11 dezembro 2006
Pesca de rede
Já noutra ocasião tive o ensejo de abordar, aqui e aqui, duas recentes decisões do Tribunal Constitucional Alemão sobre os limites do combate à ameaça do terrorista, sublinhando que tal instituição vem demonstrando uma louvável firmeza (que não é demais enfatizar nos tempos que correm) no que respeita à contenção dos cada vez mais fortes ataques do Estado às liberdades individuais que, como sempre sucede, se pretendem legitimar com a necessidade de garantir a segurança de todos nós.
Vem isto a propósito de mais uma decisão – agora de 4 de Abril de 2006 – que vem estilhaçar a pretensão do executivo de, em nome da segurança colectiva, sujeitar largas franjas da população a um assalto maciço ao seu direito à autodeterminação informacional. Concretamente, foi objecto do escrutínio do TCA a conformidade constitucional de uma lei que permitia à polícia a recolha, concentração, conexão e tratamento informático de um número gigantesco (da ordem dos milhões) de dados pessoais existentes em instituições públicas e privadas (universidades, registo civil, centros de registo de emigrantes, etc.) de modo a estabelecer um determinado conjunto de pessoas com um perfil correspondente ao terrorista-tipo do pós 11/9 (leia-se: homem, com idade de 18 a 40 anos, estudante ou ex-estudante, sobretudo das áreas tecnológicas, Islâmico, sem crianças por sua conta e com uma vida reservada, low profile). Visa-se, com este data screening preventivo (o, assim chamado, data screening repressivo – isto é, levado a efeito no âmbito da investigação de um crime – encontra-se regulado no § 98 do Código de Processo Penal alemão desde 1992), monitorizar e perseguir os, assim chamados, “dormentes” (sleepers), ou seja, supostos terroristas islâmicos que vivem em países ocidentais, de modo a não chamar a atenção de quem quer que seja, nomeadamente das autoridades, com o exclusivo propósito de, quando lhes for ordenado, levarem a cabo actos terroristas de grande impacto e mortandade.
Pois bem, o TCA considerou que, em face da intensa violação do direito fundamental à autodeterminação informacional que a utilização ante facto de um tal instrumento necessariamente implica, intensidade aumentada pelo carácter secreto dos procedimentos em causa, e bem assim pelo efeito estigmatizante dele decorrente, essa utilização, dizia-se, só estaria constitucionalmente legitimada onde se apurasse um perigo concreto, em termos de se verificarem factos que efectivamente e de modo actual apontem para a existência de sleepers preparando-se para desferir um ataque num futuro perspectivável. Não basta a possibilidade – sempre existente – mais ou menos difusa de um ataque terrorista. A tudo acresce que, ao que parece (e aliás sucede não raro com instrumentos deste tipo), a eficácia da data screening para atingir o fim indicado é mais do que questionável. O que por certo não é questionável é o seu potencial lesivo de um enorme número de pessoas que nada têm que ver com terrorismo.
Sobre este tema, em geral, pode-se ler mais aqui; sobre a citada decisão do TCA, pode espreitar-se aqui.
Vem isto a propósito de mais uma decisão – agora de 4 de Abril de 2006 – que vem estilhaçar a pretensão do executivo de, em nome da segurança colectiva, sujeitar largas franjas da população a um assalto maciço ao seu direito à autodeterminação informacional. Concretamente, foi objecto do escrutínio do TCA a conformidade constitucional de uma lei que permitia à polícia a recolha, concentração, conexão e tratamento informático de um número gigantesco (da ordem dos milhões) de dados pessoais existentes em instituições públicas e privadas (universidades, registo civil, centros de registo de emigrantes, etc.) de modo a estabelecer um determinado conjunto de pessoas com um perfil correspondente ao terrorista-tipo do pós 11/9 (leia-se: homem, com idade de 18 a 40 anos, estudante ou ex-estudante, sobretudo das áreas tecnológicas, Islâmico, sem crianças por sua conta e com uma vida reservada, low profile). Visa-se, com este data screening preventivo (o, assim chamado, data screening repressivo – isto é, levado a efeito no âmbito da investigação de um crime – encontra-se regulado no § 98 do Código de Processo Penal alemão desde 1992), monitorizar e perseguir os, assim chamados, “dormentes” (sleepers), ou seja, supostos terroristas islâmicos que vivem em países ocidentais, de modo a não chamar a atenção de quem quer que seja, nomeadamente das autoridades, com o exclusivo propósito de, quando lhes for ordenado, levarem a cabo actos terroristas de grande impacto e mortandade.
Pois bem, o TCA considerou que, em face da intensa violação do direito fundamental à autodeterminação informacional que a utilização ante facto de um tal instrumento necessariamente implica, intensidade aumentada pelo carácter secreto dos procedimentos em causa, e bem assim pelo efeito estigmatizante dele decorrente, essa utilização, dizia-se, só estaria constitucionalmente legitimada onde se apurasse um perigo concreto, em termos de se verificarem factos que efectivamente e de modo actual apontem para a existência de sleepers preparando-se para desferir um ataque num futuro perspectivável. Não basta a possibilidade – sempre existente – mais ou menos difusa de um ataque terrorista. A tudo acresce que, ao que parece (e aliás sucede não raro com instrumentos deste tipo), a eficácia da data screening para atingir o fim indicado é mais do que questionável. O que por certo não é questionável é o seu potencial lesivo de um enorme número de pessoas que nada têm que ver com terrorismo.
Sobre este tema, em geral, pode-se ler mais aqui; sobre a citada decisão do TCA, pode espreitar-se aqui.