06 outubro 2007

 

O 15-9 ou o terramoto judiciário

Apanhado numa doença no fim das férias e aturdido quando, pela primeira vez após elas, me vi a braços com a barafunda dos processos e a entrada em vigor das profundas e, em alguns passos, radicais alterações dos Códigos Penal e de Processo Penal, ainda não tive tempo para retornar a este blogue. Aliás, nem tempo tive para ler os citados códigos. Foi tanta a pressa de os pôr em vigor, que nem as editoras tiveram tempo para os imprimir e colocar em circulação a tempo de poderem ser manuseados confortavelmente em livro, logo que as alterações começaram a ter de ser aplicadas nos processos. Nunca, ao longo da minha vida profissional, deparei com um cenário tão caótico e tão “stressante”, que dir-se-ia provocado acintosamente para engendrar mais “bagunçada” nos tribunais. A par de montanhas de novos recursos que ficaram retidos durante as férias e que foram distribuídos de uma assentada (afinal as “célebres” férias judiciais pagam-se caro com o esforço que vem a seguir, porque o que se não fez nas férias tem de ser feito depois a dobrar), surgiram processos por todo o lado com incidentes originados pela entrada em vigor das alterações, discutidas sob pressão nos corredores, nos gabinetes, em “mails” trocados através do correio electrónico e tendo por guia improvisados livros feitos de folhas A4, impressos a partir do Diário da República digital. Chusmas de habeas corpus, que atingiram um número avassalador, quebrando o ritmo do trabalho normal, visto que têm de ser decididos num prazo de oito dias, para além de requerimentos de toda a espécie “atravessados” em processos pendentes, muitos deles aguardando o trânsito em julgado de decisões já proferidas. Por sobre tudo isto, um ambiente de reboliço e de alta tensão nas secretarias, com funcionários ainda no gozo de férias, porque o novo sistema de férias acabou, na realidade, por gerar mais confusão, como é hoje uma verdade indesmentível. Em suma: o cenário, se não é pior, é pelo menos parecido com o banco de urgências de um hospital.
É claro que a entrada em vigor de um novo código (e desta vez foram dois, com alterações tão extensas e profundas que equivalem a novos códigos) exige sempre um esforço acrescido por parte dos aplicadores da lei, mas exigir um esforço assim, à sobreposse, para além de desumano, é incorrer acintosamente no risco de se adoptarem soluções precipitadas, multiplicando problemas que se poderiam evitar, se tudo tivesse corrido de uma forma mais preocupada com as pessoas e o amadurecimento das situações. Afinal, já se fala em alterar novamente as alterações que entraram em vigor num sábado! Isto não é só fazer apelo ao brio profissional dos magistrados e funcionários, depois de se ter feito impender sobre eles o ónus de todas as incongruências do sistema judiciário.





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