13 março 2006

 

As mães de Bragança, o IRS, o MJ e o MP



Quem for hoje ao sítio do Ministério da Justiça pode deparar com uma notícia intitulada «Esclarecimento – Mães de Bragança». Curioso sobre a razão de ministeriais comunicados relativos ou dirigidos a «mães de Bragança», lá fiz o necessário clique e constato que afinal a notícia é sobre «as notícias relativas à fuga de um arguido com pulseira electrónica, no âmbito do caso conhecido como Mães de Bragança».
Mas a expectativa de algo de estranho afinal não é desmentida, pois no «comunicado de imprensa» afirma-se que:
«1. O Ministério da Justiça recebeu do Instituto de Reinserção Social (IRS) o relatório com todas as informações sobre este caso de onde resulta não ter existido qualquer falha nos procedimentos e na qualidade no sistema de vigilância electrónica pelo qual é responsável.
2. No mesmo relatório apuraram-se indícios da eventual falha de procedimentos por parte do Ministério Público, fundamentais para a garantia da aplicação da medida de coacção decidida pelo Tribunal.»

O que se estranha, obviamente, não é a susceptibilidade de ocorrer num processo (aliás em múltiplos) uma «falha de procedimento» do Ministério Público, mas um ministerial comunicado a referir de forma assertiva, sem, sequer, a concretizar.
Total e absoluta ausência de factos e dois juízos de valor: (a) não se verificou «qualquer falha» do IRS, (b) ocorreu «uma falha de procedimentos» do MP.
Acresce que no «Kit» do IRS sobre a vigilância electrónica, destaca-se em vários passos, o protagonismo do IRS, enfatizando-se que «A entidade competente para executar a VE é o IRS que, para tal, recorreu à contratação aos serviços de uma empresa privada para instalar, assegurar e manter o funcionamento dos meios telemáticos. O IRS elabora e transmite de imediato ao juiz informação sempre que ocorram circunstâncias susceptíveis de justificar uma intervenção judicial». Brochura de 11 páginas bem preenchidas de texto em que apenas se detectam duas referências ao MP ambas no mesmo parágrafo: «A decisão compete ao juiz durante o inquérito, na sequência de requerimento do Ministério Público ou do arguido e depois do inquérito mesmo oficiosamente, ouvido o Ministério Público» (pag. 6).
O facto do «kit» do IRS centralizar toda a responsabilidade pela execução da vigilância electrónica nesse mesmo IRS, não me parece que à partida exclua uma eventual responsabilidade do MP (aliás a confrontação do regime da vigilância electrónica e da lei processual permite constatar que o «Kit» do IRS estará longe de... ser exaustivo em questões de procedimentos necessários).
Mas parece verificar-se uma eventual «falha de procedimento» no comunicado de imprensa datado de 11 de Março, não só relativamente a regras que julgava estabelecidas no plano da ética da comunicação de instituições do Estado (e nas referências recíprocas), como em sede genérica de imputações. Esta suposção, se calhar não passa de uma susceptibilidade derivada de deformação profissional: pensar que as imputações devem, não só ser precedidas do cumprimento de regras procedimentais, como compreender factos (para que possam não só ser confirmadas como contraditadas).





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