22 junho 2010

 

Auto-de-fé

O “Osservatore Romano”, não perdendo os tiques de antanho, faz o auto-de-fé de José Saramago, acusando-o de ser «um homem e um intelectual sem reconhecimento metafísico, ancorado até ao final numa confiança obstinada no materialismo histórico, aliás marxismo”. Qualificando o “Evangelho Segundo Jesus Cristo, de «desafio à memória do cristianismo”, faz o requisitório do escritor nestes termos: “Atada como esteve sempre a sua mente por uma desestabilizadora intenção de tornar banal o sagrado e por um materialismo libertário que quanto mais avançava nos anos mais se radicalizava, Saramago não se deixou nunca abandonar por uma incómoda simplicidade teológica.”
Não conclui pela condenação à fogueira, porque já não valia a pena. O relapso escritor já estava morto e, certamente, teria o castigo merecido, lá onde ninguém escapa à ira divina. Assim deveriam pensar estes censores, herdeiros do espírito inquisitorial e intérpretes obstinados do «sagrado violento». “Caridade para com os mortos”, advertiu um dia o bispo do Porto D. António Ferreira Gomes, querendo impor alguma contenção naqueles que se armavam em censores de Sá Carneiro, recém-falecido, por causa da ligação não legitimada com Snu Abecassiz. Estes inquisidores do “Osservatore Romano” desconhecem, obviamente, aquela atitude de humildade cristã para quem acaba de deixar este mundo.
Tenho a certeza que há, no “Evangelho Segundo Jesus Cristo” muito mais amor e fraternidade, que poderiam ser reclamados por um cristianismo autêntico, do que «nestas mentes atadas por uma desestabilizadora intenção de tornar banal o sagrado”.





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