juízes, reeleito pela expressiva margem de 759 votos contra 440 da lista adversária.
Apesar de tão eloquente vitória, António Martins foi contemplado com uma seta horizontal: não sobe nem desce.
Quantos votos deveria ter recebido para merecer a seta para cima?

27 março 2009

 

Tribuno do rei

O antigo tribuno da plebe virou tribuno do rei.
Insólito? Talvez não...

24 março 2009

 

O impasse do Provedor

A situação de impasse a que chegou a substituição do Provedor de Justiça mostra bem as perversões a que podem dar causa as chamadas maiorias qualificadas parlamentares para se elegerem os representantes de certos cargos. Normalmente, esses cargos tornam-se objecto de disputa entre os dois maiores partidos e prestam-se a conluios e negociatas que não prestigiam as instituições. Quando nem um nem outro cedem, porque se sentem mutuamente no “direito” de indigitar a pessoa, conforme obscuros e pressupostos arranjos de bastidor ou invocados equilíbrios de forças, o que frequentemente sucede, chega-se a um impasse que, no limite, se tende a eternizar. Isto não se passa só aqui; passa-se noutros países, como, por exemplo, em Espanha, onde a nomeação de vogais para o Conselho Superior da Magistratura ou de juízes para o Tribunal Constitucional já chegou a idênticos impasses.
O critério partidário parece ser, assim, o prevalente, na maior parte das situações, em vez do critério de interesse público, reclamando este qualidades e perfil adequado por parte da pessoa a nomear para o respectivo cargo, que muitas vezes são sacrificadas no altar dos mesquinhos interesses dos partidos. Prefere-se, quando não a fidelidade declarada a esses interesses, ao menos a garantia de que eles pesarão no exercício das funções do nomeado e, quando não é possível ter a certeza dessa garantia ou ir deliberadamente para esse critério, adopta-se, como princípio basilar de exigência da maioria qualificada, o critério do cinzentismo, do não “fazer ondas”, do espírito acrítico, do indivíduo que viveu sempre no estilo yes, man, sem nunca tomar partido por nada e sem ter ideias muito vincadas sobre qualquer coisa, enfim a chamada eminência parda.
É assim que se serve o interesse nacional.

23 março 2009

 

Preservativo não, obrigado.

Ainda na viagem aérea para os Camarões, o Papa disse que o preservativo não era solução para a sida. O uso do preservativo, quanto a ele, não resolve problema nenhum, antes agrava a situação. Foram palavras que indignaram muita gente. Pulido Valente, na sua crónica de sexta-feira no “Público” e já antes num debate na TVI 24 horas, achou bem que as pessoas se indignassem, mas chamou a atenção para o lado compreensível dessa posição. O Papa não podia tomar outra, sob pena de trair a própria Igreja, de que é o representante supremo. A Igreja quer evitar a promiscuidade sexual, que o preservativo favoreceria. Para a Igreja, tratar-se-ia de manter os valores que sempre defendeu: castidade antes do casamento e fidelidade depois do casamento. O Papa tinha, inclusive, o direito de sustentar essa posição.
Há aqui, segundo creio, algumas confusões. Em primeiro lugar, a Igreja é formada pela comunidade dos fiéis e se há domínios onde há grande divisão entre os fiéis e na própria hierarquia, um deles é o do uso do preservativo. A Igreja não é o Papa, arriscando-se este, como se tem visto, a aprofundar essa divisão e a perder o leme de comando do barco que dirige. Muitos dos manifestantes são católicos.
Em segundo lugar, as verdades que a Igreja defende, ainda que muitas vezes a coberto de dogmas, também não são imutáveis, bastando ter uma perspectiva histórica sobre muitas das verdades que a Igreja tem assumido ao longo dos tempos. De forma que o Papa, ao defender a posição que defende, não faz mais do que assumir uma das correntes mais conservadoras, dentro da própria Igreja, sobre o uso do preservativo.
Em terceiro lugar, hoje, praticamente ninguém segue, mesmo entre os católicos (há excepções, claro) o lema da castidade antes do casamento, e essa é uma das batalhas perdidas da Igreja. Por outro lado, para a posição mais conservadora da Igreja, não basta a fidelidade no casamento; também é preciso a castidade. É que se fosse só o problema da fidelidade que estivesse em causa dentro do matrimónio como sacramento indissolúvel (que só surgiu como tal, como se sabe, no Concílio de Trento), então os casais podiam usar o preservativo como meio de gerirem autonomamente a relação e controlarem o número de filhos que pretendem ter (planificação familiar), mas não é isso que a hierarquia prega, e nisso também já perdeu a batalha, porque os católicos também já aprenderam que o relacionamento sexual não visa só nem principalmente a procriação, mas é um meio legítimo de obter prazer e de conseguimento da plenitude da expressão amorosa.
Em quarto lugar, segundo creio, a hierarquia da Igreja nem sequer admite o uso do preservativo para evitar a disseminação da sida, mesmo entre casais em que um dos parceiros está infectado. Ainda há dias vimos a notícia, segundo a qual um individuo, na Itália, conseguiu a anulação do seu casamento pelos tribunais eclesiásticos, com fundamento em que a mulher lhe exigia o uso do preservativo nas relações sexuais, fazendo-o ela para evitar justamente a transmissão de uma doença, que não era a sida, mas outra doença grave.
Em quinto e último lugar, o Papa falou, segundo se presume, para os católicos, mas fê-lo no âmbito de uma visita a países africanos que vivem a braços com o problema da disseminação da sida, que coabita com a miséria mais extrema e a total falta de informação, obstáculos que constituem uma barreira difícil de vencer para as organizações que, com grande esforço, tentam inverter o processo de propagação avassaladora daquela doença, que dizima milhares de pessoas. Neste contexto, a posição da mais alta hierarquia da Igreja constitui, tenho a certeza, um pecado muito maior do que o uso do preservativo.

18 março 2009

 

A crise

Medina Carreira tem fama de radical e de eterno inconformista. Por isso, não será para levar muito a sério, mas antes à conta de acrimónia, a sua afirmação feita numa entrevista de que a actual situação se deve fundamentalmente aos dois maiores partidos, ou seja, ao chamado bloco central. É claro que há aqui um exagero evidentíssimo. A crise vem de fora para dentro e nós tivemos o azar de o anticiclone dos Açores, por um destes acasos fatídicos, estar virado ao contrário e não ter servido de necessário anteparo aos ventos malsãos que entraram desembestadamente pelo Atlântico dentro.

 

Ser juiz, hoje

A crónica de Mário Santos, na Revista “Actual” do Expresso de sexta-feira passada, intitula-se “Dr. Juiz” e fala de um restaurante lisboeta de boa comida e ambiente acolhedor, em que o dono se preza não só de servir bem os clientes, como de perscrutar a sua psicologia e adivinhar o que fazem na vida. Como assim, começou a chamar “Sr. Dr. Juiz” a um cliente novo que lá tinha sido levado pelo cronista, deduzindo-lhe a profissão do ar circunspecto, da cabeleira branca e dos óculos de aros grossos. Esses são (ou eram) traços icónicos de uma imagem estereotipada de juiz. Nem sempre, porém, correspondem à realidade. E, no caso, não correspondiam. O novo cliente, que era professor, quis corrigir esse tratamento, dizendo que não era juiz. Porém, o excelente gastrónomo não acreditou e ficou-se sempre na sua: «Eu sei que os senhores doutores juízes, agora, com o que para aí vai, não gostam de ser reconhecidos fora do tribunal.» E passou a tratá-lo sempre por “Sr. Dr. Juiz” com toda a convicção, porém, daí para a frente, «num tom de voz mais baixo, mais confidencial e mais cúmplice (…)»
O que isto revela é interessante: que há a convicção de que os juízes não gostam de ser reconhecidos publicamente como tal. Isso deve-se fundamentalmente ao facto de terem sido causticados e vilipendiados, de uma forma muitas vezes gratuita e indiscriminada, a partir da tomada de posse deste governo. Seria possível fazer reformas sem esse ataque descabelado e sem ferir desnecessariamente a honorabilidade desses profissionais, mas foi o que não se fez, como se para implementar reformas, muitas vezes demagógicas – e talvez por isso mesmo – fosse preciso deslustrar toda uma classe profissional. Essa foi, aliás, invariavelmente a estratégia seguida com outras “corporações”. Mas os frutos envenenados de tal estratégia começam a aparecer com toda a nitidez.

14 março 2009

 

Good news

Nos EUA, o Senado do estado do Novo México, depois da Câmara de Representantes o ter feito, aprovou a revogação da pena de morte e sua substituição pela condenação à pena perpétua sem liberdade condicional.
A pena de morte aplica-se ainda em 38 dos 50 estados dos Estados Unidos, debatendo-se neste momento projectos de revogação no Kansas e em Montana.

10 março 2009

 

Refuseniks

Não é fácil ser refusenik em Israel. Recusar prestar serviço na tropa, ou seja, fazer objecção de consciência, é mais ou menos o mesmo que proferir uma declaração de traição nacional. A população israelita judaica está neste momento esmagadoramente dominada pela fobia ao “inimigo” palestiniano e os (poucos) que não pensam assim são necessariamente encarados com suspeição. Recusar defender com armas a pátria é traí-la, porque, como se sabe, a pátria não se discute.
Não se discute em Israel, como também não se podia discutir em Portugal antes do 25 de Abril. Também então eram traidores os que eram contra a guerra colonial.
Só que, tal como no Portugal de então ser contra a guerra não era ser contra a pátria, mas apenas contra uma certa concepção da mesma, também no Israel de hoje ser contra a ocupação (de carácter tipo colonial) dos territórios palestinianos e contra o uso das armas contra populações indefesas não significa que se é contra Israel.
Quem o explica bem é a jovem Sahar, uma judia israelita de 18 anos, que é refusenik e já esteve quatro vezes detida por isso. A história veio no “Público” do passado dia 7 e vale a pena lê-la. É aliás mais uma bela reportagem de Alexandra Lucas Coelho, entre várias outras que em vindo a publicar.

 

Os 50 anos da Barbie

A Barbie fez ontem 50 anos. Quem diria! Sempre tão elegante, tão airosa! Enfim talvez algumas rugas já espreitem, mas estão bem disfarçadas, ela é uma mulher moderna e sabe tratar-se.
Mas talvez o seu reinado esteja ameaçado. Ela, a representante carismática da mulher WASP (White-anglosaxon-protestant), aguentará a era Obama?
Não estará mais bem preparada para isso a Bratz, não representará esta uma cultura mais desalinhada do figurino tradicional, mais tolerante, mais multicolor, em todos os sentidos da palavra?
Qual vai ser o modelo da mulher americana no próximo meio século: Barbie ou Bratz?
Ou aparecerá alguma concorrente?

08 março 2009

 

A Inquisição no Brasil

O Arcebispo do Recife fulminou com a excomunhão os médicos que interromperam a (dupla) gravidez de uma menina de 9 anos, violada pelo padrasto!
Onde pode levar a intolerância e o dogmatismo religioso...
Salvar a vida da menina não interessava, interessava sim manter a doutrina da fé.
É este o valor que a vida tem para estes defensores incansáveis da vida...

 

As gaffes de Hillary Clinton

Em Bruxelas, perante uma plateia de quinhentos jovens europeus, a Secretária de Estado dos EUA confessou que não compreende o sistema multipartidário e que dois partidos, como no seu país, já chegam e sobram.
Estas históricas declarações foram atribuídas a "falta de sono".
Mas, cá para mim, são reveladoras é de falta de cultura política, com alguma arrogância à mistura.
Ainda há pouco se estreou no lugar e já teoriza tão enfaticamente sobre a democracia dos outros.
Vamos esperar pelo resto do mandato porque certamente nos vai contemplar com mais pérolas do seu "pensamento" político.

03 março 2009

 

Pilha-galinhas

Com a devida autorização do Autor e porque o caso relatado e posto sob a sua mira sarcástica, diz respeito a um tema actual da Justiça - o do confronto dos pilha-galinhas com os agentes da verdadeira criminalidade dos dias de hoje e a diferente eficácia, ou dicotomia eficácia-ineficácia dos tribunais para responder a esses dois tipos de criminalidade, aqui se reproduz o artigo de Manuel António Pina publicado hoje no JN.


Crime e castigo
Noticia o JN que está marcado para o dia 20 de Abril, no Tribunal da Maia, o julgamento de um homem que, em 2007, terá arrombado um galinheiro e furtado duas galinhas no valor de 50 euros.
A Justiça tarda, mas chega. O criminoso andou mal e merece justa punição, quer pela mediocridade de fins quer pela ruralidade de meios. Gente como ele, que pilha galinhas em vez de fundar um banco e pilhar as contas dos depositantes, ou como aquela septuagenária que não pagou uma pasta de dentes num supermercado em vez de pedir uns milhões à Caixa, comprar o supermercado na bolsa e igualmente não o pagar, vendendo-o depois à Caixa através de um "offshore" pelo dobro do preço (ou vendendo-lho mesmo antes de o ter comprado), não tem lugar no Portugal moderno e empreendedor. Ainda por cima, deixou-se apanhar. Se calhar, até confessou, em vez de invocar lapsos de memória. E aposto que nem se lembrou de se divorciar antes de ser preso, pondo os 50 euros a salvo na partilha de bens. Não queria estar na pele do seu advogado, não há Código de Processo Penal que valha a um caso destes. É condenação mais que certa.

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