11 setembro 2012

 

As medidas draconianas


 

Como já se esperava, o primeiro-ministro veio anunciar a inflição de medidas de austeridade mais gravosas.

Como já se esperava, o alvo dessas medidas são os mesmos estratos da população portuguesa que os têm vindo a suportar desde o início. Fundamentalmente, os trabalhadores por conta de outrem, tanto do sector privado como “do sector público”, com as devidas excepções, que, segundo consta, já são mais do que as inicialmente previstas e, pela experiência que temos, podem ainda aumentar. Excepções que, por sinal, contemplam pessoas de chorudos vencimentos.

O que não se esperava (ou não se acreditava) é que as medidas fossem tão chocantemente gravosas e tão chocantemente discriminatórias. E que fossem anunciadas durante a estadia fiscalizadora da troika, antes mesmo de esta tirar qualquer conclusão, numa espécie de antecipação destinada a surpreender, pelo arrojo, o próprio fiscalizador. Uma atitude de mais do que de “bom aluno”, mas de aluno obcecado com o desejo de agradar. Ou então, se não é isso, com a demonstração de que é “mais papista do que o papa” (melhor seria dizer, do que o papão).

Tomei conhecimento das medidas draconianas em Espanha, onde me encontrava. As televisões e os jornais não falavam de outra coisa, na abertura dos telejornais e na primeira página dos periódicos. O “El País” de sábado passado, por exemplo, ocupava uma boa parte da 1.ª página, com uma grande “caixa”: Portugal impone un recorte general de sueldos para cumplir el deficit”. E a 2.º e a 3.ª páginas estavam totalmente preenchidas com a notícia surpreendente: Portugal se hunde en la austeridade, dedicando largo espaço às medidas anunciadas por el primeiro ministro português, el conservador Pedro Passos Coelho, apresentado como “Más “troikista” que la troika” e onde Portugal era apontado como campeón de la austeridade y las reformas (…) en parte por razones ideológicas (…) en parte para destacar-se como el alumno aventajado de essas politicas.

Quando cá cheguei, vi com detalhe a dimensão do catastrófico anúncio.

Lê-se e não se acredita.

As medidas têm, mais do que nunca, um recorte classista (ainda hoje o reconheceu o insuspeito Bagão Félix), atingindo, pela enésima vez, os sacrificados de sempre, mas com uma mais vincada deliberação de esmagar os trabalhadores, os funcionários públicos, as classes médias, em descarado proveito do capital. Como se já não bastasse o destroçamento da legislação laboral, agora ultrapassam-se todos os limites, surripiando-se ainda mais nos magríssimos salários para depor a parte surripiada nos cofres dos que têm escapado às medidas de austeridade. Assim acontece com a taxa social única (TSU).

E, para além disso, continuam a discriminar-se os funcionários públicos e os pensionistas em relação aos restantes trabalhadores e todos, em relação aos titulares de outros rendimentos, numa linha francamente colidente com a argumentação do acórdão do Tribunal Constitucional. Até parece que há aqui uma vontade de afrontar aquele órgão de soberania, como se se quisesse provocá-lo a uma nova tomada de posição, que não pode ser outra senão a de reincidir no já decidido, com eventual adaptação da argumentação já expendida, para depois o acusar de obstrução.

Com efeito, seria uma quase injúria considerar que os autores das medidas anunciadas sofrem de ineptidão para interpretar convenientemente o texto do referido acórdão.





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