26 outubro 2017

 

A decisão de que se fala





Tenho uma certa relutância em tecer considerações sobre uma decisão judicial alvo dos “media”, em primeiro lugar, por uma questão de reserva que impende sobre os magistrados e, em segundo lugar, porque já fui vítima de uma campanha mediática injustificada por causa de uma decisão de que fui relator em que quase toda a gente falou sem ter lido o acórdão e sem se ter apercebido da real situação que lá se discutia (em deliberação da Entidade Reguladora da Comunicação Social datada de 22/11/2007, esta acabaria por “considerar procedente a queixa apresentada [por mim, contra o jornal que despoletou o caso], por desrespeito do dever jornalístico de relatar os factos com rigor e exactidão e interpretá-los com honestidade e por ter violado direitos de personalidade do queixoso”), mas não vou fazer comentários sobre o acerto ou desacerto dessa decisão, muito menos a partir do que se diz na comunicação social.
Apenas quero referir-me ao teor daquela parte da fundamentação que fala do adultério da mulher. Em bom rigor, a decisão seria exactamente a mesma sem essa parte (aliás, breve), porque o acórdão confirma o decidido na 1.ª instância (não atenua a pena, como erradamente tem sido dito). O recurso foi interposto pelo Ministério Público (por sinal, uma Procuradora), que pretendia o agravamento da pena. Porém, a Relação manteve-a, considerando justos os critérios de determinação da penalidade imposta. Simplesmente o aresto reforça o decidido com as infelizes considerações sobre a Bíblia e o Código de 1886 para fulminar o adultério da mulher (e só desta), acrescentando que o tribunal de 1.ª instância até poderia ter ponderado uma atenuação especial da pena.
Ora, por aí é que o acórdão patenteia a ideologia de quem o assina, ideologia na verdade ultrapassada (e quero crer que minoritária na sociedade portuguesa actual) e desajustada dos valores constitucionais. O que causa maior espanto é o mesmo ter sido assinado por uma mulher (a desembargadora adjunta), sem que esta se tenha distanciado dessa parte da fundamentação, que, como disse, nem sequer tem relevância para o decidido a final. Isto, a menos que a referida desembargadora comungue do que lá foi escrito, o que parece incompreensível, atento o particular empenho das mulheres na sociedade portuguesa actual (e não só) na materialização da igualdade de género, um objectivo que, de resto, integra os valores fundamentais da Constituição.
Talvez seja ocasião para lembrar que o Código de Processo Penal também foi penetrado pela ideia de austeridade, tendo-se diminuído radicalmente o número de juízes que formam o colégio decisório nos tribunais superiores, agora reduzido a dois, com o presidente a desempatar no caso de empate, o que fragiliza a decisão e pode mais facilmente dar origem a erros e deslizes como este.

Não creio, no entanto, que o problema se subsuma a uma carência de formação especializada dos juízes, pois ele tem a ver com a formação geral e mais concretamente com a interiorização dos valores e princípios constitucionais, porque estes, seja qual for a ideologia própria de cada um (e os juízes têm inevitavelmente a sua) têm de ser respeitados por força de um compromisso básico que a profissão tem de envolver. 

24 outubro 2017

 

O presidente e as suas imagens

Quem, nos últimos dias, se tenha debruçado sobre a nossa imprensa e sobre as emissões jornalísticas de radiodifusão e televisivas, há-de ter notado uma quase unanimidade de pontos de vista no que toca à leitura de comportamentos, atitudes e vários outros sinais veiculados pela palavra, pela expressão corporal e pela exteriorização de sentimentos polarizados nas figuras do presidente da República e do primeiro-ministro.
A par de uma clara rendição ao presidente da República, cuja actuação foi frequentemente classificada de brilhante, a análise jornalística das relações entre ele e o primeiro-ministro, enquanto figura máxima do governo, foi predominantemente feita com o uso de um vocabulário expressivo de força e dominação, muitas vezes recorrendo a metáforas em que a força física, usada no confronto directo ou na competição, tem um valor primacial.
A palavra “poder” foi a mais recorrentemente usada, não no exacto sentido jurídico-político, mas no sentido de força, demonstração de quem manda, atribuindo-se ao presidente da República uma mais valia na afirmação de poder pessoal e não propriamente institucional (“mostrou quem manda”; “somou poder” foram expressões usadas).
Dar um murro na mesa”; “partir a louça toda”, eis outras expressões significativas de uma autoridade mandona e insofrida atribuídas ao presidente da República.
Já “ter dado um soco no estômago” e “ganho o round” são expressões do âmbito da força bruta e de desportos violentos, como o box, que certos jornalistas não se coibiram de usar.
Nesta pugna entre o presidente da República e o governo, houve mesmo quem avançasse para o domínio político propriamente dito e configurasse a partir daí o estatuto do presidente da República, parecendo reconfortar-se euforicamente na ideia de um alargamento dos poderes presidenciais, no sentido de uma sobreposição destes às competências próprias do Executivo e de uma interferência do presidente na agenda do governo.
Ora, o que de todo este panorama verbal sobressai é uma visão jornalística das relações entre o órgão “presidência da República” e “governo” baseada no confronto e na truculência e desbordando do figurino constitucional.
Esta visão não será certamente a mais conveniente ao presidente da República, que, correndo incansavelmente a parte do país martirizado, confortando as pessoas doridas, como é seu timbre, com exuberante manifestação de ternura e compaixão, conquistou, como se diz, “o coração dos portugueses” e aumentou a sua popularidade, mas que não terá querido, nem com o seu discurso de chamada do governo à realidade, nem com o seu infatigável calcorreio, “dar um murro no estômago de ninguém”, nem “partir a louça toda” ou simplesmente “mostrar quem é que manda”.

Se conseguiu uma quase unanimidade de pontos de vista, isso dever-se-á a um enormíssimo mérito para “somar poder”, mas um poder que é sobretudo o grande poder dos afectos. Um poder tão grande, tão grande, que levou a imagem compassiva do presidente e, com ela, do país, além fronteiras, à capa de revistas de renome internacional. Portugal conquistou o mundo pelo coração do presidente e não pelo “murro dado na mesa”.

 

A mulher adúltera

O adultério da mulher é naturalmente encarado como um cataclismo pelas sociedades patriarcais. Assim foi também em Portugal. Mas as coisas mudaram, aconteceu o 25 de Abril, data de rutura no sistema político e ordenamento jurídico, e também na sociedade.
Invocar, como faz um acórdão de um tribunal superior agora divulgado, normas jurídicas portuguesas revogadas e obsoletas e ordenamentos jurídicos e religiosos arcaicos para desculpabilizar um ato de violência doméstica "punindo" o adultério da mulher, é absurdo. Não só é absurdo, como revela um desfasamento com o ordenamento constitucional que o 25 de Abril inaugurou: laicização da sociedade, igualdade entre os sexos, liberdade de autodeterminação pessoal, etc.
Quem entende que "o adultério é um gravíssimo atentado à honra e dignidade do homem" comunga de uma visão do mundo anacrónica, em que a família e a própria sociedade assenta na honra do "pater familias" e o adultério da mulher é um crime de lesa-majestade, legitimando que o marido por qualquer forma "limpe a sua honra", ainda que de forma brutal. Nessa visão do mundo, o adultério da mulher é necessariamente uma "provocação" ao marido, como aliás estabelecia o art. 372º do CP de 1886, artigo que foi revogado expressamente após o 25 de Abril, ainda antes da aprovação do novo CP, pelo DL nº 262/75, de 3-5. Será preciso lembrar que não são as normas revogadas que vigoram?
E que dizer da expressão: "as mulheres honestas são as primeiras a estigmatizar as adúlteras"? Que é isso de "mulheres honestas"? As adúlteras, isto é, as que violaram o dever de fidelidade conjugal, não são honestas? São delinquentes? Será preciso lembrar também que o adultério não é crime, nem constitui já sequer fundamento expresso para o divórcio litigioso?
Enfim, uma decisão desastrosa, aliás, mais que desastrosa, absolutamente inaceitável no nosso ordenamento jurídico. Não haverá recurso processual, mas alguma coisa terá de acontecer!
É mau de mais para tudo ficar em águas de bacalhau.
Compreende-se o comunicado do CSM, cauteloso mas simultaneamente incisivo, mas não bastará.
Isto não é tolerável!


20 outubro 2017

 

Rentabilizar os mortos

A moção de censura do CDS é uma iniciativa ignóbil. Mais não visa do que procurar aproveitar a dor alheia para atingir objetivos políticos imediatos. A presidente do CDS põe-se outra vez nos bicos dos pés e fica mais alta que o PSD, sem presidente. Ela sabe que a moção vai ser derrotada, mas o que lhe importa é "chegar-se à frente"... Não se honram assim as vítimas!
E o que dizer do PR? Este é o terreno ideal para ele: ombro acolhedor para todas as lágrimas... Já tinha prometido ir passar o Natal a Pedrógão Grande, mas agora por quantos pedrógãos terá de passar para não falhar a sua missão misericordiosa?...
Assumindo-se como a "voz e o coração do povo" contra o insensível, distante e indiferente Estado, faz um ultimato ao Governo, sobre o qual faz cair demagogicamente todos os anátemas e agravos, ameaçando usar todos os seus poderes (mesmo o uso de armas nucleares). Mas irá ter de engolir a derrota da moção de censura e lá vai continuar a bomba atómica guardada no paiol presidencial...

19 outubro 2017

 

As tragédias portuguesas





Se a tragédia de Pedrógão revelou falhas também a nível do governo, nomeadamente no que diz respeito ao ministério da Administração Interna, como resulta do relatório dos peritos, que só conheço através das sínteses dos jornais, a tragédia destes últimos dias torna-se mais grave, por, aparentemente, o governo não ter aproveitado os ensinamentos daquela e ter relaxado após a cessação oficial do Verão e a entrada no Outono, reduzindo os meios de combate, quando é manifesto que as estações andam trocadas e alteradas. Porém, os que agora aparecem a gritar a sua indignação, que quota-parte é que não têm nas mais de 100 mortes que ocorreram nas duas tragédias, para assim fingirem de inocentes e exibirem o seu mais do que duvidoso luto, enchouriçados de preto até ao pescoço?
Costa teve o azar de ambas as tragédias terem ocorrido no seu governo, mas elas podiam ter acontecido, mais coisa menos coisa, com qualquer outro governo, pois cada qual tem vindo a contribuir com a sua acção ou inacção, ao longo destas décadas, para a deflagração delas. O governo anterior não está isento e além do mais, cedendo a interesses particulares, até procedeu à liberalização do eucalipto, que tem sido apontado, conjuntamente com o pinheiro, como o combustível mais propício, na nossa ordenação florestal, ao alastramento dos fogos. E os governos centrais não são, como já referi em escritos anteriores, os únicos culpados; também o são as autarquias, outras entidades singulares e colectivas e os próprios cidadãos.
Nós, portugueses, somos mesmo assim. Na hora da verdade, o nosso país revela imensa fragilidade e pouca ou nula credibilidade. Quando a tragédia nos bate à porta, não falta quem lamurie, quem se indigne, quem responsabilize o outro, como não falta quem se desentranhe em solidariedade e quem mostre o rosto compungido diante das câmaras da televisão ou nas capas dos jornais. Mas, passada a hora do luto e da lágrima, já estamos a cair no comportamento relaxado e, pior do que isso, a defraudar as regras que nós próprios criamos para prevenirmos tragédias futuras.
O Marquês de Pombal foi dos raros homens de Estado que, diante da tragédia, voltou costas à lamentação e à carpidura e enfrentou as dificuldades com energia, denodo e lucidez, lançando uma fantástica obra de recuperação e de prevenção de desastres futuros, mas as gerações posteriores não só não lhe deram continuidade, como se encarregaram de a ir destruindo, até que sobrevenha a próxima catástrofe.
Ora, do que nós precisamos é desse espírito de coragem, rasgo e tenacidade, mais do que de lamentação e de pedidos de desculpa (as mortes não se desculpam). Precisamos é de mudar de mentalidade e de atitude para iniciarmos um novo ciclo, não apenas político, mas de vivência colectiva.





16 outubro 2017

 

Outra vez a ronda dos incêndios



Não adianta pegar no fogo para incendiar este governo. Se faltam fundamentos para uma oposição consistente, não são os fogos deste Verão que desborda da quadra própria, tendo começado na Primavera e prolongando-se pelo Outono, que os vão fornecer a quem anseia por exibir a voz grossa da indignação. Culpados são todos os governos que nos têm governado e não só eles, mas os responsáveis aos vários níveis da administração, os proprietários de terrenos que os descuram, os interessados em que o fogo lavre, os cidadãos que negligenciam comportamentos perigosos, enfim, os incendiários dolosos, porque os há e cada vez se suspeita mais da sua acção criminosa, em atenção a um conjunto de indícios que parece apontar para isso.
O malogrado escritor Paulo Varela Gomes chamou-lhes “os incêndios do regime” num livro de crónicas fascinante intitulado Ouro E Cinza (Tinta da China, 2016). Escreveu ele:

«O território português que está a arder – que arde há vários anos – não é um território abstracto, caído do céu aos trambolhões: é o território criado pelo regime democrático instalado em Portugal desde as eleições de 1976 ( a Terceira República portuguesa). Está a arder por causa daquilo que o regime fez, por culpa dos responsávies do regime e dos eleitores que votaram neles.
«Ardem, em Portugal, dois tipos de território: em primeiro lugar, a floresta de madeireiros, as grandes manchas arborizadas a pinheiro e eucalipto. A floresta arde, porque as temperaturas não param de subir e porque, como toda a gente sabe, está suja e mal ordenada.
(…)
«O segundo tipo de território que está a arder, em particular neste ano de 2005, é o território das matas periurbanas, características dos distritos mais feios e mais destruídos do país: os do litoral centro e norte.
«(…) é o território das casas espalhadas por todas as encostas e vales, uma aqui, outra acolá, encostadas umas às outras sem espaço para passar um autotanque, separadas por caminhos serpenteantes que ficaram em parte por alcatroar, é o território das oficinas no meio dos matos de restolho sujo de óleo, montanhas de papel amarelecido ao sol, garrafas de plástico rebentadas. É o território dos armazéns mais ou menos ilegais, cheios de materiais de obra, roupas, mobiliário, coisas de pirotecnia, encostados a casas ou escondidos em eucaliptais, o território dos parques de sucata entre pinheiros (…), de lixeiras clandestinas.
«Este rerritório foi criado, inteiramente criado, pela Terceira República. Nasceu da conjugação entre um meio-enriquecimento das pessoas, que, trinta anos depois do 25 de Abril, não chega para lhes permitir uma verdadeira mudança de vida, e o colapso da autoridade do estado central e local, este regime de desrespeito completo pela lei, que começa nos ministros e acaba no último dos cidadãos» …

Doze anos depois, o panorama, se não é o mesmo, é porque se agravou, comendo pessoas, animais e casas. Um panorama sério e trágico, pelo qual a responsabilidade começa nos ministros e acaba no último dos cidadãos.

Que os que pretendem fazer processos de intenções, sobretudo os politiqueiros do costume, comecem por levar a mão ao peito e dizer: mea culpa.

11 outubro 2017

 

O problema catalão

Dá-me a impressão que nós, portugueses, somos de uma forma geral sensíveis ao problema catalão, independentemente de posicionamentos ideológicos, o que é compreensível num povo que conquistou a independência com rebeldia e teimosia. Tenho verificado essa sensibilidade através da leitura de vários textos de opinião e da audição radiofónica de vários depoimentos e mesmo de entrevistas que tenho visto na televisão. Confirmei-o mais uma vez ontem, lendo o magnífico artigo de Paulo Rangel no Público, intitulado “Catalunha: nem só de pão legal e razão formal vive o homem”. Muitas vezes abandono a leitura dos seus artigos, quando descambam para a apologia político-partidária, o que é frequente, mas este lê-se com gosto do princípio ao fim. Trata-se de um texto muito bem informado e recheado de erudição política, jurídica e histórica, que nos dá um quadro através do qual a compreensão da pretensão à independência, por parte do povo catalão, se nos torna mais luminosa, muito embora o seu autor declare que vê «no processo independentista catalão algo muito nefasto e perigoso».
Porquê, então, este afã de demonstrar que existe, na história da Catalunha, esta legitimidade que confere ao povo catalão a pretensão à independência? Porque o problema é político e não se resolve com a força policial, nem com a invocação da legalidade que exisitiria do lado das autoridades centrais, face à desobediência das autoridades da Catalunha, como tem sido argumentado por Madrid de forma atrozmente inflexível. Diz Rangel: «… não vamos lá apostando tudo no direito; não vamos lá invocando argumentos formais de vácuo histórico e de marco sem precedentes. É preciso mais, muito mais. Sabedoria e sageza.»

Ora, isso é precisamente o que falta. Carles Puigdemont, declarando a independência sem efeitos imediatos, isto é, uma independência meramente simbólica ( e mais não lhe era possível, dada a situação a que se chegou), deu agora um passo para que uma solução negociada seja possível. Porém, Rajoy e companhia parecem determinados em prosseguir o caminho da vingança e da cegueira repressiva. Mas com isso estão a alimentar a fogueira do separatismo e da irreconciliabilidade.

10 outubro 2017

 

Catalunha: adiamento da independência, não renúncia

Decisão avisada e responsável esta do governo catalão de adiar a declaração de independência, para abrir uma pausa para o diálogo...
Mas o governo espanhol está tão cego que pode não querer aproveitar a oportunidade de negociar, como lhe foi recomendado sensatamente por Tusk.
É claro que o governo espanhol não pode perder completamente a face, tem de manter grandiloquentes declarações de princípios, etc,
Mas seria bom que discretamente começasse a dialogar, retirar a Guardia Civil para onde gostam mais dela, aliviar a tensão em todo o país. E com a consciência de que os catalães não vão esperar pela independência lá para as calendas... Se não vier a haver um calendário tudo se vai complicar de novo... Se não for estabelecido um sério processo negocial o governo de Espanha, este ou outro, arrisca-se a perder a Catalunha da pior maneira, para a Catalunha e para a Espanha...

09 outubro 2017

 

As preocupações presidenciais com a "justiça"

Aproveitando o dia da República, mais uma vez o PR fez algumas "alusões" à "justiça", agora na perspetiva da "morosidade". Embora uma concreta morosidade: a que atinge certos "cidadãos", aos quais se deve garantir "que a sua inocência ou culpabilidade não será um novelo interminável",,, Preocupação decerto justa, mas que pecará por ter referências muito explícitas, tão explícitas que não foi preciso explicitá-las para serem logo decifradas por todos...
Mas este tipo de alusões (ou "recados", como habitualmente se diz na imprensa) não ajuda nada... Mais vale dizer as coisas direitas se se quer contribuir para a solução dos problemas. O PR já falou diversas vezes sobre a "justiça", mas ainda não se percebeu o que quer, ou seja, quais os problemas que aí deteta. Onde foi mais explícito foi na obscura proposta já por várias vezes enunciada de um "pacto" entre todos os "corpos" (já não me lembro que palavra exatamente usou) intervenientes. Essa ideia pactícia não me parece nada boa, não estamos na "concertação social"...
Mas aguardemos que as ideias presidenciais sobre a "justiça" venham a beneficiar de alguma clarificação... Talvez na abertura do ano judicial, quem sabe...


 

Fachada democrática, coração franquista

Hoje um representante do PP espanhol lembrou o destino de Lluis Companys, o primeiro que ousou declarar a Catalunha uma república independente. Fugiu-lhe a boca para a verdade: fossem outros os tempos e o "problema" da Catalunha seria rapidamente "resolvido"... Mas, pensando bem, com o fuzilamento de Companys não morreu o sentimento autonomista, como agora está demonstrado à evidência...
Mas o franquismo está de tal forma enquistado na mentalidade daquela gente que eles não conseguem pensar em saídas que não sejam repressivas: ministério público, tribunais, polícia de choque (espanhola, a patriótica Guardia Civil). O TC anda também muito empenhado em "amparar" com todas as suas forças e urgências a legalidade... Será que os juízes do TC de Espanha conhecem apenas as leis espanholas, não conhecem os grandes textos jurídicos internacionais que consagram o direito à autodeterminação dos povos?
Alguém de bom senso acredita que é possível sair do atual impasse sem negociação? Alguém pode acreditar que o recurso pelo governo de Madrid à repressão policial/criminal terá sucesso, mesmo só a curto prazo? Vai o governo espanhol prender os governantes catalães, acusá-los de traição à pátria? Como reagirá a Catalunha (independentistas e os outros)?
A única solução é negociar, e já, ainda hoje, que amanhã poderá ser tarde... Às vezes a história anda depressa...


 

Schäuble: o reconhecimento implícito da derrota

Schäuble, na sua última presença no Ecofin, dá Portugal como exemplo de sucesso da ditadura da austeridade que ele impôs na Zona Euro! Mas quem pretende ele enganar? Julgará que as pessoas se esqueceram que ele excomungou a geringonça, que pressagiou os maiores infortúnios para Portugal se o novo governo continuasse a inverter a política seguida por Passos Coelho, aumentando salários, pensões e rendimentos?! É uma estratégia dos vencidos: elogiarem a obra dos vencedores, como se fosse sua!

05 outubro 2017

 

O Nobel da Literatura

Este ano é um inglês, mas com cara de japonês. Não sei se o Farage (e o Boris Johnson) vai gostar... Não o conheço, mas a Academia Sueca diz que é uma mistura de Jane Austen com Kafka e ainda com um bocadinho de Proust... Os ingredientes são bons, a mistura não sei...
Mas uma coisa é certa: desta vez é um escritor o premiado, um escritor mesmo.

04 outubro 2017

 

O discurso de Filipe VI

O rei de Espanha demorou tempo a reagir. Dir-se-ia que teve o tempo suficiente para amadurecer a sua posição e exercer o seu poder moderador com régio equilíbrio. Afinal, saiu-se de uma forma desastrada, desequilibrando ainda mais os pratos da balança. Falando grosso, acusou o governo da Catalunha de “deslealdade inadmissível”. Falou da unidade de Espanha, mas utilizando uma linguagem de desunião e fornecendo mais argumentos para o separatismo. Sobre a violência “inadmissível” da Polícia Nacional e da Guardia Civil, nem uma palavra.

Os milhares de catalães que o seguiram pela televisão (e, certamente, não só estes) ficaram desiludidos. Alguns, que nem eram pela independência da Catalunha, segundo declararam, mas que se encontravam entre os manifestantes por causa da referida violência policial, manifestaram o seu desapontamento: “Afinal, só há culpa dos catalães?...”, interrogavam-se, perplexos. “O rei devia era ter apelado ao consenso entre os políticos, os de cá e os de Madrid…», diziam. Esperavam, com razão, que o rei tivesse mais equanimidade e bom senso. Mas os reis, como se sabe, já não são assistidos por uma sageza que lhes vinha do sangue que lhes corria nas veias. 

02 outubro 2017

 

Cá e lá



Por cá, o resultado das eleições acabou por dar a machadada definitiva nas sucessivas vindas redentoras do diabo, o qual rondaria por aí até ao momento azado de mandar para o inferno a actual fórmula de governo e repor no poder quem nos governou entre 2011 e 2015, fazendo uma política de inversão dos valores fundamentais do Estado de direito democrático e social.



Quanto aos nossos vizinhos da Península, é caso para dizer que Rajoy acabou por dar um fantástico e dramático empurrão à causa catalã. O diabo tece-as, não há dúvida, sobretudo quando encontra pela frente apropriados servidores.

 

Oeiras: esse enigma

Houve ontem muitos vencedores, mas o vencedor de Oeiras destaca-se acima de todos.
E a pergunta é: como é possível? É que não estamos no interior do Brasil, nem nalguma parcela remota e obscura do território nacional, à margem da informação e do conhecimento. Oeiras fica encostada a Lisboa e, segundo dizem, tem a maior densidade nacional de licenciados por metro quadrado (ou cúbico, não sei bem). Este caso precisa de estudo, não uma qualquer tese de mestrado de um mestrando, mas um estudo profundo por uma equipa multidisciplinar (sociólogos, psicólogos, antropólogos, psiquiatras, historiadores, filósofos, enfim, especialistas de todos os saberes). É imperioso decifrar o enigma.

 

Catalunha: um processo acidentado, mas sem recuo

Rajoy, julgando que basta ter a Guardia Civil para impor a "ordem", cometeu um erro histórico e provavelmente irreparável para a sua "causa"... A Guardia Civil cometeu também o erro elementar de "atuar" à velha e boa maneira franquista, esquecendo-se que hoje há sempre gente a filmar nem que seja com telemóveis. Depois essas imagens passam para a TV (é uma chatice não se poder impedir isso), para o estrangeiro,e por aí fora, e lá se vai a "reputação democrática" do regime.
A independência da Catalunha não está ainda garantida, vai ser um processo longo e acidentado. Mas alguém acredita verdadeiramente que doravante será possível trazer "democraticamente" a maioria dos catalães ao seio da "mãe Espanha"?
As imagens que vimos ontem, os cravos vermelhos e de outras cores apontados às carapaças dos guardas, as lágrimas ou as palmas de muitos dos votantes, ao depositarem o voto, assinalam provavelmente o momento histórico do "nascimento de uma nação"...

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