23 fevereiro 2014

 

As modernas sociedades de controlo


 

 

O conhecido filósofo italiano Giorgio Agamben publicou um texto no Le Monde Diplomatique do passado mês de Janeiro, que tem por título (na versão portuguesa desse mensário) “Como a obsessão securitária altera a democracia”.

Nele, o filósofo expõe  o que tem vindo a acontecer nas nossas sociedades actuais em matéria de política securitária, mudando radicalmente toda a nossa vida, a começar por um princípio de hierarquia filosófica fundamental: a que intercede entre as causas e os efeitos. Já não se governa para atalhar as causas, mas para combater os efeitos, sendo mais fácil a política que visa estes, do que a que se fundamenta naquelas. Assim, temos uma combinação que pareceria improvável – a de um liberalismo absoluto em economia e um controlo securitário sem precedentes.

Hoje, as sociedades são regidas por métodos de controlo criminais, que começaram por ser usados para identificar os criminosos e prevenir a reincidência, mas que actualmente se estendem a todos os cidadãos, enquanto integrados e normalizados numa ordem geral securitária.

Desde os métodos antropométricos, usados inicialmente pelas polícias, até aos modernos digitalizadores ópticos, que permitem não só registar as impressões digitais, como a estrutura da íris, aos aparelhos de videovigilância e aos dispositivos biométricos e genéticos (a identidade social como identidade corporal), tudo vai servindo como forma normalíssima e ubíqua de controlar os cidadãos a partir dos seus aspectos mais íntimos, como se todos fossem criminosos em potência e como se a rua fosse um espaço carcerário.

Agamben mostra como, do ponto de vista do controlo securitário, a legislação actual dos países europeus é, em certos aspectos, «mais severa do que a dos Estados fascistas», a ponto de se poder questionar se essas sociedades se podem ainda considerar como democráticas e, mais radicalmente, como sociedades políticas, no sentido originário de intervenção no espaço público da polis, a partir da qual se concediam ao cidadão foros de identidade e de reconhecimento comunitário.  

Escreve Agamben: «A cidadania, outrora porta de entrada para uma politização activa e irredutível, está a tornar-se uma condição puramente passiva, em que a acção e a inacção, o público e o privado se esfumam e se confundem. O que era concretizado através de uma actividade quotidiana e uma forma de vida limita-se agora a um estatuto jurídico e ao exercício do direito de voto, que cada vez mais se parece com uma sondagem de opinião.»





<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?


Estatísticas (desde 30/11/2005)