27 novembro 2012

 

Ai aguenta, aguenta!


Ou de como o nosso povo tem capacidade para aguentar esta e ainda mais austeridade que seja necessário impor-se-lhe para bem da nossa tão amada Pátria

 

Meu Excelentíssimo Amigo:

É com grato prazer que lhe dirijo estas minhas breves, mas sinceras palavras, pois V. M. é um mui digno representante do movimento de restauração dos valores ancestrais da nossa Pátria.

Temos, finalmente, um governo que, sob a acção obstinada do nosso ministro-mor, um moço deveras inteligente e mui benquisto lá fora, principalmente da valorosa Senhora Merkas, se tem empenhado, contra ventos e marés, em fazer uma revolução através de leis, sem barafunda e estardalhaço. Uma revolução dentro dos padrões da democracia.

Essa revolução visa restituir o país ao que era dantes, nos bons velhos tempos, repondo os antigos soldos dos operários e funcionários do Estado, a antiga jornada de trabalho, os antigos privilégios dos patrões e proprietários em geral, o comedimento nos gastos da saúde e da escola públicas, bem como nas benesses distribuídas ao povo, pois nessas liberalidades de que o Estado se tem armado em garante se vai a mor parte da nossa riqueza e se engorda a dívida pública, que nos tem trazido a todos com o baraço ao pescoço. Em suma, levar a sociedade a retrogradar uns furos, isto é, «empobrecer o país», como de forma lapidar disse o nosso ministro-mor, definindo nessas duas palavras todo um vasto programa de acção.

«Empobrecer o país» - uma expressão aparentemente paradoxal. Como então «empobrecer o país»!? Sim, nunca tão revolucionário objectivo foi definido nos últimos decénios, em que se tem gasto à tripa-forra nessas liberalidades que referi e nas mui avantajadas despesas com o pessoal trabalhador, o que nos mereceu o epíteto de gastadores e de gente que «vive acima das suas possibilidades», como se não tem cansado de dizer a mui abundosa Senhora Merkas. «Empobrecer o país» é, pois, nivelar o país de acordo com as nossas possibilidades. É a famosa «regra de ouro», o princípio basilar que deve nortear as nações.

Ora, se o país tem de ser nivelado, é sobretudo pelos de baixo, nanja pelos de cima, visto que é pelos de baixo que se nos vai a mor parte da nossa fazenda. Estes é que têm de baixar o nível que alcançaram à força de muita reivindicação insensata e muita política esbanjadora, levando a que os soldos das classes laboriosas e dos funcionários do Estado aumentassem de forma desproporcionada, os primeiros provocando o encarecimento dos produtos e tolhendo o nosso comércio com as outras nações, e os segundos aumentando desmesuradamente a despesa do Estado.

Por sua vez, essa política de acudir à saúde de todos por igual forma e de proporcionar estudos para todos à custa do Estado, a par de outras benesses concedidas às classes mais baixas e remediadas, contribuiu de modo decisivo para a situação de descalabro em que nos encontramos. A solução, agora, é extirpar essas gorduras que puseram o Estado disforme e monstruoso, ou, para usar a linguagem realista do nosso ministro-mor, temos de «empobrecer».

Temos de voltar a ser o país pobre, mas honrado de outros tempos, em que o povo readquira a sua genuína característica de povo-povo, de parcos haveres e farta generosidade nos sacrifícios (“o melhor povo do mundo”, na comovente expressão do nosso ministro do Tesouro), a classe média encolha o necessário para ser reduzida a proporções aceitáveis, parte dela devendo regressar às classes populares e dar a estas maior consistência, e as restantes classes ocupem o lugar a que sempre tiveram direito.

É nesses estratos da população – o povo e a classe média – que se tem de apoiar a revolução em curso, como, aliás, todas as revoluções nelas sempre se apoiaram. É firmada no seu esforço, na sua praticamente ilimitada capacidade de sacrifício, na sua generosidade, que a «revolução do empobrecimento» pode seguir para a frente, devolvendo a nossa Pátria aos padrões de uma dignidade sóbria e sustentada nos seus fracos recursos. Nenhum país pode ser decente, se alimenta ilusões de o seu povo e, no geral, as classes mais baixas, que formam a parte mais numerosa de toda a população, poderem viver acima das suas possibilidades.

Trata-se de re-afundar aquelas funções do Estado que se mostrem demasiado onerosas, cortando naquelas despesas que contribuam para aumentar o défice público. É natural que os estratos da população atingidos recalcitrem, mas nada que seja dramático, pois não há revolução alguma que não tenha a sua parte dolorosa. O pior são os agitadores profissionais, sempre em busca de pretextos para criarem conflitos artificiais. Esses deverão ser reprimidos sem piedade e, contra eles, deverá, desde já, erguer-se uma forte barreira patriótica.

Quanto ao nosso povo, o nosso povo é clarividente e aguenta com heroicidade os sacrifícios necessários. “Ai aguenta, aguenta!”, como tão confiadamente afirmou aquele banqueiro que é colega de V.M. Se não puder comer bifes, come outras coisinhas mais ligeiras. E todos haveremos de ajudar os mais carenciados, porque esse é um mandamento ancestral de renovada actualidade.

Creio não ser ousado, se conjecturar que V.M. concederá todo o apoio a estas minhas pobres considerações.

 

Sempre devedor da amizade de Vossa Mercê

 

Jonathan Swift (1665 – 1745)

 

As etiquetas na justiça


A redução da complexidade que impera no mundo actual faz-se sentir, com particular intensidade, no mundo da Justiça.
A aplicação de etiquetas deturpadas que mesmo depois de contextualizadas e explicadas não descolam é uma realidade que tem vários exemplos, recentes e remotos e inúmeras cumplicidades, externas e internas ao sector.
A facilidade com que essa colagem se processa prende-se sumariamente com a total ausência de conhecimento histórico ao nível da justiça, com a falta de processamento adequado de narrativas institucionais coerentes e com a incapacidade de penetração de tudo o que problematize explicações simplificadas e aparentemente evidentes.
Sem querer entrar na lógica do agendamento mediático, no território dos lugares comuns comunicacionais ou de qualquer caderno reivindicativo parece-me importante, de quando em vez, chamar a atenção para os defeitos da tirania do presente.
Atentemos neste texto escrito em 1909, pelo Ministro dos Negócios Eclesiásticos e da Justiça, Francisco de Medeiros:
O juiz é um homem de carne e osso como os outros homens. Tanto ele como a sua família precisam de comer, vestir, e de fazer a vida no meio social em que a sua posição os coloca a todos. Não encarar assim o juiz perante a realidade das coisas e imaginá-lo um ser sobrenatural, inacessível às necessidades orgânicas de todos os seres humanos e às exigências do mundo, que nem sempre podem ser preteridas, é como que viver na lua. E só com ânimo leve se deixará de reconhecer que uma das bases da independência moral da magistratura é a sua independência económica.
 Certamente a nossa magistratura judicial, apesar da exiguidade dos seus vencimentos, tem dado e está dando sucessivas provas de rectidão, austeridade e isenção.
É, porem de bom aviso e salutar precaução ter sempre presente o prolóquio, que diz sair pela janela a virtude quando a necessidade entra pela porta”.

            A inserção e discussão das questões num tempo longo ajuda, inevitavelmente, a afastar as flores de um dia e estabelecer “a conexão com a capacidade de persuadir e ser persuadido que há em todo o ser pensante” (Fernando Savater, editorial das Claves de Razón Práctica, Nov./Dec. 2012).

20 novembro 2012

 

O alerta do professor


Leio todas as semanas as crónicas que Rui Ramos assina no Expresso. Frequentemente, não concordo com os seus pontos de vista, mas gosto de me confrontar com ideias divergentes e até antagónicas das minhas. É um exercício curioso comparar essas crónicas com as que, na mesma página, são assinadas por Daniel Oliveira. Normalmente exprimem ideias contrárias sobre os mesmos assuntos ou assuntos afins.

Assim acontece com as crónicas de ambos na semana passada sobre a greve geral e as manifestações do passado dia 14. A de Daniel Oliveira bate a tecla já tangida por vários outros opinadores de que a polícia tardou em reagir às provocações de um grupo de desordeiros, para depois reagir à bastonada, indiscriminadamente, contra pessoas inocentes e que não puderam fugir (tais como pessoas idosas e mulheres com crianças ao colo), fazendo com que uma greve geral realizada com êxito e de forma pacífica ficasse ensombrada pelo impacto mediático dessas provocações; a de Rui Ramos alerta para os perigos, que se adensarão no futuro, das acções empreendidas pela esquerda revolucionária, sem distinguir devidamente entre o grupo de indivíduos que, no final, provocaram a polícia e as manifestações que decorreram, de uma forma geral, de modo pacífico.

Se não concordo com o ponto de vista de Daniel Oliveira quanto ao maquiavelismo que parece imputar à polícia e a quem nela superintende, sem prejuízo de eu também ter ficado com dúvidas relativamente à forma de reacção policial, que me pareceu indiscriminada e algo desproporcionada, atingindo pessoas idosas e mais vulneráveis em zonas como a cabeça, acho que o artigo de Rui Ramos cai em velhos maniqueísmos e em velhos estereótipos, como o do «fascismo vermelho». Há quanto tempo não se lia nem se ouvia essa expressão da “direita radical”, que escrevia nas paredes «comunismo igual a fascismo», logo a seguir ao “25 de Abril”!

  É imperdoável que um historiador não distinga entre uma coisa e outra, muito embora o estalinismo, que campeou no mundo chamado “socialista,” hoje reduzido a uns frangalhos caricaturais, fosse um regime totalitário, como o fascismo, mas não se confundindo um com o outro.

Para ele, os insultos de rua, os protestos, as manifestações a que temos assistido, os “movimentos sociais”, as greves, as acções violentas e mesmo a campanha contra Isabel Jonet, enfim, tudo isso cabe no mesmo saco – a acção insurreccional da «esquerda revolucionária», que espera a sua hora para tentar uma desforra do “25 de Novembro”. Contra esse «fascismo vermelho», alerta o professor, é preciso que se imponha, antes que seja tarde, a «frente democrática».

Convenhamos que, para um historiador, é demasiada confusão e demasiado alarmismo.

Esta crónica é um autêntico bilhete de identidade ideológico do seu autor, contribuindo porventura para esclarecer a posteriori as reservas que normalmente são colocadas à sua interpretação do período correspondente ao Estado Novo da História de Portugal, de que ele foi coordenador.

18 novembro 2012

 

O catolicismo na Irlanda

O catolicismo na Irlanda é cruel. A lei sobre a IVG só permite o aborto em caso de risco da vida da mãe. Mas os médios (católicos) fazem uma interpretação fundamentalista da lei: ainda que o feto seja inviável, não podem fazer a interrupção da gravidez. Enquanto o coração do feto bater, espera-se por um "milagre". E se a vida da mãe correr risco? Logo se verá... Maior risco é fazer um aborto "escusado". Entre a vida de uma pessoa humana e o dogma doutrinário, o catolicismo irlandês escolhe o dogma. A crueldade dos dogmáticos não é menor que a dos que matam friamente.

12 novembro 2012

 

A visita da Sra. Chanceler


A visita da Senhora Chanceler

A Sra. Merkel deve ter levado uma imagem inefável do país. Todos os esforços foram feitos para que atravessasse ruas pacíficas e desertas e chegasse sem sobressaltos aos vários destinos protocolares que lhe estavam preparados. Não havia gente com cartazes, nem a gritar slogans, nem a atirar vaias à Sra. Chanceler. Uma paz d’alma. Um dia de sol brando, em ameno azul. Tudo tão mirífico! Parecia um país de postal ilustrado para encantar turistas. Um país a condizer com a imagem idílica que a elite dirigente queria transmitir à ilustre visitante e que muita gente faz gala em que seja a nossa, natural e autêntica, postura de povo ordeiro, afável e serviçal. De mais a mais, tratando-se de uma senhora que ostenta na sua firmeza caturra uma vontade inquebrantável de impor uma certa ideia de Europa, pautada pelas coordenadas do neoliberalismo económico, no qual se revêem os nossos dirigentes.

Por isso, a senhora chegou, olhou o mar profundo, contemplou embevecida os canhões prussianos do forte, almoçou e declarou com exaltação que gostava muito de Portugal e que, um dia, viria para qui passar férias.

Quando chegar à Alemanha, a senhora vai contemplar, atónita, algumas imagens verdadeiras de Portugal, que jornalistas do seu país, coscuvilhando, andaram a recolher pelas ruas, onde os manifestantes eram mantidos arredados a distância conveniente por infindáveis cordões de polícia.

 

A mulher mais poderosa

Alguns órgãos de comunicação social, naquele jeito superlativo que caracteriza muito da nossa sociedade mediática, dizem que vem aí «a mulher mais poderosa da Europa.» Mas mais poderosa por quê? A que título e com que legitimidade? Quem é que lhe conferiu esse poder?

11 novembro 2012

 

Frau Merkel visita o protetorado portucalense


            A Alemanha que vem aí amanhã não é a da bota ferrada e dos panzers de Hitler, mas também não é a Alemanha cosmopolita, republicana e pacifista de Kant. A Alemanha que vem aí é a que descende diretamente de Lutero: puritana, diabolizando o hedonismo, o luxo de Roma; ascética, pregando a contenção e a parcimónia, promovendo o aforro, abençoando o lucro, a usura, a acumulação de dinheiro; implacável, quando se trata de lidar com os infiéis, com os relapsos, com os preguiçosos, com os devedores…
            A Alemanha que aí vem é a dos banqueiros, investidores, cavaleiros da indústria de ponta (na terra, no mar, e sob o mar). Gostam de vender e até não se importam de emprestar dinheiro aos vadios e preguiçosos, mas impõem-lhes uma vida regrada, uma vida virtuosa de trabalho e privações, tiram-lhes todas as gorduras, para que eles possam mexer-se bem no trabalho e aprender a comer e calar (e agradecer aos seus benfeitores). Eles pregam a virtude, ensinam que todas as utopias são perigosas, são afinal os melhores amigos dos pobres e calaceiros (que são a mesma coisa), trazendo-os ao bom caminho.
            Amanhã vamos ter a visita da imperatriz ao protetorado. Por poucas horas, porque ela não tem tempo a perder, é só uma visita de soberania aos vassalos. Depois a vida continua (na mesma, isto é, sempre para pior).
            Só mais uma coisa: mesmo admitindo a adoção das medidas de segurança que estão previstas, quem vai pagar a fatura? Somos nós, os pelintras?




09 novembro 2012

 

Portugueses, acabaram os bifes!

Não é já o problema das vacas loucas. Não é um problema de saúde pública, é de austeridade financeira. A D. Isabel Jonet advertiu solenemente os portugueses: temos de assumir a nossa condição de pobres, mesmo na comida. Comer bifes pertence ao passado, comemos demasiados bifes, acima das nossa posses. Agora é voltar a um passado mais remoto, dos bons velhos tempos do Estado Novo:  comer batatas com couves, umas migas de pão, dividir uma sardinha por três bocas, enfim, alimentação saudável.
D. Isabel Jonet sabe lidar com os pobres e compreende os seus problemas e necessidades. Ela pertence àquele velho mundo dos chás de caridade, das reuniões das senhoras católicas amigas dos pobres, da conferência de S. Vicente de Paulo e outras instituições similares. Ela gosta dos pobres humildes, resignados, agradecidos das benesses da caridade. É para esses que ela trabalha. Os pobres não conformados, esses ela não os compreende e não os aceita. Que cada um assuma a sua condição! A pobreza, para ela, é um estatuto!

08 novembro 2012

 

Sobre a remuneração dos juízes

Hoje, na sua crónica semanal no "Público", o dr. Francisco Assis produz uma incrível e despudorada diatribe (ou "diabrite", como dizia um saudoso deputado já na situação de pensionista) sobre as afirmações do presidente da ASJP na AR sobre a remuneração dos juízes.
Transcrevo: "A cena ocorreu na AR. Um venerando juiz, presidente da associação que supostamente representa a corporação respetiva, produziu, com a transparência que o despudor permite, uma das mais extraordinárias afirmações dos últimos tempos: os juízes deste país, abaixo de uma certa remuneração, felizmente não publicamente quantificada, tornam-se permeáveis à corrupção. No entendimento deste senhor, a integridade moral e profissional dos nossos juízes depende do montante do salário que auferem. Numa sociedade sã esta declaração seria intolerável."
Pois bem. Numa sociedade sã e dotada de representantes lúcidos e responsáveis a posição tomada pelo dr. Assis seria não só intolerável, como repudiada frontalmente.
Para esclarecimento "deste senhor", aí vai a transcrição da parte da Carta Europeia sobre o Estatuto dos Juízes, aprovada pelo Conselho da Europa (essa instituição suspeita) relativa à remuneração dos juízes:
"6.1. O exercício a título profissional de funções judiciais dá direito a uma remuneração do juiz, cujo montante é fixado de forma a pô-lo ao abrigo de pressões visando influenciá-lo sobre o sentido das suas decisões e, mais em geral, sobre o seu comportamento jurisdicional afetando a sua independência e a sua imparcialidade.
6.2. A remuneração pode variar em função da antiguidade, da natureza das funções exercidas ou ainda da importância dos cargos.
6.3. O estatuto prevê a garantia do juiz contra os riscos sociais ligados à doença, à maternidade, à invalidez, à velhice e à morte.
6.4. Em particular, o estatuto assegura ao juiz que atingiu a idade legal de cessação de funções uma pensão de reforma cujo montante deve ser tão próximo quanto possível da sua última remuneração no ativo."
O Estatuto elaborado pelo CE é, pois, muito claro: a remuneração dos juízes deve ser suficiente para pô-los ao abrigo de pressões; a remuneração é condição essencial para a sua independência e imparcialidade. Foi precisamente isto que o presidente da ASJP foi dizer à AR: isto e nada mais.
Mas onde a crónica do dr. Assis ultrapassa as raias do intolerável é quando afirma: "A justiça está doente e essa doença prejudica o país em geral. Agora que se fala numa revisão constitucional por outros motivos talvez se deva colocar a questão de saber se não é precisamente no âmbito da justiça que ela mais se justifica."
Qual revisão? Como disse em tempos o João Correia, há em certos setores político-partidários, uma perigosa sanha anti-judicial. Perigosa porque anti-democrática (digo eu).

05 novembro 2012

 

Obama II

Amanhã os americanos lá vão a votos, num dia de semana, como é habitual, para desencorajar o mais possível as pessoas (pelo menos as que trabalham) de votar...
A reeleição de Obama não estará garantida, o que é um pouco estranho, já que normalmente os americanos dão dois mandatos aos presidentes, o que até é razoável. E se até Bush filho foi reeleito, que diabo, porque não o seria Obama?!
É claro que Obama apresenta alguns problemas para muitos americanos, a começar pela cor da pele. Tem também o handicap de ser muçulmamo (às escondidas) e de nem sequer ser americano... Os homens brancos não gostam mesmo dele... Tem de pescar votos no restante eleitorado.
Mas penso que acabará por ser reeleito. Tem a seu favor trunfos contraditórios. Para a direita conservadora mostra a cabeça de Bin Laden (e de mais três ou quatro esposas deste, também abatidas na mesma ocasião, e geralmente esquecidas), os drones, e a continuação indefinida de Guantánamo.
Para o resto do eleitorado, exibe a sua reforma da saúde, bem tímida em termos europeus, mas inovadora naquele país... Acenou também com algumas ideias simpáticas aos setores liberais, em matéria de droga, discriminação sexual, etc. Nada de concreto, é certo.
Para mim, o mais positivo do seu mandato foi a revogação da declaração de guerra ao terrorismo. Embora apenas no plano das ideias, uma vez que continua a guerra no Afeganistão e a permanente "pressão" (consintamos neste eufemismo) sobre o Paquistão, essa declaração esvaziou o arsenal ideológico dos falcões, hienas e chacais de todo o "Ocidente".
Enfim, não há dúvida de que Obama é preferível a Romney... E mais, no estado em que está a Europa, ele até aqui faria figura de "progressista"...
Deus (Jeová e Allah) o proteja.

04 novembro 2012

 

Preparem-se para "suster a respiração" durante anos!

Segundo a imprensa, a sra. Merkel, nossa tutora, avisou que a austeridade é ainda para durar cinco ou mais anos, período durante o qual deveremos "suster a respiração". Esperemos que se trate de ironia (mas ela não é forte nesse capítulo) ou de uma metáfora (mas ela também não é forte nesse registo). Porque, francamente, suster a respiração durante tanto tempo...

01 novembro 2012

 

O assalto final


 

Parece ter chegado a hora do assalto final. Agora trata-se de rever a Constituição, de repensar as funções do Estado, ou, por outras palavras, de proceder a uma refundação. Refundar o regime noutras bases. Muitos passos se têm dado já nesse sentido. Afanosamente. Com uma metódica fria, calculada, invertendo situações, anulando direitos (não todos, nem os de todos, mas tão-somente os da maioria, os que foram surgindo, esperançosamente, nestas derradeiras décadas após o “25 de Abril”, os chamados “direitos adquiridos”), esmagando a classe média, atirando as classes baixas para a miséria, alterando profundamente as relações sociais, de modo a instaurar outras onde predominem os interesses de certos estratos bem definidos, obrigando a grande massa da população a pagar uma crise provocada por quem maneja os cordelinhos do capital e da finança, com o pretexto de que se viveu (isto é, os da tal maioria viveram) acima das suas possibilidades.

Esta é, aliás, a política da “troika” para os países periféricos que mais têm sofrido a crise, que, como observa lucidamente Fernanda Palma (Correio da Manhã de 21/10/2012) tem origem no sistema económico europeu e na divisão de trabalho internacional. Não se trata de um problema de culpa, mas de irracionalidade económica. O discurso da culpa como causa não é racional, é mítico e destrói o respeito pela vontade de superação dos povos de países que enfrentam dificuldades em financiar-se.

No entanto, é esse o pensamento que os nossos dirigentes e os que comandam os destinos da União Europeia nos querem impingir (o da culpa imputada aos povos que viveram acima das suas possibilidades). Essa é a máscara da ideologia do pensamento único, que esconde os seus verdadeiros intentos de recomposição do capital internacional.

Como escreveu Henriques Gaspar, vice-presidente do Supremo Tribunal de Justiça, na sua notável comunicação apresentada no V Colóquio sobre direito do trabalho, realizado no STJ no passado dia 10 de Outubro: A naturalização da crise e a inevitabilidade das opções, afirmadas com força indiscutível no domínio dos factos, e a radicalidade na convicção da essencialidade das escolhas (e do modelo) como naturais e social e politicamente neutras («não há alternativa»), retira o carácter discutível e “por cause” político, de matérias e opções que, menos domináveis ou não domináveis no nível dos Estados (de cada Estado), são eminentemente escolhas com projecções no rearranjo das sociedades.

Pelo que nos toca particularmente, os nossos dirigentes devem ter agradecido profusamente aos deuses a oportunidade única da crise para, finalmente, darem efectividade ao tal «rearranjo da sociedade» há tanto tempo almejado, sob a capa da inevitabilidade das opções.  

Trata-se agora, de acordo com a “troika”, em consonância total de ideologias de parte a parte, de atacar a Constituição e as funções do Estado. Para que tudo fique perfeito, finalmente. E, “naturalmente”, como opção inevitável.

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