06 janeiro 2008
Diálogos entre George Bush e Condoleeza Rice (4)
B.: Então como passaste estes dias de festas?
R.: Trabalhando.
B.: Tu és realmente uma máquina de trabalho, mas precisavas de outras coisas, precisavas, enfim…
R.: George…
B.: És tão reservada! Olha, eu estive no Texas, no meu rancho, aí é que eu me sinto bem. O Texas, com as suas tradições e os seus valores, é o coração da América. Estes gajos aqui na Costa Leste têm a mania que são mais inteligentes do que nós, os texanos, e até podem ser, ma nós somos mais autênticos, mais puros, mais americanos! Quem me mandou vir para Washington, este antro de intriga e maledicência?! Enfim, sei que tinha de responder a um imperativo (é assim que se diz, não é?) patriótico, que tinha de servir a Nação, mas tanto me custa estar aqui, longe do meu rancho! E, depois, tudo continua a correr mal… 2007 foi mais um desastre. Perdi mais um grande amigo, o John, o australiano, era tão meu amigo que fazia tudo o que eu queria, mais ainda que o Tony, pois sempre se recusou a assinar aquela bodega do protocolo de Quioto, ou lá o que é… E este agora, nem sei o nome dele, foi logo assinar, deixando-nos ainda mais isolados! Como se isso aliás me ralasse alguma coisa: estamos sós, mas orgulhosamente sós!!! Não dizes nada?
R.: Estava a ouvir.
B.: Que diabo, de vez em quando convém que digas alguma coisa, de preferência que tenho razão, mas se não tiver diz também, porque, como sabes, é em ti que eu con-fio! Dizia eu que estamos isolados, mas continuamos a ser os mais fortes, temos todo o poder militar na mão…
R.: O poder militar não é tudo…
B.: Infelizmente não, o Iraque que o diga, mas em última instância é ele que vale! E nós não temos rival. Podíamos arrasar o Irão, a China, a Rússia…
R.: George…
B.: Eu sei que não vamos por aí claro, eu tenho o coração ao pé da boca, ou a boca ao pé o coração, tanto faz, eu sou do Texas, já sabes, sou frontal e directo e, além disso, estava a brincar um pouco, também tenho um pouco de espírito de humor, embora isso não seja reconhecido, aliás as minhas qualidades raramente são reconhecidas.
R.: É preciso ter cuidado com o humor, às vezes sai caro…
B.: Pois é, mas um gajo tem que desabafar de vez em quando e eu sei que tu és absolutamente discreta. Bom, mas adiante, e agora a sério, temos que falar da minha viagem ao Médio Oriente. Como pões imaginar, eu estou pelos cabelos por ter que me deslocar ali. Em primeiro lugar, não gosto de sair do nosso país (até do Texas me custa sair), até porque nunca sou bem recebido em parte nenhuma, há sempre manifestações, eu nunca as vejo, claro, mas sei que existem e não fico satisfeito, sou ridicularizado na imprensa desses países, quando são democráticos, claro, nas entrevistas sou tratado como se fosse um treinador de futebol da 2ª divisão! Estou farto! E agora fazem-me ameaças, a Al-Qaida quer liquidar-me, é claro que a nossa segurança é eficaz, mas quem gosta de viajar nestas circunstâncias?
R.: São ossos do ofício.
B.: E que ossos! E que ofício! Quem me mandou vir para cá! Reconheço que hoje não estou nos meus melhores dias, é por ter que sair já depois de amanhã! Depois, aquilo é uma confusão: uns são reis, outros são príncipes, outros são presidentes, outros são primeiro-ministros, uma barafunda em poucos dias, mas garanto-te que já não volto lá até ao fim do meu mandato, tu é que lá hás-de ir mais vezes, minha querida… são os ossos do ofício…
R.: Nunca me queixei deles.
B.: Tu realmente pareces feita de aço, mas não sei se será completamente assim…
R.: Vamos então falar um pouco dessa viagem?
B.: Claro, foi para isso que te chamei, minha querida. Vamos lá ver: o que é que eu vou dizer a uns e outros. Porque aquilo é muito complicado: Israel de um lado, os ára-bes do outro, mas os árabes também não se entendem entre eles…
R.: Uma coisa para mim é clara: temos que dar um impulso à Autoridade Palesti-niana (que de autoridade só tem o nome, reconheça-se), para isolar os radicais do Hamás. Parece-me também que não se pode deixar de falar no Estado Palestiniano, mas é arriscado falar em datas, porque os israelitas podem não gostar…
B.: Tu desculpa, mas esses judeus que vão para… eu estou fartinho deles, são duma arrogância, julgam que têm o rei na barriga, julgam que me podem impor soluções e factos consumados, quando eles não passam de um protectorado nosso naquela região…
R.: George, cuidado com as palavras…
B.: Então eles não estão sob a nossa protecção? Sem ela não teriam eles sido já lançados à água?
R.: Sim, mas eles são um posto avançado da nossa civilização naquela zona, tão vital para os nossos interesses…
B.: Para os nossos interesses, dizes bem, e são os nossos interesses que os ameri-canos me confiaram defender. Não podemos ficar subordinados aos interesses deles.
R.: Temos que tentar harmonizar as coisas.
B.: Harmonizar sim, desde que eles saibam que é aqui em Washington que as coisas são decididas!
R.: George, mas eles não podem ter essa percepção, eles são inteligentes e teimo-sos!
B.: Deixa isso comigo! Os gajos têm sempre lavado a melhor. O Bill, coitado, tentou a todo o custo obter uma solução e não conseguiu e a culpa foi do tal Bibi, que anda por lá outra vez. Eu vou ser duro. Tenho um ano para fazer alguma coisa, não os vou deixar andar a empatar. E vou explicar-lhes que eles têm que ceder alguma coisa aos palestinianos, se querem ganhar a maior fatia.
R.: Eles não gostam de dar, só gostam de receber!
B.: Os judeus parece que são mesmo assim. Mas eles têm de perceber que che-gou a altura de tomar decisões. Aliás, esta é até a melhor altura para eles, porque os palestinianos estão profundamente divididos, não é assim?
R.: Esse parece-me o nosso argumento fundamental. Se o adversário está enfra-quecido, a solução mais correcta não é esmagá-lo, é chegar a um acordo com ele, um acordo, digamos, “leonino”, para utilizar a linguagem jurídica. Claro que, em direito, um tal acordo seria nulo, mas em política é diferente.
B.: Muito bem, estamos de acordo. Eu vou ser claro com os judeus: quero um acordo definitivo entre eles e os palestinianos até ao fim deste ano e quero estar pes-soalmente presente na assinatura desse acordo. Não achas que assim poderei ainda rece-ber o Prémio Nobel da Paz?
R.: Com certeza, já outros o receberam com pior currículo, quero dizer, com menos boas acções…
B.: Bom, vamos lá ver como isso corre… já estou ansioso pelo regresso… e como estará lá o tempo? Ao menos, não chove, não é? Tenho que pedir à Laura que veja o boletim meteorológico.
R.: Chuva, esperemos que só de esperança.
B.: Deste-me agora uma boa imagem para eu citar nos meus discursos: uma “chuva de esperança”. Mas será que eles sabem o que é chuva?
(Risos de ambos)
R.: Trabalhando.
B.: Tu és realmente uma máquina de trabalho, mas precisavas de outras coisas, precisavas, enfim…
R.: George…
B.: És tão reservada! Olha, eu estive no Texas, no meu rancho, aí é que eu me sinto bem. O Texas, com as suas tradições e os seus valores, é o coração da América. Estes gajos aqui na Costa Leste têm a mania que são mais inteligentes do que nós, os texanos, e até podem ser, ma nós somos mais autênticos, mais puros, mais americanos! Quem me mandou vir para Washington, este antro de intriga e maledicência?! Enfim, sei que tinha de responder a um imperativo (é assim que se diz, não é?) patriótico, que tinha de servir a Nação, mas tanto me custa estar aqui, longe do meu rancho! E, depois, tudo continua a correr mal… 2007 foi mais um desastre. Perdi mais um grande amigo, o John, o australiano, era tão meu amigo que fazia tudo o que eu queria, mais ainda que o Tony, pois sempre se recusou a assinar aquela bodega do protocolo de Quioto, ou lá o que é… E este agora, nem sei o nome dele, foi logo assinar, deixando-nos ainda mais isolados! Como se isso aliás me ralasse alguma coisa: estamos sós, mas orgulhosamente sós!!! Não dizes nada?
R.: Estava a ouvir.
B.: Que diabo, de vez em quando convém que digas alguma coisa, de preferência que tenho razão, mas se não tiver diz também, porque, como sabes, é em ti que eu con-fio! Dizia eu que estamos isolados, mas continuamos a ser os mais fortes, temos todo o poder militar na mão…
R.: O poder militar não é tudo…
B.: Infelizmente não, o Iraque que o diga, mas em última instância é ele que vale! E nós não temos rival. Podíamos arrasar o Irão, a China, a Rússia…
R.: George…
B.: Eu sei que não vamos por aí claro, eu tenho o coração ao pé da boca, ou a boca ao pé o coração, tanto faz, eu sou do Texas, já sabes, sou frontal e directo e, além disso, estava a brincar um pouco, também tenho um pouco de espírito de humor, embora isso não seja reconhecido, aliás as minhas qualidades raramente são reconhecidas.
R.: É preciso ter cuidado com o humor, às vezes sai caro…
B.: Pois é, mas um gajo tem que desabafar de vez em quando e eu sei que tu és absolutamente discreta. Bom, mas adiante, e agora a sério, temos que falar da minha viagem ao Médio Oriente. Como pões imaginar, eu estou pelos cabelos por ter que me deslocar ali. Em primeiro lugar, não gosto de sair do nosso país (até do Texas me custa sair), até porque nunca sou bem recebido em parte nenhuma, há sempre manifestações, eu nunca as vejo, claro, mas sei que existem e não fico satisfeito, sou ridicularizado na imprensa desses países, quando são democráticos, claro, nas entrevistas sou tratado como se fosse um treinador de futebol da 2ª divisão! Estou farto! E agora fazem-me ameaças, a Al-Qaida quer liquidar-me, é claro que a nossa segurança é eficaz, mas quem gosta de viajar nestas circunstâncias?
R.: São ossos do ofício.
B.: E que ossos! E que ofício! Quem me mandou vir para cá! Reconheço que hoje não estou nos meus melhores dias, é por ter que sair já depois de amanhã! Depois, aquilo é uma confusão: uns são reis, outros são príncipes, outros são presidentes, outros são primeiro-ministros, uma barafunda em poucos dias, mas garanto-te que já não volto lá até ao fim do meu mandato, tu é que lá hás-de ir mais vezes, minha querida… são os ossos do ofício…
R.: Nunca me queixei deles.
B.: Tu realmente pareces feita de aço, mas não sei se será completamente assim…
R.: Vamos então falar um pouco dessa viagem?
B.: Claro, foi para isso que te chamei, minha querida. Vamos lá ver: o que é que eu vou dizer a uns e outros. Porque aquilo é muito complicado: Israel de um lado, os ára-bes do outro, mas os árabes também não se entendem entre eles…
R.: Uma coisa para mim é clara: temos que dar um impulso à Autoridade Palesti-niana (que de autoridade só tem o nome, reconheça-se), para isolar os radicais do Hamás. Parece-me também que não se pode deixar de falar no Estado Palestiniano, mas é arriscado falar em datas, porque os israelitas podem não gostar…
B.: Tu desculpa, mas esses judeus que vão para… eu estou fartinho deles, são duma arrogância, julgam que têm o rei na barriga, julgam que me podem impor soluções e factos consumados, quando eles não passam de um protectorado nosso naquela região…
R.: George, cuidado com as palavras…
B.: Então eles não estão sob a nossa protecção? Sem ela não teriam eles sido já lançados à água?
R.: Sim, mas eles são um posto avançado da nossa civilização naquela zona, tão vital para os nossos interesses…
B.: Para os nossos interesses, dizes bem, e são os nossos interesses que os ameri-canos me confiaram defender. Não podemos ficar subordinados aos interesses deles.
R.: Temos que tentar harmonizar as coisas.
B.: Harmonizar sim, desde que eles saibam que é aqui em Washington que as coisas são decididas!
R.: George, mas eles não podem ter essa percepção, eles são inteligentes e teimo-sos!
B.: Deixa isso comigo! Os gajos têm sempre lavado a melhor. O Bill, coitado, tentou a todo o custo obter uma solução e não conseguiu e a culpa foi do tal Bibi, que anda por lá outra vez. Eu vou ser duro. Tenho um ano para fazer alguma coisa, não os vou deixar andar a empatar. E vou explicar-lhes que eles têm que ceder alguma coisa aos palestinianos, se querem ganhar a maior fatia.
R.: Eles não gostam de dar, só gostam de receber!
B.: Os judeus parece que são mesmo assim. Mas eles têm de perceber que che-gou a altura de tomar decisões. Aliás, esta é até a melhor altura para eles, porque os palestinianos estão profundamente divididos, não é assim?
R.: Esse parece-me o nosso argumento fundamental. Se o adversário está enfra-quecido, a solução mais correcta não é esmagá-lo, é chegar a um acordo com ele, um acordo, digamos, “leonino”, para utilizar a linguagem jurídica. Claro que, em direito, um tal acordo seria nulo, mas em política é diferente.
B.: Muito bem, estamos de acordo. Eu vou ser claro com os judeus: quero um acordo definitivo entre eles e os palestinianos até ao fim deste ano e quero estar pes-soalmente presente na assinatura desse acordo. Não achas que assim poderei ainda rece-ber o Prémio Nobel da Paz?
R.: Com certeza, já outros o receberam com pior currículo, quero dizer, com menos boas acções…
B.: Bom, vamos lá ver como isso corre… já estou ansioso pelo regresso… e como estará lá o tempo? Ao menos, não chove, não é? Tenho que pedir à Laura que veja o boletim meteorológico.
R.: Chuva, esperemos que só de esperança.
B.: Deste-me agora uma boa imagem para eu citar nos meus discursos: uma “chuva de esperança”. Mas será que eles sabem o que é chuva?
(Risos de ambos)