29 setembro 2017
Schäuble de saída
Os resultados das eleições alemãs são contraditórios. A uma incontestável derrota da chancelerina, corresponde uma vitória da extrema direita; uma derrota do SPD é compensada pela opção pela recusa de mais uma "grande coligação" (o "centrão" alemão que descaracterizou e esvaziou o SPD). O Die Linke manteve (até subiu umas décimas), mas muito democraticamente é ignorado (a generalidade da imprensa portuguesa nem lhe fez referência). Mas há um resultado que os portugueses não podem ignorar, nem deixar (maioritariamente, claro) de festejar: a saída de Schäuble do governo. Saindo do governo, deixa em paz o Eurogrupo, onde era rei, acolitado pelo seu capataz Dijsselbloem, que também está de saída, defenestrado que foi pelos eleitores holandeses. O Eurogrupo vai deixar de ser uma sala de aula onde se ensinava e impunha aos alunos a austeridade como evangelho. Claro que haverá lá um ministro alemão e não dirá coisas muito diferentes das que dizia Schäuble. Mas a sua autoridade já não será a mesma, creio bem. Um pouco de ar fresco, espera-se.
28 setembro 2017
A Catalunha e os portugueses
O que está a passar-se na Catalunha mostra a matriz franquista da direita espanhola, que não consegue esconder quando precisa de garantir a Espanha "Una, grande y libre", como Franco a proclamava. Incapaz de dialogar com os catalães, mesmo com os que pretendem apenas o diálogo, Rajoy recorre a uma via que se mostrará a prazo suicida: a da repressão policial, a da criminalização do direito à autodeterminação. Será que ele e a direita espanhola acreditam que a repressão vai calar o sentimento soberanista avassalador que percorre a Catalunha? Acreditarão que, sem uma ditadura (e mesmo com ela, já que Franco não "resolveu o problema"), esmagarão esse sentimento?
A "Europa", já se sabe, não gosta de modificações no "seu" mapa. Países novos só lá para leste, aí, sim, com todo o gosto se fragmenta a Jugoslávia, primeiro, depois, a Sérvia... Derrubam-se os "maus" na Ucrânia, mesmo com risco de mais fragmentações... A "Europa" tem um conceito "à la carte" do direito à autodeterminação dos povos, de acordo com os seus interesses.
Note-se que o nacionalismo catalão nada tem de oportunista ou de acidental. A Catalunha é efetivamente uma nação, com língua, cultura (literatura, arquitetura, pintura e outras artes e outros domínios de expressão cultural), enfim toda uma identidade que remonta à Idade Média, à mesma época em que se formaram as identidades castelhana e galego-portuguesa, esta última só mais tarde cindida... A Catalunha "fundiu-se" com Castela por via conjugal em 1492, mas manteve essa identidade própria. Procurou reaver a independência em meados do sec. XVII, na mesma época em que Portugal também lutava no mesmo sentido, e foi certamente a incapacidade de Castela manter duas frentes de guerra que viabilizou a independência portuguesa. Mas o sentimento autonomista manteve-se sempre, particularmente forte durante a República de 1931-1936, e foi a grande bandeira de luta da Catalunha durante a guerra civil, tendo pago por isso um preço muito elevado durante a ditadura franquista.
Querer comparar o caso da Catalunha ao da Flandres, ou ao da "Padânia" é demonstrar a maior ignorância da história.
E que dizer dos portugueses? Aqui parece, neste cantinho da península, que não se sabe de nada do que se passa do outro lado da mesma... Nos últimos dias alguns comentários, a grande maioria contra o referendo!
O governo português cala-se. Talvez seja uma atitude "sábia", no pior sentido da palavra. Os partidos políticos, mesmo os de esquerda, estão muito ocupados com a campanha eleitoral das autárquicas, ainda não deram conta do que se passa em Barcelona, nem sequer das prisões de altos funcionários governamentais da Catalunha... Até onde e quando irá o silêncio?
Servirá de alguma coisa lembrar o nº 3 do art. 7º da nossa Constituição? Ei-lo: "Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão."
A "Europa", já se sabe, não gosta de modificações no "seu" mapa. Países novos só lá para leste, aí, sim, com todo o gosto se fragmenta a Jugoslávia, primeiro, depois, a Sérvia... Derrubam-se os "maus" na Ucrânia, mesmo com risco de mais fragmentações... A "Europa" tem um conceito "à la carte" do direito à autodeterminação dos povos, de acordo com os seus interesses.
Note-se que o nacionalismo catalão nada tem de oportunista ou de acidental. A Catalunha é efetivamente uma nação, com língua, cultura (literatura, arquitetura, pintura e outras artes e outros domínios de expressão cultural), enfim toda uma identidade que remonta à Idade Média, à mesma época em que se formaram as identidades castelhana e galego-portuguesa, esta última só mais tarde cindida... A Catalunha "fundiu-se" com Castela por via conjugal em 1492, mas manteve essa identidade própria. Procurou reaver a independência em meados do sec. XVII, na mesma época em que Portugal também lutava no mesmo sentido, e foi certamente a incapacidade de Castela manter duas frentes de guerra que viabilizou a independência portuguesa. Mas o sentimento autonomista manteve-se sempre, particularmente forte durante a República de 1931-1936, e foi a grande bandeira de luta da Catalunha durante a guerra civil, tendo pago por isso um preço muito elevado durante a ditadura franquista.
Querer comparar o caso da Catalunha ao da Flandres, ou ao da "Padânia" é demonstrar a maior ignorância da história.
E que dizer dos portugueses? Aqui parece, neste cantinho da península, que não se sabe de nada do que se passa do outro lado da mesma... Nos últimos dias alguns comentários, a grande maioria contra o referendo!
O governo português cala-se. Talvez seja uma atitude "sábia", no pior sentido da palavra. Os partidos políticos, mesmo os de esquerda, estão muito ocupados com a campanha eleitoral das autárquicas, ainda não deram conta do que se passa em Barcelona, nem sequer das prisões de altos funcionários governamentais da Catalunha... Até onde e quando irá o silêncio?
Servirá de alguma coisa lembrar o nº 3 do art. 7º da nossa Constituição? Ei-lo: "Portugal reconhece o direito dos povos à autodeterminação e independência e ao desenvolvimento, bem como o direito à insurreição contra todas as formas de opressão."
26 setembro 2017
A Catalunha e o referendo
O
que o governo central de Espanha está a fazer em relação à
Catalunha é a coisa mais idiota que já se viu. Se Rajoy pensa que é
com medidas destas que se erradicam os sentimentos nacionalistas,
está muito enganado. O que ele está a fazer é a exaltar os ânimos
cada vez mais, a fortalecer os sentimentos independentistas
e a despertar o velho ódio contra o domínio expansionista de
Castela,o mesmo de que nós nos libertámos e de que nos orgulhámos,
como povo autóctone.
Se
Rajoy pensa que, com proibições sucessivas, coarctando os direitos
mais elementares dos catalães, com processos penais sobre os
“prevaricadores”, com confiscações das urnas e de boletins de
voto, com
encerramento de “sites” na Internet, com
legiões de polícias e de militares do Estado central, que manda
para a região, consegue calar a voz e anular a vontade de um povo,
está
é a criar um estado de sítio e a fazer proliferar os desejos
independistas. Ou seja, está a actuar a favor daqueles que combate.
Se
se pode dizer que o processo do referendo catalão não tem primado
pela
observância de
um
escorreito
protocolo, nomeadamente no que toca às últimas deliberações do
Parlamento regional, isso também
é
devido
aos entraves que lhe têm sido postos pelas autoridades centrais; se
os próceres do independentismo pretendem
ultrapassar certas dificuldades internas pela criação de um
conflito aberto com o governo central e instituições correlativas
e
consequente
desencadeamento
de uma vaga repressiva, como alguns aventam, então
é caso para dizer que todas as facilidades a esse nível lhe têm
sido concedidas pelas
autoridades
centrais.
Estas
estão a contribuir fortemente para reactivar fogos antigos nunca
extintos.
21 setembro 2017
Obstáculos à paz
Entre
os obstáculos a um caminho de “paz e de prosperidade”
universais, Trump, discursando nas Nações Unidas, esqueceu-se de
enumerar um dos mais importantes: ele próprio e a sua política de
confronto e de agressividade em matéria internacional. O seu
discurso foi, aliás, uma prova disso mesmo: uma bomba incendiária.
Parece que não obteve as ovações que esperava, e isso sugere-me
uma atitude que deveria ser norma perante as suas desnorteantes
afirmações em fóruns internacionais: o silêncio, ou melhor, a
pateada. Sem, obviamente, serem descuradas outras formas de rejeição,
tanto interna como externamente.