28 maio 2012
Caladinhos que nem ratos
A "opinião pública" - disse Pessoa - é "um conjunto de instintos, e não de ideias". O chamado "caso Esmeralda" foi daqueles em que essa "opinião pública", esse "conjunto de instintos", mostrou a sua face mais primária. Acicatada, de entre outros místicos, por uma trupe de "cientistas" de "ciências" de duvidosa catadura, por gente de substância (e até uma Senhora esposa de um Senhor Presidente) que mais não tem com que se ocupar a não ser com o destilar de "afectos" (seja o que isso for) e por uma comunicação social exclusivamente interessada em "audiências" e só preterintencionalmente focada no dever de informar, todos postulando uma oposição maniqueísta entre "afectos" (lá está: os instintos) e razão, todos dando vazão a atávico desprezo pelo sistema de Justiça pátrio (e aqui também releva, e muito, pela negativa, o lamentável papel da polícia, só faltando saber se vão ser tomadas providências, ao menos disciplinares, que o 23.º ponto da decisão no mínimo sugere), enfim, todos confundindo a moral que é de cada um com o Direito que é de todos, levaram de um modo ou outro ao desrespeito de uma decisão de um tribunal e assim contribuiram de um modo ou outro para esta condenação do Estado português pelo TEDH. Não vejo nenhum desses defensores dos "afectos" (dos "instintos") contra o Direito, que é o mesmo que dizer defensores de um Estado de não-Direito, a abrirem o bico sobre esta decisão. Surgiram envergonhadas referências à mesma num ou noutro jornal da praça, como se fosse um pormenor que já não conta. Neste blogue vários de nós haviamos vaticinado desfechos que não se postam muito longe do decidido pelo TEDH. Mas, por especialmente ilustrativa, remeto para a opinião deste meu colega e amigo - como sempre com inteira razão antes do tempo.