16 junho 2010

 

Equidade

Fala-se de equidade a propósito dos sacrifícios exigidos pela crise. Finalmente, de todos vão ser exigidos esforços para a debelar. Ricos e pobres, todos participam com o seu quinhão de sacrifício. As medidas tocam a todos, é o que se diz. É o que dizem os responsáveis. No entanto, há uma grande porção de portugueses (talvez a maior fatia) que tem de cortar em bens essenciais: despesas de saúde; despesas de alimentação, ensino, educação. A saúde desses portugueses vai tornar-se mais débil; a sua alimentação vai ficar abaixo das carências mínimas; os estudos vão ter de ficar pelo caminho e a educação vai ser um encargo difícil de suportar.
Outros portugueses vão sofrer diminuições nos seus orçamentos e vão ter de cortar em despesas, mas que não atingem bens essenciais. Quando muito, vão ter que fazer outras opções, porventura menos ambiciosas, mas, ainda assim, satisfatórias. Outros ainda vão também contribuir com a sua quota-parte, mas não precisarão de fazer cortes em quaisquer bens essenciais, nem de fazer outras opções de vida, nem sequer – pasme-se! – de sacrificar os seus gastos em bens supérfluos e de luxo. Estes portugueses constituem uma minoria escassa, mas, no conjunto, terão, provavelmente, os principais meios de fortuna.
Isto é a tal equidade na repartição dos sacrifícios que a crise exige – uma crise que não veio do ar, nem do céu, nem foi gerada por qualquer força obscura, mas proveio de políticas concretas, de concretas escolhas económicas e da opção por determinados valores e interesses, de que se mantiveram arredados os que verdadeiramente suportam as consequências (a não ser, provavelmente. pela vaga participação em eleições periódicas) e de que auferiram os principais benefícios aqueles que para ela contribuíram e agora pouco ou nada sentem os catastróficos efeitos.
Os responsáveis da UE claro que aprovam e aplaudem as medidas que, assim, atingem os sacrificados de sempre e, mais do que isso: vão avisando que é preciso medidas mais duras em 2011. As receitas já se sabe quais são: desemprego, diminuição dos salários, quebra das prestações sociais, maior precarização das relações laborais, ou seja, aquilo que eufemísticamente se chama “flexibilização do mercado de trabalho” e que tem vindo, de degrau em degrau, a anular todos os direitos fundamentais nessa área, com a orquestração de um coro de cinismo que todos os dias trauteia o estribilho do passadismo dos “direitos adquiridos”.
Essa é a exemplar equidade na distribuição dos sacrifícios por todos. sem excepção.





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