28 fevereiro 2010
Leituras de fim de semana: "O Eterno Marido", de Dostoievski
Quando nas fastidiosas aulas de direito, nos anos 60, devorei os grandes romances de Dostoievski, escapou-me um livrinho “menor”, que só há pouco li: “O Eterno Marido”. Para constatar que não há livros menores na obra gigantesca do autor.
O adultério foi o tema por excelência do realismo do sec. XIX; basta citar, por ordem cronológica, “Madame Bovary”, “Anna Karenina”, “O Primo Basílio”. Mas em todo eles é a adúltera, e reflexamente o seu amante, que ganham o primeiro plano da cena, ela como heróica vítima, ele como cínico agressor, mas afinal “compreendido” e até “exaltado” pela sua “vitória”. O marido é nesses romances uma figura praticamente inexistente, ridícula, um pobre diabo, um “vencido” por natureza, nem herói, nem vítima, apenas uma figura do cenário de fundo do drama que se desenrola à boca da cena.
Dostoievski vai pegar também no tema do adultério, mas vai fazê-lo de forma completamente diferente. O “herói” é agora o marido enganado, o “eterno marido”. A adúltera aqui não é vítima; pelo contrário, consumou o(s) adultério(s) com prazer e proveito e morre na paz doméstica e no reconhecimento social. Não há castigo, nem sequer “crime”. É a inversão completa da abordagem daqueles outros autores.
Quando o romance começa, a adúltera já morreu e é então que o “eterno marido” inicia a sua peregrinação em busca dos amantes da mulher. Não para se vingar, nem sequer motivado pelo ressentimento. Apenas pela curiosidade, pela necessidade de saber o que tinham os outros a mais do que ele, ou de diferente, que levara a mulher a elegê-los como amantes. É essa inquietante figura enlutada que percorre as ruas de São Petersburgo, seguindo o amante da mulher, que inicialmente não reconhece de quem se trata. Depois de estabelecerem o primeiro contacto, seguir-se-á uma estranha relação, que deixa o ex-amante completamente desconcertado: que quererá o outro de facto? É uma ligação ambígua: ódio, ressentimento, inveja, admiração, e também afectividade, uma afectividade ambígua pela pessoa que a mulher amou…
O Eterno Marido é resgatado por Dostoievski da sua condição de pária ou de bobo da história, adquirindo a grandeza de “herói”, isto é, de portador da dignidade, da profundidade e da complexidade de sentimentos e razões que caracteriza a frágil “condição humana”, que, mais do que ninguém, Dostoievski, esse explorador do abismo interior, soube revelar e trazer à superfície.
O adultério foi o tema por excelência do realismo do sec. XIX; basta citar, por ordem cronológica, “Madame Bovary”, “Anna Karenina”, “O Primo Basílio”. Mas em todo eles é a adúltera, e reflexamente o seu amante, que ganham o primeiro plano da cena, ela como heróica vítima, ele como cínico agressor, mas afinal “compreendido” e até “exaltado” pela sua “vitória”. O marido é nesses romances uma figura praticamente inexistente, ridícula, um pobre diabo, um “vencido” por natureza, nem herói, nem vítima, apenas uma figura do cenário de fundo do drama que se desenrola à boca da cena.
Dostoievski vai pegar também no tema do adultério, mas vai fazê-lo de forma completamente diferente. O “herói” é agora o marido enganado, o “eterno marido”. A adúltera aqui não é vítima; pelo contrário, consumou o(s) adultério(s) com prazer e proveito e morre na paz doméstica e no reconhecimento social. Não há castigo, nem sequer “crime”. É a inversão completa da abordagem daqueles outros autores.
Quando o romance começa, a adúltera já morreu e é então que o “eterno marido” inicia a sua peregrinação em busca dos amantes da mulher. Não para se vingar, nem sequer motivado pelo ressentimento. Apenas pela curiosidade, pela necessidade de saber o que tinham os outros a mais do que ele, ou de diferente, que levara a mulher a elegê-los como amantes. É essa inquietante figura enlutada que percorre as ruas de São Petersburgo, seguindo o amante da mulher, que inicialmente não reconhece de quem se trata. Depois de estabelecerem o primeiro contacto, seguir-se-á uma estranha relação, que deixa o ex-amante completamente desconcertado: que quererá o outro de facto? É uma ligação ambígua: ódio, ressentimento, inveja, admiração, e também afectividade, uma afectividade ambígua pela pessoa que a mulher amou…
O Eterno Marido é resgatado por Dostoievski da sua condição de pária ou de bobo da história, adquirindo a grandeza de “herói”, isto é, de portador da dignidade, da profundidade e da complexidade de sentimentos e razões que caracteriza a frágil “condição humana”, que, mais do que ninguém, Dostoievski, esse explorador do abismo interior, soube revelar e trazer à superfície.