01 outubro 2006

 

Um editorial modelar

Entendo que qualquer cidadão é livre de questionar a legitimidade democrática do presidente do Supremo Tribunal de Justiça, pois esse não é seguramente um assunto que diga apenas respeito a umas escassas centenas de juízes.
Qualquer cidadão é livre de manifestar a sua opinião e de discordar da estreiteza e da natureza do colégio que elege a 4.ª figura do Estado, por inerência também presidente de um relevantíssimo órgão, como é o Conselho Superior da Magistratura.
Qualquer cidadão pode criticar a forma como decorreu um concreto acto eleitoral para a eleição do presidente do mais alto tribunal do país e lamentar a falta de verdadeira disputa democrática que possa ter afectado esse acto.
É legítimo que qualquer cidadão se possa inteirar das qualidades pessoais de determinado candidato ao referido cargo, apresentando uma perspectiva crítica do perfil desse candidato, pois o lugar que ele pretende alcançar não se confunde com o de simples presidente de um agrupamento profissional.
Pode mesmo um cidadão qualquer dar uma imagem polémica, com traços de contundência, daquele que se apresenta a disputar ou que acabou de vencer uma eleição, sem concorrentes, para o lugar de presidente do Supremo Tribunal de Justiça. E pode criticar e mesmo reduzir a ridículo o programa com que esse candidato se apresentou à eleição, daí deduzindo o amorfismo ou o passadismo do colégio que o elegeu com tal programa.
Tudo isso é legítimo, desde que esse cidadão esteja de boa-fé e exerça fundamentadamente a sua crítica. Mais: esse será um sinal positivo enquanto evidenciador do interesse dos cidadãos por um acto, que sendo da «polis», pouco interesse suscita normalmente, reflectindo um alheamento colectivo em relação a este tipo de questões.
O que não pode de maneira nenhuma aceitar-se é que o director de um jornal como o Público faça editoriais como aquele que assinou na última sexta-feira. Um editorial que desonra não só quem o assina, como constitui «um exemplo de delinquência deontológica», para empregar aqui a expressão de um prezado amigo que é um grande jornalista, referindo-se a tal escrito. Mas não só de delinquência deontológica; também de delinquência criminal. E não se invoque aqui a liberdade de imprensa, nem se mascarem actos tais com o estatuto moral da coragem.





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