05 fevereiro 2013
A excitação que o álcool provoca na esfera do poder
Há sempre quem, aproveitando a
embalagem de medidas restritivas adoptadas numa situação de crise, se sirva da
parcela de poder que detém para encurtar o espaço de liberdade dos cidadãos.
Assim parece acontecer com a mais
recente congeminação dos Ministérios da Saúde e da Administração Interna – a proibição
de venda de álcool a menores de 18 anos de idade e, sobretudo, a dificultação
do acesso a bebidas alcoólicas a toda a gente, pelo seu encarecimento e
oneração com impostos (caramba! parece que a panaceia universal está na descoberta
de mais um imposto sobre o que quer que seja) e a proibição de venda dessas
bebidas, que são um psicotrópico –
note-se bem o chavão – nas estações de serviço das auto-estradas.
Tudo isto com que fundamento? Com
o de se ter vindo a registar um aumento de suicídios em Portugal e, em
situações de crise, as pessoas se refugiarem mais no álcool.
Não sei que relação científica
haverá entre o consumo de álcool e o aumento de suicídios, a menos que as
pessoas se suicidem com álcool, bebendo, por exemplo, até ficarem atestadas e
depois pegarem num fósforo e atearem o fogo ao bafo que sai da boca, como
quando se chega lume ao bico de gás dum fogão, e o corpo começar a arder como
uma tocha. Digamos que é uma forma de suicídio estrambótica.
Quanto às pessoas se refugiarem mais
no álcool em situações de crise, é outra história. A mim parece-me uma violência
e uma hipocrisia proibir as pessoas de procurarem no álcool um momento de
catarse ou simplesmente de onirismo para esquecerem as tristes agruras que lhes
são infligidas pelas estruturas do poder nas situações de crise. Só não será
assim, quando a bebedeira desemboca em agressão a valores fundamentais da
comunidade. Mas, para isso, lá está a repressão penal; não é preciso o poder acudir
à situação com mais uma medida preventiva de carácter sanitário.
No que se refere à proibição de
venda de bebidas alcoólicas nas estações de serviço, está a querer passar-se
além das marcas, saltando do terreno da saúde pública e da prevenção razoável para
o da repressão cega. Não se percebe por que é que se não hão-de vender bebidas
alcoólicas nesses locais. Mesmo que os condutores não devessem tomar bebidas
alcoólicas, o que não é exactamente verdade, nem só condutores viajam pelas
auto-estradas.
As sociedades em que vivemos
tendem a ser totalitárias, pelo controle total que pretendem exercer sobre os
cidadãos, e a política da saúde e da administração dos corpos é hoje um dos veículo principais desse totalitarismo.