13 maio 2012
Três mortes recentes
Num curto espaço de tempo
desapareceram do nosso horizonte três pessoas marcantes: Miguel Portas,
Fernando Lopes e Bernardo Sassetti.
De Miguel Portas pouco sabia, a
não ser do seu trajecto político e da paixão com que defendia as suas ideias e
da cultura que ostentava. Apreciei, sobretudo, a sua coragem diante da doença e
da morte, a sua serenidade, a forma como se despediu, sem ressentimento, sem
mágoa, com a consciência de ter cumprido limpamente o seu papel e, por isso,
sem remorso algum, antes transmitindo a sensação de ter vivido a sua curta vida
em plenitude e em concordância, não só com os seus ideais, mas também com uma
forma confortável (embora combativa) e feliz de estar no mundo.
Um exemplo, sem dúvida.
Fernando Lopes, um dos
renovadores fundamentais do panorama cinematográfico português. Juntamente com
um punhado de intelectuais e de artistas animados de uma outra consciência da
realidade portuguesa, contribuiu poderosamente para uma outra visão da nossa
cultura, do nosso país e do nosso povo – uma visão não enfeudada ao
provincianismo reinante e aos constrangimentos (culturais, morais, ideológicos,
estéticos) impostos pela ditadura. Do mesmo passo, renovou os processos de
fazer cinema em Portugal.
Aprendemos com ele a ver cinema,
crescemos culturalmente com ele. Ele foi-se tornando uma figura familiar para a
minha geração, mesmo no sentido afectivo, desde os tempos da Universidade até
ao presente. O seu último filme, “Em Câmara Lenta”, tem o sabor de uma
comovente despedida e, ao mesmo tempo, de uma lúcida análise de um certo tipo
de homem português, onde ele próprio se não terá furtado a uma fria e
desencantada autocontemplação.
Uma perda que mortifica.
Finalmente, Bernardo Sassetti. Um
jovem de uma geração completamente diferente da minha. Uma morte que me tocou
profundamente, nem eu sei bem porquê. Talvez por ser jovem. Talvez por a morte
ter revelado aqui a sua face de profunda injustiça. Ou talvez por ter levado a
sua paixão pela vida até ao ponto de tocar o ponto mais extremo onde a morte
espreita voluptuosamente as suas vítimas. Ou talvez, sobretudo, pelos acordes
do seu piano, o som obsidiante da sua música a invadir-nos por todos os lados,
a submergir-nos num mar por onde nos vamos deixando levar até uma zona
inacessível onde a morte se transforma numa nostalgia infinita.