29 abril 2012

 

A mentira política






«Para a história da mentira política em Portugal, o recente episódio da data da reposição dos 13.º e 14.º meses, representado pelo primeiro-ministro e pelo ministro das Finanças, pode figurar como um exemplo de estudo académico. Ainda que saibamos que «as mentiras foram sempre consideradas como utensílios necessários e legítimos, não apenas do ofício político e do demagogo, mas também do homem de Estado» (assim iniciava Hanna Arendt um ensaio de 1967 sobre “Verdade e Política”), e que é dever do cidadão informado e consciente não cometer erros de cálculo e julgamento, avaliando o discurso político por critérios ingénuos, neste caso  a mentira foi exposta sem ambiguidades, irredutível a uma das variantes politicamente mais comuns: a simulação, a dissimulação, a falsa promessa. Tratou-se, em suma, de uma mentira desprovida dos habituais alibis políticos e retóricos que protegem a mentira política. Por isso, Pacheco Pereira pôde mesmo dizer que o primeiro-ministro agiu de má-fé. Tal classificação significa, em primeiro lugar, que há uma dimensão irredutivelmente ética da mentira (e que há um limite além do qual a aceitável mentira política cai na esfera da razão moral e, despolitizada, fica sujeita a outro julgamento.»

António Guerreiro, “Política, Mentira e Artes Afins”, Expresso – Actual, 21/04/2012) 





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