23 fevereiro 2014
Tudo o que acabou
Na
comovente carta que o escritor João Tordo escreveu ao pai, o cantor Fernando
Tordo, na despedida deste para o Brasil, à procura, aos 65 anos de idade, de
melhores condições de vida (Público do
passado dia 20), transparece a animosidade que em Portugal se criou contra uma
franja etária tida como vivendo à custa de quem trabalha – os reformados.
Porém,
a frase que, na carta, mais me impressionou foi a seguinte: «Os nossos governantes têm-se preparado para
anunciar, contentíssimos, que a crise acabou, esquecendo-se de dizer tudo o que
acabou com ela.»
Na
verdade, João Tordo resume aqui, em poucas palavras, o essencial de toda uma
política de “austeridade”, levada a cabo com o pretexto da “crise” e
traduzindo-se em consideráveis (senão trágicas) perdas para uma grande parte
dos portugueses. Além disso, perdas perduráveis, visto não acabarem com a
“crise”, já que muitas delas se perderam de forma irremediável, e outras foram provocadas
para terem efeitos duradouros ou mesmo “definitivos”.
Por
outro lado, João Tordo sublinha como toda essa panóplia de consequências
funestas é rasurada num discurso político de carácter triunfalista, como se,
passada a “crise”, tudo voltasse à normalidade.