28 outubro 2008
A crise do capitalismo
A seguir à implosão da União Soviética e à queda do Muro de Berlim, o capitalismo entrou numa fase de euforia sem limites, como se, finalmente, tivessem desaparecido todos os entraves à sua pretensão de domínio como “ordem natural” da economia. A retracção dos direitos fundamentais, nomeadamente dos direitos dos trabalhadores, consequente a tal desabamento, restituiu-lhe o velho rosto e o velho espírito de ganância. Em certos aspectos, regressou-se a uma espécie de “acumulação primitiva do capital”, não no sentido histórico em que Marx falou dele, mas no sentido metafórico, em que “primitivo” corresponde a “selvagem”: intensificação do ritmo de trabalho, diminuição de salários e perda de regalias, desemprego em massa, deslocalizações de multinacionais, que se mudam para mercados onde os trabalhadores não têm quaisquer direitos e trabalham a baixo custo, deslocalização dos próprios trabalhadores, exploração infame da mão de obra imigrante, quase reduzia à escravidão, enfim, liquidação do sistema de segurança social.
Ao mesmo tempo, o sistema financeiro começou a ganhar predomínio num espaço globalizado e a distanciar-se da economia real, assentando em bases fictícias, em que os jogos dos especuladores da bolsa, acicatados por um ânimo de lucro puxado até limites de alto risco, com incentivos irrealistas e remunerações principescas dos principais operadores do sistema, passaram a constituir uma espécie de roleta de casino. Foi assim que, por uma audaciosa engenharia, como agora se diz, se transformaram créditos sem garantia nenhuma de pagamento em títulos financeiros, estes títulos foram depois vendidos por bancos a sociedades de investimento, disseminando-os pelo mundo inteiro para diluírem o risco e com uma cotação elevada conferida por agências de notação, que estimavam esse risco por baixo, graças à referida disseminação. As companhias de seguros entraram nesse jogo perigoso, garantindo as perdas que pudessem ocorrer aos seus segurados (os detentores daqueles títulos) através de uma sistema complexo de transferência ou intercâmbio de riscos entre diversos sectores económicos e diversos países (os denominados credit defaullt swaps). Não sei se este mecanismo é exactamente como o descrevo, a partir de uma leitura atenta e interessada de numerosos artigos que fui coligindo de jornais e revistas. O que sei é que, graças a este autêntico “jogo de pocker”, como lhe chamou um articulista no mensário Le Monde Diplomatique, tudo acabou por ruir, falências de bancos arrastando a de seguradoras na principal sede do capitalismo financeiro – a Wall Street - e logo contaminando todo o mercado financeiro mundial, inundado de produtos ditos “tóxicos”. A economia real também acaba por vir de cambulhada por aí abaixo, inaugurando um persistente e doloroso período de recessão, de consequências muito funestas.
É este o panorama do capitalismo na era neoliberal. Um capitalismo que liquidou os direitos sociais fundamentais e que desregulou os mercados financeiros e o próprio sistema económico, pondo em causa a sobrevivência de milhares de trabalhadores e a estabilidade de países inteiros.
Esta crise, como sempre, não é paga pelos causadores dela, mas pelas suas vítimas. Os Estados acodem a ela de afogadilho, num intervencionismo que se cifra sobretudo na socialização dos prejuízos e na salvação do sistema (o Estado-bombeiro). Trata-se de “refundar o capitalismo” em novas bases, dizem os responsáveis imbuídos de maior preocupação ética, até porque, como escreve Miguel Gaspar na sua crónica de hoje, no “Público”, “o fim do capitalismo é um problema teórico do marxismo, não do capitalismo”. Quanto ao socialismo, foi submerso no mar das utopias.
Ao mesmo tempo, o sistema financeiro começou a ganhar predomínio num espaço globalizado e a distanciar-se da economia real, assentando em bases fictícias, em que os jogos dos especuladores da bolsa, acicatados por um ânimo de lucro puxado até limites de alto risco, com incentivos irrealistas e remunerações principescas dos principais operadores do sistema, passaram a constituir uma espécie de roleta de casino. Foi assim que, por uma audaciosa engenharia, como agora se diz, se transformaram créditos sem garantia nenhuma de pagamento em títulos financeiros, estes títulos foram depois vendidos por bancos a sociedades de investimento, disseminando-os pelo mundo inteiro para diluírem o risco e com uma cotação elevada conferida por agências de notação, que estimavam esse risco por baixo, graças à referida disseminação. As companhias de seguros entraram nesse jogo perigoso, garantindo as perdas que pudessem ocorrer aos seus segurados (os detentores daqueles títulos) através de uma sistema complexo de transferência ou intercâmbio de riscos entre diversos sectores económicos e diversos países (os denominados credit defaullt swaps). Não sei se este mecanismo é exactamente como o descrevo, a partir de uma leitura atenta e interessada de numerosos artigos que fui coligindo de jornais e revistas. O que sei é que, graças a este autêntico “jogo de pocker”, como lhe chamou um articulista no mensário Le Monde Diplomatique, tudo acabou por ruir, falências de bancos arrastando a de seguradoras na principal sede do capitalismo financeiro – a Wall Street - e logo contaminando todo o mercado financeiro mundial, inundado de produtos ditos “tóxicos”. A economia real também acaba por vir de cambulhada por aí abaixo, inaugurando um persistente e doloroso período de recessão, de consequências muito funestas.
É este o panorama do capitalismo na era neoliberal. Um capitalismo que liquidou os direitos sociais fundamentais e que desregulou os mercados financeiros e o próprio sistema económico, pondo em causa a sobrevivência de milhares de trabalhadores e a estabilidade de países inteiros.
Esta crise, como sempre, não é paga pelos causadores dela, mas pelas suas vítimas. Os Estados acodem a ela de afogadilho, num intervencionismo que se cifra sobretudo na socialização dos prejuízos e na salvação do sistema (o Estado-bombeiro). Trata-se de “refundar o capitalismo” em novas bases, dizem os responsáveis imbuídos de maior preocupação ética, até porque, como escreve Miguel Gaspar na sua crónica de hoje, no “Público”, “o fim do capitalismo é um problema teórico do marxismo, não do capitalismo”. Quanto ao socialismo, foi submerso no mar das utopias.