10 abril 2012

 

Austeridade e democracia

A política de austeridade que vem sendo seguida só tem conduzido a mais austeridade e ao aprofundamento da recessão da economia, numa multiplicação de efeitos conjugados que pode levar o país ao precipício. Isto mesmo tem sido afirmado, desde há muito, por economistas de relevo, tanto nacionais como internacionais, que não se limitam a ver a realidade pelos óculos da troika e pela obstinação míope da senhora Merkel e do senhor Sarkozi. Os resultados estão à vista, levando os nossos governantes a desmentirem sucessivamente as afirmações que vão publicamente emitindo acerca do êxito das medidas e da sua suficiência.
O mais recente e clamoroso desmentido foi o caso do corte dos subsídios de férias e de Natal. Aplicado à função pública, era para ser uma medida temporária, destinada a vigorar nos anos
de 2012 e 2013. Veio recentemente o ministro das Finanças dizer que, afinal, era para durar até ao fim de 2014 e, logo a seguir, o primeiro-ministro, acrescentando mais um ponto ao conto, que a recuperação dos subsídios não era para ser obtida na totalidade em 2015, mas apenas em parte. Informações posteriores e que ganham cada vez mais consistência consideram que os ditos subsídios irão ser repostos em 10% não só em 2015, como nos anos seguintes. Segundo o Expresso, a reposição integral dos subsídios só estará concluída ao fim de 10 anos, à tal média de 10% por ano, aventando-se a hipótese de aqueles serem diluídos nos salários.
Quer isto dizer que a supressão dos subsídios vai converter-se em medida permanente, pois é isso que acaba por significar a sua reposição em conta-gotas ao longo dos anos, ao passo que a sua integração paulatina nos vencimentos constituirá um alibi para o não aumento real destes.
Estamos, assim, em face de uma nova e considerável medida de austeridade, pois é nisso que se traduz o alargamento do prazo inicial do corte dos subsídios e da sua reposição faseada ao longo de um longo tempo, implicando, na prática, a definitividade do corte, tudo muito ao contrário do que antes foi proclamado com a ênfase de uma verdade grossa como um punho.
A par disto, há a expectativa de uma nova sobretaxa vir a incidir sobre os subsídios de férias e de Natal de todos os que auferem rendimentos do trabalho, o que se traduz em mais uma grave
medida de austeridade, contra o antes afirmado pelas entidades responsáveis.
Por sobre isto, novas medidas restritivas sobre as prestações sociais, tornando-as uma miragem praticamente inatingível.
Austeridade sobre austeridade, sem que se veja o termo dos sacrifícios impostos às mesmas camadas sociais. Isto para já não falar no desemprego, sempre em crescendo.
O povo português (leia-se “as camadas sociais mais atingidas”) tem aguentado com estoicismo, segundo se diz. E tem. Mas a polícia de intervenção começa ela própria a dar mostras de
impaciência nas suas formas de actuação, talvez por causa do pavor que a reacção dos gregos suscita, e nós, como se sabe, não somos os gregos. Estamos a milhas de distância deles, quer na forma de honrar os compromissos que nos vão lançando para o atoleiro e em relação aos quais responsáveis do próprio FMI, de ordinário insensíveis ao sofrimento dos povos em dificuldades, já começam a reconhecer necessidades de ajustamento, quer na forma como nos comportamos.
Quanto à democracia, na União Europeia, é cada vez mais um simulacro e, internamente, vai-se afunilando, não só por força de limitações impostas pela troika à nossa soberania e por ingerências várias nos nossos assuntos internos, como por opção política, em que dominam
espaços de silêncio, de secretismo e de arredamento dos cidadãos das decisões mais importantes.





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