10 janeiro 2017

 

Mário Soares: um percurso sinuoso

Umas vezes à esquerda, as mais das vezes à direita, foi assim o percurso político de Soares, umas vezes com o socialismo na lapela, a maior parte do tempo com ele dentro da gaveta... Há quem na direita não o suporte, mas essa é a direita trauliteira, saudosista, colonialista. A direita inteligente reconhece nele o seu herói, o que a salvou do "comunismo"... Mas vamos por partes e comecemos após o 25 de Abril. Desde a revolução até à institucionalização do regime, a ação de Soares foi guiada pela procura de reduzir a democracia aos "mínimos" prescritos pela "democracia liberal", ou seja, a um estado de direito circunscrito às liberdades, sem componente social. Institucionalizadas contra sua vontade certas transformações sociais entretanto ocorridas (nacionalizações, reforma agrária, contratação coletiva e direitos dos trabalhadores), ele empenhou-se denodadamente na sua eliminação quando chegou ao poder, primeiro sozinho, depois aliado ao CDS. Foi sempre contra a esquerda que ele governou. O caso da reforma agrária foi muito significativo, pois ele demitiu o ministro da Agricultura socialista António Lopes Cardoso, que pretendia dar continuidade à reforma agrária, embora com algumas modificações, para meter no governo António Barreto, que levou a cabo uma política pura de razia da reforma agrária, entregando a terra aos seus "legítimos proprietários", os latifundiários absentistas, abdicando completamente da viabilização de uma reforma agrária alternativa, Toda a governação de Soares foi a de destruição do que tinha sido construído após o 25 de Abril pelos governos provisórios, para gáudio da direita. O socialismo estava lá bem no fundo da gaveta. Um momento particularmente sinistro foi a sua atitude, quando das eleições presidenciais de 1980, de se autossuspender do cargo de secretário-geral do PS, favorecendo fortemente a candidatura francamente direitista do general Soares Carneiro. Ele nunca explicou esta atitude... Depois, foi eleito PR com o apoio de toda a esquerda (muita dela engolindo elefantes vivos). Dá-se então um distanciamento em relação à direita, que se acentua no segundo mandato, em que assumiu uma posição crítica da política de Cavaco. Com a saída de Belém, passou a assumir posições mais à esquerda, que soavam tantas vezes a falso, dados os antecedentes... Mas é de registar a sua oposição à guerra no Iraque, por exemplo, e as suas críticas contundentes à deriva autoritária e austeritária da UE. No entanto, há também que registar que se recusou a comentar a "geringonça" (o que se compreende porque fora ele o construtor do "arco da governação"). Um aspeto fortemente negativo da sua personalidade era a proteção dos "amigos", mesmo quando estes eram acusados de condutas delituosas de direito comum (o primeiro foi Melancia, depois houve outros e mais outros...) Enfim, um percurso cheio de curvas (algumas perigosas), sobretudo para a direita.






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