02 junho 2006

 

“Ressocialização” de espaços e atitudes nos Tribunais Portugueses

Também, BAAMONDE, Xulio Ferreiro, La víctima en el proceso penal, Madrid: La Ley-Actualidad, SA, 2005, pp. 180-183, aponta várias soluções para evitar a vitimização secundária, partindo da ideia de que é necessário dotar o processo penal de uma nova orientação, tendo em atenção os interesses e as necessidades da vítima (a nível dos “operadores da justiça” – v.g. polícias, funcionários, magistrados - importa mudar a atitude e forma de contacto com a vítima, criando maior empatia; há que oferecer medidas de protecção e assistência se necessário; estando em causa vítimas menores, pode-se aliviar a ansiedade do depoimento, em julgamento, através da separação física em relação ao arguido, de modo a que não se estabeleça o contacto visual ou então permitir que as declarações sejam prestadas junto a uma pessoa que o apoie; pode-se adequar as instalações judiciais às necessidades das vítimas e testemunhas; nos tribunais ter salas de espera suficientes de modo a separar as testemunhas de acusação das da defesa; facilitar estacionamento, transporte público, pessoal habilitado a prestar informações, especialmente destinadas a resolver dúvidas, como informações pontuais sobre os horários previstos para as intervenções processuais e suspensões dos julgamentos; edição de folhetos informativos que indiquem os direitos das vítimas e os lugares onde podem obter assistência).

Nas medidas que possam vir ainda a ser tomadas não se pode esquecer, além do mais, a garantia dos direitos de defesa do arguido, bem como o direito a um processo equitativo.

Em particular, quanto ao depoimento prestado pelo menor, fora da presença do arguido, ver BARRETO, Irineu Cabral, “Os Direitos da Criança – na Convenção Europeia dos Direitos do Homem”, in Direitos das Crianças, Corpus Iuris Gentium Conimbrigae 3, Coimbra: Coimbra Editora, 2004, pp. 85-88, alertando para a jurisprudência do TEDH, no sentido de «o princípio do contraditório ficar protegido se o defensor ou o seu representante estiverem presentes e [o] possam interrogar», citando, ainda, os Casos A.M. v. Itália, ac. de 14/12/1999 e SE. v. Itália, ac. de 12/1/1999 (queixa nº 36686/97).

GASPAR, António Henriques, “Tribunal Europeu dos Direitos do Homem (Direito Penal e Processual Penal) 2002”, RPCC, ano 13, fasc. 2, Abril-Junho 2003, pp. 266 e 267, recorda o Caso S.N. v. Suécia, ac. de 2/7/2002, no qual o “Tribunal apreciou a compatibilidade entre o modo como foram prestadas as declarações da vítima em processo por crime de natureza sexual e as garantias concedidas pelo artigo 6, § 3, alínea d), da Convenção», sendo certo que, «[nas] circunstâncias do caso, a testemunha que estava em causa – a vítima - foi a única prova na qual se baseou a convicção dos tribunais sobre a culpabilidade».
Assim, continua o mesmo Autor, «impôs-se ao Tribunal averiguar se o arguido dispôs de uma oportunidade adequada e suficiente de exercer os seus direitos de defesa a respeito da prova produzida por essa testemunha. (…) O TEDH fez notar que o registo de vídeo das primeiras declarações prestadas na polícia foi exibido durante o julgamento e na audiência no recurso, e que o registo das segundas declarações foi lido perante o tribunal do julgamento e a gravação destas declarações foi passada perante o tribunal de recurso. Nestas circunstâncias, tais medidas foram consideradas suficientes para permitir ao requerente contraditar, no decurso do processo, as declarações e a credibilidade da testemunha, tanto que tal contradita se revelou eficaz, pois o tribunal de recurso reduziu a pena aplicada ao requerente por considerar não provados parte dos factos de que era acusado. Embora reiterando que a prova obtida através de testemunha, em condições nas quais os direitos de defesa não são assegurados na extensão normalmente exigida pela Convenção, deve ser tratada com extrema cautela, o Tribunal considerou que, no caso, as instâncias internas haviam agido com a cautela exigível na avaliação das declarações prestadas pelo menor durante a investigação».

Salienta ainda GASPAR, António Henriques que, no Caso Craxi v. Itália, ac. de 5/12/2002, apreciou-se «a valoração de prova testemunhal produzida em fase anterior à audiência pública. (…) Com efeito, em certas circunstâncias, pode ser necessário que as autoridades judiciárias recorram a declarações prestadas na fase do inquérito ou da instrução, nomeadamente quando a impossibilidade de reiterar as declarações é devida a factos objectivos, como é por exemplo a morte do seu autor, ou quando seja necessário proteger o direito da testemunha a manter o silêncio sobre circunstâncias que podem originar a sua responsabilidade penal. Se o arguido tiver oportunidade, adequada e suficiente, de contraditar tais declarações, no momento em que foram produzidas ou posteriormente, a sua utilização não afecta, apenas por si mesma, o artigo 6, § 3, alínea d). No entanto, os direitos de defesa serão limitados de modo incompatível com o artigo 6 sempre que uma condenação se baseie, unicamente ou de maneira determinante, nas declarações de uma pessoa que o arguido não teve oportunidade de interrogar ou fazer interrogar, seja na fase anterior, seja durante a audiência».





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