07 agosto 2012
Viver acima das possibilidades
Uma razão que tem sido
recorrentemente invocada, para justificar as medidas de austeridade, é a de que
temos vivido acima das nossas possibilidades. Subentende-se que não todos os
portugueses, mas aqueles que passaram a ter um padrão de vida melhor com as
condições criadas pela revolução do “25 de Abril” – uma boa fatia das tão
detestadas classes médias e as classes trabalhadoras, mais propriamente, o
operariado.
Como que a impor-se como
corolário dessa afirmação, essas classes têm sido as mais sacrificadas com a
crise. As outras, as classes que sempre exerceram o seu domínio no país,
beneficiando de condições de excepção no regime ditatorial que foi derrubado
com a revolução, não só foram, com o tempo, generosamente indemnizadas dos
prejuízos causados, como rapidamente reconstituíram o seu antigo poderio.
A par dessas, novas classes
dominantes se impuseram depois da revolução, beneficiando de condições
específicas que surgiram durante e após o “25 de Abril”, com a implantação do
regime democrático.
Nenhuma dessas, porém, sofre
verdadeiramente o impacto das medidas de austeridade, a não ser por reflexo,
como consequência da crise financeira, da retracção da economia e do efeito
nesta das medidas de austeridade, de que não são alvo directo.
A crise, originada pela chamada “bolha
imobiliária” proveniente dos Estados Unidos da América, estendeu-se à Europa,
atacando os países periféricos, de economias mais débeis: Grécia, Irlanda,
Portugal e agora Espanha e Itália. Para os países da Europa do Norte, em que
pontifica a Alemanha, eram e são os PIGS.
Todos eles viviam, pelos vistos,
à custa dos países da Europa do Norte, em particular da Alemanha. Todos esses
povos têm vivido acima das suas possibilidades. Isso mesmo se deduz da receita
da troika, que é sempre a mesma: diminuir aos salários dos trabalhadores em
geral, aumentar a carga horária de trabalho e surripiar nas indemnizações por
despedimento e nas férias, cortar nos vencimentos dos funcionários públicos e promover
o seu despedimento. Tudo isso, como é de justiça, em prol da recapitalização
dos bancos, que faliram por causa das suas arrojadas engenharias financeiras, da
rentabilidade das empresas e da competitividade.
Entretanto, o foco infeccioso da
crise vai-se aproximando da França e, em breve, da Alemanha.
É claro que esse espalhamento do
vírus se deve, naturalmente, aos trabalhadores por conta de outrem, aos funcionários
públicos, às classe médias dos países periféricos, que obrigam, agora, à
adopção de medidas de austeridade, mesmo por parte dos países que custearam os
seus elevados níveis de vida.
São eles os responsáveis pela
crise do euro e da desregulação da economia.