19 fevereiro 2017
De episódio em episódio até à vitória final
O
caso das negociações entre o Ministério das Finanças e António
Domingues foi muito mal conduzido e tem partes obscuras. Desde logo é
lamentável que o Ministério das Finanças tenha ido até tão longe
na cedência a exigências do banqueiro tendentes a alterar o
Estatuto do Gestor Público, de modo a furtá-lo a um conjunto de
obrigações a que o gestor público de modo geral está vinculado.
Uma dessas exigências, por sinal tida como muito relevante para
Domingues – a isenção de entrega de declaração de rendimentos
ao Tribunal Constitucional – falhou o alvo, por inabilidade ou
falta de previsão de quem conduziu as negociações. E essa foi a
circunstância que fez estragar tudo, dando azo a falatório e
agitação nos meios políticos e em certos sectores da opinião
pública e à desistência do próprio Domingues de administrador da
Caixa Geral de Depósitos.
Ora,
a meu ver, o Ministério nunca devia ter cedido às exigências
daquele, pelo menos a certas dessas exigências, como se o que
contasse fosse apenas a questão do saneamento financeiro e a
viabilidade da Caixa com total desprezo pela ética de serviço
público.
Como
resultado dessa falta de sensibilidade ética e política, seguiu-se
este confrangedor rosário de peripécias em que ambas as partes se
têm visto envolvidas, com inevitável desdouro para o governo em
geral e Centeno em particular, com este a enredar-se em explicações
mais ou menos confusas e perplexas. Porém, o caso deveria ter ficado
encerrado com a saída de Domingues e a sua equipa, mas a oposição
está obstinada em fazer dele o seu cavalo de Tróia para mortificar
o governo, abater o ministro e tirar daí o seu quinhão de vitória.
Não conseguindo ver concretizadas as suas profecias de desgraça,
nem vendo a sorte bafejar-lhe os seus anseios de que o governo entre
em colapso e o país em crise que lhe devolva o palanque do poder, a
oposição agarra-se ao caso Centeno como cão a um osso, filando-o
com os caninos a ver se a presa lhe não foge. Inclusive brande a
ameaça de procedimento criminal por falsidade nas declarações
prestadas à comissão de inquérito, arremedando um cenário de
“empeachment” ao ministro. É esta a sua primeira grande
oportunidade. Fazer um dramalhão em vários actos, cada qual o mais
confrangedor, arvorar-se em campeã da ética e, ao mesmo tempo, em
vítima da falta dela por parte de quem se opõe aos seus intentos e
pôr fora de campo um elemento que parece fundamental no governo, a
ver se, jogando sem esse elemento, corrido a cartão vermelho,
consegue obter uma ligeira vantagem e recuperar o tempo perdido.