11 maio 2007

 

Envelope findo ou anatomia de um gato que pariu um rato


Quando foi publicada a resolução que instituiu a «comissão eventual de inquérito parlamentar ao processamento, disponibilização e divulgação de registos de chamadas telefónicas protegidos pela obrigação de confidencialidade» tive oportunidade de referir que «lendo a Resolução da Assembleia da República nº 56/2006 pode constatar-se que a sua previsão é muito abrangente e genérica, visando um “inquérito parlamentar ao processamento, disponibilização e divulgação de registos de chamadas telefónicas protegidos pela obrigação de confidencialidade”. A República deve aguardar serena e atenta a metodologia adoptada e os esclarecedores resultados de tão ampla tarefa».

Hoje, ao ler o relatório final da Comissão e confrontando-o com a resolução instituidora constatei que a «ampla tarefa» indagatória da comissão se terá cingido a umas «disquetes» que, embora referidas, não eram identificadas na resolução, um gato inicialmente escondido?
O objectivo final identificado no título e enunciado no nº 1 da resolução, nem sequer é mencionado no relatório final (decerto por razões de economia já que o texto é de apenas 62 páginas) e quando no nº 2 da resolução se menciona «designadamente» afinal queria significar-se «exclusivamente», e também quanto às alíneas o que aparecia no texto da resolução como um «Processo “fantasma” que ao cair sobre a alínea d) ainda pairou nas duas últimas alíneas (e) e f))» e me levou a questionar se seria «algo de “que toda a gente sabe o nome” “mas ninguém se atreve a nomear”? », domina o relatório final onde, acabou por se assumir que o processo n.º 1718/02.9 JDLSB constitui «o caso objecto desta comissão» (p. 59) - pelo que o nome da comissão terá sido algo exagerado já que, afinal, tratou-se apenas da comissão eventual de inquérito parlamentar ao envelope 9 do anexo V do processo n.º 1718/02.9 JDLSB.
O tratamento do caso, contudo, em nada se pareceu com o de um processo judiciário já que depois do relatório e, para evitar confusões, desenvolveu-se a parte B, com o título « Matéria de facto e de direito» (pp. 28 a 60) aí se inserindo a conclusão.

Aliás, qual seria o motivo para a Assembleia da República se interessar por uma questão incipiente como o «processamento, disponibilização e divulgação de registos de chamadas telefónicas protegidos pela obrigação de confidencialidade», quando tinha a oportunidade de, com a sua superior autoridade, poder concluir que, num processo concreto relativamente à apensação de uma disquete, «se verificou alguma “desatenção” e “esquecimento”, conforme os depoimentos prestados pelo Ex-Procurador-Geral da República, Souto Moura e o Sr. Procurador João Guerra, à semelhança do já anteriormente afirmado no relatório da PGR, na sequência da reportagem do “24 horas”, de 13 de Janeiro de 2006 [*]».

A dúvida que mantive centra-se no motivo que levou a comissão a nem sequer referir no relatório final a ««ampla tarefa» para que foi mandatada, cingindo-se ao que aconteceu num processo penal concreto... terá sido fruto de uma «desatenção» da comissão ou o texto da resolução não passava de uma «ficção»?

[*] Parece que, decerto em virtude de uma pequena desatenção, o que se refere como «relatório da PGR» será o despacho final da fase de inquérito de um processo penal concreto.

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