12 fevereiro 2007

 

Cinquenta e seis por cento.

Cerca de cinquenta e seis em cada cem cidadãs e cidadãos deste país entenderam que nada tinham a dizer sobre a pergunta que lhes foi colocada ontem. Cinquenta e seis pessoas em cem entenderam, porventura, que a questão que lhes era pública e oficialmente dirigida não era de tal modo importante que justificasse uma saída à rua e uns pingos de chuva. Parece-me dramático, do ponto de vista da responsabilidade cívica e política, que essas cinquenta e seis pessoas pensem que uma questão como a da despenalização do aborto, nas circunstâncias enunciadas, nada lhes diz respeito e que deixem aos demais a resposta definitiva sobre o assunto. Reflecte, a meu ver e apesar de tudo, a cinzenta apatia da sociedade portuguesa que, mesmo quando solenemente chamada a intervir, não é, na sua maioria, capaz de agir.
De todo o modo, a verdade é que três milhões, oitocentos e cinquenta e um mil, seiscentos e treze cidadãs e cidadaõs entenderam ter uma palavra a dizer. E felizmente que a maior parte daquelas e daqueles percebeu o que realmente se discutia e considerou que não existe espaço, num Código Penal democrático, para a criminalização de condutas cuja valoração passa, essencialmente, pela ordem moral pessoal e não pela óptica valorativa de cariz constitucional. Cumpre, agora, com redobrada razão, colocar algumas destas questões e dar-lhes solução legal rápida e adequada.
Para além disso, a resposta ao referendo é, a meu ver, um passo que denota, ainda que com necessidade de recurso a uma discutível legitimidade popular referendária, um evidente distanciamento do Estado face à doutrina da Igreja Católica no plano das relações familiares, que, de um ponto de vista optimista, augura um aprofundamento da legalidade laica e um recuo saudável do Estado face a uma moral religiosa, seguramente não unânime.





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