19 junho 2017
A tragédia de Pedrógão
Uma
vez escrevi, a propósito dos incêndios, que “o nosso país era
mesmo para arder”. Claro que uma afirmação destas não é para
tomar a sério. O seu objectivo é, por um lado, chocar e, por outro,
exprimir um desalento. Porque se trata de desalento este sentimento
que nos acompanha ao vermos o país arder metodicamente, anualmente,
imparavelmente, como se fosse uma fatalidade. Eu estava muito longe
de pensar que aquela afirmação pudesse corresponder a uma realidade
em que o país se fosse reduzindo a cinzas, mas com a tragédia
destes últimos dias ficámos todos com a sensação de que o país
vai mesmo no caminho da incineração total. O país arde. E não é
só a floresta que se vai dizimando (o que, de si, já seria uma
tragédia incomensurável), mas também as casas, os veículos, os
animais e as pessoas.
Por
sobre ou por sob essa tragédia de efeitos bem palpáveis e
dolorosos, uma outra tragédia se vai cimentando – a da falta de
acção, pelo menos de acção eficaz. Há dezenas de anos que se
fazem relatórios, diagnósticos, declarações de peritos, planos de
acção, e os incêndios continuam imperturbavelmente, porventura com
mais sanha de ano para ano, a sua obra de destruição. É
exasperante continuarmos por estes dias a ouvir as mesmas coisas que
se ouviam há trinta anos. Nem os factores naturais que terão
intervindo neste caso de forma excepcional nos dão suficiente
guarida. Que os mortos sirvam (se assim podem ser instrumentalizados
sem ofensa ao nosso pudor) para mais do que lamentação e apelo à
solidariedade com as famílias enlutadas.