19 janeiro 2006
Política criminal e autonomia do Ministério Público
A emissão de directivas dirigidas ao MP em matéria de política criminal é típica dos sistemas em que o MP depende do executivo e simultaneamente vigora o princípio da oportunidade. Nenhum problema se suscita aí quanto à validade ou constitucionalidade das directivas, geralmente, mas não necessariamente, oriundas do governo.
Mas a questão é totalmente diferente onde, como em Portugal, o MP é autónomo, e autónomo por prescrição constitucional. Como conciliar autonomia com sujeição a directivas externas? Note-se que o projecto governamental em discussão apressa-se a proclamar que as directivas não podem «prejudicar o princípio da legalidade, a independência dos tribunais e a autonomia do MP» (al. a) do art. 2º). Mas trata-se de uma "declaração piedosa", sem alcance normativo. O que importa é indagar se o articulado comporta algum atentado à autonomia.
O projecto tenta fazer a conciliação através de duas formas: restringindo a possibilidade de intervenção da AR à emissão de directivas genéricas; fazendo intervir no processo a AR, e dando-lhe a primazia decisória, limitando o papel do Governo à formulação da proposta. Acresce que a "vinculação" do MP é de "baixa intensidade", uma vez que, como já referi em texto anterior, as directivas da AR não afectam directamente o MP, cabendo ao PGR assumir (ou seja, interpretar, desenvolver, integrar, concretizar) tais directivas através de outras, direccionadas aos membros do MP, estas sim vinculativas para estes últimos, nos termos do seu Estatuto.
Mantendo-se, por outro lado, em vigência o princípio da legalidade e a sujeição do MP, na sua actividade, a critérios de legalidade estrita e de objectividade, creio que, embora o projecto implique alguma "compressão" do princípio da autonomia. o núcleo essencial deste está salvaguardado.
Mas com uma anotação importante: esta compressão constitui uma linha infranqueável, sob pena de lesão efectiva da autonomia. Seriam inconstitucionais quaisquer eventuais desenvolvimentos futuros no sentido de uma ampliação dos poderes de direcção (da AR ou do Governo) relativamente ao MP.
(Questão diferente é a de saber se se justifica, se é necessário, criar um instrumento como este. A essa questão já respondi, negativamente, em texto anterior.)
Mas a questão é totalmente diferente onde, como em Portugal, o MP é autónomo, e autónomo por prescrição constitucional. Como conciliar autonomia com sujeição a directivas externas? Note-se que o projecto governamental em discussão apressa-se a proclamar que as directivas não podem «prejudicar o princípio da legalidade, a independência dos tribunais e a autonomia do MP» (al. a) do art. 2º). Mas trata-se de uma "declaração piedosa", sem alcance normativo. O que importa é indagar se o articulado comporta algum atentado à autonomia.
O projecto tenta fazer a conciliação através de duas formas: restringindo a possibilidade de intervenção da AR à emissão de directivas genéricas; fazendo intervir no processo a AR, e dando-lhe a primazia decisória, limitando o papel do Governo à formulação da proposta. Acresce que a "vinculação" do MP é de "baixa intensidade", uma vez que, como já referi em texto anterior, as directivas da AR não afectam directamente o MP, cabendo ao PGR assumir (ou seja, interpretar, desenvolver, integrar, concretizar) tais directivas através de outras, direccionadas aos membros do MP, estas sim vinculativas para estes últimos, nos termos do seu Estatuto.
Mantendo-se, por outro lado, em vigência o princípio da legalidade e a sujeição do MP, na sua actividade, a critérios de legalidade estrita e de objectividade, creio que, embora o projecto implique alguma "compressão" do princípio da autonomia. o núcleo essencial deste está salvaguardado.
Mas com uma anotação importante: esta compressão constitui uma linha infranqueável, sob pena de lesão efectiva da autonomia. Seriam inconstitucionais quaisquer eventuais desenvolvimentos futuros no sentido de uma ampliação dos poderes de direcção (da AR ou do Governo) relativamente ao MP.
(Questão diferente é a de saber se se justifica, se é necessário, criar um instrumento como este. A essa questão já respondi, negativamente, em texto anterior.)