30 maio 2014

 

Mais um chumbo

O TC manteve, como não podia deixar de ser, a sua jurisprudência anterior. Não podia deixar de ser, mas é importante acentuar que têm fracassado todas as chantagens e todos os chantagistas que não perdoam ao TC que se assuma como um verdadeiro tribunal, vinculado à Constituição e não à (defunta?) troika... Não se percebe por que não pediu o PR a fiscalização preventiva... Aliás, percebeu-se: foi à espera da eficácia "ex tunc" do acórdão, que o TC concedeu, e que lá poupou muitos milhões ao orçamento, esvaziando esses milhões dos bolsos dos cidadãos... De salientar, mais uma vez, a distinção, clareza e objetividade com que o presidente do TC esclareceu o teor do acórdão no final da leitura, explicando inclusivamente muito bem que não estava ali para dar conferências de imprensa e responder a este ou àquele agente político, mas sim para, através dos jornalistas, informar os cidadãos... Nem mais!

29 maio 2014

 

Os grandes responsáveis


 

 

No rescaldo de eleições que demonstraram um grande descontentamento (e não me refiro a nenhum partido especial que supostamente concentrasse, em termos politicamente oposicionistas,  todo o universo de descontentes), em relação às políticas de austeridade que têm sido desenvolvidas, eis que se voltou, com renovado ímpeto, a apontar o bode expiatório do costume, mencionado como “os responsáveis que têm importantes decisões em mãos” e que podem estragar todo o trabalho que se tem feito. Já se sabe quem são esses responsáveis. Porém, a “bola” (passe a imagem futebolística) pode ser recambiada para o campo adversário nestes termos: lembrem-se os responsáveis da Nação que um dos primeiros deveres a cumprir é respeitar a Constituição e que, não a respeitando, o mais normal é que se sujeitem ao veredicto negativo dos “responsáveis que têm importantes decisões em mãos”.  

 

"Ser homem" à americana

John Kerry desafiou Snowden a "ser homem" e regressar aos EUA. Mas Kerry não prometeu "ser homem" e rebebê-lo como herói da liberdade que Snowden é... Snowden sabe que nos EUA será tratado como "traidor" e por isso certamente não embarcará em engodos tão primários...

27 maio 2014

 

O Papa e o muro

Ontem o "Público" trazia uma fotografia com uma carga política e simbólica tremenda: Francisco com a cabeça encostada ao muro, não o Muro das Lamentações dos judeus (onde ele também foi obviamente), mas o muro do apartheid que Israel impõe aos palestinianos, barrando-lhes a passagem com uma parede de betão com 8 metros de altura. A este muro nunca vão (apesar de saberem que ele existe) os dirigentes do muito democrático "Ocidente". Mas Fancisco foi, e nele meditou, mimetizando a atitude dos judeus no seu muro, assim implicitamente estabelecendo um paralelo entre o sofrimento imposto historicamente aos judeus e o sofrimento agora por estes imposto aos palestinianos, que nenhuma culpa tiveram na história da perseguição antissemita... Um gesto de um alcance político muito intenso. Francisco não tem medo de atitudes difíceis. Lembre-se que a sua primeira saída do Vaticano foi a Lampedusa.

26 maio 2014

 

O povo nunca se engana (?)

Os resultados das eleições de ontem são de análise relativamente simples: o governo (digamos assim para simplificar) ultrapassou sofrivelmente o teste... É inacreditável como um governo com uma política que basicamente prejudicou e empobreceu a grande maioria da população consegue um resultado acima dos 25%... Concordância ou resignação do povo? Mas que alternativa credível se apresentava? Esse é o ponto. Não há alternativa em Portugal... O PS é a continuidade, e aliás não consegue descolar dos partidos do governo. A CDU cresceu um bocadinho, mas isso altera alguma coisa? Enquanto não houver uma frente de esquerda com um programa mínimo que convença que pode vencer e que representa outra coisa, o eleitorado não se mobilizará sequer para ir votar em força... Já se sabe que a esquerda em Portugal é sectária e suicidária. Nem sequer foi possível fazer uma aliança entre o Livre, o BE e outras forças... A esquerda em Portugal nunca aprende. Para o ano teremos mais do mesmo: uma esquerda pulverizada, um PS medroso rendido a uma aliança dentro do "arco da governação", a tocar a mesma música... Isto na hipótese de o PS conseguir ficar em 1º, o que não é certo... Mas o mais interessante das eleições ontem foi sem dúvida a votação no "Partido da Terra"... De uma votação de 0,7 passou para 7,2%! O eleitorado deixou-se encantar com o programa eleitoral do partido? Não, ninguém conhecia tal programa, nem sequer alguma proposta concreta. O dito partido não tinha programa, tinha Marinho Pinto, que vale, para já, cerca de 7% do eleitorado, mesmo sem qualquer proposta concreta, sem qualquer ideia sobre a Europa ou Portugal... Notável! Um voto completamente em branco do eleitorado. A desilusão leva as pessoas a estas apostas no escuto. Pior ainda em muitos países da Europa, em que o descontentamento se manifesta na adesão aos partidos de extrema direita e xenófobos. Aqui, para já, temos este epifenómeno que valerá a pena analisar. Um sujeito subitamente desempregado, mas com largos contactos, conhecidíssimo do "povo" pela sua presença assídua, obsessiva, na TV na última década, bem falante, dizendo ao "povo" as coisas mais básicas e ocas, mas "populares", evitando completamente o compromisso com qualquer programa político, com qualquer projeto concreto, muito menos com qualquer ideologia que não seja um vago "humanismo" despolitizado, compondo e enfatizando um discurso assente apenas em pressupostos "morais", tal sujeito faz um pacto com um partido que encontra a uma qualquer esquina, um partido que se chama da Terra, mas que poderia ser do Mar, que ninguém conhece apesar de já se ter apresentado a eleições várias vezes, e fazem um contrato, válido por uma época eleitoral, no interesse de ambos. E ganham a aposta. O povo vai votar no sujeito, evidentemente, não no partido. Vamos ver se haverá revalidação do contrato. É duvidoso. O sujeito é muito maior que o partido... Agora terá talvez de dizer algumas coisas mais concretas. Mas talvez não. Ninguém sabe o que fazem os deputados no Parlamento Europeu. Se o povo soubesse, o Livre, com Rui Tavares, teria suplantado em muito o partido da Terra... E dizem que o povo nunca se engana...

25 maio 2014

 

O grande vencedor das eleições


 

 

O grande vencedor das eleições europeias foi a abstenção.

Que outra coisa seria de esperar, se a União Europeia é tão escassa em democracia e nunca fomentou verdadeiramente um processo democrático? Se a maior parte das decisões mais relevantes têm sido tomadas nas costas dos cidadãos europeus? Se os principais dirigentes da União têm demonstrado tanto medo do voto popular, sonegando-o o mais que podem, a pretexto da tecinicidade das matérias, despolitizando-as?

Que outra coisa seria de esperar, se os pequenos países como Portugal, os países periféricos, pouco contam na estrutura da União? Se a União é, actualmente, o produto de um quase “diktat” do país que, para ser domado (ou, para empregar uma linguagem mais suave, “para ser integrado num bloco pacífico”) mais determinou os fundadores da mesma União a criá-la?

Que outra coisa seria de esperar, se a União Europeia é uma real desunião de Estados, cada qual deles lutando pelos seus interesses egoístas e adoptando como lema de fachada a consigna da solidariedade?

Que outra coisa seria de esperar, se os países que se armam de “os bons da Europa” tanto causticaram os países periféricos, como Portugal, esmagando-os sob o peso de uma austeridade férrea, ainda por cima com o sobranceiro pretexto moralista de viverem acima das suas possibilidades?

Que outra coisa seria de esperar, se a política caseira tem  sido de apoio férreo a essa férrea austeridade que nos impuseram os nossos aliados credores e se grande parte das pessoas não enxerga alternativa viável para esta deprimente situação?

A abstenção é uma tomada de posição. Aparentemente, corresponde a uma despolitização ou falta de interesse, mas há responsáveis por isso, tanto na chamada União, como aqui.

15 maio 2014

 

O grande tema político


O grande partido da comunicação social, em especial da rádio e da televisão, é o futebol. Em dias de futebol (e é praticamente dia sim, dia não), o espaço radiofónico e televisivo fica totalmente ocupado com o desporto-rei. Não é só  a transmissão do jogo, mas também a expectativa do grande momento, os palpites,  as conversas fiadas, os fóruns, a preencherem as longas horas que antecedem o espectáculo e, depois de este ter acabado, mais conversa fiada, mais entrevistas, mais futebol retórico, mais imagens da multidão e de sequências do jogo, mais bandeiras a agitarem-se no ar ou de pendão caído, isto assim pela noite fora, até os noticiários ou os telejornais, retardados, começarem finalmente a ser emitidos, abrindo com mais baboseira sobre futebol, mais imagens repetidas de sequências do jogo, mais entrevistas e a Ucrânia pelo meio, uma ou outra notícia caseira e, finalmente, regresso ao futebol, a terminar.

No dia seguinte, mais mesas redondas sobre o jogo da véspera, mais auscultações dos rádio-ouvintes, mais imagens televisivas e as primeiras páginas dos jornais ocupadas com o evento futebolísitico.

O futebol é o grande tema político da actualidade.

12 maio 2014

 

Um herói do nosso tempo

A entrevista televisiva do menino Moedas deu-nos a verdadeira dimensão desta figura cimeira da nossa "intelligentsia", que nós não temos valorizado devidamente. Nascido em chão alentejano, depressa procurou a capital, pois altos eram os seus projetos. Não se contentou, porém, como tantos, com a nossa provinciana capital, onde só recebia uns trocos. Tomou o rumo de Paris, onde começou a servir com sucesso no "privado", sua raiz e pátria. Mas esse sucesso não o podia satisfazer. Mais longe, mais alto, era o seu lema. Por isso voou para o outro lado do Atlâncito (norte, evidentemente), onde bate o coração do capitalismo. Aí tirou um MBA e depois entrou nesse mundo acessível a poucos, só aos melhores, o do GoldenSachs (penso que é assim que se chama uma das mais sinistras instituições bancárias...). Voltou a Portugal porque o "dever" o chamava. Isto é, o dever de arrasar o Estado. Cumprida a missão, voltará para o "privado", a que ele pertence por alma e coração...

06 maio 2014

 

O segredo do êxito


Como já era esperado, foi decidido termos uma “saída limpa” do “programa de emergência” da “troika”. Tão esperado, que até me parece que o facto nem é notícia e a decisão, nem verdadeiramente é decisão, livre e autónoma, como deve ser uma decisão. Adaptando o título célebre de um livro de Gabriel Garcia Márquez, que recentemente nos abandonou para sempre, digamos que a tal notícia é a «crónica de uma limpeza anunciada” e a decisão é, mais ou menos, a de quem nos queria ver pelas costas, depois de termos sido submetidos a uma boa operação de “limpeza”.

No âmbito doméstico, o êxito da barrela foi atribuído a todos nós, que suportámos estoicamente o enérgico esfreganço com que, generosamente, nos limparam o “sebo” (ou as “gorduras”, numa outra versão da linguagem tão densa de metáforas, que tem feito carreira com grande sucesso).

No plano externo, vieram algumas excelências dar-nos os parabéns por termos tão escrupulosamente cumprido o programa de “limpeza” e mostrado ao mundo que o austero detergente empregue, com particular empenho europeu, é uma marca que se recomenda.

Aconselham, no entanto, os nossos parceiros que tenhamos prudência e, sobretudo, que não se abra mão das conquistas alcançadas em matéria de limpeza, nomeadamente na área das pensões e dos salários da função pública, e ainda que eliminemos os factores de rigidez que permanecem na economia portuguesa, conforme se lê hoje no Público.

Com efeito, estes são os três grandes vectores do êxito da limpeza: pensões, salários da função pública e a rigidez que permanece na economia, ou seja, aquilo que impede o mercado de trabalho de ser tão flexível como seria desejável, não sei se entendem.

 

Nem limpa nem sequer saída

O anúncio solene da "saída limpa" não trouxe nada de novo. Há muito se sabia que essa era a "saída alemã". A Alemanha (e o Zona Euro que ela comanda) precisa de apresentar "bons exemplos", nunca insucessos. A Alemanha não podia aceitar uma saída oficialmente suja, porque isso seria reconhecer que tinha imposto uma política errada a Portugal, seria reconhecer que a austeridade não é solução... Isso nunca! O governo português não escolheu nada, tudo foi escolhido em Berlim. O discurso de "vitória" do "nosso" PM foi igual ao do homólogo irlandês porque ambos foram escritos em Berlim. Mas, para que não houvesse ambiguidades indesejáveis, o nosso governo vai ter de escrever uma "carta de intenções" a dizer que a austeridade (que será chamada "política reformista" ou coisa parecida) vai continuar exatamente na mesma. Escrever é uma forma de dizer... Vai ter de traduzir a minuta que lhe mandarem, depois assiná-la e a seguir publicitá-la como própria...

01 maio 2014

 

Reposição


O Primeiro Ministro afirmou, recentemente, por várias vezes, inclusive nos debates com os partidos na Assembleia da República, que não mais se regressaria ao nível salarial de 2011.

Há dias, a propósito da apresentação do DEO (para quem não sabe:  Documento de Estratégia Orçamental. Laus Deo! Esta maldita linguagem das siglas!), a ministra das Finanças anunciou que os salários vão ser repostos até 2020. Neste jogo em que temos andado do diz hoje uma coisa e amanhã outra, nesta incerteza que se faz pairar sobre a cabeça dos portugueses, afirmando-se num dia o que vai ser negado no outro, ou vice-versa, até parece que a afirmação da ministra das Finanças é o contrário do que disse o PM e que há nisso um volte-face esperançoso, o que quadraria muito bem com a época de eleições que se avizinha e o regresso das promessas, que são o chupa-chupa que se dá aos eleitores. Os salários vão ser repostos.

Uma análise mais fria mostra, porém, que essa palavra – “reposição” – é mais um termo de engodo da chamada novilíngua. Na verdade, não se trata de uma reposição. Trata-se, muito simplesmente, da confirmação de que o que se perdeu nos salários, a título provisório (na linguagem da altura), ser afinal definitivo e, a partir de 2015 (segundo a promessa mais recente) ir-se aumentando o nível salarial de uma forma prefixada para cada ano, de forma que, em 2020, se fique a ganhar o mesmo que em 2011. Bonito, não é? Quantos anos de sonegação de salários é que isto representa?

 

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