21 abril 2013
Os tribunais e a realidade circundante
O presidente da República lembrou
na Colômbia que os tribunais têm de estar atentos à realidade que o país
atravessa. Eis uma verdade com a qual será difícil não estar de acordo.
Questiona-se se o presidente da
República teve ou não em mente algum tribunal especial, nomeadamente o Tribunal
Constitucional, cuja decisão sobre a Lei do Orçamento tem constituído o facto
judiciário mais relevante nestas duas últimas semanas.
A verdade é que o presidente da
República referiu-se genericamente aos tribunais e não, especificamente, a
nenhum deles. Por outro lado, ele foi uma das personalidades que requereu a fiscalização
da constitucionalidade, por ter dúvidas sobre a conformidade de algumas normas
daquele diploma legislativo com a Lei Fundamental.
Por conseguinte, nesse contexto,
parece um pouco paradoxal que, na sua advertência, tenha querido referir-se
especialmente ao Tribunal Constitucional e, logo, por ter declarado a
inconstitucionalidade de algumas normas da Lei do Orçamento, quando ele próprio
teve dúvidas sobre a constitucionalidade de parte dessas normas. A menos que
ele tenha querido fazer a advertência, não ao Tribunal Constitucional, por ter
decidido como decidiu, mas àqueles que, nomeadamente ao Governo, vêm criticando
o TC por não ter, alegadamente, mostrado solidariedade com as demais
instituições e órgãos de soberania na situação decorrente do Programa de
Ajustamento Económico e Financeiro que o país atravessa.
Foi, então, como se lembrasse a
esses críticos que o TC cumpriu o seu dever, atendendo à realidade económica e financeira
decorrente das medidas de austeridade, que têm pesado de forma muito problemática,
para não dizer calamitosa, sobre certos sectores da sociedade portuguesa.
De resto, é muito avisada a
observação do presidente da República sobre a necessidade de os tribunais em
geral deverem atender, nas suas decisões, à realidade circundante, sobretudo
nesta situação de crise. Por exemplo, muitos juízes do crime continuam a fazer
impender, negativamente, sobre os arguidos a situação de estarem desempregados,
sem terem em devida conta a realidade de desemprego forçado que é a nossa,
actualmente.
Outras situações são as dos
arrendatários que não podem pagar as rendas de casa, as quais, não obstante a
crise, subiram de forma generalizada; a das pessoas que perdem a casa por deixarem
de ter possibilidade de pagar os empréstimos aos bancos e continuarem com
dívidas aos mesmos bancos, correspondentes à diferença entre o preço obtido em
hasta pública e o valor do empréstimo que ainda falta pagar, etc., etc., etc.
Em todas essas situações e muitas
outras, os tribunais, nas decisões que têm de emitir, deveriam atender, como
advertiu o presidente da República, à realidade que o país atravessa.