14 dezembro 2011

 

Uma criminalização que pode ser polémica

Fernanda Palma, ex-juíza do Tribunal Constitucional e professora catedrática de Direito Penal, na sua crónica habitual do “Correio da Manhã”, escreveu desta vez sobre o consumo de prostituição. Comentando a proposta de penalização dos clientes de sexo, à semelhança do que acontece na Suécia, apresentada por uma deputada socialista ao Parlamento francês, Fernanda Palma, num esforço para situar a questão em termos aceitáveis do ponto de vista jurídico-penal, defende que a criminalização do consumo de serviços sexuais só é justificável e constitucionalmente admitida numa perspectiva: a de se fundamentar na promoção ou facilitação da exploração de prostitutas ou prostitutos por proxenetas ou redes de tráfico de pessoas. Ou seja, o consumo de serviços sexuais seria punível porque fomenta ou facilita aquelas formas condenáveis e já criminalizadas de exploração. Nesse sentido, ela conclui que o próximo passo a dar «só poderá ser a criminalização generalizada do consumo de prostituição, protegendo qualquer ser humano da utilização como objecto, com violação da sua essencial dignidade».
Sem prejuízo de outros desenvolvimentos que o caso merece, parece-me haver aqui um certo artificialismo na construção apresentada e, por fim, o descambar para uma posição moralista – a protecção do ser humano da utilização como objecto. Esse artificialismo e esse moralismo ficarão completamente a descoberto, se a intenção for a de criminalizar toda e qualquer forma de consumo de serviços sexuais por dinheiro, porque nem toda a prostituição tem por detrás uma organização de proxenetismo ou tráfico de seres humanos. Por outro lado, parece-me partir-se do princípio de que a prestação de serviços sexuais por dinheiro tem sempre como pressuposto a abolição da autonomia de quem presta tais serviços, a violação da dignidade humana e a redução a objecto dessas pessoas. Aí me parece estar encapotada uma posição moralista e paternalista. Leia-se o célebre Diário da Belle de Jour, editado pela Dom Quixote, e digam-me depois se há aí uma vítima da prostituição carecida de protecção penal. E mais, aí, a autora até trabalhava para uma agência.





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