28 julho 2009

 

Balanço de Maio de 68

É proibido proibir
(Alberto João Jardim)

Conferi o balanço de «Maio de 68», à luz das críticas que lhe têm sido movidas e que recenseei a partir sobretudo da revista «Magazine Littéraire» de Maio de 2008, todo ela dedicada ao 40.º aniversário do movimento.
« Maio de 68» tem sido criticado á direita e à esquerda. As criticas à direita que têm feito carreira nos tempos presentes, a começar pelo presidente Nicolas Sarcozy e pelo seu conselheiro Henri Guaino) salientam, como derivando do movimento de «Maio de 68», a crise de valores, o relativismo intelectual e moral, a equivalência entre o bem e o mal, o verdadeiro e o falso, o belo e o feio, o regresso das tribos, dos bandos e das feudalidades, a crise da escola, o descalabro da família, o enfraquecimento do Estado, a pulverização da coesão social, a desorganização do trabalho, a dissolução dos costumes, a subversão das hierarquias e a crise do princípio de autoridade, a emergência de uma geração de privilegiados, que conquistou os melhores abonos de família do século passado e as melhores reformas do século presente (privilégios sacados à custa das gerações futuras), o Estado-Providência como aquela entidade capaz de responder à reivindicação ilimitada traduzida na palavra de ordem «Pedi o impossível» (Pascal Bruckner: «O que é que, nas nossas sociedades, está em condições de nos prometer o impossível senão o Estado-Providência?»). Este mesmo autor, de resto a muitos títulos interessante, põe em relevo o individualismo desmedido da geração de «Maio de 68», imputando-lhe a criação desse «monstro moderno, o hedonismo puritano», a promoção do casamento do sonho libertário com o sonho publicitário, traduzido na libertação de todas as pulsões, aliada à profusão de mercadorias, a exaltação da juventude como um fim em si, responsabilizando essa geração por «fazer da imaturidade um valor canónico e por não ter querido transmitir aos seus filhos senão a recusa da autoridade, assimilada à arbitrariedade.
À esquerda, a geração de «Maio de 68» é principalmente acusada de ter favorecido a explosão do capitalismo neo-liberal e de ter criado uma «metafísica do desejo e da felicidade», que conduziu à sociedade do consumo.
Percebem-se, através destas acusações, muitas das reacções actuais que atravessam as nossas sociedades e que identificam atitudes de muitos dos responsáveis políticos, da esquerda à direita Refiro-me, sobretudo, a uma certa política de recuperação de muitos valores tradicionais, como a autoridade e a hierarquia, a luta contra direitos económicos e sociais, crismados de «privilégios», o recuo do Estado-Providência, o endurecimento nas relações de trabalho, a degradação das condições em que este é exercido. Isto, a par de certas políticas ditas «fracturantes» que descendem de «Maio de 68» e que constituem, ao nível dos costumes, a principal marca de esquerda de uma certa esquerda instalada no poder.
Não sou apologista da geração de «Maio de 68»; concordo com muitas críticas que lhe são feitas (com outras, não). O que me questiono é sobre o destino de muitos indivíduos que contestaram radicalmente todos os fundamentos da chamada «civilização burguesa», desde a «miséria da vida sexual» à «miséria do poder». E, quanto a Jardim, que se identificará (não é preciso especular muito sobre isso) com os mais duros críticos, à direita, do espírito de «Maio de 68», achei piada a ele ter evocado, com uma certa «inocência» anacrónica, o slogan «é proibido proibir». Estou-lhe grato por me ter estimulado a esta revisitação, aproveitando o lazer do fim-de-semana, enquanto ele esganiçava a voz no Chão da Lagoa e alguém acertava mortalmente num «zeppelim» do PND (Partido da Nova Democracia), que sobrevoava a zona.





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