25 abril 2009

 

O meu 25 de Abril

O meu 25 de Abril foi assim:
Eu estava na Guiné, colocado na Base Aérea de Bissalanca, a 8 km de Bissau, onde vivia.
Naquele dia, como habitualmente, fui na carrinha militar para a Base, pelas 8,30. Tudo dentro da normalidade.
Cerca da 10,30 entra-me um colega pelo gabinete e diz-me "Parece que há uma revolução em Lisboa." Respondi-lhe: "Estás a gozar!". Um mês antes tinha abortado o golpe das Caldas e eu e muita gente ficara a pensar que o regime saíra fortalecido e capaz de durar mais uns tantos anos. Mas ele respondeu: "Não estou a gozar, parece que há uma revolução em Lisboa." Entretanto, pelas 11 h, abriu o bar e para lá nos dirigimos e juntámos com outros milicianos. Sintonizámos a Emissora Nacional (não havia televisão na Guiné). Estava a transmitir música clássica... Nenhuma voz, nenhum locutor a intervir, música e mais música clássica. Não era seguramente a programação normal do canal 1 da Emissora... Algo estava a passar-se... Especulámos: seria realmente uma revolução? Que revolução? Seria a "revolução" do Kaúlza? De um movimento militar não podia vir nada de bom...
A discussão continuou durante o almoço. De vários lados vinham rumores de que havia mesmo um golpe militar. Da parte da tarde já não se fez nada obviamente. Mas não havia certezas de nada, a rádio continuava a dar-nos música... Todas as especulações eram legítimas. Mas a vida na Base continuava aparentemente na mesma. À hora do costume regressei a Bissau na carrinha militar. Ao jantar, na messe, não se falava de mais nada, claro. Mas nada se sabia de concreto. A revolução triunfara de facto? E sobretudo: que revolução?
Só quando, algumas horas depois, já não sei precisar, apareceu na rádio a voz de um tal Vítor Alves, em nome do Movimento das Forças Armadas, a anunciar a vitória do golpe e a ler o programa do movimento, onde se falava em democracia, etc., ficámos convictos de que tínhamos de facto revolução.
Uma nova era se abria na história de Portugal. O regime, que parecia eterno e até recentemente reforçado, caíra de uma vez por todas! Estávamos em democracia!!! O sonho realizado assim de repente e na nossa ausência! Era tudo estranho, ainda incerto, não me lembro de ninguém comemorar, de se abrir uma garrafa...
Regressando a casa, na noite tranquila e quente de Bissau, essa revolução parecia-me irreal, uma coisa distante, se não uma miragem.
Depois, nos dias seguintes, foi uma catadupa de notícias, chegaram os primeiros jornais sem censura, sempre era certo que já não havia ditadura.
Foi assim, aos poucos, por sedimentação de indícios e provas, que me fui convencendo de que tinha havido uma revolução.
Foi este o 25 de Abril que me coube.





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