09 maio 2009
Luandino Vieira
Parece um pouco desconcertante que um homem que passou oito anos no Tarrafal (entre 1964 e 1972), depois de ter andado cerca de três anos de cadeia em cadeia, em Luanda, condenado a 14 anos de prisão por actividades subversivas contra a segurança exterior do Estado, diga que «Os anos de cadeia foram muito bons para mim.» Esse homem é o notável escritor angolano Luandino Vieira, que, ao arrebatar o prémio pelo seu livro de contos «Luuanda», provocou o apedrejamento e o encerramento da Sociedade Portuguesa de Escritores, que teve o arrojo de galardoar, em 1965, «um terrorista».
Foi na entrevista que deu ao «Público», no passado dia 1 de Maio, que fez essa e outras afirmações aparentemente desconcertantes. Lê-la é mergulhar numa atmosfera de paz, de bonomia, de tranquila navegação no mar incerto da vida. É receber uma sábia lição da arte de bem viver, ou de como tirar partido, pelo engenho, pela superior inteligência, pela sensibilidade desperta a tudo o que nos rodeia, das circunstâncias mais adversas e até das situações injustas. A capacidade para inventar a felicidade mesmo no meio de todas as privações, para manter a dignidade humana em circunstâncias que a negam, para construir um mundo solidário e de cumplicidades entre as pessoas e os seres mais diversos, seja um companheiro de prisão, uma camponesa que vende leite à porta do campo de concentração, um director prisional, ou um pardalito que nos visita e acaba por, confiantemente, nos vir comer à mão, essa é a grande lição de amor que nos dá o grande mestre da escrita e da vida que é Luandino Vieira. Um homem que também confessa não guardar rancor a ninguém e em cuja palpável humildade se pressente uma atitude exigente face a si próprio e face ao outro, mas em que esse outro se não reduz à pessoa humana. Foi essa radical exigência que o levou a recusar o prémio “Camões”, quando lho quiseram atribuir, porque, segundo dizia, já há dezenas de anos que não produzia nada e por isso não se sentia merecedor da distinção (depois disso, apareceu em força com o pequeno-grande livro «De Rios Velhos e Guerrilheiros», o primeiro de uma trilogia, que tem por título «O Livro dos Rios»).
Revelou-se-me como escritor em Luanda, quando por lá passei no rescaldo da época colonial, em 1975. Foi uma descoberta fascinante. Quinze anos depois, tive o grato prazer de o conhecer em pessoa e de com ele manter uma conversa cativante, no Convento de São Paio, em Vila Nova de Cerveira, propriedade do escultor José Rodrigues, onde vivia e levava uma vida de eremita, entre animais e montes.
Agora, ao ler esta entrevista, senti-me outro, como que mais leve e disponível e com uma vontade de mandar às urtigas tudo aquilo a que damos tanta importância e que não é senão, a maior parte das vezes, uma forma de falsificarmos a vida e de nos defraudarmos a nós próprios. Bem haja quem assim é capaz de produzir um tal efeito num leitor.
Foi na entrevista que deu ao «Público», no passado dia 1 de Maio, que fez essa e outras afirmações aparentemente desconcertantes. Lê-la é mergulhar numa atmosfera de paz, de bonomia, de tranquila navegação no mar incerto da vida. É receber uma sábia lição da arte de bem viver, ou de como tirar partido, pelo engenho, pela superior inteligência, pela sensibilidade desperta a tudo o que nos rodeia, das circunstâncias mais adversas e até das situações injustas. A capacidade para inventar a felicidade mesmo no meio de todas as privações, para manter a dignidade humana em circunstâncias que a negam, para construir um mundo solidário e de cumplicidades entre as pessoas e os seres mais diversos, seja um companheiro de prisão, uma camponesa que vende leite à porta do campo de concentração, um director prisional, ou um pardalito que nos visita e acaba por, confiantemente, nos vir comer à mão, essa é a grande lição de amor que nos dá o grande mestre da escrita e da vida que é Luandino Vieira. Um homem que também confessa não guardar rancor a ninguém e em cuja palpável humildade se pressente uma atitude exigente face a si próprio e face ao outro, mas em que esse outro se não reduz à pessoa humana. Foi essa radical exigência que o levou a recusar o prémio “Camões”, quando lho quiseram atribuir, porque, segundo dizia, já há dezenas de anos que não produzia nada e por isso não se sentia merecedor da distinção (depois disso, apareceu em força com o pequeno-grande livro «De Rios Velhos e Guerrilheiros», o primeiro de uma trilogia, que tem por título «O Livro dos Rios»).
Revelou-se-me como escritor em Luanda, quando por lá passei no rescaldo da época colonial, em 1975. Foi uma descoberta fascinante. Quinze anos depois, tive o grato prazer de o conhecer em pessoa e de com ele manter uma conversa cativante, no Convento de São Paio, em Vila Nova de Cerveira, propriedade do escultor José Rodrigues, onde vivia e levava uma vida de eremita, entre animais e montes.
Agora, ao ler esta entrevista, senti-me outro, como que mais leve e disponível e com uma vontade de mandar às urtigas tudo aquilo a que damos tanta importância e que não é senão, a maior parte das vezes, uma forma de falsificarmos a vida e de nos defraudarmos a nós próprios. Bem haja quem assim é capaz de produzir um tal efeito num leitor.