26 abril 2011

 

Trinta e sete anos depois

Trinta e sete anos sobre o “25 de Abril”. Uma enorme sombra paira sobre as grandes esperanças que então se abriram. Provavelmente nenhum daqueles que viveram esse acontecimento com a vibração de uma incontida alegria, que não era senão a materialização de um sonho de liberdade acalentado ao longo de décadas de repressão e de uma mudança radical de vida, imaginariam, então, que o País viesse a resvalar para o beco onde hoje se encontra e a encafuar-se de novo numa “apagada e vil tristeza”.
Temos liberdade, sim, pelo menos a liberdade de falarmos à vontade nas ruas e nos cafés sem termos os esbirros da Pide à perna, liberdade para votarmos periodicamente e, assim, teoricamente escolhermos os representantes que deveriam defender as nossas justas ambições, liberdade de pensamento e de expressão, de imprensa e de informação (cada vez mais condicionadas por interesses espúrios). Quanto ao mais (direitos sociais, económicos e culturais), quase tudo o que se conseguiu está em derrocada e em fase de reversão total. Estamos agora a caminhar ao invés e, em certos aspectos, a regressar ao statu quo ante.
Apesar de tudo, acho lamentável o que disse Otelo Saraiva de Carvalho: que se soubesse que iríamos chegar ao ponto a que chegamos, nunca se tinha empenhado no “25 de Abril”. É uma daquelas afirmações que definem a personalidade daquele que, nos tempos áureos da esperança, em que tudo era ainda novo e, de certa maneira, puro, foi o rosto da revolução. Depois, meteu-se em cavalarias que só o desacreditaram. Para dizer a verdade, eu nunca tive grande fé nele, sobretudo a partir do momento em que ele, impulsionado por alguns visionários, começou a achar que tinha um papel imprescindível a desempenhar. As suas proverbiais contradições voltaram a aparecer nas suas declarações recentes, ao sugerir que os militares, por força das suas actuais condições de vida, poderiam canalizar a sua revolta para uma nova saída dos quartéis. Mas adiante.
Dos discursos proferidos na cerimónia que o actual presidente da República resolveu empreender, fiquei sobretudo sensibilizado por uma ideia que foi, salvo erro, batida por Jorge Sampaio e Ramalho Eanes: a de que nós, cidadãos, também não cumprimos o papel que nos compete, na medida em que ou nos conformamos ou somos indiferentes, ou apenas barafustamos, sem contudo nada fazermos. E o nosso papel é fundamental na criação de uma sociedade civil forte, exigente, interventora, condicionadora da acção dos nossos chamados “representantes”, exercendo um poder crítico, questionando, pedindo contas, desenvolvendo formas de associativismo para defesa dos interesses colectivos.
O “25 de Abril” também se fez (ou fez-se sobretudo) para isso: para que fôssemos cidadãos de pleno direito, ou seja, “políticos” no verdadeiro sentido da palavra.





<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?


Estatísticas (desde 30/11/2005)