25 novembro 2014
Juan Goytisolo
Dos muitos autores de culto que foram sucessivamente preenchendo as muitas horas de leitura da minha vida, Juan Goytisolo foi um dos que mais rasto deixou. Tudo começou nos anos 70, com a leitura de "Don Julián", terrível ajuste de contas com a Espanha tradicionalista, seguindo-se a leitura dos outros livros da trilogia: "Señas de identidad" e "Juan sin Tierra", que completam a rutura com o "patriotismo" e o europeísmo. Certa ocasião, sentado numa esplanada de Tânger, olha para Tarifa, a primeira povoação da Europa, e sente nojo (conta este episódio em "En los Reinos de Taifa"). A Europa não tem deixado de lhe dar razão. Outros livros são marcantes. Lembro-me particularmente da autobiografia, e sobretudo do primeiro volume: "Coto vedado", relato pungente de uma infância, adolescência e juventude vividas no final da guerra civil e primeiros anos do regime franquista, acabando com o exílio voluntário em França. Páginas impressionantes sobre a vivência familiar (uma família poderosa, conservadora, autoritária), a descoberta progressiva da pulsão homossexual e todo o desconcerto que isso gera até à "revelação" inequívoca da sua "identidade", que doravante assumirá sem medo mas também sem exibicionismo. Enfim, um percurso pelo século XX em busca da liberdade e da identidade. Gahou agora o prémio Cervantes. Parece que só à sétima votação... É natural. Ele, afinal, é um "renegado", abandonou Espanha e a Europa, para viver em Marraquexe...