22 outubro 2009

 

Evangelho, bons costumes e licenciosidade


Achei particularmente interessante e pertinente o paralelo traçado por Artur Costa, no post anterior, entre as mais recentes declarações de José Saramago na apresentação do seu livro Caim e a posição assumida por ele aquando da discussão pública sobre as caricaturas dinamarquesas.
Parece-me, de qualquer modo, que existe uma linha de continuidade e coerência. A propósito das caricaturas chegou então a ser colocado o problema da sua licenciosidade, agora Saramago procede a uma das culturalmente mais significativas avaliações sobre a Bíblia apodando-a de livro de «maus costumes», e, naturalmente, em face das suas preocupações pedagógicas adverte que «se deve manter escondida das crianças».
Para quem tem uma visão um pouco diferente sobre os livros e a vida não tem sentido criticar o Nobel Saramago pelas suas considerações sobre a Bíblia em conferência de imprensa. No meu caso devo agradecer até o seu carácter instrutivo, por um lado, em termos de auto-reflexão, ou talvez seja mais ajustado falar de autocrítica à luz de cânones saramaguianos, permitindo-me confirmar os receios de ser licencioso segundo certos defensores dos bons costumes, e ajuda-me a perceber (decerto uma autojustificação) porque muito antes das incursões evangélicas de Saramago, iniciadas há mais de 10 anos, nunca consegui apreciar as suas obras, mesmo quando escreve sobre «maus costumes», matéria com elevado potencial literário, parece ter sempre subjacente uma cartilha ou manual de «bons costumes».





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