10 fevereiro 2012
Os compromissos são para ser honrados
Os compromissos são para ser honrados e nós honramos os nossos! Estas palavras têm vindo a
ser repetidas pelo nosso Primeiro Ministro que insiste em garantir aos investidores de dívida portuguesa que não vai haver qualquer renegociação como está a ocorrer na Grécia.
No que toca a compromissos internos, já não há qualquer garantia, pois na verdade, para honrar os ditos compromissos externos é preciso tirar a alguém, internamente. Os infelizes ontemplados foram os trabalhadores, que viram os seus salários serem reduzidos em dois-catorze-avos com a erradicação dos subsídios de férias e de Natal.
Seja como for, vale a pena o esforço em nome da nação e da nossa honra. Hmmmm! Será mesmo?
Como é do conhecimento de todos, o actual Governo tem reduzido postos de trabalho e diminuído os salários da função pública (retirando os subsídios). Muitos portugueses que trabalham no sector privado talvez se regozijem com as perdas dos seus compatriotas do sector público, como se a desgraça dos outros lhes enchesse a mesa. E que muitos dos que perderam os subsídios no sector público exijam que a medida se estenda a todos os portugueses, como se a pobreza dos outros os enriquecesse. Tem-se perdido muito tempo a apontar o dedo uns aos
outros. O Governo conseguiu colocar os portugueses uns contra os outros para que se esquecessem da realidade. A realidade da incompetência negocial com a troica e da ingenuidade de acreditar que estamos no caminho certo.
Em 2010 o Estado gastou 10,8 mil milhões de euros na categoria Pessoal. Em 2011 gastou 9,6 mil milhões e projecta-se um gasto de 8,8 mil milhões para este ano. Ao mesmo tempo, em 2010
gastou-se 5,5 mil milhões em juros, 6,3 mil milhões em 2011 e projecta-se um gasto de 8 mil milhões para este ano. Enquanto houve uma poupança de 2 mil milhões com Pessoal, os juros aumentaram 2,5 mil milhões. Só neste ano de 2012, projecta-se um aumento de 1.7 mil milhões.
Era suposto que a ajuda financeira oriunda da UE nos ajudasse a redenominar a anterior dívida, ou seja, usar os novos fundos para refinanciar a dívida a uma taxa de juro mais baixa. A aceitação de uma série de medidas de austeridade tem por função dar garantias aos novos credores, para que estes aceitem conceder um empréstimo a uma taxa de juro mais favorável. Mas, embora isso tenha acontecido, Portugal continua a financiar-se no mercado secundário a taxas escabrosas. Basicamente o ganho monetário decorrente da supressão de trabalhadores e subsídios serve para pagar o acréscimo dos juros decorrente da especulação. O esforço não serve para nada, pois o Estado não tomou medidas para evitar este descalabro. Assim, quando nos dizem que é um esforço que precisamos fazer, ou nos enganam, ou são ingénuos.
A negociação tripartida foi um insucesso. Os nossos líderes tinham a obrigação de garantir que o esforço dos portugueses valeria a pena. Isso significava garantir que a austeridade não seria canalizada para o pagamento de juros especulativos. Garantir que ela serviria para diminuir a nossa dívida. Ao negociar os empréstimos da EU,aceitamos uma série de medidas austeras. Ao mesmo tempo, devíamos ter exigido os montantes necessários para não ir ao mercado secundário em situação alguma.
Isto cortaria o link especulativo e deixar-nos-ia concentrar no real problema. A situação actual é
insustentável. O Estado vai conseguir diminuir o défice à custa do aumento da receita da venda de património até que não reste uma pedra na calçada. Os salários vão continuar a diminuir, as exigências vão ser cada vez maiores, a recessão mais profunda, e o défice cada vez mais difícil de cumprir. Assim, terei de concluir que o esforço dos portugueses de nada vale. O ganho vai parar às mãos de especuladores, numa catastrófica transferência de riqueza do trabalho para o
capital. Concordo que os compromissos são para ser honrados, mas não cegamente. Se podemos atravessar a linha quando o comboio não está a passar, porquê metermo-nos debaixo dele, suicidariamente?
Filipe Costa
ser repetidas pelo nosso Primeiro Ministro que insiste em garantir aos investidores de dívida portuguesa que não vai haver qualquer renegociação como está a ocorrer na Grécia.
No que toca a compromissos internos, já não há qualquer garantia, pois na verdade, para honrar os ditos compromissos externos é preciso tirar a alguém, internamente. Os infelizes ontemplados foram os trabalhadores, que viram os seus salários serem reduzidos em dois-catorze-avos com a erradicação dos subsídios de férias e de Natal.
Seja como for, vale a pena o esforço em nome da nação e da nossa honra. Hmmmm! Será mesmo?
Como é do conhecimento de todos, o actual Governo tem reduzido postos de trabalho e diminuído os salários da função pública (retirando os subsídios). Muitos portugueses que trabalham no sector privado talvez se regozijem com as perdas dos seus compatriotas do sector público, como se a desgraça dos outros lhes enchesse a mesa. E que muitos dos que perderam os subsídios no sector público exijam que a medida se estenda a todos os portugueses, como se a pobreza dos outros os enriquecesse. Tem-se perdido muito tempo a apontar o dedo uns aos
outros. O Governo conseguiu colocar os portugueses uns contra os outros para que se esquecessem da realidade. A realidade da incompetência negocial com a troica e da ingenuidade de acreditar que estamos no caminho certo.
Em 2010 o Estado gastou 10,8 mil milhões de euros na categoria Pessoal. Em 2011 gastou 9,6 mil milhões e projecta-se um gasto de 8,8 mil milhões para este ano. Ao mesmo tempo, em 2010
gastou-se 5,5 mil milhões em juros, 6,3 mil milhões em 2011 e projecta-se um gasto de 8 mil milhões para este ano. Enquanto houve uma poupança de 2 mil milhões com Pessoal, os juros aumentaram 2,5 mil milhões. Só neste ano de 2012, projecta-se um aumento de 1.7 mil milhões.
Era suposto que a ajuda financeira oriunda da UE nos ajudasse a redenominar a anterior dívida, ou seja, usar os novos fundos para refinanciar a dívida a uma taxa de juro mais baixa. A aceitação de uma série de medidas de austeridade tem por função dar garantias aos novos credores, para que estes aceitem conceder um empréstimo a uma taxa de juro mais favorável. Mas, embora isso tenha acontecido, Portugal continua a financiar-se no mercado secundário a taxas escabrosas. Basicamente o ganho monetário decorrente da supressão de trabalhadores e subsídios serve para pagar o acréscimo dos juros decorrente da especulação. O esforço não serve para nada, pois o Estado não tomou medidas para evitar este descalabro. Assim, quando nos dizem que é um esforço que precisamos fazer, ou nos enganam, ou são ingénuos.
A negociação tripartida foi um insucesso. Os nossos líderes tinham a obrigação de garantir que o esforço dos portugueses valeria a pena. Isso significava garantir que a austeridade não seria canalizada para o pagamento de juros especulativos. Garantir que ela serviria para diminuir a nossa dívida. Ao negociar os empréstimos da EU,aceitamos uma série de medidas austeras. Ao mesmo tempo, devíamos ter exigido os montantes necessários para não ir ao mercado secundário em situação alguma.
Isto cortaria o link especulativo e deixar-nos-ia concentrar no real problema. A situação actual é
insustentável. O Estado vai conseguir diminuir o défice à custa do aumento da receita da venda de património até que não reste uma pedra na calçada. Os salários vão continuar a diminuir, as exigências vão ser cada vez maiores, a recessão mais profunda, e o défice cada vez mais difícil de cumprir. Assim, terei de concluir que o esforço dos portugueses de nada vale. O ganho vai parar às mãos de especuladores, numa catastrófica transferência de riqueza do trabalho para o
capital. Concordo que os compromissos são para ser honrados, mas não cegamente. Se podemos atravessar a linha quando o comboio não está a passar, porquê metermo-nos debaixo dele, suicidariamente?
Filipe Costa