19 março 2015

 

Listas de pedófilos e de "vips"


 

Parece que estamos em maré de listas. De um lado, a lista dos pedófilos; do outro a lista dos vips.

No caso da lista dos pedófilos, de que foi aprovada em Conselho de Ministros a respectiva proposta de lei, trata-se de fixar numa base de dados os nomes de pessoas condenadas por crime de abuso sexual sobre menores e que se manterá em aberto, após o cumprimento da pena, por um lapso de tempo que vai de cinco a quinze anos, conforme a gravidade do crime. Trata-se de exercer vigilância especial sobre essas pessoas, com fins preventivos, e de possibilitar informação policial às famílias com crianças a cargo, mediante pedido justificado.

O que essa lista traduz materialmente é uma flagrante desconfiança no sistema punitivo. Mesmo depois de cumprida uma pena, o condenado continua sujeito a um regime de vigilância policial, institucional e social (por via de informações que podem ser obtidas pelas famílias).

São princípios basilares do direito penal e consagrados na Constituição e na lei ordinária, como o princípio da culpa, enquanto função e limite da determinação da pena, e os princípios ligados aos fins das penas (prevenção geral e prevenção especial), visando prevenir a prática de futuros crimes, pela aplicação da pena justa, que, por um lado, satisfaça as exigências de defesa do ordenamento jurídico e, por outro, seja instrumento adequado de reintegração do agente na sociedade, que ficam comprometidos.

A proposta de lei vem dizer que o cumprimento da pena não é suficiente para satisfazer aquelas finalidades e que se impõe a adopção de outras medidas adicionais para prevenir a prática de futuros crimes. E que medidas são essas? Qual a sua natureza? Medidas de segurança baseadas na perigosidade do agente? Aplicadas como e por quem? Que efeito têm sob o ponto de vista da coerência do sistema?

 

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No caso da lista de “vips,” pretende-se exactamente o contrário da lista de pedófilos. Salvaguardar determinadas personalidades de qualquer curiosidade alheia relativamente à sua situação fiscal, evitando a ocorrência de casos de denúncia pública de irregularidades, como a que foi detectada no primeiro-ministro.

Enquanto ali se pretende expor, aqui visa-se ocultar; enquanto ali se almeja seguir cidadãos que cometeram determinadas crimes, aqui intenta-se ocultar das vistas públicas determinadas infracções que possam acarretar responsabilidade de pessoas ditas “vip”, isto é, cidadãos tidos como de “primeira”, pois é disso mesmo que se trata. Mas é precisamente porque se trata de “figuras públicas” que mais avulta o interesse em conhecer aspectos relacionados com o cumprimento das suas obrigações fiscais. A protecção da sua privacidade é menor do que a requerida para os outros cidadãos. Diz o art. 80.º, n.º 2 do Código Civil que a extensão da reserva da vida privada “é definida conforme a natureza do caso e a condição das pessoas”.

Algumas dessas pessoas (as que desempenham certos cargos públicos) até são obrigadas a declarar no Tribunal Constitucional os seus rendimentos, precisamente em nome de um princípio de transparência. Ora, a informação sobre o cumprimento de obrigações fiscais por parte dessas pessoas até deveria ser tornada pública, como regra e não objecto de ocultação, como se pretenderia com a lista “vip”.





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