17 setembro 2015

 

Prisão preventiva: dois esclarecimentos para os ignorantes

A propósito de um caso judicial muito conhecido têm aparecido na imprensa, e também saídos da boca de pessoas (alegadamente) responsáveis, alguns comentários que revelam nuns casos má fé, noutros cândida ignorância, a propósito da aplicação da prisão preventiva, em termos tais que parece que vivemos sob a alçada da inquisição. Cada um pode pensar o que quiser sobre esse ou qualquer outro processo judicial. Mas algumas coisas tem que saber para poder comentar com seriedade. Duas coisas nomeadamente, que passo a expor. A primeira é que o despacho que aplica a prisão preventiva contém necessariamente a descrição dos factos concretamente imputados ao arguido, a enunciação dos elementos do processo que indiciam esses factos e a qualificação jurídica dos mesmos. Não tem pois sentido afirmar que o arguido em prisão preventiva desconhece a "acusação", no sentido de que desconhece os factos ou os crimes lhe são imputados. Conhece-os e pode impugná-los imediatamente junto dos tribunais superiores... Kafka não é para aqui chamado; se o for, é invocado em vão... Outra questão é a do prazo da prisão preventiva, que seria escandalosamente excessivo por permitir a prisão por um ano até à acusação formal do MP... Este sobressalto de cidadania não deixa de fazer sorrir, já que obviamente direcionado para a proteção (exclusiva) dos arguidos "ilustres" (por que não se lembraram antes, já que o prazo vigora desde 1987?)... De qualquer forma, a afirmação enferma de vários vícios. Em primeiro lugar, o prazo da prisão preventiva até à acusação só é de um ano nos casos em que o processo é por crime punível com prisão superior a 8 anos ou por um dos crimes do catálogo enunciado no nº 2 do art. 215º do CPP (que o legislador, quer dizer, a AR, bem ou mal, entendeu equipararem-se àqueles) e o processo for declarado de especial complexidade. Normalmente o prazo é de 4 meses, prazo que se eleva para 6 meses nos casos já referidos do nº 2 do art. 215º. Acresce que, compulsando as normas correspondentes de vários países próximos (Espanha, França, Alemanha, por exemplo), constata-se que aí o prazo normal da prisão reventiva é de um ano... Quer dizer, a lei portuguesa é mais benévola... Em resumo, a ignorância devia estar de boca calada... Já à má fé não se pode pedir o mesmo, evidentemente; só um pouco de decência...





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