28 abril 2011

 

Juízes pagos à peça

Não sei se a proposta será levada a sério, mas o simples facto de ter sido sugerida é inquietante.
Eu conto. Há aí um "movimento", que dá pelo nome de "Mais Sociedade", que junta notáveis pensantes alinhados ao neoliberalismo mais radical, e esse movimento propõe que a remuneração dos juízes e a progressão na carreira devem depender dos "resultados", ou seja, da quantidade e qualidade das suas decisões.
Não viria daí talvez grande mal ao mundo se não fosse divulgado que o autor da ideia (um advogado de nome Jorge Bleck, que integra as hostes do tal movimento) está a "colaborar" com o PSD na elaboração do programa eleitoral desse partido.
A ideia é demasiado peregrina para poder ter sucesso (não falando já da sua exequibilidade), mas merece alguns comentários.
É evidente desde logo a perspectiva funcionalista que lhe subjaz. O propósito de fazer dos juízes e dos magistrados em geral meros funcionários não é nova e o actual (e o anterior) governo navegaram nas mesmas águas. Mas agora dá-se mais um passo, ao introduzir-se a lógica dos "objectivos" e "resultados" (como com os gestores ou os jogadores de futebol), o que seria uma regressão institucional e cultural profunda, um verdadeiro atentado à independência dos tribunais e, por extensão, ao Estado de Direito. Os titulares dos órgãos de soberania não podem ser remunerados segundo aqueles critérios. Seria obviamente absurdo remunerar os deputados conforme os projectos de lei apresentados ou o número de intervenções feitas no plenário, ou os ministros segundo o número de portarias publicadas, ou o PR de acordo com o número (e a qualidade...) dos discursos, das mensagens à AR, ou dos vetos legislativos... Da mesma forma, os juízes não podem ser pagos à peça...
O frenesim neoliberal, que pode beneficiar de uma aceleração com as próximas eleições, coloca graves riscos de perversão democrática, sob a capa da promoção da "meritocracia".





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