05 janeiro 2009

 

O direito de defesa tal como Israel o pratica

Israel, como qualquer estado, tem o direito de se defender. Muito bem.
Mas os palestinianos, que têm o seu território ocupado por Israel há 40 anos, também têm o direito de se defenderem contra o ocupante. E mais: "Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão." Quem o diz não é algum radical desvairado, mas sim a nossa Constituição (art. 7º, nº 3).
O povo palestiniano tem, pois, o direito à insurreição (o que significa luta armada) contra o ocupante israelita.
Dúvidas se podem pôr quanto à forma como o Hamás tem exercido esse direito. Não se podem apoiar obviamente acções dirigidas contra civis ou que os ponham deliberadamente em risco.
Mas há que compreender que o desespero é mau conselheiro e que é Israel, com a sua intransigência, a sua arrogância e toda a prepotência e impiedade da sua acção, que tem empurrado a resistência palestiniana para o radicalismo.
Creio, aliás, que os palestinianos só têm perdido, e a perder, com as acções bombistas contra civis, que só fornecem argumentos a Israel para os tratar como simples "terroristas". Em meu entender, foi muito mais eficaz a Intifada das pedras do que a das bombas.
Mas não se pode comparar a acção destrutiva dos mísseis do Hamás com a reacção israelita. O que se está a passar em Gaza é um massacre, uma chacina generalizada, um verdadeiro genocídio do povo palestiniano, cercado no seu exíguo território, servindo todo ele, homens, mulheres e crianças, civis ou combatentes, de tiro ao alvo
dos agressores israelitas, ou expostos à morte lenta por falta dos mais elementares meios de sobrevivência. (Os assassínios colectivos da famílias inteiras para atingir apenas o "chefe" é uma invenção israelita que faz lembrar as façanhas dos seus outrora carrascos nazis, como a execução de reféns inocentes como punição de actos de resistência cometidos por outros.)
Ainda que Israel tivesse o direito de se defender, a forma desproporcionada como está a agir revela, não a intenção de se defender (aliás, a operação estava a ser preparada há meses, muitos antes da ruptura do cessar-fogo pelo Hamás), mas sim de acabar de vez com a resistência do Hamás, para "negociar" com a Fatah (entretanto, após a morte de Arafat, "domesticada"). Projecto alucinado, porque o Hamás tem uma inserção popular indiscutível, que a agressão só irá reforçar, e não pode por isso ser ignorado em futuras negociações de paz.
Nesta hora terrível para o povo de Gaza, sem electricidade, sem água, com o pão a acabar, nós, europeus, temos o dever de exigir dos nossos governos que assumam as responsabilidades que lhes cabem em defesa dos altos valores da civilização europeia, consagrados nas nossas constituições e nas declarações universais de direitos, para as quais contribuímos decisivamente. O silêncio, as declarações dúbias, as meias condenações só podem enfraquecer ainda mais o papel da Europa no mundo.
Uma certeza, em todo o caso: os povos não se abatem facilmente. O povo palestiniano continuará a luta até ao final da ocupação. Quanto mais não seja com uma nova Intifada, porventura o meio mais adequado de resistir: uma Intifada de sapatos!





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