12 novembro 2007

 

Diálogos entre George Bush e Condoleeza Rice (1)

Na Sala Oval


B.: Mandei-te chamar porque preciso de falar contigo a sós e nas calmas. Tenho de me abrir contigo, já não tenho confiança em mais ninguém. Não, não me interrompas, esta é a verdade e eu preciso agora de esvaziar o saco, deixa-me falar. A questão é esta: aproxima-se o fim do meu mandato, do segundo e último, e tudo vai de mal a pior. Eu, que estava convencido, porque aliás era o que todos me diziam, que ia marcar, com a minha política e visão do mundo, todo o sec. XXI, vejo-me agora acossado e abandonado. Uns vão porque querem ir, outros sou eu que tenho de os mandar embora. Aquela notável equipa, deixa-me falar assim, que reuni à minha volta desfez-se: o Paul, o Donald, o Karl, o Alberto, enfim e muitos outros. Só ficou o Dick, claro, esse não se pode ir embora, antes fosse, já estou farto dele, só tem ideias parvas e depois eu é que as pago, sobre mim é que recaem as consequências! E é claro que estás também tu, estás desde a primeira hora e espero que estejas até ao fim… (hesitação) Não dizes nada?...
R.: Mandou-me calar no início, de forma que estou a ouvir…
B.: Tu és muito esperta, não há dúvida! Em todo o caso podias ter dito qualquer coisa de animador, mas enfim, tu és mesmo assim, sempre muito profissional, muito fria, ao menos aparentemente, não sei lá muito bem se isso é só por fora e por dentro tu, enfim…
R.: Se continuássemos o assunto que o levou a convocar-me?...
B.: Já vou, já vou, tu não perdoas nada, mas eu gosto mesmo de ti assim, dás-me confiança, só em ti é que a posso ter. E era aí que eu queria chegar. Tens que me valer! O meu mandato está a chegar ao fim e arrisco-me a ficar conhecido como o pior presi-dente de toda a nossa história, o que é pior do que ficar desconhecido! Por isso tenho que fazer qualquer coisa, qualquer coisa que deixe a minha marca, estar a perceber? Foi para isso que te chamei, para ver se tens alguma ideia que não seja disparatada, como as do Dick, que me traz todos os dias listas de países a bombardear ou invadir…
R.: Vivemos momentos muito difíceis…
B.: A quem o dizes!
R.: …e temos que ser cautelosos, usar mais a diplomacia do que antes, conversar, negociar…
B.: Mas com quem vamos nós conversar? Com os aliados? A esses damos ordens! Com os inimigos? A esses invadimos ou bombardeamos!
R.: Então isso não é precisamente o que pensa o Dick?
B.: Tens razão, aquele gajo mói-me o juízo e eu acabo por fazer o que ele diz e às vezes até penso que fui eu que tive a ideia! Mas diz lá coisas, menina, faz sugestões válidas, mas não te esqueças que temos que ficar por cima, temos que arranjar uma vitó-ria qualquer, em qualquer parte… sei lá…
R.: Uma estratégia agressiva não me parece propícia neste momento. Por todo o lado há resistência à nossa intervenção, ficámos enfraquecidos com aquele atoleiro no Iraque…
B.: Até tu falas assim? Não te admito! É uma situação difícil, é verdade, mas havemos de ganhar, qualquer coisa temos de ganhar, a começar por aí, foi para isso que te chamei e não para… bom, desculpa, desculpa, estamos realmente metidos numa enra-scadela dos diabos, eu sei, eu sei…
R.: De forma que, como eu ia dizendo, uma estratégia agressiva não é fácil. Bombardear, invadir, pelas resistências que suscitam nos territórios visados, e pela con-denação generalizada no mundo inteiro, são actos absolutamente desaconselhados.
B.: Ao ponto a que o mundo chegou! Já não há respeito pela força! Já não pode-mos invadir impunemente um país qualquer, pária ou não pária, arrasar uma cidade ou outra, sem que todo o mundo nos caia em cima! Bem, em todo o caso, ainda tenho alguns amigos… aqueles gémeos polacos, não me lembro dos nomes, porque são nomes que não lembra ao diabo, mas são tão simpáticos para mim, apoiam-me em tudo.
R.: Já só lá está um.
B.: Só um? Qual? E o que aconteceu ao outro?
R.: Ficou o presidente. O primeiro-ministro perdeu as eleições.
B.: Mas quando é que foi isso? Por que não me disseram nada?
R.: Foi em Outubro e foi incluído nos recortes diários da imprensa que circulam na Casa Branca.
B.: Ultimamente não me apetece ler recortes de jornais, é verdade… é tudo a cor-rer mal… Depois, é todo o dia em reuniões, recepções, despachos. Quando chego à cama, já não tenho cabeça para nada. Só para umas palavras cruzadas que a Laura me ajuda a fazer. Ela é forte em língua inglesa, mais do que eu, diga-se. Olha, está o telefone a tocar, deve ser ela. (Atende) Era, e está a chamar-me para o almoço, a sopa já está na mesa e ela detesta esperar. Continuamos esta reunião de Estado logo à tarde.





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